Sobre
o conceito de ética, já vimos brevemente: Ética x moral; Ética bíblica; Ceticismo e ética; Éticasituacional... Sobre este último,
vimos como Fletcher analisa a ética do ponto-de-vista da “lei do amor”. A ética
situacional de Joseph Fletcher defende que a única lei moral absoluta é
o amor (ágape), e que as decisões morais devem ser tomadas com base
nas circunstâncias de cada situação, e não em regras fixas. O amor,
entendido como uma ação sacrificial e não apenas como sentimento, guia a
escolha do que é melhor para a situação em questão, justificando o uso de
qualquer meio se o fim for amoroso... Mas, a Bíblia realmente ensina a ética
situacional? Vejamos a seguir o que diz o Ministério Got
Questions [2] sobre isto.
A éticasituacional é uma visão
particular da ética moral que sustenta que a moralidade de um ato é determinada
por seu contexto. A ética situacional afirma que se há um certo e errado, ele é
simplesmente determinado pelo resultadodesejado da situação. A
ética situacional é diferente do relativismo moral porque o relativismo moral
afirma que não há certo ou errado. A ética situacional desenvolve um código de
ética no qual atender às necessidades de cada situação determina o que é certo
ou errado.
De capa a capa, a Bíblia é verdadeira,
consistente e aplicável. A Bíblia ensina, admoesta ou até mesmo inclina-se a
defender a ética situacional? A resposta curta é "não". Vamos
considerar três princípios: 1) Deus é o criador e sustentador. 2) Toda a
Palavra de Deus é verdadeira, até mesmo as partes de que não gostamos ou
entendemos. 3) O certo e o errado são determinados e definidos por quem Deus é.
1.Deus é o criador e sustentador
A ética situacional afirma que a moralidade é
determinada pelo ambiente ou circunstância. A Palavra de Deus diz que a
moralidade é determinada pela soberania de Deus, pois Ele é o criador e
sustentador. Isso não é uma questão de semântica, mas de fato. Ainda que Deus
desse um comando para um grupo de pessoas e o proibisse a um outro grupo, a
determinação de que é certo ou errado, ético ou não, não se baseia na situação,
mas sim no comando de Deus. Deus tem a autoridade para governar o certo e o
errado. Romanos 3:4 diz: "Antes seja Deus verdadeiro, e todo
homem mentiroso."
2.Toda a Palavra de Deus é verdadeira
Sugerir que a Bíblia defende a ética
situacional seria implicar que ela contém erros. Isso não é possível. Não é
possível por causa do número 1, Deus é o criador e sustentador.
3.O certo e o errado são definidos por quem
Deus é
O amor é a natureza de Deus. Ele define o que
o amor é, não pelo que faz, mas simplesmente por quem é. A Bíblia diz:
"Deus é amor" (1 João 4:16). O amor é desinteressado e atencioso com
os outros, nunca procura a sua própria glória ou prazer (1 Coríntios 13).
Portanto, em virtude de quem é Deus, a Bíblia, sendo dada por Deus e sendo
completamente verdadeira, não pode conter um sistema de ética que desafiaria a
natureza de Deus. A ética situacional encontra o certo e o errado para agradar
a maioria ou uma única pessoa por egoísmo. O amor é o oposto. O amor procura
incentivar e encorajar outras pessoas.
Dois problemas fundamentais com a ética
situacional são a realidade de uma verdade absoluta e o conceito de amor real.
A Bíblia ensina a verdadeabsoluta, a qual ensina que o certo e o
errado são pré-determinados por um Deus Santo. E o amor – a definição de Deus
do amor verdadeiro, honesto e real – não deixa espaço para motivações egoístas
ou impuras. Mesmo se alguém dissesse que a situação exige abnegação, ainda é
uma determinação humana e não divina. As razões de um ser humano para
determinar o que é melhor sem o amor verdadeiro são fundacionalmente[3] egoístas.
Então o que acontece quando as coisas parecem
certas, mas Deus diz que são erradas? Temos de confiar na soberania de Deus e
confiar "que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a
Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito" (Romanos 8:28).
Se nós pertencemos a Cristo, Deus nos deu o Seu Espírito (João 16), e por meio
dEle temos uma compreensão do que é certo e errado. Através dEle, somos
convencidos, incentivados e orientados para a justiça. Um desejo sincero de
conhecer a verdade de um assunto, juntamente com a busca de Deus, será
recompensado com a resposta de Deus. "Bem-aventurados os que têm fome e
sede de justiça porque eles serão fartos" (Mateus 5:6).
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Vejamos
mais estes textos [4] / comentários:
“Ora, o homem natural não compreende as coisas do
Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque
elas se discernem espiritualmente. Mas o
que é espiritual discerne bem tudo, e ele de ninguém é discernido. Porque, quem
conheceu a mente do Senhor, para que possa instruí-lo? Mas nós temos a mente de
Cristo” (1Co 2.14-16).
“Examinai tudo. Retende o bem” (1Ts 5.21)
“E vós tendes a unção do Santo, e sabeis todas as
coisas... E a unção que vós recebestes dele, fica em vós, e não tendes
necessidade de que alguém vos ensine; mas, como a sua unção vos ensina todas as
coisas, e é verdadeira, e não é mentira, como ela vos ensinou, assim nele
permanecereis” (1Jo 2.20,27).
Comentando
sobre 1Co 2.14 (Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito de
Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se
discernem espiritualmente), o Dr. C. I. Scofield [5] destaca: “Paulo
divide os homens em três classes:
1) psuchikos, significando dossentidos,
sensuais (Tg 3.15; Jd 19), naturais, isto é, o homem adâmico, não
renovado pelo novo nascimento (Jo 3.3,5);
2) pneumatikos, significando espirituais,
isto é, o homem renovado cheio do Espírito e andando no Espírito em comunhão
com Deus (Ef 5.18-20); e
3) sarkikos, significando carnais,
isto é, o homem renovado que, andando ‘segundo a carne’, permanece uma
criancinha em Cristo (I Co 3.1-4). O homem natural pode ser culto, educado,
eloquente, fascinante, mas o conteúdo espiritual das Escrituras lhe é absolutamente
oculto; e o cristão carnal só consegue entender as verdades mais simples, ‘o
leite’ (1 Co 3.2)”.
São
os espirituais que conseguem "julgar todas as coisas" em uma situação
complexa que requer discernimento fora do comum e que pode gerar consequências
dependendo das escolhas a serem tomadas. Ao decidirem fazer a escolha correta
segundo os princípios divinos podem pagar um preço por esta escolha. Essa
capacidade de escolha da verdade permite aos seguidores espirituais avaliar a
veracidade de ensinamentos e distinguir entre o certo e o errado, mas não se
opõe ao mandamento de não julgar de forma hipócrita ou condenatória,
especialmente em questões pessoais. E, por falar em escolhas arriscadas, veja o
exemplo da aparente “mentira” de Raabe no vídeo a seguir, de Leandro Quadros:
Notas / Referências bibliográficas:
[1] Imagem meramente ilustrativa feita através do Chat Gpt, em 17/10/2025.
[3]Fundacionalismo:
“... uma vertente da epistemologia que afirma que só podemos ter certeza de
algo se, em algum ponto da linha, pudermos rastreá-lo até uma verdade
indubitável e irrefutável. Essa verdade servirá como base a partir da qual
todos os nossos outros conhecimentos e crenças poderão ser construídos e
justificados...” (In: Expresso
existencial). Veja também: Coerentismo
e fundacionalismo.
O que me
motivou a falar aqui sobre Joseph Fletcher foi buscar conhecer um pouco acerca de seu
ponto de vista sobre valores cristãos e o que ele chama de “ética situacional”.
Numa época de pragmatismo, relativismo, consequencialismo, ideologia/narrativa,
“governo do amor” etc., torna-se importante saber sobre as mentes pensantes por
trás destes conceitos. E Fletcher é uma destas mentes, cuja teologia serviu e
serve de base para a (tentativa de) aplicação de uma ética cujo “fim justifica
os meios”.
JosephFrancisFletcher (1905–1991) [2] foi um teólogo e filósofo norte-americano conhecido como o principal formulador
da éticasituacional (ou ética da situação), apresentada em sua
obra SituationEthics: The New Morality (1966).
O pensamento de Fletcher em relação à ética
situacional baseada no “amor ágape”[3] já tinha embasamento nas ideias de outros
pensadores e concentrava-se:
· na
"vontade de Deus para a comunidade" (Brunner);
· na
"receptividade para com a exigência do amor" (Barth);
· em se
"deixar que o amor de Deus flua através de nós"; “onde há amor, nenhum outro preceito é
necessário" (Nygren );
Assim, foi consagrado seu tema da éticasituacional. Como enfatiza Reginald E. O. White [4], ela não depende das percepções cristãs. Fletcher
cita expressões e precedentes bíblicos quando é conveniente e menciona oito
"textos de prova" para sua "norma do amor" incluindo
palavras de Jesus, a respeito do Grande Mandamento, e de Paulo, sobre o amor
que cumpre a lei, mas nada vê de especialmente diferente ou sem igual nas
escolhas do cristão. A amorosidade é o motivo operante com plena força, por
trás das decisões de muitos não-cristãos.
Além disso, Fletcher rejeita todas as normas
reveladas, exceto o mandamentodoamor. Jesus não tinha
regras nem sistemas de valores; princípios reverenciados, até mesmo os Dez
Mandamentos, podem ser colocados de lado se entrarem em conflito com o amor.
Violar o sétimo mandamento, por exemplo, pode ser uma coisa boa: depende de se
os interesses do amor são plenamente revelados. As relações sexuais antes do
casamento se a decisão for feita de modo "cristão" podem ser certas.
Não há nenhuma ética pessoal, visto que a moralidade depende do relacionamento
do amor, o que torna o Sermão do Monte supérfluo em grande medida.
Paradoxalmente, ao fazer tudo depender da reação instante e intuitiva do agente
diante das circunstâncias, a ética situacional exclui qualquer padrão
generalizado de moralidade aplicável aos outros ou à sociedade outro sabor
nitidamente não-cristão.
"A fé que opera pelo amor" oferece
um alicerce para a norma do amor, mas não é essencial; um homem sincero,
inteligente e sábio pode rejeitar a Cristo sem afetar a sua moralidade
situacional. A base da norma é nossa decisão de que ela será o amor; para
alguns, isto dependerá de uma decisão (não revelação) prévia de que Deus é
amor.
Procura-se apoio num famoso ditado de
Agostinho: "Ama, e faze o que queres" – "seis palavras benditas,
parte do patrimônio dos emancipados", que fazem de Agostinho o santo
padroeiro da "nova moralidade". Este fato ilustra bem o perigo da
moralidade dos lemas, porque naquele contexto (Homilias, 1 Jo 7.8, 10.7) Agostinho
está argumentando que é uma atitude amorosa o uso da força do Estado para
obrigar os hereges donatistas a "entrarem" na festa ortodoxa do
evangelho; o argumento de uma consciência inquieta que procura tristemente
comprovar que um fim "amoroso" justifica quaisquer meios usados,
produzindo um princípio que foi o alicerce para toda a perseguição religiosa a
partir de então. Fica claro que tudo depende daquilo que é incluído na conduta
amorosa.
Mas na ética situacional somente uma coisa é
intrinsecamente boa – o amor, "um modo de se relacionar com as pessoas e
de usar coisas". O fim procurado, o amor, é o único critério, e
exclusivamente ele justifica os meios. Não há regras determinadas somente o
amor. A única pergunta a ser levantada em qualquer situação é: O que produzirá
a quantidade máxima de amor? A pessoa não recita textos, deveres, mandamentos,
virtudes, obrigações, nem estima consequências: a pessoa reage em cada situação
como o eu livre, exercitando o amor responsável, e pratica ou evita uma coisa
segundo as exigências do amor. Esta atitude simplifica, liberta e é suficiente.
Nenhuma outra orientação é necessária ou possível numa era tão nova. E porque
as situações modernas podem ser mesmo tão complexas, o amor pode facilmente
achar-se sacrificando os outros (para preservar segredos da guerra); contando
mentiras; furtando; permitindo-se práticas homossexuais,
"autossexuais", promíscuas ou adúlteras; lançando bombas atómicas;
aprovando o aborto, a prostituição ou a poligamia.
Na superfície, há muita coisa atraente para
os cristãos “A única lei é a lei do amor, de Cristo"; mas o critério-chave
permanece essencialmente vago, porque não fica definido qual é o alvo do amor.
É totalmente individualista, impulsivo, produto da situação: todas as
obrigações são dissolvidas no impulso amoroso. Talvez seja verdadeiro que
semelhante "amor" não é peculiar aos cristãos: mas o amor cristão o
é.
Se for alegado que a norma é o amor ensinado
por Jesus, logo é incoerente abandonar o Seu conceito de amor como o
cumprimento, e não a revogação, da lei divina: argumentar que Jesus tinha razão
somente no tocante ao amor, mas que estava enganado quanto à castidade, ao
divórcio, à autodisciplina, aos mandamentos de Deus; e é bem falso reivindicar
a Sua autoridade para qualquer coisa que o "amor" desculpe – o aborto,
o sexo extraconjugal, as mentiras e as demais coisas. Sempre que se apela à
autoridade de Cristo, o significado dEle deve ser mantido. Fletcher não
raciocina, em lugar algum, acerca daquilo que o amor requer; os evangelhos
estão repletos de ilustrações daquilo que Jesus queria dizer com isso, e fica
abundantemente claro, no NT inteiro, que o amor cristão proíbe positivamente a
fornicação, o adultério, o assassínio, a mentira, o furto e muitas coisas mais.
Aquilo que o amor requer, e aquilo que ele exclui, não é deixado aos impulsos
intuitivos e sem instrução.
Desta forma, embora a aparente simplificação
também seja atraente, a norma do amor, que com justa razão é suprema, não é
autossuficiente. Muita coisa deve ser conhecida de antemão quanto ao alvo
cristão para a vida e os indivíduos, no tocante à escala de valores cristãos,
acerca daquilo que realmente é bom para o nosso próximo e quanto à vontade de
Deus em cada situação, antes de o amor saber o que fazer. A
"situação", também, não é um mero acaso, mas uma oportunidade dentro
da qual a providência colocou o cristão, com indicações do dever e da
orientação divina Pressupõem-se bastante percepção, conhecimento e maturidade
espiritual. A ética situacional é, na melhor das hipóteses, uma etapa final no
crescimento moral, que vem depois de etapas anteriores que precisam de
diretrizes, experiência emprestada e instrução clara. Fletcher reconhece
tacitamente este fato, ao pressupor que o amor inclui inteligência, informação,
previsão, prudência e muitas coisas mais.
Finalmente, a imediação prática da ética
situacional é atraente aos cristãos. Sugere que o indivíduo está "aberto à
inspiração do momento" quanto àquilo que deve fazer. Mas o indivíduo
cristão não está totalmente aberto aos impulsos imediatos do amor caprichoso
simplesmente por ser ele cristão. Ele confronta todas as situações com a mente
e o coração já moldados pela experiência cristã, herdando (até certo grau) a
longa tradição cristã daquilo que é certo, e tendo um compromisso com a fé e
obediência do cristianismo. Com o exemplo de Jesus diante dos seus olhos, entra
em cada nova situação tendo "a mente de Cristo". Sua norma de
comportamento, portanto, embora certamente deva ser aplicada a situações
variadas e sem precedentes, está, na realidade, arraigada no passado, expressa
na encarnação do ideal em Cristo.
Hoje, o cristão alerta realmente enfrenta de
modo renovado cada nova situação e confia na inspiração do Espírito de Jesus
para saber como agir com amor; mas as diretrizes estão claras. Sua norma para
todas as circunstâncias é a imitação de Cristo. Despojada de exageros e
concentrada em Jesus, a ética situacional tem muita coisa para ensinar àqueles
para quem a citação de textos antigos é orientação suficiente para os problemas
contemporâneos...
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Resumindo, a
ética situacional de Joseph Fletcher defende que a única lei moral
absoluta é o amor (ágape), e que as decisões morais devem ser tomadas
com base nas circunstâncias de cada situação, e não em regras
fixas. O amor, entendido como uma ação sacrificial e não apenas como
sentimento, guia a escolha do que é melhor para a situação em questão,
justificando o uso de qualquer meio se o fim for amoroso... Essa abordagem nos
fazer pensar no numa expressão muito falada hoje no Brasil: “governodoamor”. Pode-se, inclusive, traçar um paralelo entre ambos: a centralidade
do amor como norma ética (?) e a medida de todas as decisões, além da crítica
ao legalismo, à rigidez institucional, mas com o de chegar ao fim último: “o
fim justifica os meios”.
Neste
artigo [5] (Escola Goffs) é
mencionado que embora as ideias de Joseph Fletcher “estivessem enraizadas na
Bíblia, eram novas e, para alguns, chocantes!” para a época (1966) e que
“... mais tarde, tornou-se ateu e participou da Associação Americana de
Eutanásia e da Associação para Esterilização Voluntária...”.
Sobre uma
resposta bíblica para o conceito de “ética situacional” falaremos mais em outro
artigo.
Notas / Referências bibliográficas:
[1] Imagem ilustrativa feita pelo Chat GPT, em 14/10/2025.
[3] Amor (Ágape):
“’… boa vontade atuando em parceria com a razão” na busca do “melhor
interesse do próximo, com um olhar atento a todos os fatores da situação’”.
Ágape é preocupação com os outros. Fletcher usa o termo “melhor interesse”,
então isso parece muito semelhante ao utilitarismo de Singer. Agimos por amor
aos outros, tentando fazer o melhor para servir aos seus interesses” (Idem,
Nota 5).
[4] WHITE, R. E. Oscar. Ética
situacional. In: Enciclopédia Histórico-Teológica. Editor Walter A. Elwell.
Vol. II. São Paulo: Vida Nova: 1988, Pág.94 a 96 (texto adaptado).
“... E certo jovem o seguia [a Jesus], envolto em um lençol sobre
o corpo nu. E os jovens lançaram-lhe a mão. Mas ele, largando o lençol, fugiu
deles nu...” (Marcos 14.51-52)
Resumo:
A Igreja Católica e algumas denominações protestantes celebram a quaresma, um período de quarenta dias que começa na Quarta-Feira de Cinzas, voltado para a conversão espiritual e penitência. Durante esse tempo, os cristãos se preparam para a Páscoa por meio da oração, jejum e caridade. Os textos bíblicos usados incluem passagens dos Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João. Após a prisão de Jesus, ocorreu um julgamento em três etapas: primeiro, o julgamento judeu com Anás, Caifás e o Sinédrio; depois, a negação de Pedro e o suicídio de Judas, seguido pelo julgamento romano diante de Pilatos e Herodes. Um aspecto curioso é a menção de um jovem que fugiu nu durante a confusão, considerado por alguns como uma referência ao próprio Marcos, o autor do Quarto Evangelho. Essa figura simboliza a vulnerabilidade frente a um sistema judicial desigual, refletindo o estado de insegurança jurídica enfrentado por seguidores de Jesus naquele contexto.
Ao traçar paralelos com a atual sociedade brasileira, o texto sugere que conservadores são tratados como cidadãos de segunda classe, assim como os seguidores de Jesus. O autor observa que, apesar de um sentimento de maioria conservadora, o sistema parece favorecer uma minoria, resultando em perseguições a indivíduos ligados a ideias conservadoras. Exemplos de prisões e condenações de pessoas ligadas a movimentos conservadores ilustram essa comparação com a vulnerabilidade do jovem do Evangelho. Conclui-se que, assim como aquele jovem, muitos conservadores atualmente sentem-se expostos e desprotegidos, sem respaldo legal em um cenário que parece hostil.
Escrevi até aqui dois artigos específicos
sobre ética: ética bíblica e ética x
moral. E antes de continuar com
outros artigos relativos ao assunto achei por bem falar antes sobre os
conceitos de ceticismo, dogmatismo e falibalismo. E, como são assuntos longos,
resolvi fazer isto em três momentos, começando, na sequência, com o ceticismo.
Mas, sempre com uma pitada de apologia teológica e/ou de fé.
1.Ceticismo: conceito
A
palavra ceticismo diz respeito a um estado de um indivíduo que
duvida de tudo, que é descrente e/ou tem predisposição constante para a
dúvida e incredulidade. Deriva da palavra grega askesis, que significa
exercício de reflexão, meditação. Fala de um indivíduo que, ao pé da letra, é
uma pessoa pensativa, absorvida em si mesma e, portanto, "ausente" do
mundo. Mas o ceticismo é também nome de uma corrente filosófica, cujo fundador
foi o filósofo grego Pirro de Élis (360? a 272? a.C.). Ele pregava uma
ideia radical, caracterizada, essencialmente, por duvidar de todos os fenômenos
que rodeiam o ser humano. Para ele, seria impossível conhecer verdadeiramente
qualquer coisa.
Os
céticos, seguidores da escola de Pirro, “... admitiam que a realidade
existe, mas afirmavam que o ser humano não teria nenhum instrumento para
atingir a verdade de qualquer coisa. Em outras palavras, a filosofia deveria
ser uma negação do saber, não uma busca” (CHALITA: 2004, pág. 75). Em tese,
os céticos desprezam a ideia de valores sociais regendo o comportamento e as
relações entre os homens. Aliás, eles defendem que a felicidade pode até ser
atingida desde que o indivíduo alcance “... o estado de ataraxia, palavra
grega que designa a imperturbabilidade, o estado de paz tal como concebido pelo
ceticismo...” (Idem, pág. 75) e em relação com o que Pirro aprendeu do
bramanismo.
Bem,
se o dogmatismo – como veremos mais adiante –, por exemplo, é a crença absoluta
em certas verdades, sem questionamento ou possibilidade de erro, ocético questiona tudo o que
lhe é apresentado como verdade e não admite a existência de dogmas, fenômenos
religiosos ou metafísicos.
Outro
pensador que ficou conhecido também por conta de seu ceticismo foi o humanista
francês MicheldeMontaigne (1533-1592), em sua obra Ensaios.
A frase atribuída a ele, “dizem que filosofar é duvidar”, expressa bem
este aspecto do ceticismo, quando manifesta a sua visão de que o conhecimento
humano é limitado. No entanto, o ceticismo de Montaigne não é passivo, mas
sim ativo, e é usado como ferramenta para questionar e criticar os costumes,
saberes e instituições da época e, portanto, seu pensamento servia para atenuar
a excessiva confiança que o homem renascentista – contemporâneo seu –, tinha
nas capacidades humanas. Em síntese, a obra Ensaios, de Montaigne, se
caracteriza pela sua abordagem individual, subjetiva e reflexiva, onde ele explora
a diversidade e complexidade do ser humano, relativizando verdades absolutas e
questionando dogmas.
A
questão é que se for levado ao pé da letra o ceticismo leva-nos a duvidar do
próprio ceticismo. “Ao mesmo tempo, não poderíamos emitir nenhuma opinião
sobre o ceticismo. Será que é possível negar tudo que está a nossa volta? Se
negarmos tudo, negaremos a própria negação e a dúvida que nos fez questionar o
objeto. Desta maneira, em algo devemos acreditar, ainda que tenhamos que
contestar as verdades que nos rodeiam” (BEZERRA. O.C.).
O
ceticismo tem ocupado o pensamento de muitos no meio religioso. No item abaixo,
veremos um pouco sobre isto.
O
ceticismo religioso não é sinônimo de ateísmo, sendo que céticos podem ter
dúvidas sobre a religião sem rejeitá-la completamente. Exemplos históricos de
céticos, como os discípulos Natanael (Jo 1.45-47) e Tomé (Jo 20.25), ilustram
que esse fenômeno não é novo, mas tem se intensificado atualmente. A cultura
contemporânea, marcada pelo Iluminismo, por exemplo, e pela diversidade
de influências, tem contribuído para o aumento do ceticismo, especialmente
entre os jovens, que consideram as respostas bíblicas simplistas.
Além
disso, experiências negativas com práticas religiosas e a hipocrisia de alguns
indivíduos têm levado muitos a se afastarem da fé cristã. A dependência do empirismo
e a confusão provocada por diversas crenças religiosas também alimentam o
ceticismo. No entanto, o ceticismo saudável é importante para questionar
doutrinas errôneas e buscar verdade. O diálogo respeitável e humilde é
essencial para abordar as dúvidas dos céticos e compartilhar a esperança cristã
de maneira construtiva.
Na
verdade, o ceticismo religioso de base intelectual, por si só, não é ruim. De
fato, o ceticismo saudável é uma coisa boa — devemos ser cautelosos com o
ensino falso, e recebemos a seguinte instrução: "... provai os
espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo
mundo fora" (1 Jo 4.1). Aqui, vemos um exemplo de ceticismo no sentido
positivo: ter dúvida se algo é bom ou ruim. Uma fé saudável e duradoura
incorpora permissão para questionar e buscar respostas. Deus pode resistir ao
nosso escrutínio, e a dúvida não tem que equiparar a descrença. Deus nos
convida: "Vinde, pois, e arrazoemos, diz o SENHOR" (Is 1.18).
O apóstolo Paulo também afirma: “Portai-vos com sabedoria para com os que
são de fora; aproveitai as oportunidades..." (Cl 4.5), quando podemos envolver
os céticos no diálogo que conduz à verdade. O apóstolo Pedro também diz:
"... antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando
sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança
que há em vós" (1Pe 3.15). Ele segue imediatamente esse comando com
instruções sobre como envolver o questionador: "... fazendo-o, todavia,
com mansidão e temor, com boa consciência, de modo que, naquilo em que falam
contra vós outros, fiquem envergonhados os que difamam o vosso bom procedimento
em Cristo" (1Pe 3.16). A humildade e o respeito são cruciais para
lidar com céticos em nossa era pós-moderna.
Mas
como um cético pode encarar ou abordar um princípio ético? Como conciliar
posições céticas com normas ou deveres legais? Possivelmente, um cético, ao
abordar a ética, geralmente adotará uma postura questionadora e, por
vezes, incrédula em relação às verdades morais e às suas bases. Em vez de
assumir a existência de um código moral universal e objetivo, o cético pode se
concentrar em examinar e avaliar as diversas perspectivas e costumes que formam
a ética em diferentes contextos. Daí, o desafio de membros do governo
(Legislativo), por exemplo, de criar uma ética social – como veremos também em
outro momento – que possa ser aplicada a toda a sociedade e que contemple os
céticos.
Quero
terminar enfatizando a pessoa do Tomé como um cético e questionador. Mas, Jesus
soube envolvê-lo no diálogo e confrontá-lo na sua fé. Vejamos:
· Jo 14.5 – Tomé questiona a Jesus sobre o Caminho
para o Pai dito por Ele.
· Jo 14.6 – Jesus responde, ser Ele o Caminho.
Será que Tomé entendeu? Parece que não, mas aceitou, pensou, creu...
· Jo 20.25 – Conhece o ditado “sou igual a
Tomé, tenho que ver para crer”? Pois é, esta frase está baseada nas palavras
que ele disse: "Se eu não vir as marcas dos pregos em suas mãos, se eu
não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não
acreditarei".
· Jo 20.27-29 – Jesus aparece aos discípulos, diz
a Tomé para ele colocar o seu dedo nas marcas dos pregos e parar de duvidar. Ou
seja, Jesus confronta a dúvida ou o ceticismo de Tomé com verdade, a fé e o
milagre da ressurreição: o ceticismo de Tomé é revertido em fé, pois ele sabia
que Jesus tinha morrido e agora aparece vivo. Veja a resposta de Tomé: “Senhor
meu e Deus meu!”. Esta é uma das maiores verdades de um ex-cético que deixou de
duvidar e passou a crer. Aceitar a Jesus como o seu Deus (deísmo de Jesus) é um
dos dogmas mais importantes do Cristianismo, pois trata-se de Jesus, como o
Cristo e uma das pessoas da trindade, a principal doutrina cristã.
O rei Ciro, ao qual nos referimos aqui, também
chamado de Ciro II e Ciro, oGrande, foi responsável pela
formação do Império Persa e a efetivação de uma política de expansão territorial,
consolidando um dos maiores impérios da Antiguidade. E também foi um
instrumento de Deus em favor de Israel, chamado inclusive por Deus de “meu
pastor” e meu “ungido”.
Ciro, o grande, com o seu cilindro [1]
1.Ciro e
o Império Persa
O planalto do
Irã, região montanhosa e desértica, situado à leste do Crescente Fértil [2], entre a Mesopotâmia e a
Índia, foi povoado pelos medos e pelos persas. A princípio, os persas eram
dominados pelos medos. Essa situação se inverteria por volta de 559 a.C., pois
nessa época, sob o comando de Ciro, os persas dominaram os medos e
passaram a controlar a região.
Com Ciro, os
persas se estenderam por um largo território e
conquistaram vários reinos como Babilônia, Egito, Reinos da Lídia, Fenícia,
Síria, Palestina e regiões gregas da Ásia Menor. Ciro governou entre 559
e 530 a.C.
Ciro era
descendente de Teispes, neto de Ciro I e filho de certo Acaemênio Cambises.
Dentre suas virtudes destacamos o fato de que ele respeitava os costumes e
religiões dos povos conquistados e defendia os direitos humanos. Por conta
disto Ciro gozava de elevada reputação também entre os judeus.
Ciro era da DinastiaAquemênida e
depois dele, segue a lista de reis desta dinastia [3]: Cambises II (530-522 a.C.);
Esmérdis (522 a.C.); Dario I, o Grande (522-486 a.C.); Xerxes I (486-465 a.C.);
Artaxerxes I (465-424 a.C.) etc., até a conquista do Reino por Alexandre, o
Grande (336-323 a.C.). Para nosso propósito, no entanto, queremos destacar apenas
a pessoa de Ciro, o Grande, e como ele chegou à Babilônia, em 539 a.C., pondo
fim à hegemonia babilônica, como – teologicamente falando – um instrumento de
Deus para a realização de sua vontade naquele momento histórico, sobretudo em
favor de Israel.
2.Ciro e
a conquista de Babilônia
Em Isaías 44.28 se lê: “Que digo de Ciro: É
meu pastor, e cumprirá tudo o que me apraz, dizendo também a Jerusalém: Tu
serás edificada; e ao templo: Tu serás fundado”. Ligando os textos bíblicos
com a história, sabemos que aqui foi a primeira vez que Ciro é mencionado pelo
nome. E o nome Ciro foi profetizado por Isaías cerca de mais de 150 anos
antes de ele nascer, pois Isaías profetizou entre 740 e 701 a.C. e Ciro, o
persa, reinou entre 559 e 530 a.C.
Deus governa sobre toda a terra usando pessoas
como instrumentos para cumprirem seus propósitos. No texto de Isaías 44.24 até
45.25, o instrumento que Deus usou foi Ciro, chamando-o, inclusive de
“meu pastor” (44.28) e “ungido” (45.1). Com esse último título (ungido), por
exemplo, Ciro é, em determinado sentido, considerado o precursor gentio, ou
tipo do Messias: Jesus Cristo. W. Fitch [4] destaca que “... Flavo
Josefo (Antiguidades [5], 11:1,
seção 2) registra que mostraram a Ciro esta profecia quando ele entrou na Babilônia,
resolvendo logo o monarca dar-lhe cumprimento...”. Sabe-se que
Isaías faleceu provavelmente em 701 a.C., e em seu trabalho sobre o assunto
Gabriel Girotto Lauter afirma que “... isso faz com que muitos tenham
dificuldade em crer que se trata de uma profecia genuína, mas defendem que essa
porção do livro tenha sido escrita no período em que os fatos aconteceram...[6]”. Mas, como sabemos pelas
Escrituras, Deus anuncia o “fim” desde o “princípio” e “... desde a
antiguidade as coisas que ainda não sucederam...” (Is 46.10).
Considera-se que a expressão “Que diz a
profundeza: ‘seca-te’” (Is 44.27) seja um ardil de que Ciro se serviu para
conquistar Babilônia. Nabonido era o rei na época e foi o último governante da
Babilônia. “Por artes de engenharia, [Ciro] desviou as águas do
Eufrates do seu curso através da cidade, e fez com que os seus soldados
entrassem nela pelo leito seco do rio” (Fitch, Nota 4). Isto ocorreu em 539
a.C. Mas, segundo ainda Lauter, “... as tropas de Ciro sitiaram a cidade e
seu general entrou nela sem precisar lutar. O povo da Babilônia recebeu Ciro
como libertador e não como conquistador...” (Idem, Nota 6). Heródoto,
segundo Fitch, informa ainda que “... as portas de Babilônia eram em número
de cem. Todas elas se abrirão [abriram] de par em par, revelando
tesouros ocultos, escondidos nas caves e lugares secretos da cidade”[7].Bem, podemos
resumir o que diz a Bíblia acerca de Ciro, assim, conforme os cinco primeiros
versos do capítulo 45 de Isaías:
Deus escolheu Ciro como seu agente para cumprir sua divina vontade. E ai dos que se opusessem ao seu governo!
Deus o ungiria como rei, iria à sua frente e aplanaria as montanhas.
Deus arrebentaria portões de bronze e quebraria trancas de ferro.
Deus lhe daria tesouros escondidos e riquezas guardadas em lugares secretos.
Ciro cumpriria a vontade do Deus de Israel mesmo não conhecendo-O.
“Assim diz o SENHOR ao seu ungido, a Ciro, a quem tomo pela mão
direita, para abater as nações diante de sua face, e descingir os lombos dos
reis, para abrir diante dele as portas, e as portas não se fecharão. Eu irei
adiante de ti, e endireitarei os caminhos tortuosos; quebrarei as portas de
bronze, e despedaçarei os ferrolhos de ferro.Dar-te-ei os
tesouros escondidos, e as riquezas encobertas, para que saibas que eu sou o
Senhor, o Deus de Israel, que te chama pelo teu nome. Por amor de meu servo
Jacó, e de Israel, meu eleito, eu te chamei pelo teu nome, pus o teu sobrenome,
ainda que não me conhecesses. Eu sou o Senhor, e não há outro; fora de mim não
há Deus; eu te cingirei, ainda que tu não me conheças...” (Is 45.1-5).
3.O
decreto de Ciro e o fim do cativeiro
Importante destacar que o Soberano Deus usa
reis e outras importantes personalidades como Lhe apraz, seja para castigar ou
abençoar o seu povo. Por exemplo, Deus usou também outro rei, este último,
porém, com caráter e postura muito diferentes de Ciro, há uns 70 anos antes,
por volta de 607 a.C., que foi Nabucodonosor, chamando-o “meu servo” (Jr 27.6),
para castigar seu povo, levando-o cativo para a Babilônia. “E toda esta
terra virá a ser um deserto e um espanto; e estas nações servirão ao rei de
babilônia setenta anos” (Jr 25.11), disse o Senhor. Mas “... no ano
primeiro de Dario [8], filho de Assuero, da
linhagem dos medos, o qual foi constituído rei sobre o reino dos caldeus”
(Dn 9.1), Daniel entendera pela leitura dos escritos de Jeremias (Dn 9.2), que
o cativeiro estava chegando ao fim. E se pôs a orar ao seu Deus. A resposta
vinda a ele pelo anjo Gabriel (Dn 9.21) fala da “... ordem para restaurar e
para edificar Jerusalém...” (v. 25) até do surgimento do “... príncipe,
que há de vir...” (v. 26), assunto do qual já falamos aqui.
Sabemos que a ordem de saída trata-se do edito
de Ciro, assinado em 538 a.C., que põe fim ao cativeiro babilônico. Isto
significa que Ciro tomou esta decisão um ano após ter conquistado o Império
Babilônico. Veja 2Cr 36.22,23; Ed 1.2; 5.13; 6.3. Ciro também devolveu os vasos
pertencentes ao templo (Ed 1.7) e proveu fundos para a obra de reabilitação de
Judá (Ed 3.7).
O texto do decreto de Ciro tal como foi
descrito em Esdras 1.1-4, “... poderia sugerir que Ciro cria em Jeová. No
entanto, sabemos pelas inscrições do próprio Ciro que ele também atribuiu as
suas vitórias ao deus babilônico Marduc. É provável que Ciro sentisse respeito
por vários deuses em geral e redigisse os seus decretos a todas as nações.
Provavelmente pediu a qualquer dirigente judaico (quem sabe se Daniel) para
redigir o decreto de forma que este fosse aceitável para os judeus”[9]. Ciro era benquisto por
todos os seus governados, mas não alguém que se convertera ao Deus dos judeus.
Mesmo assim, Deus o usou pois como Ele diz: “Eu fiz a terra, o homem, e os
animais que estão sobre a face da terra, com o meu grande poder, e com o meu
braço estendido, e a dou a quem é reto aos meus olhos” (Jr 27.5); “... o
Altíssimo domina sobre os reinos dos homens e os dá a quem quer" (Dn
4.32). Aliás, a referência de Daniel 4.32, é uma continuação da explicação de
Daniel a respeito do sonho que Nabuconosor teve, que dizia respeito à queda da “grande
Babilônia”, assim considerada pelo rei. "A sentença sobre Nabucodonosor cumpriu-se imediatamente. Ele foi expulso do meio dos
homens e passou a comer capim como os bois. Seu corpo molhou-se com o orvalho
do céu, até que os seus cabelos e pelos cresceram como as penas de uma águia, e
as suas unhas como as garras de uma ave” (Dn 4.33). O Império Persa
também chegou ao fim, em 330 a.C. através do grande rei Alexandre da Macedônia.
Veja: “Agora, pois, vou dar-lhe a conhecer a verdade: Outros três reis
aparecerão na Pérsia, e depois virá um quarto rei, que será bem mais rico do
que todos os outros. Quando ele tiver conquistado o poder com sua riqueza,
instigará todos contra o reino da Grécia. Então surgirá um rei guerreiro, que
governará com grande poder e fará o que quiser” (Dn 11.2-3). O rei guerreiro
(poderoso) mencionado no verso 3 trata-se de Alexandre, o Grande. Mas o fim
deste também já estava previsto: “Depois que ele [Alexandre] surgir,
o seu império se desfará e será repartido para os quatro ventos do céu. Não
passará para os seus descendentes, e o império não será poderoso como antes,
pois será desarraigado e dado a outros” (v. 4). E assim, temos uma sucessão
de reinos e governantes até a volta do”... REI DOS REIS E SENHOR DOS SENHORES”
(Ap 19.16).
4. Existem
“Ciros” nos dias atuais?
Como dissemos acima, Deus usou no passado e ainda
usa – no presente –, pessoas para exercerem determinadas tarefas segundo a sua
vontade no mundo, sejam elas pessoas honestas, religiosas ou não. Normalmente –
podemos afirmar – que Deus interfere na história quando determinados fatos têm
relação direta com Israel. Devemos lembrar que segundo a Bíblia, quem não é
judeu ou israelita é chamado de “gentio”[10] (ou estrangeiro), e embora
a graça de Deus abranja toda a humanidade [11], há uma aliança dEle específica
com seu povo: Israel. De modo que todos que aceitam crer e servir a
Deus, tornando-se parte da Igreja de Cristo, têm que ter em mente que o Deus em
quem eles creem como cristãos é antes de tudo o Deus de Israel. Portanto, o
Deus dos cristãos é o mesmo Deus dos judeus. Não é concebível ser cristão e
antissemita, por exemplo. A propósito, veja este meu artigo sobre o assunto: Semitismo, antissemitismo e xenofobia.
Seguindo este raciocínio, podemos dizer que
outros “Ciros” (figurativamente e talvez de menor importância) foram e estão
sendo usados hoje através da história, para o bem de Israel e de sua Igreja,
assim como outros “Nabucodonosores”, “Faraós” ou “Herodes”..., mas para o
castigo e/ou disciplina do seu povo. Interferência na história e negócios dos
homens é um dos meios como Deus como “Senhor da História”. A tolerância dos
pecados homens tem um tempo determinado por Deus. Assim, podemos dizer que Deus
interviu em alguns momentos da história modificando seu rumo e permitiu em
outros momentos as ações de governantes – inclusive tiranos – para um
julgamento posterior. Diversas passagens bíblicas como Ezequiel 38 e 39,
Zacarias 12 e 14, Apocalipse 14 etc., tratam do juízo de Deus no futuro, de
nações rebeldes e inimigas de Israel. Disse Deus: “Por meu intermédio os
reis governam, e as autoridades exercem a justiça; também por meu intermédio
governam os nobres, todos os juízes da terra” (Pv 8.15,16 – NVI).
Bem, sobre o holocausto, por exemplo, será
que Hitler foi usado ou teve permissão de Deus para praticar aqueles horrores
que ele fez aos judeus, matando cerca de seis milhões deles? Ele se gabava, por
exemplo, de ter sido escolhido por Deus para castigar os judeus. Aliás, veja aqui, qual foi também a posição cristã
católica (mais especificamente, do Papa Pio XII)e
protestante (principalmente de Dietrich Bonhoeffer) sobre as atitudes de Hitler
durante a segunda guerra mundial.
Em linhas gerais, como nos Estados Modernos não
há reis com poderes absolutos (ou não deveriam ter) e sim democráticos, que
dependem da escolha dos seus líderes pelos cidadãos de seus respectivos países,
entendo – como um cristão conservador – que para errarmos menos, devemos votar
em nossos representantes, seja do Poder Legislativo, mas principalmente do
Executivo, que, em linhas gerais, sejam pró-Israel; defensores da
cultura judaico-cristã – não se trata de defesa do etnocentrismo
ocidental ou do cristianismo apenas –, conservadores que reconhecem os
fundamentos do Cristianismo e da Bíblia como alicerce da civilização ocidental;
defensores de princípios como honestidade, família tradicional (pai,
mãe, filhos), liberdade de comércio, de imprensa e de crença (seja ela qual
for); que sejam defensores do Estado laico e não laicismo... Além disso, por
princípio, os conservadores são contrários ao Comunismo e defensores do Capitalismo.
Como já falamos aqui “o conservadorismo implica em
preservar valores, costumes e tradições da cultura judaico-cristã. Portanto, se
alguém é antissemitista, e anticristão, por exemplo, não pode ser considerado
um conservador, ao passo que na sociedade, alguém que mesmo não sendo ...
cristão, mas aceita os valores cristãos como moral, ética etc., conseguem
conviver muito bem com os conservadores...”.
Votando então à questão de que se existem
“Ciros” nos dias atuais, podemos afirmar que governantes que consideram os
princípios acima sine qua non em sua administração podem ser um Ciro
moderno. E acrescento que os que assim o fazem presenciam prosperidade
econômica e social em seus países, com as devidas proporções, obviamente,
porque na sociedade, aqueles que não aceitam tal postura lutam (e muito) contra
suas aplicações das medidas que defendem.
Um exemplo de líder político conservador que
até certo ponto, pode se assemelhar a um “Ciro” moderno é DonaldTrump
nos EUA. Uma matéria do PortalVox [12], publicada em março de
2018, trazia o título: A história bíblica que a direita cristã usa para defender
Trump. A história bíblica é exatamente a de Ciro, o persa. Segundo
a matéria, há até uma moeda mostrando Trump e Ciro lado a lado. O apelo e o
desejo da direita estadunidense de ver Trump presidente do seu país (agora,
novamente eleito), significa que esta (grande) parcela da sociedade
norte-americana goza dos mesmos princípios que Trump. Acho que estas pessoas
não esperam um Trump santo, mas um líder que defende os princípios descritos
acima: judaico-cristãos e base da civilização ocidental. Mas o que mais leva em
conta na comparação de Trump com Ciro é o fato de ambos defenderem Israel. A
maioria dos que apoiam e votam em Trump, portanto conservadores, é cristã. E
estes cristãos entendem que a bênção de Abraão está sobre os que apoiam os
filhos de Abraão: “E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que
te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gn
12.3).
De 2016 para cá, passei a observar o perfil de
outro líder político brasileiro: JairBolsonaro. Na época, eu
ainda achava que PSDB, por exemplo, era partido de direita. Mas quando percebi
que Bolsonaro não era bem quisto nem pela extrema esquerda e nem pelos
psdbistas passei a questionar o porquê daquele deputado federa na época ser tão
perseguido. Mais adiante, em setembro de 2018, quando levou uma facada acabei
descobrindo que quem eu achava ser de direita, na verdade era apenas uma
oposição faz-de-conta da extrema-esquerda. Foi nesta época que conheci a
expressão de Olavo de Carvalho: “o teatro das tesouras”. A defesa da crença em
Deus, de apoio a Israel, da família tradicional etc., foram os temas que
mostram a grande diferença entre os verdadeiros conservadores e os demais. Jair
Bolsonaro está sempre cercado de apoiadores e conta com grande popularidade dos
conservadores, cristãos, em sua maioria. E mesmo inelegível (no momento, pelo
menos – dezembro de 2024) [13] e mesmo depois de tanta perseguição
que sofreu durante o seu governo (2019-2022), ainda mantém seu slogan: “Deus,
Pátria, Família e Liberdade”. Portanto, embora odiado pela esquerda ele é
recompensado pelo apreço da maioria dos cristãos por conta desta sua defesa dos
mesmos princípios conservadores, mas que – podemos afirmar – seus princípios servem
para todos. O país de Jair Bolsonaro é muito diferente do de Trump, e não teria
a mesma relevância. Quando o Presidente dos EUA fala ou toma alguma medida, esta
tem repercussão internacional. A mesma atitude de Jair Bolsonaro não teria o
mesmo efeito, mas seu país e parte do mundo seriam beneficiados como já foi
entre 2019 e 2022, em meio a um turbilhão de críticas de opositores, pandemia, justiça
trabalhando contra e assim por diante. Por que ele não foi reeleito em 2022?
Bem, este é assunto do qual não podemos falar hoje no Brasil. Outros líderes
conservadores, como Javier Milei, na Argentina, Nayib Bukele em El-Salvador, Giorgia
Meloni na Itália e outros seguem no mesmo caminho.
Concluindo, o governo de Ciro, o
persa, é visto como um governo ideal. Deus usou sua pessoa e outros como seus
instrumentos e também abençoa os que têm os princípios conservadores como
norteadores de suas administrações. Mas embora, mesmo sendo cidadãos que votamos
para escolher nossos representantes, não podemos nos esquecer de que Deus
governam as nações. E ao que espiritualmente observo, Deus está permitindo
nosso país passar pelo que está passando: Judiciário aliado a um Executivo de
extrema-esquerda, portanto contrário aos princípios conservadores. Diz a Palavra
de Deus: “Todos devem sujeitar-se às autoridades governamentais, pois não há
autoridade que não venha de Deus; as autoridades que existem foram por ele
estabelecidas” (Rm 13.1). “Por meu intermédio os reis
governam, e as autoridades exercem a justiça; também por meu intermédio
governam os nobres, todos os juízes da terra” (Pv 8.15,16). “Na verdade,
as nações são como a gota que sobra do balde; para ele [o Senhor] são
como o pó que resta na balança; para ele as ilhas não passam de um grão de
areia” (Is 40.15). Que as Nações atuais tenham ou não seus Ciros, o certo é
que:
“Já refulge a glória
eterna de Jesus, o Rei dos reis
[2] O CrescenteFértil
“... corresponde a uma região do Oriente Médio, com aproximadamente 500 mil
km2 de extensão. Está localizada entre a Jordânia, Líbano,
Síria, Egito, Israel, Palestina, Irã, Iraque e parte da Turquia. Abriga grandes
rios tal qual o Nilo, Tigre, Eufrates e Jordão. Todos eles tornaram a
agricultura o principal meio de subsistência das primeiras grandes civilizações
da antiguidade oriental... O ‘Crescente Fértil’ ou ‘Meia Lua Fértil’ recebe
esse nome uma vez que a região, se olhada no mapa, possui a forma de uma lua em
estágio crescente...”. In: <https://www.todamateria.com.br/crescente-fertil/>. Acesso em:
06/12/2024.
[4] FITCH, W. Isaías.
Apud: SHEDD, Russel P., Editor. O NovoComentáriodaBíblia,
Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1963 (1ª ed.)., pág. 724.
[5] FLÁVIO JOSEFO foi um
escritor e historiador judeu do século I d.C. Dentre suas obras está
Antiguidades Judaicas (AJ). As Antiguidades dos Judeus detalham a
história do povo judeu desde a narrativa da criação (Gênesis no Antigo
Testamento) a época da escrita de Josefo (Novo Testamento e depois).
[6] LAUTER. Gabriel
Girotto. Um estudo das profecias sobre Ciro presentes no livro do profeta Isaías.
Disponível em: <https://revista.batistapioneira.edu.br/index.php/ensaios/article/view/102/141>. Acesso em:
09/12/2024.
[7] In: FITCH, Nota 4, pág. 724.
[8]Dario I, o Grande
(522-486 a.C.), foi o quarto rei da Dinastia Aquemênida. Como o Decreto de
Ciro, dando oportunidade para os judeus voltarem para sua terra foi assinado em
538 a.C., entende-se que esta oração de Daniel ocorreu cerca de pelo menos uns
trinta anos depois. E muita gente ainda não tinha voltado para Israel nesta
época.
[9] WRIGHT, J. Stafford. Esdras.
Apud: SHEDD, Russel P., Editor. O Novo Comentário da Bíblia, Vol.
I. São Paulo: Vida Nova, 1963 (1ª ed.)., pág. 431.
[10] Os hebreus,
povo escolhido por Deus, através de Abraão, com o tempo teve seu Estado,
chamado ReinodeIsrael. Depois de Salomão, houve uma
divisão do reino em Israel, formado por dez tribos do Norte, e Judá,
formado por duas tribos do Sul. São as tribos do Sul que foram levadas por
Nabucodonosor para a Babilônia. Depois disto, o adjetivo judeu (de Judá) passou
também a ser sinônimo de hebreu e israelita. O profeta Daniel fala que depois
da 69ª semana (Dn 9.25-26 = 7 semanas + 62 semanas) o Messias (Jesus) seria
cortado (morto). Jesus veio para todos: judeus e não-judeus, estes chamados de
gentios. De judeus e gentios, Jesus, que “... de ambos os povos [judeus e
gentios] fez um...” (Ef 2.14) formou sua Igreja. Portanto, os povos bíblicos
são: judeus (povo escolhido), gentios (não-judeus) e igreja (judeus
e gentios que receberam Cristo como seu Senhor e Salvador). Veja também a nota
seguinte.
[11] Jesus “... veio
para o que era seu [Israel], e os seus [maioria dos israelitas] não
o receberam. Mas, a todos quantos o receberam [Igreja], deu-lhes o poder
de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome” (Jo 1.11-12).
[13] Enquanto escrevo isto
– 14 de dezembro de 2024 –, ouço a notícia da prisão do ex-Chefe do
Estado-Maior do Exército do Governo Bolsonaro (2019-2022). Por isso, acho que o
caminho para a prisão do líder maior dos conservadores brasileiros, Jair
Bolsonaro está aberto e a ditadura do Judiciário já está instalada no Brasil.
[14] Louvor "Vencendo
Vem Jesus", apresentado pelo local da Igreja Memorial Batista/Brasília.
In: <https://www.youtube.com/watch?v=uPn7eHATdS0>. Acesso em: 16/12/2024.