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23 dezembro 2024

Bispos e Papas (13): Vítor

 Por: Alcides Amorim 


Bispo Vítor I [1]


Continuando a lista dos bispos e papas, destacando inicialmente os listados por Eusébio de Cesareia, ele descreve a ordem dos bispos até o número 12 de seu livro História Eclesiástica (HE) [2], que foi Eleutero. Este aparece no final do seu livro 5, capítulo VI: “O décimo segundo desde os apóstolos no episcopado agora é Eleutero, na mesma ordem e na mesma doutrina...”.  Os demais bispos citados por ele, não aparecem na ordem numérica.

O próximo bispo, o número 13 na ordem dos bispos romanos, é Vítor. “No décimo ano do reinado de Cômodo, Eleutero, que tinha mantido o episcopado por treze anos, foi sucedido por Vítor...” (EC, 5, XXII). Na lista de todos os papas da Igreja Católica (p.ex., aqui), o nome Vítor é acrescido do número I (Vítor I) e corresponde ao 14º papa da lista, considerando que o Apóstolo Pedro também foi papa, juntamente com os demais bispos de Roma. Na Lista, há também o Vítor II (1055-1057), que ocupa a 153ª posição. 

As informações que transcrevemos sobre Vítor I são de fontes católicas, por exemplo, nesta [3] e nesta outra [4].

Vítor I:

  • Nasceu na atual Tunísia, norte da África. Portanto, o primeiro “papa” africano
  • Seu pontificado [ou bispado] foi marcado por definições importantes na liturgia da igreja, referentes a (o):

- Idioma: uso do latim na celebração da missa, ao invés do grego; 

- Batismo: uso de qualquer água no rito batismal;

- Páscoa: celebração no domingo, dia da ressurreição de Cristo;

- Domingo: dia mais importante da semana, em lugar do sábado judaico;

  • As definições litúrgicas acima foram institucionalizadas no primeiro Concílio de Niceia (325).
  • Vítor I também combateu heresias como o adocionismo [5], que ”... pregava que Jesus Cristo não era filho de Deus, mas um homem puríssimo e superior aos outros, adotado por Ele como seu filho...” (Nota 4).

Eusébio (5, XXIV) afirma que o bispo Vítor recebeu de Polícrates, líder dos bispos da Ásia, uma carta na qual afirma: “... assim observamos o dia genuíno, sem pôr nem tirar. Pois na Asia grandes luzes já dormem, as quais ressuscitarão no dia da manifestação do Senhor, em que Ele virá do céu com glória e levantará todos os santos... Todos eles [Filipe e João (apóstolos), Policarpo e outros] eles observam o décimo quarto dia da páscoa de acordo com o evangelho, não se desviando em nada, antes, seguindo a regra da fé...”. Eusébio afirma que Vítor tentou excomungar Polícrates e outros por terem tido essa opinião, mas depois reverteu sua decisão após Irineu e outros terem intercedido. Observe que aqui percebemos divergências doutrinárias entre as igrejas da Ásia e as de Roma...

Bem, segundo esta fonte , Vítor I foi papa entre 189 a 199. E no vídeo, a seguir, veja mais sobre o Bispo ou papa Vítor I.


Notas / Referências bibliográficas:

17 dezembro 2024

Ciro, o persa... e outros

Por: Alcides Barbosa de Amorim

O rei Ciro, ao qual nos referimos aqui, também chamado de Ciro II e Ciro, o Grande, foi responsável pela formação do Império Persa e a efetivação de uma política de expansão territorial, consolidando um dos maiores impérios da Antiguidade. E também foi um instrumento de Deus em favor de Israel, chamado inclusive por Deus de “meu pastor” e meu “ungido”.

Ciro, o grande, com o seu cilindro [1]

1.  Ciro e o Império Persa

O planalto do Irã, região montanhosa e desértica, situado à leste do Crescente Fértil [2], entre a Mesopotâmia e a Índia, foi povoado pelos medos e pelos persas. A princípio, os persas eram dominados pelos medos. Essa situação se inverteria por volta de 559 a.C., pois nessa época, sob o comando de Ciro, os persas dominaram os medos e passaram a controlar a região.

Com Ciro, os persas se estenderam por um largo território e conquistaram vários reinos como Babilônia, Egito, Reinos da Lídia, Fenícia, Síria, Palestina e regiões gregas da Ásia Menor. Ciro governou entre 559 e 530 a.C.

Ciro era descendente de Teispes, neto de Ciro I e filho de certo Acaemênio Cambises. Dentre suas virtudes destacamos o fato de que ele respeitava os costumes e religiões dos povos conquistados e defendia os direitos humanos. Por conta disto Ciro gozava de elevada reputação também entre os judeus.

Ciro era da Dinastia Aquemênida e depois dele, segue a lista de reis desta dinastia [3]: Cambises II (530-522 a.C.); Esmérdis (522 a.C.); Dario I, o Grande (522-486 a.C.); Xerxes I (486-465 a.C.); Artaxerxes I (465-424 a.C.) etc., até a conquista do Reino por Alexandre, o Grande (336-323 a.C.). Para nosso propósito, no entanto, queremos destacar apenas a pessoa de Ciro, o Grande, e como ele chegou à Babilônia, em 539 a.C., pondo fim à hegemonia babilônica, como – teologicamente falando – um instrumento de Deus para a realização de sua vontade naquele momento histórico, sobretudo em favor de Israel.

2.  Ciro e a conquista de Babilônia

Em Isaías 44.28 se lê: “Que digo de Ciro: É meu pastor, e cumprirá tudo o que me apraz, dizendo também a Jerusalém: Tu serás edificada; e ao templo: Tu serás fundado”. Ligando os textos bíblicos com a história, sabemos que aqui foi a primeira vez que Ciro é mencionado pelo nome. E o nome Ciro foi profetizado por Isaías cerca de mais de 150 anos antes de ele nascer, pois Isaías profetizou entre 740 e 701 a.C. e Ciro, o persa, reinou entre 559 e 530 a.C.

Deus governa sobre toda a terra usando pessoas como instrumentos para cumprirem seus propósitos. No texto de Isaías 44.24 até 45.25, o instrumento que Deus usou foi Ciro, chamando-o, inclusive de “meu pastor” (44.28) e “ungido” (45.1). Com esse último título (ungido), por exemplo, Ciro é, em determinado sentido, considerado o precursor gentio, ou tipo do Messias: Jesus Cristo. W. Fitch [4] destaca que “... Flavo Josefo (Antiguidades [5], 11:1, seção 2) registra que mostraram a Ciro esta profecia quando ele entrou na Babilônia, resolvendo logo o monarca dar-lhe cumprimento...”. Sabe-se que Isaías faleceu provavelmente em 701 a.C., e em seu trabalho sobre o assunto Gabriel Girotto Lauter afirma que “... isso faz com que muitos tenham dificuldade em crer que se trata de uma profecia genuína, mas defendem que essa porção do livro tenha sido escrita no período em que os fatos aconteceram...[6]”. Mas, como sabemos pelas Escrituras, Deus anuncia o “fim” desde o “princípio” e “... desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam...” (Is 46.10).

Considera-se que a expressão “Que diz a profundeza: ‘seca-te’” (Is 44.27) seja um ardil de que Ciro se serviu para conquistar Babilônia. Nabonido era o rei na época e foi o último governante da Babilônia. “Por artes de engenharia, [Ciro] desviou as águas do Eufrates do seu curso através da cidade, e fez com que os seus soldados entrassem nela pelo leito seco do rio” (Fitch, Nota 4). Isto ocorreu em 539 a.C. Mas, segundo ainda Lauter, “... as tropas de Ciro sitiaram a cidade e seu general entrou nela sem precisar lutar. O povo da Babilônia recebeu Ciro como libertador e não como conquistador...” (Idem, Nota 6). Heródoto, segundo Fitch, informa ainda que “... as portas de Babilônia eram em número de cem. Todas elas se abrirão [abriram] de par em par, revelando tesouros ocultos, escondidos nas caves e lugares secretos da cidade[7]. Bem, podemos resumir o que diz a Bíblia acerca de Ciro, assim, conforme os cinco primeiros versos do capítulo 45 de Isaías:

  • Deus escolheu Ciro como seu agente para cumprir sua divina vontade. E ai dos que se opusessem ao seu governo!
  • Deus o ungiria como rei, iria à sua frente e aplanaria as montanhas.
  • Deus arrebentaria portões de bronze e quebraria trancas de ferro.
  • Deus lhe daria tesouros escondidos e riquezas guardadas em lugares secretos.
  • Ciro cumpriria a vontade do Deus de Israel mesmo não conhecendo-O.

Assim diz o SENHOR ao seu ungido, a Ciro, a quem tomo pela mão direita, para abater as nações diante de sua face, e descingir os lombos dos reis, para abrir diante dele as portas, e as portas não se fecharão. Eu irei adiante de ti, e endireitarei os caminhos tortuosos; quebrarei as portas de bronze, e despedaçarei os ferrolhos de ferro. Dar-te-ei os tesouros escondidos, e as riquezas encobertas, para que saibas que eu sou o Senhor, o Deus de Israel, que te chama pelo teu nome. Por amor de meu servo Jacó, e de Israel, meu eleito, eu te chamei pelo teu nome, pus o teu sobrenome, ainda que não me conhecesses. Eu sou o Senhor, e não há outro; fora de mim não há Deus; eu te cingirei, ainda que tu não me conheças...” (Is 45.1-5).

3.    O decreto de Ciro e o fim do cativeiro

Importante destacar que o Soberano Deus usa reis e outras importantes personalidades como Lhe apraz, seja para castigar ou abençoar o seu povo. Por exemplo, Deus usou também outro rei, este último, porém, com caráter e postura muito diferentes de Ciro, há uns 70 anos antes, por volta de 607 a.C., que foi Nabucodonosor, chamando-o “meu servo” (Jr 27.6), para castigar seu povo, levando-o cativo para a Babilônia. “E toda esta terra virá a ser um deserto e um espanto; e estas nações servirão ao rei de babilônia setenta anos” (Jr 25.11), disse o Senhor. Mas “... no ano primeiro de Dario [8], filho de Assuero, da linhagem dos medos, o qual foi constituído rei sobre o reino dos caldeus” (Dn 9.1), Daniel entendera pela leitura dos escritos de Jeremias (Dn 9.2), que o cativeiro estava chegando ao fim. E se pôs a orar ao seu Deus. A resposta vinda a ele pelo anjo Gabriel (Dn 9.21) fala da “... ordem para restaurar e para edificar Jerusalém...” (v. 25) até do surgimento do “... príncipe, que há de vir...” (v. 26), assunto do qual já falamos aqui.

Sabemos que a ordem de saída trata-se do edito de Ciro, assinado em 538 a.C., que põe fim ao cativeiro babilônico. Isto significa que Ciro tomou esta decisão um ano após ter conquistado o Império Babilônico. Veja 2Cr 36.22,23; Ed 1.2; 5.13; 6.3. Ciro também devolveu os vasos pertencentes ao templo (Ed 1.7) e proveu fundos para a obra de reabilitação de Judá (Ed 3.7).

O texto do decreto de Ciro tal como foi descrito em Esdras 1.1-4, “... poderia sugerir que Ciro cria em Jeová. No entanto, sabemos pelas inscrições do próprio Ciro que ele também atribuiu as suas vitórias ao deus babilônico Marduc. É provável que Ciro sentisse respeito por vários deuses em geral e redigisse os seus decretos a todas as nações. Provavelmente pediu a qualquer dirigente judaico (quem sabe se Daniel) para redigir o decreto de forma que este fosse aceitável para os judeus[9]. Ciro era benquisto por todos os seus governados, mas não alguém que se convertera ao Deus dos judeus. Mesmo assim, Deus o usou pois como Ele diz: “Eu fiz a terra, o homem, e os animais que estão sobre a face da terra, com o meu grande poder, e com o meu braço estendido, e a dou a quem é reto aos meus olhos” (Jr 27.5); “... o Altíssimo domina sobre os reinos dos homens e os dá a quem quer" (Dn 4.32). Aliás, a referência de Daniel 4.32, é uma continuação da explicação de Daniel a respeito do sonho que Nabuconosor teve, que dizia respeito à queda da “grande Babilônia”, assim considerada pelo rei. "A sentença sobre Nabucodonosor cumpriu-se imediatamente. Ele foi expulso do meio dos homens e passou a comer capim como os bois. Seu corpo molhou-se com o orvalho do céu, até que os seus cabelos e pelos cresceram como as penas de uma águia, e as suas unhas como as garras de uma ave” (Dn 4.33). O Império Persa também chegou ao fim, em 330 a.C. através do grande rei Alexandre da Macedônia. Veja: “Agora, pois, vou dar-lhe a conhecer a verdade: Outros três reis aparecerão na Pérsia, e depois virá um quarto rei, que será bem mais rico do que todos os outros. Quando ele tiver conquistado o poder com sua riqueza, instigará todos contra o reino da Grécia. Então surgirá um rei guerreiro, que governará com grande poder e fará o que quiser” (Dn 11.2-3). O rei guerreiro (poderoso) mencionado no verso 3 trata-se de Alexandre, o Grande. Mas o fim deste também já estava previsto: “Depois que ele [Alexandre] surgir, o seu império se desfará e será repartido para os quatro ventos do céu. Não passará para os seus descendentes, e o império não será poderoso como antes, pois será desarraigado e dado a outros” (v. 4). E assim, temos uma sucessão de reinos e governantes até a volta do”... REI DOS REIS E SENHOR DOS SENHORES” (Ap 19.16).

4.  Existem “Ciros” nos dias atuais?

Como dissemos acima, Deus usou no passado e ainda usa – no presente –, pessoas para exercerem determinadas tarefas segundo a sua vontade no mundo, sejam elas pessoas honestas, religiosas ou não. Normalmente – podemos afirmar – que Deus interfere na história quando determinados fatos têm relação direta com Israel. Devemos lembrar que segundo a Bíblia, quem não é judeu ou israelita é chamado de “gentio”[10(ou estrangeiro), e embora a graça de Deus abranja toda a humanidade [11], há uma aliança dEle específica com seu povo: Israel. De modo que todos que aceitam crer e servir a Deus, tornando-se parte da Igreja de Cristo, têm que ter em mente que o Deus em quem eles creem como cristãos é antes de tudo o Deus de Israel. Portanto, o Deus dos cristãos é o mesmo Deus dos judeus. Não é concebível ser cristão e antissemita, por exemplo. A propósito, veja este meu artigo sobre o assunto: Semitismo, antissemitismo e xenofobia.

Seguindo este raciocínio, podemos dizer que outros “Ciros” (figurativamente e talvez de menor importância) foram e estão sendo usados hoje através da história, para o bem de Israel e de sua Igreja, assim como outros “Nabucodonosores”, “Faraós” ou “Herodes”..., mas para o castigo e/ou disciplina do seu povo. Interferência na história e negócios dos homens é um dos meios como Deus como “Senhor da História”. A tolerância dos pecados homens tem um tempo determinado por Deus. Assim, podemos dizer que Deus interviu em alguns momentos da história modificando seu rumo e permitiu em outros momentos as ações de governantes – inclusive tiranos – para um julgamento posterior. Diversas passagens bíblicas como Ezequiel 38 e 39, Zacarias 12 e 14, Apocalipse 14 etc., tratam do juízo de Deus no futuro, de nações rebeldes e inimigas de Israel. Disse Deus: “Por meu intermédio os reis governam, e as autoridades exercem a justiça; também por meu intermédio governam os nobres, todos os juízes da terra” (Pv 8.15,16 – NVI).

Bem, sobre o holocausto, por exemplo, será que Hitler foi usado ou teve permissão de Deus para praticar aqueles horrores que ele fez aos judeus, matando cerca de seis milhões deles? Ele se gabava, por exemplo, de ter sido escolhido por Deus para castigar os judeus. Aliás, veja aqui, qual foi também a posição cristã católica (mais especificamente, do Papa Pio XII)  e protestante (principalmente de Dietrich Bonhoeffer) sobre as atitudes de Hitler durante a segunda guerra mundial.

Em linhas gerais, como nos Estados Modernos não há reis com poderes absolutos (ou não deveriam ter) e sim democráticos, que dependem da escolha dos seus líderes pelos cidadãos de seus respectivos países, entendo – como um cristão conservador – que para errarmos menos, devemos votar em nossos representantes, seja do Poder Legislativo, mas principalmente do Executivo, que, em linhas gerais, sejam pró-Israel; defensores da cultura judaico-cristã – não se trata de defesa do etnocentrismo ocidental ou do cristianismo apenas –, conservadores que reconhecem os fundamentos do Cristianismo e da Bíblia como alicerce da civilização ocidental; defensores de princípios como honestidade, família tradicional (pai, mãe, filhos), liberdade de comércio, de imprensa e de crença (seja ela qual for); que sejam defensores do Estado laico e não laicismo... Além disso, por princípio, os conservadores são contrários ao Comunismo e defensores do Capitalismo. Como já falamos aquio conservadorismo implica em preservar valores, costumes e tradições da cultura judaico-cristã. Portanto, se alguém é antissemitista, e anticristão, por exemplo, não pode ser considerado um conservador, ao passo que na sociedade, alguém que mesmo não sendo ... cristão, mas aceita os valores cristãos como moral, ética etc., conseguem conviver muito bem com os conservadores...”.

Votando então à questão de que se existem “Ciros” nos dias atuais, podemos afirmar que governantes que consideram os princípios acima sine qua non em sua administração podem ser um Ciro moderno. E acrescento que os que assim o fazem presenciam prosperidade econômica e social em seus países, com as devidas proporções, obviamente, porque na sociedade, aqueles que não aceitam tal postura lutam (e muito) contra suas aplicações das medidas que defendem.

Um exemplo de líder político conservador que até certo ponto, pode se assemelhar a um “Ciro” moderno é Donald Trump nos EUA. Uma matéria do Portal Vox [12], publicada em março de 2018, trazia o título: A história bíblica que a direita cristã usa para defender Trump. A história bíblica é exatamente a de Ciro, o persa. Segundo a matéria, há até uma moeda mostrando Trump e Ciro lado a lado. O apelo e o desejo da direita estadunidense de ver Trump presidente do seu país (agora, novamente eleito), significa que esta (grande) parcela da sociedade norte-americana goza dos mesmos princípios que Trump. Acho que estas pessoas não esperam um Trump santo, mas um líder que defende os princípios descritos acima: judaico-cristãos e base da civilização ocidental. Mas o que mais leva em conta na comparação de Trump com Ciro é o fato de ambos defenderem Israel. A maioria dos que apoiam e votam em Trump, portanto conservadores, é cristã. E estes cristãos entendem que a bênção de Abraão está sobre os que apoiam os filhos de Abraão: “E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gn 12.3).

De 2016 para cá, passei a observar o perfil de outro líder político brasileiro: Jair Bolsonaro. Na época, eu ainda achava que PSDB, por exemplo, era partido de direita. Mas quando percebi que Bolsonaro não era bem quisto nem pela extrema esquerda e nem pelos psdbistas passei a questionar o porquê daquele deputado federa na época ser tão perseguido. Mais adiante, em setembro de 2018, quando levou uma facada acabei descobrindo que quem eu achava ser de direita, na verdade era apenas uma oposição faz-de-conta da extrema-esquerda. Foi nesta época que conheci a expressão de Olavo de Carvalho: “o teatro das tesouras”. A defesa da crença em Deus, de apoio a Israel, da família tradicional etc., foram os temas que mostram a grande diferença entre os verdadeiros conservadores e os demais. Jair Bolsonaro está sempre cercado de apoiadores e conta com grande popularidade dos conservadores, cristãos, em sua maioria. E mesmo inelegível (no momento, pelo menos – dezembro de 2024) [13] e mesmo depois de tanta perseguição que sofreu durante o seu governo (2019-2022), ainda mantém seu slogan: “Deus, Pátria, Família e Liberdade”. Portanto, embora odiado pela esquerda ele é recompensado pelo apreço da maioria dos cristãos por conta desta sua defesa dos mesmos princípios conservadores, mas que – podemos afirmar – seus princípios servem para todos. O país de Jair Bolsonaro é muito diferente do de Trump, e não teria a mesma relevância. Quando o Presidente dos EUA fala ou toma alguma medida, esta tem repercussão internacional. A mesma atitude de Jair Bolsonaro não teria o mesmo efeito, mas seu país e parte do mundo seriam beneficiados como já foi entre 2019 e 2022, em meio a um turbilhão de críticas de opositores, pandemia, justiça trabalhando contra e assim por diante. Por que ele não foi reeleito em 2022? Bem, este é assunto do qual não podemos falar hoje no Brasil. Outros líderes conservadores, como Javier Milei, na Argentina, Nayib Bukele em El-Salvador, Giorgia Meloni na Itália e outros seguem no mesmo caminho.

Concluindo, o governo de Ciro, o persa, é visto como um governo ideal. Deus usou sua pessoa e outros como seus instrumentos e também abençoa os que têm os princípios conservadores como norteadores de suas administrações. Mas embora, mesmo sendo cidadãos que votamos para escolher nossos representantes, não podemos nos esquecer de que Deus governam as nações. E ao que espiritualmente observo, Deus está permitindo nosso país passar pelo que está passando: Judiciário aliado a um Executivo de extrema-esquerda, portanto contrário aos princípios conservadores. Diz a Palavra de Deus: “Todos devem sujeitar-se às autoridades governamentais, pois não há autoridade que não venha de Deus; as autoridades que existem foram por ele estabelecidas” (Rm 13.1). Por meu intermédio os reis governam, e as autoridades exercem a justiça; também por meu intermédio governam os nobres, todos os juízes da terra” (Pv 8.15,16). “Na verdade, as nações são como a gota que sobra do balde; para ele [o Senhor] são como o pó que resta na balança; para ele as ilhas não passam de um grão de areia” (Is 40.15). Que as Nações atuais tenham ou não seus Ciros, o certo é que:

“Já refulge a glória eterna de Jesus, o Rei dos reis

Breve os reinos deste mundo seguirão as Suas leis

Os sinais da Sua vinda mais se mostram cada vez

Vencendo vem Jesus...

(...)

E, por fim entronizado, as nações irá julgar

Todos, grandes e pequenos, o Juiz hão de encarar

E os remidos, triunfantes, lá no Céu irão cantar

Venceu o Rei Jesus!!!”

(in: Cantor Cristão: 112) [14].



Notas / Referências bibliográficas
:

  • [2] O Crescente Fértil “... corresponde a uma região do Oriente Médio, com aproximadamente 500 mil km2 de extensão. Está localizada entre a Jordânia, Líbano, Síria, Egito, Israel, Palestina, Irã, Iraque e parte da Turquia. Abriga grandes rios tal qual o Nilo, Tigre, Eufrates e Jordão. Todos eles tornaram a agricultura o principal meio de subsistência das primeiras grandes civilizações da antiguidade oriental... O ‘Crescente Fértil’ ou ‘Meia Lua Fértil’ recebe esse nome uma vez que a região, se olhada no mapa, possui a forma de uma lua em estágio crescente...”. In: <https://www.todamateria.com.br/crescente-fertil/>. Acesso em: 06/12/2024.
  • [4] FITCH, W. Isaías. Apud: SHEDD, Russel P., Editor. O Novo Comentário da Bíblia, Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1963 (1ª ed.)., pág. 724.
  • [5] FLÁVIO JOSEFO foi um escritor e historiador judeu do século I d.C. Dentre suas obras está Antiguidades Judaicas (AJ). As Antiguidades dos Judeus detalham a história do povo judeu desde a narrativa da criação (Gênesis no Antigo Testamento) a época da escrita de Josefo (Novo Testamento e depois).
  • [6] LAUTER. Gabriel Girotto. Um estudo das profecias sobre Ciro presentes no livro do profeta Isaías. Disponível em:  <https://revista.batistapioneira.edu.br/index.php/ensaios/article/view/102/141>. Acesso em: 09/12/2024.
  • [7] In: FITCH, Nota 4, pág. 724.
  • [8] Dario I, o Grande (522-486 a.C.), foi o quarto rei da Dinastia Aquemênida. Como o Decreto de Ciro, dando oportunidade para os judeus voltarem para sua terra foi assinado em 538 a.C., entende-se que esta oração de Daniel ocorreu cerca de pelo menos uns trinta anos depois. E muita gente ainda não tinha voltado para Israel nesta época.
  • [9] WRIGHT, J. Stafford. Esdras. Apud: SHEDD, Russel P., Editor. O Novo Comentário da Bíblia, Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1963 (1ª ed.)., pág. 431.
  • [10] Os hebreus, povo escolhido por Deus, através de Abraão, com o tempo teve seu Estado, chamado Reino de Israel. Depois de Salomão, houve uma divisão do reino em Israel, formado por dez tribos do Norte, e Judá, formado por duas tribos do Sul. São as tribos do Sul que foram levadas por Nabucodonosor para a Babilônia. Depois disto, o adjetivo judeu (de Judá) passou também a ser sinônimo de hebreu e israelita. O profeta Daniel fala que depois da 69ª semana (Dn 9.25-26 = 7 semanas + 62 semanas) o Messias (Jesus) seria cortado (morto). Jesus veio para todos: judeus e não-judeus, estes chamados de gentios. De judeus e gentios, Jesus, que “... de ambos os povos [judeus e gentios] fez um...” (Ef 2.14) formou sua Igreja. Portanto, os povos bíblicos são: judeus (povo escolhido), gentios (não-judeus) e igreja (judeus e gentios que receberam Cristo como seu Senhor e Salvador). Veja também a nota seguinte.
  • [11] Jesus “... veio para o que era seu [Israel], e os seus [maioria dos israelitas] não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam [Igreja], deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome” (Jo 1.11-12).
  • [13] Enquanto escrevo isto – 14 de dezembro de 2024 –, ouço a notícia da prisão do ex-Chefe do Estado-Maior do Exército do Governo Bolsonaro (2019-2022). Por isso, acho que o caminho para a prisão do líder maior dos conservadores brasileiros, Jair Bolsonaro está aberto e a ditadura do Judiciário já está instalada no Brasil.
  • [14] Louvor "Vencendo Vem Jesus", apresentado pelo local da Igreja Memorial Batista/Brasília. In: <https://www.youtube.com/watch?v=uPn7eHATdS0>. Acesso em: 16/12/2024.

03 dezembro 2024

Bispos e Papas (12): Eleutero

Eleutero [1]

Continuando nossa lista de bispos e papas, destacando inicialmente os listados por Eusébio de Cesareia, quero destacar o número 12 de seu livro História Eclesiástica (HE) [2]: Eleutero. Depois de citar a sequência de bispos (HE: 5, VI): Lino, Anacleto, Clemente, Evaristo, Alexandre, Xisto, Telésforo, Higino, Pio, Aniceto e Sotero “... o décimo segundo desde os apóstolos no episcopado agora é Eleutero...”.

Sobre o bispo Eleutero ou Eleutério [3] segundo as fontes listadas abaixo [4], destacamos:

  • Eleutério é mencionado apenas a partir de fontes hagiográficas tardias (século VIII);
  • Era grego e seu nome (em grego) significa “homem livre”; parece indicar que ele era um escravo liberto.
  • Veio a Roma acompanhando do Papa (Bispo) Aniceto e tornou-se seu secretário. Depois, como papa (ou bispo), exerceu seu “papado” (episcopado) entre 175 e 189.
  • Seu episcopado foi marcado pela luta contra movimentos heréticos que chegaram a Roma: gnosticismo, montanismo e marcionismo.
  • Com a perseguição mais amena, no tempo do Cômodo, Eleutério passou a dedicar ao combate às questões heréticas. Emitiu um decreto acabando com a distinção herética entre alimentos puros e impuros. E, através de outro decreto, acredita-se que Eleutério tenha ordenado que o dia da Páscoa fosse comemorado no domingo.
  •  Foi martirizado (em 189) durante uma nova perseguição aos cristãos.

“Segundo a tradição, [Eleutério] recebeu cartas de Lúcio, rei de uma parte da Bretanha, pedindo o envio de missionários para o instruir na fé Católica[5]. Atendeu ao pedido iniciando assim a obra de evangelização, enviando os padres São Damião e São Fugácio para baptizarem o rei Lúcio, sua rainha e grande parte da população. Esta história merece o cepticismo dos historiadores por não ser suportada por relatos concretos. Eleutério resolveu a questão de origem judaica, sobre a distinção entre alimentos puros e impuros, libertando os cristãos de restrições alimentares” (Papa Eleutório / Coração devoto).

Sugiro, para concluir, o vídeo do site católico Altivez Altierez dos Santos Catequese e Teologia Católica, sobre Eleutério:


Notas / Referências bibliográficas:

  • [1] Imagem ilustrativa e adaptada. Disponível em: <https://coracaodevoto.com.br/paginas/papas/13>. Acesso em: 02/12/2024.

  • [2] Na versão publicada pela CPAD em 1995, nas páginas 409/410, a editora fez uma lista de 29 bispos de Roma citados por Eusébio, e Pio é o número 9 da lista...

  • [3] O bispo, chamado por Eusébio de Eleutero é conhecido também como Papa/Santo Eleutério nas fontes católicas consultadas.

  • [5] Entende-se por “fé católica” a aceitação, já no segundo século, após a morte dos apóstolos, de uma unidade doutrinária universal (católica) do Cristianismo. “A organização da Igreja Católica tomou-se necessária em face de um grande perigo. O Gnosticismo lançava confusão nas massas a respeito da verdade cristã. Outro movimento estava também produzindo dissensão: o Montanismo. Os montanistas desejavam uma igreja como a do 1º século, sob a direção do governo direto do Espírito Santo. Sustentavam que as autoridades da Igreja estorvavam a ação do Espírito, e se opunham ao poder sempre crescente que se desenvolvia no ministério. A crença deles a respeito da direção imediata do Espírito levou-os a uma estranha e fanática emissão de sons e palavras. Para preservar a religião cristã de se perder na confusão, foram necessários certos meios de unidade externa. O meio de que lançaram mão foi a organização da Igreja Católica, uma instituição que pretendia possuir autoridade, excluindo do seu seio os que se recusassem a lhe obedecer. Esse fato teve posteriormente resultados funestos, mas foi necessário naquele tempo...” (NICHOLS, Robert Hastings. História da Igreja Cristã. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 2000, pag. 47/48). Destaques meus...

22 novembro 2024

Tempo e tempos (6): O Dia do Senhor (profético)

Por: Alcides Amorim

"Multidões, multidões no vale da decisão; porque o dia do Senhor está perto, no vale da decisão. O sol e a lua se enegrecerão, e as estrelas retirarão o seu resplendor. E o Senhor bramará de Sião, e de Jerusalém fará ouvir a sua voz; e os céus e a terra tremerão, mas o Senhor será o refúgio do seu povo, e a fortaleza dos filhos de Israel. E vós sabereis que eu sou o Senhor vosso Deus, que habito em Sião, o meu santo monte; e Jerusalém será santa; estranhos não passarão mais por ela" (Jl 3.14-17) [1].

A frase o dia do Senhor é usada dezenove vezes no Velho Testamento (Is 2.12; 13.6,9; Ez 13.5; 30.3; Jl 1.15; 2.1,11,31; 3.14; Am 5.18,20; Ob 15; Sf 1.7,14; Zc 14.1; Ml 4.5) e quatro vezes no Novo Testamento (At 2.20; 2Ts 2.2; 2Pe 3.10) [2]. E não trata apenas de um período curto de um dia como já vimos – dia de vinte e quatro horas –, mas de um período longo (2Ts 2.2) em que Deus cumprirá seu propósito sobre o mundo e os homens, podendo incluir inclusive, além do arrebatamento da Igreja, também a grande tribulação (Ap 6.17), a vinda do Senhor (1Co 1.8; 5.5; Fp 1.6,10; 2.16) até o Milênio (assuntos do quais falaremos em outros artigos).

Como parte da escatologia bíblica, a expressão dia do Senhor [3] aparece também como “o dia” (Am 5.18...), “naquele dia” (Is 2.11, Lc 21.34…) etc. A primeira menção, cronologicamente falando, do “dia do Senhor” está em Amós 5.18-20 e significa o dia em que o Deus de Israel haveria de intervir a fim de colocar Israel à testa das nações, mas ao mesmo tempo significa julgamento para o mesmo (Is 2.12; Ez 13.5; Jl 1.15; 2.1,11; Sf 1.7,14; Zc 14.1) e para outras nações individualmente como castigo contra suas violências, como por exemplo, a Babilônia (Is 16.6,9); o Egito (Jr 46.10) [4]; Edom (Ob 15); muitas nações (Jl 2.31; 3.14; Ob 15).

O Dia do Senhor é, dessa maneira, a ocasião quando Yahweh intervirá ativamente para punir o pecado, que terá chegado ao seu clímax. Esse castigo poderá vir por meio de uma invasão (Am 5 e 6; Is 13; Ez 13.5), ou através de algum desastre natural, tal como uma invasão de gafanhotos (Jl 1 e 2). Todas as intervenções menores chegarão ao seu apogeu por ocasião da vinda verdadeira do próprio Senhor. Nesse Dia, haverá crentes verdadeiramente arrependidos que são salvos (Jl 2.28-32), enquanto que aqueles que tiverem permanecido inimigos do Senhor, quer judeus quer gentios, serão punidos. Também haverá efeitos físicos por todo o mundo natural (Is 2).

No Novo Testamento, o Dia do Senhor é a segunda vinda de Jesus Cristo. A frase 'dia de nosso Senhor Jesus Cristo', ou equivalente, ocorre em 1Co 1.8; 5.5; Fp 1.6,10; 2.16; 2Ts 2.2. Essa vinda será inesperada (1Ts 5.2; 2Pe 3.10), mas certos sinais devem ocorrer antes de tudo, os quais devem ser discernidos pelos crentes (2Ts 2.2 e seg.). Efeitos físicos sobre o mundo natural acompanharão o Dia do Senhor (2Pe 3.12 e seg.).

Em suma, o Dia do Senhor:

  • Virá como o ladrão de noite (1Ts 5.2);

  • Está longe (2Ts 2.2) e perto (Jl 1.15; Sf 1.7) ao mesmo tempo;

  • Virá de improviso sobre os glutões, bêbados e descuidados em relação à vida espiritual (Lc 21.34);

  • Será dia de trevas e não de luz (Am 5.18-20);

  • Será de queda e humilhação dos arrogantes, soberbos e de exaltação do Senhor dos Exércitos (Is 2.11,12,17).

  • Será de bênção e aprovação para os irrepreensíveis e sinceros (1Co 1.8; Fp 1.10);

  • Será o grande dia da ira do Senhor (Ap 6.17).

  • Será dia de juízo das multidões e de refúgio para Israel (Jl 3.14-17)...

Por fim,

"Breve vem o grande dia / Em que lutas findarão / Todos males, agonias / Deste mundo cessarão. 

Cessará no céu o pranto / Pois não haverá mais dor / E ouvir-se-á o canto / Dos remidos do Senhor. 

Oh, que gozo estar com Cristo / Escutando a sua voz / Eu almejo hoje isto / E segui-lo sempre após... 

Se Jesus Cristo é meu guia / O caminho hei de trilhar / Quem assim em Deus confia / Lá no céu há de chegar..." (Harpa Cristã, Hino 371).

Veja mais no vídeo (cf. nota 2) a seguir:


Notas / Referências bibliográficas:

  • [1] Todas as referências bíblicas utilizadas neste artigo são da versão ACF – Almeida Corrigida Fiel. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf>.

  • Texto adaptado de:
  • [3] WRIGHT, J. S. Dia do Senhor. Apud: DOUGLAS, J. D. (Editor Organizador). O Novo Dicionário da Bíblia, Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1979, pág. 416/7.

  • [4] Veja também este artigo: Profecias em cumprimento: rio Eufrates secando e egípcios contra egípcios. In: <https://institutoparacleto.org/2012/07/06/profecias-em-cumprimento-rio-eufrates-secando-e-egipcios-contra-egipcios/>. Acesso em 21/11/2024 .


15 novembro 2024

Tempo e tempos (5): Dia do Senhor (Domingo) - Apocalipse 1.10

 Por: Alcides Amorim

Já vimos aqui que a palavra hebraica para dia é yom (יוֹם) no seu sentido literal e de tempo ou período percorrido como entendemos: dia de 24 horas. Aqui, destaquei o dia de descanso ou de adoração utilizado pelos cristãos: “Hemera ou Iméra tou Kyríou” (Dia do Senhor ou o Domingo), baseados nos comentários de Wood. [1] e de BEASLEY-MURRAY (Nota 4 abaixo).

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Essa expressão [Dia do Senhor] é encontrada apenas uma vez nas Escrituras como indicação do primeiro dia da semana. Em Ap 1:10, João desvenda que a visão do Apocalipse lhe foi dada quando foi arrebatado 'no espirito, no dia do Senhor’. Essa é a primeira ocorrência que temos, na literatura cristã, da expressão “hê kyriaké hemera”. A construção adjetival sugere que se tratava de uma designação formal sobre o dia de adoração da Igreja. Como tal certamente aparece no início do segundo século (Inácio, Epístola aos Magnesianos, i. 67) [2].

Pouco apolo pode ser aduzido em favor da teoria que diz que esse termo se refere ao dia da Páscoa, exceto, naturalmente, no sentido que cada dia do Senhor é uma recaptulação pascal. Porém, deve ser observado que eruditos de tanta reputação como Wettstein, Deissmann, e Hort, entre outros, preferem interpretar o versículo como indicação que João foi transportado, em seu êxtase espiritual, até o grande dia do próprio juízo (cf Ap 6:17; 16:14). Lightfoot acredita que existem ‘razões muito boas, não até mesmo conclusivas’ em favor dessa posição (The Apostolic Fathers, II, secção I, parte II, pág. 129. A opinião da maioria, entretanto, se inclina a sentir, juntamente com Swete, que tal interpretação ao contexto imediato e contrário ao uso linguístico (a Septuaginta sempre emprega a expressão he hemera tou kyriou para o profético ‘dia do Senhor’: kyriakos não aparece nunca). Seria razoavelmente seguro, portanto, concluir que, assim como a localização real da visão de João é registrada no versículo, semelhantemente a ocasião real também é registrada no versículo 10.

Mesmo que pudéssemos aceitar uma data tardia para o livro de Apocalipse (c. de de 96 D. C.), não seria necessário supor, juntamente com Harnack, que a expressão he kyriake hemera não estava em uso antes do término do primeiro século de nossa era. É possível que essa expressão tenha surgido tão cedo quanto 57 D. C., quando Paulo escreveu a epístola de 1 Coríntios. Em 11:20 desse livro o apóstolo fala em kyriakon deipnon ('ceia do Senhor'). É interessante que a versão pesita diz 'dia do Senhor' nesse versículo. Porém dificilmente parece que o termo estivesse então em uso corrente, pois, mais adiante naquela mesma epístola, Paulo diz kata mian sabbatou, (no primeiro dia da semana' (16:2).

Deissmann lançou mais alguma luz sobre o título ao mostrar que na Ásia Menor e no Egito, até mesmo antes da era Cristã, o primeiro dia de cada mês era chamado de dia do Imperador ou Sebastē. Isso, eventualmente, pode ter sido transferido para um dia qualquer da semana, provavelmente a quinta-feira (dies Iovis). 'Se essas conclusões são válidas', comenta R. H. Charles, 'então poderemos entender quão naturalmente o termo "Dia do Senhor" teve início; pois assim como o primeiro dia de cada mês, ou como certo dia de cada semana era chamado de "Dia do Imperador", semelhantemente seria natural que os crentes dessem nome ao primeiro dia de cada semana, associado como estava à ressurreição do Senhor e ao costume dos crentes de se reunirem para adorar, chamando-o de "Dia do Senhor". Talvez tenha surgido primeiramente em círculos apocalípticos, quando uma atitude hostil para com o império foi adotada pelo Cristianismo' (R. H. Charles, The Revelation of St. John, 1920, I, pág. 23; cf BS, págs. 218 e segs.).

'Senhor, nessa passagem, claramente significa Cristo, e não Deus Pai. Trata-se do dia de Cristo. Pertence-Lhe por causa de Sua ressurreição, quando foi 'poderosamente demonstrado filho de Deus' (Rm 1:4). Mc Arthur certamente tem razão ao afirmar que esse título, afinal de contas, se deriva da Soberania de Jesus Cristo, Soberania essa que se tornou manifesta na ressurreição do 'primeiro dia da semana' (Mc 16:2; vd A. A. Mc Arthur, The Evolution of the Christian Year, 1953, pág. 21). A adoração cristã é essencialmente uma anamnesis (lembrança) do acontecimento da Páscoa, que revelou o triunfo do propósito redentor de Deus. Isso explica o tom prevalente de alegria e louvor. O primeiro dia era igualmente apropriado, visto que relembrava o dia inicial da criação, quando Deus criou a luz, bem assim o fato que o Pentecoste Cristão caiu no domingo. Além disso, é bem possível que a expectativa dos crentes primitivos fosse que o retorno do Senhor se verificasse em Seu próprio dia.

A mais antiga evidência relacionada com a observância do primeiro dia da semana, por parte dos cristãos, aparece em 1 Co 16:1,2, ainda que não haja ali referência explícita a alguma reunião realmente levada a efeito. At 20:7 [3] é passagem mais específica e provavelmente reflete o uso continuado do calendário judaico por parte dos crentes, conforme o qual o dia do Senhor teria início ao pôr do sol do dia de sábado. Alford vê na prontidão dos gentios em aceitar este cálculo judaico 'a maior prova de todas que o dia foi assim observada' (H. Alford, The New Testament for English Readers, p. 788). Por outro lado, não há no Novo Testamento qualquer indicação duma controvérsia sabatista. O dia do Senhor, que de fato cumpriu todos os propósitos beneficentes de Deus na instituição do sábado para a humanidade, era observado 'em novidade de espírito e não na caducidade da letra' (Rm 7:6).

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Resumindo, conforme diz Murray [4], o Dia do Senhor não deve ser entendido no sentido escatológico, como pensam alguns, “… como se João tivesse sido transportado para viver naquele dia, mas ‘no dia consagrado ao Senhor’, uma frase que se usava já no segundo século referindo-se ao domingo. O termo ‘o dia do Senhor’, como Deissmann [5] tem mostrado, é provavelmente a substituição desafiadora dos cristãos ao ‘dia do Imperador’, que era celebrado ao menos mensalmente na Ásia Menor, se não semanalmente. Indicava originalmente o dia da elevação de Faraó ao trono do Egito, ou seu dia natalício; a ideia foi apropriada pelos imperadores romanos. Como memorial do dia da ressurreição de Cristo, e assim, da sua exaltação à soberania, o título ‘o dia do Senhor’ é especialmente apropriado” (destaques meus).

Veja também o vídeo do Portal CACP, a seguir, sob o título “O que significa a expressão ‘O Dia do Senhor’?”, do Pr. Natanael Rinaldi:


Notas / Referências bibliográficas:

  • [1] WOOD, A. S. Dia do Senhor (Domingo). Apud: DOUGLAS, J. D. (Editor Organizador). O Novo Dicionário da Bíblia, Volume I. São Paulo: Vida Nova, 1979, Pág. 417/8.

  • [2“… Portanto, não precisamos mais manter o sábado, como fazem os judeus, ou alegrar-se pelos dias de ociosidade, pois “aquele que não trabalha, não deve comer”. Também foi dito pelos [santos] oráculos: ‘É pelo suor da tua face que comerás o teu pão’. Mas deixe todo aquele entre vós que ainda mantém o sábado por motivo espiritual, alegrando-se na meditação da Lei e não no descanso do corpo, admirando a obra de Deus e não comendo coisas preparadas no dia anterior, não fazendo uso de bebidas mornas ou andando um certo limite prescrito, não deleitando-se por dançar e aplaudir, e outras coisas sem sentido. Porém, após a observância do sábado, deve todo amigo de Cristo observar o Dia do Senhor como festa, o dia da ressurreição, a rainha e comandante de todos os dias [da semana]. Foi sobre isto que o profeta declarou: 'Para encerrar, o oitavo dia' [Foi nesse dia] que a nossa vida renasceu e a vitória sobre a morte foi obtida em Cristo…” (“Epístola aos Magnésios”.(Inácio, Bispo de Antioquia, 67 – 110 d.C., Parte IV, 9). Disponível em: <Inácio de Antioquia / Epístola aos magnesios>. Acesso em 13/11/2024.

  • [3E no primeiro dia da semana, ajuntando-se os discípulos para partir o pão, Paulo, que havia de partir no dia seguinte, falava com eles; e prolongou a prática até à meia-noite” (Versão A.C.F.).

  • [4BEASLEY-MURRAY, George Raymond. Apocalipse. In: O Novo Comentário da Bíblia, Vol. II. São Paulo: Vida Nova, 1983, Comentário sobre Apocalipse 1.10.

  • [5Gustav Adolf Deissmann (1866-1937): “teólogo protestante alemão, melhor conhecido por sua pioneira obra sobre a língua grega utilizada no Novo Testamento, que ele demonstrou ser o koiné, ou a língua comum utilizada no mundo helênico daquele tempo…”. Mais em: <Wikipedia – Deissmann>. Acesso em: 14/11/2024.