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03 novembro 2023

Estado Laico e Laicismo

 Estado Laico e Laicismo

Por Alcides Barbosa de Amorim


Laicidade [1]

Quando nos referimos ao Estado, estamos falando da unidade administrativa de um território, abrangendo suas instituições públicas que visam a representação, organização e atendimento dos anseios da população que lá habita. E como instituições, podemos citar o governo (no caso do Brasil, nas esferas municipal, estadual e federal), escolas, prisões, hospitais públicos etc., além das Forças Armadas: Exército, Marinha e Força Aérea. Percebe-se que o conceito de Estado é mais amplo do que o de governo. Quando dizemos, por exemplo, que a Aeronáutica é uma instituição nacional permanente e regular, estamos nos referindo a uma instituição de Estado, por ser ela permanente, como o próprio nome diz, enquanto o governo é provisório.

Acontece que as instituições do Estado estão sujeitas ao seu Chefe Supremo (ou Chefe do Executivo) e sua equipe de governo, com suas ideologias, projetos, promessas de campanha etc., a serem executados. Ainda que num país democrático com o governo dividido em três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário), como é (ou deveria ser) o caso do Brasil, este Chefe do Executivo e sua equipe não estão liberados para fazer o que bem entenderem. Acima deles e dos demais poderes ou instituições estão a Constituição e as leis do país. Mas, via de regra, seus planos e projetos são colocados à mesa para aprovação (ou não) e, se aprovados, dependendo de ter maioria no Congresso (Legislativo ou da interferência do Supremo) são postos em prática. São os casos, por exemplo, de controle da mídia, aborto, liberação de drogas, controle da religião etc. E é sobre este último caso que pretendo destacar a seguir.

Com o argumento do Estado laico o Estado brasileiro tem tentado “transformar a religião em um assunto estritamente privado”, diz a matéria da Gazeta do Povo [2], de 29/04/2017, sobre a qual quero destacar (texto adaptado).

  • Não se pode confundir poder político com poder religioso. Mas as religiões sempre tiveram papel fundamental na construção da maioria das sociedades modernas.
  • A herança judaico-cristã é uma das bases da civilização ocidental.
  • Segundo o filósofo Jürgen Habermas, a laicidade é definida como “… a neutralidade do poder estatal, no que tange às cosmovisões, neutralidade que garante iguais liberdades éticas a todos os cidadãos”.
  • O Estado não deve privilegiar nem coibir determinada religião, mas sim, garantir a liberdade religiosa e de culto, inclusive público.
  • Estado laico não é o mesmo que Estado ateu, e um Estado que se definisse como ateu estaria, portanto, adotando um posicionamento que viola a neutralidade.

Confundir Estado laico e Estado ateu equivale a confundir a saudável laicidade com o perigoso laicismo – perigoso porque viola as liberdades individuais e pode degenerar para a pura e simples perseguição religiosa, como ocorreu na França revolucionária e nos regimes comunistas.

  • Certos elementos da cultura de uma sociedade, como símbolos religiosos, formas de culto e até a aplicação do ensino religioso – não obrigatório – devem ser respeitados e não violam o princípio da laicidade.

O argumento do ‘Estado laico’ tem sido usado de forma inapropriada com o objetivo de transformar a religião em um assunto estritamente privado, que só tem espaço de cidadania das portas das residências para dentro. Ora, isso é ignorar a diferença existente entre a dimensão de governo e a dimensão da sociedade. Aqui, cabe ao Estado reconhecer a importância da religião na sociedade, sem ações que tenham o objetivo de minimizar esse fenômeno – o que seria uma interferência indevida. O que quer que as religiões pleiteiem precisa ser justificado em termos puramente racionais.

Como vimos acima, a existência do Estado com suas instituições visam a representação, organização e atendimento dos anseios da população que habita o seu território. Neste caso, se certos grupos sociais como sindicatos, entidades de classe, movimentos sociais e de minorias, são atendidos, os grupos religiosos e/ou igrejas também devem estar nesta lista. Por outro lado, a decisão da legalização das políticas públicas são do Estado, mas esta não pode violar os direitos e garantias dos membros de qualquer grupo social. Os grupos sociais devem ser ouvidos sobre a melhor forma de participar do debate público, de forma justificada sob o prisma da razão e não em detrimento de outras crenças. “Nisso consiste a laicidade saudável: basear as decisões de Estado em princípios puramente racionais, ainda que eles tenham sido defendidos principalmente ou exclusivamente por grupos religiosos”. Desta forma, o Estado laico deve dar a liberdade de culto e permitir sua participação pública – vida política – de qualquer grupo religioso, enquanto este último deve usar sua fé ou crença de forma racional, observando o caráter científico de seus argumentos e para o bem coletivo de seus concidadãos.

Muitos defendem o Estado laico, mas se confundem com as ideias de laicização. O Estado é laico por aceitar todas as crenças religiosas, mas ao mesmo tempo não deve restringir a participação de suas atividade apena na esfera do privado. Sobre isto, sugiro o BTCast – Direito Religioso já informado acima e também o vídeo abaixo do Canal Teologia Liberada, através do Pr. Veridiano Pantarotto:


Notas / Referências bibliográficas:

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