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01 janeiro 2025

“Pai, começa o começo!”

 "Melhor é o fim das coisas do que o princípio delas..." (Ec 7.8a)


"Quando eu era criança e pegava uma tangerina para descascar, corria para meu pai e pedia: - 'pai, começa o começo!'. O que eu queria era que ele fizesse o primeiro rasgo na casca, o mais difícil e resistente para as minhas pequenas mãos. Depois, sorridente, ele sempre acabava descascando toda a fruta para mim. Mas, outras vezes, eu mesmo tirava o restante da casca a partir daquele primeiro rasgo providencial que ele havia feito.

Meu pai faleceu há muito tempo (e há anos, muitos, aliás) não sou mais criança. Mesmo assim, sinto grande desejo de tê-lo ainda ao meu lado para, pelo menos, 'começar o começo' de tantas cascas duras que encontro pelo caminho. Hoje, minhas 'tangerinas' são outras. Preciso 'descascar' as dificuldades do trabalho, os obstáculos dos relacionamentos com amigos, os problemas no núcleo familiar, o esforço diário que é a construção do casamento, os retoques e pinceladas de sabedoria na imensa arte de viabilizar filhos realizados e felizes, ou então, o enfrentamento sempre tão difícil de doenças, perdas, traumas, separações, mortes, dificuldades financeiras e, até mesmo, as dúvidas e conflitos que nos afligem diante de decisões e desafios.

Em certas ocasiões, minhas tangerinas transformam-se em enormes abacaxis...

Lembro-me, então, que a segurança de ser atendido pelo papai quando lhe pedia para “começar o começo” era o que me dava a certeza que conseguiria chegar até ao último pedacinho da casca e saborear a fruta.

O carinho e a atenção que eu recebia do meu pai me levaram a pedir ajuda a Deus, meu Papai do Céu, que nunca morre e sempre está ao meu lado.

Meu pai terreno me ensinou que Deus, o Papai do Céu, é eterno e que Seu amor é a garantia das nossas vitórias.

Quando a vida parecer muito grossa e difícil, como a casca de uma tangerina para as mãos frágeis de uma criança, lembre-se de pedir a Deus: 'Pai, começa o começo!'. Ele não só 'começará o começo', mas resolverá toda a situação para você. Não sei que tipo de dificuldade eu e você estamos enfrentando ou encontraremos pela frente neste ano. Sei apenas que vou me garantir no Amor Eterno de Deus para pedir, sempre que for preciso: 'Pai, começa o começo!'”.

(Autoria Desconhecida)

21 maio 2024

Marxismo e fé cristã: considerações gerais

 

O estudo sobre o marxismo e a fé cristã é um pós-escrito acrescido ao livro Filosofia e fé cristã, de Colin Brown (*). Embora escrito em 1983 e reimpresso em 1985, resolvi rever este assunto e destacar em alguns posts, os principais temas extraídos da ideias de Karl Marx, acrescentando aos mesmos outras observações...

O estudo-base está gravado em PDF, disponível em:  

O marxismo e a fé cristã, por Richard J. Sturz

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(*) BROWN, Colin. Filosofia e fé cristã. São Paulo: Vida Nova: 1985, pág. 207 a 221 (Texto adaptado por Alcides Amorim).

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Já falamos em alguns posts, além do referido acima, sobre a relação do marxismo com o cristianismo, por exemplo:

16 maio 2024

Campo 14 – bebês mortos a pauladas, fome e execuções: a vida em um campo de concentração norte-coreano

Por Jones Rossi [1]

Uma aula no Campo 14
 

Os professores do Campo 14 eram guardas uniformizados: tratados por Shin no desenho acima, um deles bateu em uma aluna até a morte [2].


Shin In-geun é o único prisioneiro a ter escapado do Campo 14, conhecido como o mais cruel campo de concentração da Coreia do Norte. Ele viu o irmão ser fuzilado e a mãe ser enforcada.


Com o fim do Terceiro Reich, o suicídio de Hitler e a vitória dos aliados na Segunda Guerra Mundial, era de se esperar que o mundo nunca mais tolerasse as cenas chocantes e crueldades cometidas nos campos de concentração de Auschwitz ou Buchenwald. Porém faz mais de 50 anos que as mesmas atrocidades continuam acontecendo com o conhecimento do mundo inteiro e que não é exagero comparar com o pior da Alemanha nazista: os campos de prisioneiros da Coreia do Norte, para onde são enviados os inimigos políticos da ditadura comunista.

Ao contrário do que seria de se esperar, a pressão mundial para fechar esses centros de torturas e assassinatos é praticamente nula. Pouco se fala sobre o assunto, porque são poucos os prisioneiros que conseguem escapar dos campos de concentração. Do pior deles, o Campo 14, somente uma pessoa conseguiu escapar: Shin In-geun, de 37 anos, que foi concebido, criado e viveu até o início da vida adulta neste teatro dos horrores, com breves períodos em outros campos menos severos.

Shin In-geun, depois de fugir para a China, foi para a Coreia do Sul e atualmente vive na Califórnia. Mudou seu nome para Shin Dong-hyuk e hoje é um ativista dos direitos humanos. Ele contou sua história ao jornalista americano Blaine Harden, que trabalhava como correspondente em Seul para o jornal The Washington Post e publicou tudo no livro ‘Fuga do Campo 14’, publicado no Brasil pela Editora Intrínseca. Shin mudou detalhes de sua história várias vezes, o que muitos apoiadores do cruel regime comunista da Coreia do Norte usaram para tentar desacreditar todo o seu relato.

A principal das mudanças é especialmente compreensível. Na primeira versão de sua história, Shin omitiu o fato de que ele foi o responsável pela morte de sua mãe e de seu irmão mais velho. Eles pretendiam fugir. Shin ouviu a conversa e contou a um guarda do campo. Seu irmão foi fuzilado e sua mãe enforcada.

Criado em um ambiente de brutalidade e desconfiança, Shin nunca desenvolveu laços de amor com sua família. Estimulado pelo Estado a delatar os outros desde pequeno, lhe pareceu que a coisa certa a fazer era denunciar os planos da mãe e do irmão. Somente anos depois, já livre, tomou consciência da maldade de seus próprios atos. Então, em seus primeiros relatos, omitiu os fatos que o retratariam como um monstro. Um monstro criado pelo Estado norte-coreano, ainda assim um monstro.

No livro, Harden deixa claro que, apesar dos desertores serem a única fonte de informações sobre os campos, “suas motivações e seu grau de credibilidade não são imaculados. Na Coreia do Sul e em outros lugares, eles se encontram muitas vezes desesperados para ganhar a vida, dispostos a confirmar as ideias preconcebidas dos ativistas dos direitos humanos, dos missionários anticomunistas e dos ideólogos de direita. Alguns sobreviventes de campos recusam-se a falar sem receber dinheiro vivo antecipadamente. Outros repetem episódios impressionantes de que ouviram falar, mas que não testemunharam em primeira mão.”

Essas incongruências foram exaustivamente usadas pelos apologistas do regime norte-coreano e pelo próprio governo, que levou o pai de Shin à TV estatal para desmentir o filho. Mas desertores, incluindo ex-guardas que trabalharam nos campos, confirmam os fatos. Imagens de satélite não deixam dúvidas sobre a existência desses lugares funestos.

Infelizmente as atrocidades do Campo 14 não fazem parte do passado. Neste momento, milhares de pessoas estão passando por isso ali e em outras instalações do regime norte-coreano: um mundo de fome, maus tratos e execuções. A história de Shin Dong-hyuk é escabrosa. A fome nos campos é tamanha que Shin cresceu vendo a mãe e o irmão não como familiares, mas sim competidores pela escassa comida disponível. As únicas refeições dadas aos prisioneiros eram sopa de repolho, repolho na salmoura ou mingau de milho. Quando conseguia, Shin furtava a comida de sua mãe, que o surrava com uma enxada ou uma pá. A única carne disponível era a dos ratos, muitas vezes capturados nas latrinas do campo. Os prisioneiros que cometiam alguma falta aos olhos dos guardas eram punidos recebendo ainda menos alimento. A estes restava vasculhar até o estrume das vacas para tentar encontrar algum grão comestível.

A população que vive fora dos campos também passa fome. Dois terços das crianças norte-coreanas foram consideradas abaixo do peso por um levantamento feito pelo Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas, que só foi permitido em troca da doação de alimentos ao país. Esse número é o dobro do que o registrado na época em Angola, que estava saindo de uma guerra civil.

Homens e mulheres não viviam juntos no Campo 14 e o contato físico era proibido sem autorização prévia. Prisioneiros que fossem obedientes e cumprissem com sucesso sua cota de trabalho forçado às vezes recebiam autorização para se casar. O mesmo valia caso delatassem alguém. Mesmo assim, só podiam casar com outros prisioneiros que fossem escolhidos pelo Estado. Era possível recusar parceiros muito velhos ou muito feios, mas perdiam a chance de se casar para sempre. Foi assim que os pais de Shin se conheceram. Seu pai recebeu Jang Hye-gyung como “presente” por seu trabalho na oficina mecânica.

Fora desses casamentos arranjados, a gravidez era terminantemente proibida. Isso não quer dizer que elas não ocorressem. Os guardas abusavam das prisioneiras, que se submetiam em troca de apanhar menos nas fábricas ou receber mais comida. Mas se engravidassem, tanto elas como os filhos eram mortos. De acordo com o relato de An Myeong Chul, que trabalhou como guarda de vários campos (não do Campo 14), os guardas eram ensinados a tratar os prisioneiros sem qualquer humanidade, pensando neles como se fossem “cães ou porcos”. Ele viu mais de uma vez recém-nascidos serem mortos a golpes de pesadas barras de ferros.

As aulas dentro do campo eram apenas uma maneira de doutrinar as crianças desde cedo. Shin lembra de uma vez que uma colega de classe foi pega, durante uma revista surpresa feita pelo professor, com cinco grãos de milho no bolso. A xingou, mandou que ela se ajoelhasse e começou a bater em sua cabeça várias vezes. Harden escreve: “Enquanto Shin e os colegas observavam em silêncio, protuberâncias brotaram-lhe no crânio. Sangue escorria-lhe do nariz. Ela tombou no piso de concreto. Shin e vários outros colegas a levantaram e a levaram para casa, uma fazenda de porcos que não ficava longe da escola. Mais tarde naquela noite, a menina morreu.” Mais “sorte” teve outro aluno que desobedeceu o professor. Foi amarrado a uma árvore e uma fila de estudantes se formou para lhe dar murros no rosto.

Com dez anos de idade, as crianças eram encaminhadas para trabalhos insalubres, como empurrar minério em gôndolas sobre trilhos. Uma amiga de Shin se desequilibrou e teve o pé esmagado pela roda de aço de uma gôndola. Levada ao hospital do campo, teve o dedo amputado sem anestesia e tratado apenas com água salgada. Em outra ocasião, durante a construção de uma represa, um muro de concreto caiu perto de Shin, matando oito trabalhadores, cinco deles crianças de 15 anos de idade. Foram esmagados a ponto de ficarem irreconhecíveis. Todos continuaram trabalhando como se nada tivesse acontecido.

Neste ambiente de absoluto desespero, o suicídio era muitas vezes a única saída que alguns prisioneiros enxergavam. Mas os governantes viam o suicídio como uma tentativa de escapar ao domínio do partido. Como escreveu Kang Cholhwan no livro sobre seu período como prisioneiro do Campo 15, “se o indivíduo que tentara o ardil não estava por perto para pagar por isso, alguém mais precisava pagar no lugar dele.” Todos os prisioneiros são avisados de que, caso optem por esse caminho, seus familiares serão punidos com sentenças e punições ainda maiores.

A situação nos campos, porém, era mais difícil de ser suportada por aqueles que tinham uma vida pregressa. A diferença entre a vida levada antes de serem presos era um fardo pesado demais. Para pessoas como Shin, no entanto, que não conheciam outra vida, o desespero, por incrível que pareça, era menor.


Veja também:


Notas:

  • [1ROSSI, Jones “... é editor de Ideias na Gazeta do Povo e co-autor do livro Guia Politicamente Incorreto do Futebol (Ed. Leya), com Leonardo Mendes Júnior. Foi editor de ciência e saúde do site de VEJA, editor da revista Galileu e repórter do G1 e do extinto Jornal da Tarde” In:<https://www.gazetadopovo.com.br/autor/jones-rossi/>. Acesso em: 02/08/2022.


Referência bibliográfica:

  • ROSSI, Jones. Campo 14 – Bebês mortos a pauladas, fome e execuções: a vida em um campo de concentração norte-coreano. In: As atrocidades do comunismo que você não aprendeu na escola – Ebook, pp. 60-67. Gazeta do Povo. Acesso em: 02/08/2022.

28 abril 2024

Revolução dos Bichos (X)

Por: George Orwell [1]

In: Gazeta do Povo [2]

    Capítulo X [3]

Os anos se passaram. As estações chegavam e partiam e as vidas curtas dos animais passavam voando. Chegou o tempo em que mais ninguém se lembrava dos velhos tempos antes da Revolução, exceto Esperança, Benjamim, Moisés, o corvo, e alguns dos porcos.

Muriel tinha morrido; Mimi, Lulu e Pipa tinham morrido. Jones também estava morto – ele havia morrido em um lar para alcoólatras em outro canto do país. O Bola de Neve foi esquecido. Golias foi esquecido, exceto pelos poucos que o conheceram. Esperança era agora uma égua velha e robusta, com articulações rígidas e com uma tendência a ter remelas nos olhos. Ela já tinha passado dois anos da idade de aposentadoria, mas na verdade nenhum animal jamais chegou a se aposentar. A conversa de reservar um canto do pasto para animais velhos já havia sido abandonada há muito tempo. Napoleão era agora um javali maduro de cento e cinquenta quilos. O Berro estava tão gordo que mal conseguia enxergar através do espaço que suas bochechas deixavam para os olhos. Apenas o velho Benjamin era quase o mesmo de sempre, exceto por ter mais pelos cinzas ao redor do focinho e, desde a morte de Golias, ter ficado mais rabugento e casmurro do que nunca.

Agora a fazenda tinha bem mais criaturas, embora o aumento não tenha sido tão grande como se esperava em anos anteriores. Para muitos dos animais jovens, a Revolução não passava de uma tradição confusa, transmitida de boca a boca, enquanto outros animais comprados nunca tinham ouvido falar sobre a Revolução antes de chegarem lá. A fazenda possuía agora três cavalos além da Esperança. Eram animais de bem, trabalhadores dispostos e bons camaradas, mas muito estúpidos. Nenhum deles se mostrou capaz de aprender o alfabeto além da letra B. Eles aceitaram tudo o que lhes foi dito sobre a Revolução e os princípios do animalismo, especialmente pela Esperança, por quem tinham um respeito quase filial; mas ninguém sabia ao certo se tinham entendido bem.

A fazenda era agora mais próspera e organizada: tinha até sido ampliada com compra de dois campos do Sr. Pilkington. O moinho tinha sido finalmente concluído com sucesso, e a fazenda possuía uma debulhadora e um elevador de feno, e várias novas construções tinham sido acrescentadas a ele. Whymper tinha comprado uma pequena carruagem para si mesmo. O moinho de vento, entretanto, não havia sido usado para gerar energia elétrica no fim das contas. Ele era usado para moer milho, o que trazia um belo lucro em dinheiro. Os animais estavam trabalhando duro na construção de mais um moinho de vento; quando este estivesse terminado, assim se dizia, os dínamos seriam instalados. Mas os luxos mencionados por Bola de Neve, que deixou os animais sonhando com baias com luz elétrica, água quente e fria e semanas com apenas três dias de trabalho não eram mais mencionados. Napoleão havia denunciado tais ideias como contrárias ao espírito do animalismo. A felicidade mais verdadeira, disse ele, estava em trabalhar duro e viver frugalmente.

De alguma forma, parecia que a fazenda tinha ficado mais rica sem tornar os próprios animais mais ricos – exceto, é claro, os porcos e os cães. Talvez isto se deva em parte ao fato de haver tantos porcos e cães. Não que essas criaturas não trabalhassem, dentro de suas possibilidades. Havia, como Berro nunca se cansava de explicar, uma quantidade interminável de trabalho na supervisão e organização da fazenda. Muito desse trabalho era do tipo que os outros animais eram ignorantes demais para entender. Por exemplo, Berro lhes disse que os porcos despendiam horas de trabalho diário em coisas misteriosas chamadas “arquivos”, “relatórios”, “atas” e “memorandos”. Estas eram grandes folhas de papel que tinham que ser cobertas de escrita, e assim que eram cobertas, eram queimadas na fornalha. Isto era da maior importância para o bem-estar da fazenda, disse Berro. Mas, mesmo assim, nem os porcos nem os cães produziam qualquer alimento com seu próprio trabalho; e eles eram muitos, e seus apetites eram sempre imensos.

Quanto aos outros, suas vidas eram, até onde sabiam, como sempre foram. Geralmente tinham fome, dormiam na palha, bebiam dos bebedouros, trabalhavam nos campos; no inverno, eram perturbados pelo frio, e no verão, pelas moscas. Às vezes, os mais velhos entre eles guardavam suas lembranças sombrias e tentavam determinar se nos primeiros dias da Revolução, quando a expulsão de Jones ainda era recente, as coisas eram melhores ou piores do que agora. Mas eles não conseguiam se lembrar. Não havia nada com que pudessem comparar suas vidas atuais: eles não tinham nada para se basear, exceto as listas de dados de Berro, que demonstravam invariavelmente que tudo estava ficando cada vez melhor. Os animais achavam o problema insolúvel; em todo caso, eles tinham pouco tempo para especular sobre tais coisas agora. Somente o velho Benjamin professou recordar cada detalhe de sua longa vida e saber que as coisas nunca haviam sido, nem poderiam ser, muito melhores ou muito piores – a fome, as dificuldades e o desapontamento sendo, assim disse, a lei inalterável da vida.

E, no entanto, os animais nunca perderam a esperança. Mais ainda, eles nunca perderam, mesmo por um instante, seu senso de honra e privilégio de serem membros da Fazenda dos Animais. Eles ainda eram a única fazenda em todo o condado – em toda a Inglaterra! – possuída e operada por animais. Nenhum deles, nem mesmo os mais jovens, nem mesmo os recém-chegados que haviam sido trazidos de fazendas a dez ou vinte milhas de distância, jamais deixaram de se maravilhar com isso. E quando eles ouviam a arma disparar e viam a bandeira verde tremulando no mastro, seus corações se enchiam de orgulho irrevogável, e a conversa voltava-se sempre para os velhos dias heroicos, a expulsão de Jones, a escrita dos Sete Mandamentos, as grandes batalhas nas quais os invasores humanos haviam sido derrotados. Nenhum dos velhos sonhos havia sido abandonado. A República dos Animais que o Major havia predito, quando os campos verdes da Inglaterra deveriam ser libertos de pés humanos, ainda era um sonho. O dia estava chegando: poderia não estar em breve, poderia não acontecer com os animais vivos agora, mas ainda assim estava chegando. Até mesmo a melodia de “Animais da Inglaterra” era cantarolada secretamente aqui e ali: de qualquer forma, era algo que todos os animais da fazenda conheciam, embora ninguém ousasse cantá-la em voz alta. Talvez suas vidas fossem difíceis e nem todas as suas expectativas tivessem sido cumpridas; mas eles estavam conscientes de que não eram como os outros animais. Se passavam fome, não era para alimentar seres humanos tirânicos; se trabalhavam duro, pelo menos trabalhavam para si mesmos. Nenhuma criatura entre eles tinha duas pernas. Nenhuma criatura chamava qualquer outra criatura de “Mestre”. Todos os animais eram iguais.

Um dia, no início do verão, Berro ordenou que as ovelhas o seguissem, e as levou para um terreno baldio tomado por mudas de bétula no outro extremo da fazenda. As ovelhas passaram o dia inteiro lá sob a supervisão do Berro. À noite, ele voltou para a fazenda mas, como estava quente, disse às ovelhas para ficarem onde estavam. No fim, elas ficaram lá uma semana inteira, sem contato nenhum com os outros animais. O Berro ficava com elas durante a maior parte do dia. Disse que estava lhes ensinando uma nova canção e precisa de privacidade.

Em uma noite agradável logo após o retorno das ovelhas, quando os animais tinham terminado o trabalho e estavam voltando para as instalações da fazenda, o relincho aterrorizado de um cavalo soou do pátio. Assustados, os animais pararam em seus lugares. Era a voz da Esperança. Ela relinchou novamente, e todos os animais arrombaram em galope e correram para o pátio. Então todos viram o que ela tinha visto.

Era um porco andando sobre suas patas traseiras.

Sim, era o Berro. Um pouco desajeitado, como se não estivesse acostumado a suportar sua considerável massa naquela posição, mas com perfeito equilíbrio, ele estava passeando pelo pátio. E no momento seguinte, da porta da casa, saiu uma longa fila de porcos, todos andando sobre suas patas traseiras. Alguns o faziam melhor do que outros, um ou dois estavam até um pouco instáveis e pareciam precisar do apoio de uma vara, mas cada um deles conseguiu dar uma volta inteira no quintal com sucesso. Finalmente, os cães ladraram e a gata preta deu um miado estridente, então veio o próprio Napoleão, majestosamente erguido, lançando olhares altivos de um lado para o outro, com seus cães empolgados à sua volta.

Ele carregava um chicote em sua pata.

Havia um silêncio mortal. Espantados, aterrorizados e amontoados, os animais observavam a longa fila de porcos marchando lentamente ao redor do pátio. Era como se o mundo tivesse virado de cabeça para baixo. Depois veio um momento em que o primeiro choque havia passado e quando, apesar de tudo – apesar do terror dos cães e do hábito, desenvolvido durante longos anos de nunca reclamar, nunca criticar, não importando o que acontecesse – eles poderiam ter proferido alguma palavra de protesto. Mas naquele momento, como se fosse um sinal, todas as ovelhas explodiram em um tremendo balido de…

“Quatro pernas bom, duas pernas melhor! Quatro patas bom, duas patas melhor!

Quatro patas bom, duas patas melhor!”

Isso continuou por cinco minutos sem parar. E, quando as ovelhas se acalmaram, a chance de protestar já havia passado, pois os porcos haviam voltado para a casa.

Benjamin sentiu um nariz zumbindo em seu ombro. Ele olhou em volta. Era Esperança. Seus olhos velhos pareciam mais escuros do que nunca. Sem dizer nada, ela o puxou suavemente pela crina e o levou até o final do grande celeiro, onde os Sete Mandamentos foram escritos. Durante um ou dois minutos eles ficaram olhando a parede marcada com as letras brancas.

“Minha visão está falhando”, disse ela finalmente. “Mesmo quando eu era jovem, não conseguia ler o que estava escrito ali. Mas me parece que aquele muro está diferente. Os Sete Mandamentos são os mesmos que eram antes, Benjamin?”

Por uma vez Benjamin consentiu em quebrar sua própria regra, e leu para ela o que estava escrito na parede. Agora não havia nada lá, exceto um único Mandamento:

Todos os animais são iguais

Mas alguns animais são mais iguais do que outros

Depois disso, não pareceu estranho quando no dia seguinte os porcos que estavam supervisionando o trabalho da fazenda carregavam todos chicotes em suas patas. Não pareceu estranho saber que os porcos tinham comprado um rádio, estavam organizando a instalação de um telefone e tinham feito assinaturas das revistas “John Bull” e “Tit-Bits”, e do jornal “Daily Mirror”. Não parecia estranho quando Napoleão foi visto passeando no jardim da fazenda com um cachimbo na boca – não, nem mesmo quando os porcos tiraram as roupas do Sr. Jones do guarda-roupa e as vestiram, o próprio Napoleão aparecendo com um casaco preto, calças bufantes com botas de couro, enquanto sua porca favorita apareceu com o vestido leve de seda que a Sra. Jones costumava vestir aos domingos.

Uma semana depois, à tarde, uma série de carroças foi até a fazenda. Uma delegação de fazendeiros vizinhos havia sido convidada para fazer uma excursão de inspeção. Eles foram levados para todos os cantos da fazenda, e expressaram grande admiração por tudo o que viram, especialmente o moinho de vento. Os animais estavam trabalhando no campo de nabos. Eles trabalhavam diligentemente, mal levantando o rosto do chão, sem saber se deviam ter mais medo dos porcos ou dos visitantes humanos.

Naquela noite, gargalhadas e cantorias vieram da casa. E, de repente, ao som das vozes misturadas, os animais foram acometidos de curiosidade. O que poderia estar acontecendo ali, agora que pela primeira vez animais e seres humanos estavam se encontrando em termos de igualdade? Em comum acordo, eles começaram a rastejar o mais silenciosamente possível para o jardim da fazenda.

Eles pararam no portão, meio assustados para continuar, mas a Esperança liderou o caminho para dentro. Eles se inclinaram para a casa, e os animais que eram suficientemente altos se espreitaram na janela da sala de jantar. Lá, ao redor da longa mesa, sentavam-se meia dúzia de agricultores e meia dúzia dos porcos mais eminentes, o próprio Napoleão ocupando o assento de honra à frente da mesa. Os porcos pareciam completamente à vontade em suas cadeiras. A companhia vinha desfrutando de um jogo de cartas, mas havia feito uma pausa, evidentemente para fazer um brinde. Um grande jarro estava circulando, e as canecas estavam sendo reabastecidas com cerveja. Ninguém notou as faces curiosas dos animais que olhavam para dentro da janela.

O Sr. Pilkington, de Foxwood, havia se levantado com sua caneca na mão. Ele logo pediria, disse, que todos fizessem um brinde. Mas antes de fazer isso, havia algumas palavras que ele sentia que lhe competia dizer.

Foi uma fonte de grande satisfação para ele, disse – e, estava certo, para todos os outros presentes também – sentir que um longo período de desconfiança e mal-entendidos havia chegado ao fim. Houve um tempo – não que ele, ou qualquer um dos fazendeiros presentes, tivesse compartilhado tais sentimentos – mas houve um tempo em que os respeitados proprietários da Fazenda dos Animais foram considerados, não com hostilidade, mas talvez com uma certa dose de apreensão, por seus vizinhos humanos. Ocorreram infelizes incidentes, ideias equivocadas tinham corrido por aí. Tinha-se sentido que a existência de uma fazenda de propriedade de porcos e operada por porcos era de alguma forma anormal e poderia ter um efeito perturbador na vizinhança. Muitos agricultores haviam assumido, sem a devida investigação, que em tal fazenda prevaleceria um espírito de preguiça e indisciplina. Eles estavam nervosos com os efeitos sobre seus próprios animais e até mesmo sobre seus empregados humanos. Mas todas essas dúvidas foram agora dissipadas. Hoje ele e seus amigos haviam visitado a Fazenda dos Animais e inspecionado cada centímetro dela com seus próprios olhos, e o que encontraram? Não apenas os métodos mais atualizados, mas uma disciplina e uma ordenação que deveria ser um exemplo para todos os fazendeiros em todos os lugares. Ele acreditava estar certo ao dizer que os animais ali trabalhavam mais e recebiam menos comida do que os animais em qualquer outra fazenda do condado. De fato, hoje ele e seus colegas visitantes haviam observado muitas características que pretendiam introduzir imediatamente em suas próprias fazendas.

Ele terminaria suas observações, disse ele, enfatizando mais uma vez os sentimentos amigáveis que subsistiam, e deveriam subsistir, entre a Fazenda dos Animais e seus vizinhos. Entre porcos e seres humanos não havia, e não precisava haver, nenhum conflito de interesses, seja qual fosse. Suas lutas e suas dificuldades eram uma só. O problema do trabalho não era o mesmo em todos os lugares? Então ficou evidente que o Sr. Pilkington estava prestes a fazer alguma graça cuidadosamente preparada, mas ele ficou tão impactado pelo seu próprio humor que foi incapaz de contar a piada em voz alta. Depois de muita asfixia, durante a qual seus vários queixos ficaram roxos, ele conseguiu: “Se vocês têm que lidar com animais inferiores”, disse ele, “nós temos que lidar com nossas classes inferiores”! Esta tirada fez com que toda a mesa fosse tomada por risos; e o Sr. Pilkington mais uma vez parabenizou os porcos pelo baixo consumo de ração, pelas longas horas de trabalho e pela ausência geral de mimos que ele havia observado na Fazenda dos Animais.

E agora, disse finalmente, pediria a todos que se levantassem e se certificassem de que seus copos estavam cheios. “Cavalheiros”, concluiu o Sr. Pilkington, “cavalheiros, eu lhes faço um brinde: À prosperidade da Fazenda dos Animais”!

Houve uma ovação entusiasmada e um bater de pés. Napoleão ficou tão grato que saiu de seu lugar e deu a volta na mesa para brindar com o Sr. Pilkington, dando uma batidinha leve entre as canecas antes de esvaziar a sua. Quando os aplausos se extinguiram, Napoleão, que havia ficado de pé, insinuou que ele também tinha algumas palavras a dizer.

Como todos os discursos de Napoleão, esse também foi curto e direto ao ponto. Ele também, disse, estava feliz pelo fim do período de mal-entendidos. Durante muito tempo houve rumores – circulados, tinha motivos para pensar, por algum inimigo maligno – que havia algo subversivo e até revolucionário na visão dele e de seus colegas. Acreditavam que eles tentavam provocar a rebelião de animais em fazendas vizinhas. Nada poderia estar mais longe da verdade! Seu único desejo, agora e no passado, era viver em paz e ter relações comerciais normais com seus vizinhos. Esta fazenda, que ele teve a honra de controlar, acrescentou, era uma empresa cooperativa. Os títulos de propriedade, que estavam em seu próprio poder, eram de propriedade conjunta dos porcos.

Ele não acreditava, disse ele, que qualquer uma das antigas suspeitas ainda persistisse, mas certas mudanças haviam sido feitas recentemente na rotina da fazenda, o que deveria ter o efeito de promover ainda mais a confiança. Até então, os animais da fazenda tinham um costume bastante tolo de se tratarem uns aos outros como “camarada”. Isso seria suprimido. Havia também um costume muito estranho, cuja origem era desconhecida, de marchar todos os domingos de manhã passando pelo crânio de um javali que era pregado em um poste no jardim. Isto também seria suprimido e o crânio já havia sido enterrado. Seus visitantes também poderiam ter observado a bandeira verde que voava do mastro. Se assim fosse, eles talvez tivessem notado que o casco branco e o chifre com os quais ela havia sido marcada anteriormente tinham sido removidos. A partir de agora, seria uma bandeira verde simples.

Ele tinha apenas uma crítica, disse ele, a fazer ao excelente discurso do Sr. Pilkington. O Sr. Pilkington havia se referido a “Fazenda dos Animais”. É claro que ele não podia saber – pois ele, Napoleão, estava anunciando isso pela primeira vez – mas o nome “Fazenda dos Animais” havia sido abolido. Daí em diante a fazenda seria conhecida como “Fazenda Solar” – que, ele acreditava, era seu nome correto e original.

“Cavalheiros”, concluiu Napoleão, “Eu farei o mesmo brinde de antes, mas de uma forma diferente. Encham seus copos até a borda. Meus senhores, aqui está meu brinde: À prosperidade da Fazenda Solar”!

Houve o mesmo aplauso de antes, e as canecas foram esvaziadas até o fundo. Mas enquanto os animais do lado de fora olhavam para o local, parecia que alguma coisa estranha estava acontecendo. O que foi que havia mudado no rosto dos porcos? Os velhos olhos escuros de Esperança iam de um rosto para o outro. Alguns deles tinham cinco queixos, outros quatro, outros três. Mas o que foi que parecia estar fundindo e mudando? Então, os aplausos chegaram ao fim, a companhia pegou suas cartas e continuou o jogo que havia sido interrompido, e os animais saíram se arrastando silenciosamente.

Ainda não tinham se afastado mais de 20 metros quando pararam. Um alvoroço de vozes vinha da casa da fazenda. Eles correram de volta e olharam pela janela novamente. Sim, uma violenta briga estava em andamento. Havia gritos, pancadas sobre a mesa, olhares suspeitos, negações furiosas. A fonte do problema parecia ser que Napoleão e o Sr. Pilkington tinham jogado um ás de espadas simultaneamente.

Doze vozes gritavam raivosas e iguais. Agora não havia mais dúvidas sobre o que havia acontecido com os rostos dos porcos. As criaturas lá fora olhavam de porco para o homem, e de homem para porco, e de porco para homem novamente; mas já era impossível dizer quem era quem.

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Agora, veja o Capítulo X e último, em audiolivro:



Notas:

  • [1] George Orwell: “...escritor nascido em uma colônia inglesa na Índia, é considerado um dos mais importantes romancistas da vertente distópica da literatura mundial, caracterizada pela narração de enredos em que os personagens vivenciam situações em espaço e tempo futuros, nos quais não há possibilidade para a utopia, ou seja, para o sonho e para a esperança. Nessa linha, destacam-se suas duas obras-primas, traduzidas para vários idiomas e transpostas para as telas do cinema mais de uma vez: o romance A revolução dos bichos, publicado em 1945, e o romance 1984, publicado em 1949.” Veja mais aqui.
  • [2O que diz o livro Revolução dos Bichos? “O conhecido livro do inglês George Orwell, A Revolução dos Bichos (1945), é um dos legados atemporais mais importantes que escritores do século passado nos deixaram. Na obra, Orwell faz uma crítica ao stalinismo. Então socialista, o inglês – nascido na Índia durante o domínio britânico – se desilude com a ideologia ao ver o totalitarismo soviético e satiriza o sucessor de Lênin. Na alegoria, o autor apresenta uma revolução idealizada por um porco, o Major (que pode representar tanto Marx como Lênin), que convoca os bichos da granja em que vive a expulsar seu proprietário, o humano Sr. Jones (que seria Nicolau II, imperador do Czar). Porco Major morre em seguida e dois outros suínos tomam a frente: Napoleão (representando Stálin) e Bola de Neve (que seria Trotski). A estória segue o roteiro soviético… Napoleão expurga Bola de Neve, deturpa as leis a seu favor e se torna um ditador. Os demais bichos (galinhas, gado, cavalo…) se rendem à autocracia sem questionar, de forma passiva. Cada vez trabalham mais, exaustivamente e com alimento controlado; enquanto isso, Napoleão toma posse das dependências do Sr. Jones, agindo, portanto, de forma mais exploradora e cruel que o antigo chefe. A ironia está no fato de que a máxima da revolução era ‘duas pernas/patas mau’ – referindo-se a seres humanos”. Leia mais em: Rodrigo Constantino – Gazeta do Povo.com.
  • [3] ORWELL, George. Revolução dos Bichos. Gazeta do Povo. Capítulo X, pág. 147 a 163. Veja o livro completo aqui.

25 abril 2024

Revolução dos Bichos (IX)

Por: George Orwell [1]

In: Gazeta do Povo [2]

    Capítulo IX [3]

O casco rachado de Golias levou um bom tempo para curar. Os animais haviam começado a reconstrução do moinho no dia seguinte ao término das comemorações da vitória. Ele se recusou a tirar um dia de folga sequer do trabalho e fez questão de não deixar que os outros vissem como estava sofrendo. À noite, ele admitiu para a Esperança que o casco o incomodava muito. A Esperança tentou tratar o casco com uma pasta que ela preparava mastigando ervas, e tanto ela quanto Benjamin incitaram Golias a trabalhar menos. “Os pulmões de um cavalo não duram para sempre”, ela lhe disse. Mas isso entrou por um ouvido de Golias e saiu pelo outro. Tinha, segundo ele mesmo, apenas uma ambição na vida – ver a construção do moinho bem avançada antes de chegar à idade de se aposentar.

No início, quando as leis da Fazenda dos Animais foram formuladas pela primeira vez, a idade de aposentadoria havia sido fixada aos doze anos para cavalos e porcos, aos quatorze para vacas, aos nove para os cães, aos sete para as ovelhas e aos cinco para as galinhas e os gansos. Tinham combinado pensões generosas para aposentados por velhice. Até agora, nenhum animal havia realmente se aposentado e usado o benefício, mas o assunto era cada vez mais discutido recentemente. Agora que o pequeno campo depois do pomar havia sido reservado para a cevada, havia rumores de que um canto do grande pasto seria cercado e transformado em um pasto para animais aposentados. Diziam que a pensão de um cavalo seria de dois quilos de milho por dia e sete quilos de feno no inverno, além de uma cenoura ou até, quem sabe, uma maçã, nos feriados públicos. Golias faria doze anos no final do próximo verão.

Enquanto isso, a vida era difícil. O inverno estava tão frio quanto o último, e a comida era ainda mais escassa. Mais uma vez, todas as rações foram reduzidas, exceto as dos porcos e dos cães. Igualar a quantidade de ração entre todos os animais, explicou Berro, seria contrário aos princípios do animalismo. De qualquer forma, ele não teve grandes dificuldades para provar aos outros animais que na realidade eles não tinham escassez de alimento, por mais que parecesse que sim. Por enquanto, certamente, havia sido considerado necessário fazer um reajuste das rações (Berro sempre chamou isso de “reajuste”, nunca de “redução”), mas se comparassem com a época de Jones veriam que a melhoria era enorme. Lendo os números com uma voz estridente e veloz, ele provou em detalhes que tinham mais aveia, mais feno e mais nabos do que tinham antes, que trabalhavam menos horas, que sua água potável era de melhor qualidade, que viviam mais tempo, que uma proporção maior de filhotes sobreviviam à infância, que tinham mais palha em suas baias e sofriam menos com pulgas. Os animais acreditavam em cada palavra. Verdade seja dita, Jones e tudo o que representava já tinha quase desaparecido de suas memórias. Eles sabiam que a vida hoje em dia era dura e difícil, que muitas vezes tinham fome e frio, e que estavam trabalhando sempre que não estivessem dormindo. Mas, sem dúvida, era pior nos velhos tempos. Eles ficavam felizes em acreditar que sim. Além disso, naqueles dias eram escravos e agora eram livres, e isso fez toda a diferença, como Berro não deixou de ressaltar.

Agora tinham bem mais bocas para alimentar. No outono, as quatro porcas tinham dado à luz, gerando trinta e um porquinhos no total. Os porcos jovens eram malhados e, como Napoleão era o único javali da fazenda, era fácil adivinhar a paternidade da cria. Anunciaram que mais tarde, quando tivessem adquirido tijolos e a madeira, construiriam uma sala de aula no jardim da fazenda. Por enquanto, os jovens porcos recebiam instruções do próprio Napoleão na cozinha da casa. Eles se exercitavam na horta e eram desencorajados a brincar com os outros filhotes. Também nesta época, foi estabelecido como regra que quando um porco e qualquer outro animal se encontrassem no mesmo caminho, o outro animal deveria ficar ao lado e abrir passagem; e também que todos os porcos, de qualquer escalão, deveriam ter o privilégio de usar fitas verdes em seus rabos aos domingos.

A fazenda tinha tido um ano de bastante sucesso, mas ainda tinha pouco dinheiro. Precisavam comprar tijolos, areia e cal para a sala de aula, além de começar a economizar novamente para a maquinaria do moinho de vento. Precisavam comprar também óleo de lâmpada e velas para a casa, açúcar para a mesa de Napoleão (ele proibiu que outros porcos comessem açúcar, afirmando que isso os deixaria gordos), além das compras de rotina, como ferramentas, pregos, cordas, carvão, arame, ferro-velho e biscoitos para cães. Venderam uma meda de feno e parte da colheita de batata, e subiram o contrato dos ovos para seiscentos por semana, de modo que naquele ano as galinhas mal chocaram o número suficiente de ovos para manter a quantidade de filhotes no mesmo nível.

As rações, reduzidas em dezembro, foram novamente reduzidas em fevereiro e, para economizar óleo, foi proibido acender lanternas nas baias. Mas os porcos estavam confortáveis o suficiente, e na verdade pareciam estar engordando. Uma tarde, no final de fevereiro, um aroma quente, rico e apetitoso, que os animais nunca haviam cheirado antes, se espalhou pelo pátio ao redor da pequena casa de fermentação que ficava além da cozinha, que já havia sido desativada no tempo de Jones. Alguém disse que era o cheiro de cevada cozida. Os animais farejavam o ar com fome e se perguntavam se um purê quente estava sendo preparado para seu jantar. Mas nenhum purê quente apareceu, e no domingo seguinte foi anunciado que a partir de agora toda a cevada seria reservada para os porcos. O campo além do pomar já havia sido semeado com cevada. E logo veio a notícia de que cada porco receberia agora uma ração de um litro de cerveja diariamente, além de meio galão para o próprio Napoleão, que o bebia na terrina da sopa de louça fina da Royal Crown Derby.

Mas se havia dificuldades a serem suportadas, elas acabavam sendo compensadas pelo fato de que a vida tinha mais dignidade agora do que antes. Havia mais canções, mais discursos, mais procissões. Napoleão havia ordenado que uma vez por semana fosse realizado algo chamado Demonstração Voluntária, cujo objetivo era celebrar as lutas e triunfos da Fazenda dos Animais. Na hora marcada, os animais deixariam seu trabalho e marchariam em torno das instalações da fazenda em formação militar, com os porcos à frente, seguidos pelos cavalos, pelas vacas, ovelhas e aves. Os cães circundariam a procissão e os galos pretos de Napoleão liderariam a fila. Golias e Esperança sempre levavam entre eles uma bandeira verde marcada com um casco e um chifre e a legenda: “Viva o camarada Napoleão!” Em seguida havia a recitação de poemas compostos em honra de Napoleão, um discurso de Berro com detalhes dos últimos aumentos na produção de alimentos e, ocasionalmente, um disparo da arma. As ovelhas eram as maiores devotas da Demonstração Voluntária, e se alguém reclamasse (como alguns animais às vezes faziam quando não havia porcos ou cães por perto) que elas desperdiçavam tempo e significavam ficar de pé no frio, as ovelhas com certeza gritariam o clássico “Quatro patas bom, duas patas ruim”! Mas, de modo geral, os animais apreciavam estas comemorações. Eles acharam reconfortante lembrar que, no fim das contas, eles eram seus próprios mestres e que o trabalho que faziam era em benefício próprio. E as canções, as procissões, as listas de produtividade de Berro, o estrondo da arma, o canto do galo e o tremular da bandeira fazia com que eles pudessem esquecer que suas barrigas estavam vazias, pelo menos por parte do tempo.

Em abril, a Fazenda dos Animais foi proclamada uma República, e tornou-se necessário eleger um presidente. Havia apenas um candidato, Napoleão, que foi eleito por unanimidade. No mesmo dia, foi divulgado que novos documentos haviam sido descobertos, revelando mais detalhes sobre a cumplicidade de Bola de Neve com Jones. Parecia que Bola de Neve não só havia tentado fazer com que os animais perdessem a Batalha do Estábulo por meio de um estratagema, como os animais haviam imaginado anteriormente, mas também tinha lutado abertamente do lado de Jones. Na verdade, era ele quem tinha sido o verdadeiro líder das forças humanas, e tinha proferido as palavras “Viva a Humanidade!” durante a batalha. As feridas nas costas de Bola de Neve, que alguns dos animais ainda lembravam ter visto, tinham sido infligidas pelos dentes de Napoleão.

Em meados do verão, o corvo Moisés reapareceu repentinamente na fazenda, após uma ausência de vários anos. Ele permaneceu bastante inalterado: ainda não trabalhava e ficou falando como sempre sobre a Montanha Doce de Açúcar. Ele se empoleirava em um toco, abanava suas asas negras e falava de hora em hora com qualquer um que o ouvisse. “Lá em cima, camaradas”, ele dizia solenemente, apontando para o céu com seu grande bico – “lá em cima, do outro lado daquela nuvem escura ali – lá em cima está a Montanha Doce de Açúcar, aquele lugar feliz onde nós, pobres animais, descansaremos para sempre de nosso trabalho”! Ele até alegou ter estado lá em um de seus voos mais altos, e ter visto os campos infinitos de trevo e os pedaços de bolo de linhaça e açúcar crescendo em árvores. Muitos dos animais acreditavam nele. No momento, suas vidas eram, assim achavam, cheias de fome e trabalho; não era certo e justo que um mundo melhor existisse em outro lugar? Uma coisa que era difícil de entender era a atitude dos porcos para com Moisés. Todos eles declararam desdenhosamente que suas histórias sobre o Montanha Doce de Açúcar eram mentiras, e ainda assim permitiam que ele permanecesse na fazenda, sem trabalhar, com uma mesada diária de um pouco de cerveja.

Depois que seu casco sarou, Golias trabalhou mais do que nunca. Na verdade, todos os animais trabalharam como escravos naquele ano. Além do trabalho regular da fazenda e da reconstrução do moinho de vento, havia a escola para os porcos jovens, que foi iniciada em março. Às vezes, era difícil superar as muitas horas com pouca comida, mas Golias nunca vacilou. Em nada do que ele dizia ou fazia havia qualquer indício de que sua força não era mais a mesma de antes. Apenas sua aparência estava um pouco alterada; seu pelo era menos brilhante do que costumava ser, e suas grandes pernas pareciam ter encolhido. Os outros diziam: “O Golias vai voltar ao peso normal quando a grama da primavera chegar”; mas a primavera chegou e ele não engordou nem um pouco. Às vezes, na encosta que leva ao topo da pedreira, quando ele se apoiava com seus músculos contra o peso de algum pedregulho grande, parecia que nada o mantinha em pé além da vontade de continuar. Em tais momentos, dava para ver seus lábios formando as palavras: “Vou trabalhar mais”; mas ele não tinha mais voz. Esperança e Benjamin o advertiram mais de uma vez para cuidar de sua saúde, mas Golias não prestou atenção. Seu aniversário de doze anos estava se aproximando. Ele não se importava com o que aconteceria, desde que um bom estoque de pedras fosse acumulado antes que ele entrasse na aposentadoria.

No final de uma noite de verão, um rumor repentino de que algo havia acontecido com Golias correu pela fazenda. Ele tinha saído sozinho para arrastar uma carga de pedra até o moinho de vento. E é claro que o boato acabou se mostrando verdadeiro. Alguns minutos depois, dois pombos vieram correndo com a notícia: “Golias caiu! Ele está deitado de lado e não consegue se levantar”!

Cerca da metade dos animais da fazenda correu para o morro onde estava o moinho de vento. Ali estava Golias, caído entre os eixos da carroça, seu pescoço esticado, incapaz até mesmo de levantar a cabeça. Seus olhos estavam vidrados e seu corpo estava molhado de suor. Um jato de sangue fino saia de sua boca. Esperança caiu de joelhos ao seu lado.

“Golias!”, gritou. “Como você está?”.

“Meu pulmão”, disse Golias em voz fraca. “Mas isso não importa. Acho que você vai conseguir terminar o moinho sem mim. Há um bom estoque de pedras acumuladas. Eu tinha apenas mais um mês de trabalho, de qualquer forma. Para dizer a verdade, eu estava ansioso pela minha aposentadoria. E talvez, como Benjamin também está envelhecendo, eles o deixem se aposentar ao mesmo tempo para ser um companheiro para mim”.

“Temos que conseguir ajuda imediatamente”, disse Esperança. “Alguém corre contar para o Berro o que aconteceu”.

Todos os outros animais correram imediatamente de volta à fazenda para dar a notícia. Somente Esperança permaneceu, além de Benjamin, que se deitou ao lado de Golias e, sem falar nada, manteve as moscas longe dele com seu longo rabo. Após cerca de um quarto de hora, Berro apareceu, cheio de simpatia e preocupação. Ele disse que o camarada Napoleão recebeu a notícia da desgraça de um dos trabalhadores mais leais da fazenda com muita angústia e já estava tomando providências para enviar Golias para ser tratado no hospital em Willingdon. Os animais se sentiram um pouco desconfortáveis com isso. Com exceção de Mollie e Bola de Neve, nenhum outro animal havia deixado a fazenda, e eles não gostavam de pensar em seu camarada doente nas mãos de seres humanos. Entretanto, Berro logo os convenceu de que o cirurgião veterinário de Willingdon poderia tratar o caso de Golias muito melhor do que qualquer um na fazenda. E cerca de meia hora depois, quando Golias se recuperou um pouco, ele conseguiu se levantar com dificuldade e mancar de volta para sua baia, onde Esperança e Benjamin haviam preparado uma boa cama de palha.

Durante os dois dias seguintes, Golias permaneceu em seu estábulo. Os porcos haviam enviado um grande frasco de remédio cor-de-rosa que haviam encontrado no baú de remédios no banheiro, e Esperança o administrou duas vezes ao dia após as refeições. À noite, ela deitava-se na baia de Golias e falava com ele, enquanto Benjamin mantinha as moscas longe. Golias confessou não se arrepender do que havia acontecido. Se tivesse uma boa recuperação, provavelmente viveria mais três anos, e ansiava pelos dias de paz que passaria no canto do grande pasto. Seria a primeira vez que ele teria tempo livre para estudar e melhorar sua mente. Ele pretendia, disse ele, dedicar o resto de sua vida a aprender as vinte e duas letras restantes do alfabeto.

Entretanto, Benjamin e Esperança só podiam ficar com Golias após o horário de trabalho, e ele foi levado embora ao meio-dia. Os animais estavam todos trabalhando, colhendo nabos sob a supervisão de um porco, quando ficaram surpresos ao ver Benjamin vir galopando da direção das instalações da fazenda, zurrando no alto de sua voz. Foi a primeira vez que eles viram Benjamin agitado – na verdade, foi a primeira vez que alguém o viu galopar. “Rápido, rápido!”, gritou ele. “Venham imediatamente! Estão levando o Golias embora!” Sem esperar por ordens do porco, os animais interromperam o trabalho e correram de volta para as instalações. E como era de se esperar, encontraram lá no pátio um grande reboque fechado, puxado por dois cavalos, com um letreiro ao lado e um homem suspeito com um chapéu coco sentado na posição de condutor. E a baia de Golias já estava vazia.

Os animais se aglomeravam ao redor do veículo. “Adeus, Golias!”, eles gritaram juntos. “Adeus!”.

“Tolos! Tolos!” gritaram Benjamin, se mexendo inquieto e dando patadas no chão com seus pequenos cascos. “Tolos! Vocês não veem o que está escrito na lateral da carroça?”

Os animais fizeram uma pausa e houve um grande silêncio. Muriel começou a soletrar as palavras. Mas Benjamin a empurrou para o lado e, em meio a um silêncio mortal, leu:

“’Alfred Simmonds, Abate de Cavalos e Caldeira de Cola, Willingdon. Negociante de peles e farinha de ossos. Canil disponível’. Vocês não entendem o que isso significa? Eles estão levando o Golias para o abatedouro!”

Um grito de horror irrompeu de todos os animais. Neste momento, o homem chicoteou seus cavalos e o veículo saiu do pátio rapidamente. Todos os animais seguiram, gritando o mais alto que conseguiam. Esperança forçou seu caminho para a frente. A carroça começou a ganhar velocidade. Ela se agitou para correr e alcançou um galope. “Golias!”, ela chorou. “Golias! Golias! Golias!”. E justamente neste momento, como se tivesse ouvido o tumulto lá fora, o rosto dele, com a faixa branca no nariz, apareceu na pequena janela na parte de trás da carroça.

“Golias!” gritou Esperança com uma voz terrível. “Golias! Saia! Saia rapidamente! Eles estão te levando para a morte!”

Todos os animais repetiram o grito de “Saia, Golias, saia!”, mas o veículo já estava ganhando velocidade e se afastando deles. Ninguém sabia se ele havia entendido o que a Esperança havia dito. Mas, um momento depois, seu rosto desapareceu da janela e os animais ouviram o som tremendo de bater de cascos dentro do veículo. Ele estava tentando dar um chute para fora. Havia uma época em que alguns pontapés dos cascos dele teriam facilmente esmagado a carruagem. Mas infelizmente sua força o havia deixado; e em poucos momentos o som dos cascos de bater os tambores ficou mais fraco e morreu. Em desespero, os animais começaram a pedir para os dois cavalos que puxavam a carroça parassem. “Camaradas, camaradas!” gritaram eles. “Não levem seu próprio irmão para a morte!” Mas eles eram brutos, estúpidos, ignorantes demais para perceberem o que estava acontecendo, apenas taparam seus ouvidos e aceleraram seu ritmo. O rosto de Golias não apareceu mais na janela. Alguém pensou tarde demais em correr na frente da carruagem e fechar o portão de cinco grades; mas a carruagem já havia passado por ela e desaparecido rapidamente pela estrada. O Golias nunca mais foi visto.

Três dias depois, foi anunciado que ele havia morrido no hospital em Willingdon, apesar de ter recebido toda atenção que um cavalo poderia ter. Berro veio para anunciar a notícia aos outros. Ele tinha, disse ele, estado presente durante as últimas horas de vida de Golias.

“Foi a visão mais comovente que já vi”, disse Berro, levantando sua pata e enxugando uma lágrima. “Fiquei no seu leito de morte até o último momento. E no final, quase fraco demais para falar, ele sussurrou no meu ouvido que sua única tristeza foi ter caído antes que o moinho estivesse terminado. ‘Avante, camaradas!’, ele sussurrou. ‘Avante, em nome da Revolução. Viva a Fazenda dos Animais! Longa vida ao camarada Napoleão! Napoleão está sempre certo’. Essas foram suas últimas palavras, camaradas”.

Aqui o comportamento de Berro mudou repentinamente. Ele caiu em silêncio por um momento, e seus olhinhos ousaram olhar desconfiados de um lado para o outro antes de prosseguir.

Tinha chegado ao seu conhecimento, disse ele, que um rumor tolo e perverso havia circulado no momento da remoção de Golias. Alguns dos animais haviam notado que a carroça que o levou estava identificada como “Abate de Cavalos”, o que fez com que chegassem à conclusão de que Golias estava sendo enviado para o abatedouro. Era quase inacreditável, disse Berro, que qualquer animal pudesse ser tão estúpido. Certamente, ele chorou indignado, balançando sua cauda e pulando de um lado para o outro, certamente eles conheciam seu amado Líder, o camarada Napoleão, melhor do que isso? Mas a explicação era realmente muito simples. A carroça havia pertencido anteriormente ao abatedouro, e havia sido comprada pelo cirurgião veterinário, que ainda não havia apagado o antigo nome. Assim que o erro surgiu.

Os animais ficaram imensamente aliviados ao ouvir isso. E quando Berro passou a dar detalhes explícitos do leito de morte de Golias, dos cuidados admiráveis que ele havia recebido e dos medicamentos caros pelos quais Napoleão havia pago sem pensar no custo, suas últimas dúvidas desapareceram e o pesar que sentiram pela morte de seu camarada foi suavizado pelo pensamento de que pelo menos ele havia morrido feliz.

O próprio Napoleão apareceu na reunião na manhã do domingo seguinte e pronunciou uma breve oração em honra de Golias. Não havia sido possível, lamentavelmente, disse ele, trazer de volta os restos mortais de seu camarada para serem enterrados na fazenda, mas ele havia ordenado que uma grande coroa de flores fosse feita com os louros do jardim para ser colocada sobre o túmulo de Golias. E dentro de alguns dias os porcos pretendiam realizar um banquete memorial em sua honra. Napoleão terminou seu discurso com um lembrete das duas máximas favoritas de Golias, “Vou trabalhar mais” e “O camarada Napoleão está sempre certo” – lemas que, disse ele, seria bom se cada animal adotasse como seus.

No dia marcado para o banquete, uma carruagem do merceeiro veio de Willingdon e entregou uma grande caixa de madeira na casa da fazenda. Naquela noite, houve o som de um canto tumultuoso, que foi seguido pelo que parecia uma violenta briga e terminou por volta das onze horas com algum vidro quebrando. Ninguém se mexeu na casa da fazenda antes do meio-dia do dia seguinte, e a notícia de que de alguma maneira os porcos tinham conseguido o dinheiro para comprar outra caixa de uísque para eles correu pela fazenda.

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Veja também o vídeo a seguir com áudio sobre a leitura do capítulo IX:


Notas:

  • [1] George Orwell: “...escritor nascido em uma colônia inglesa na Índia, é considerado um dos mais importantes romancistas da vertente distópica da literatura mundial, caracterizada pela narração de enredos em que os personagens vivenciam situações em espaço e tempo futuros, nos quais não há possibilidade para a utopia, ou seja, para o sonho e para a esperança. Nessa linha, destacam-se suas duas obras-primas, traduzidas para vários idiomas e transpostas para as telas do cinema mais de uma vez: o romance A revolução dos bichos, publicado em 1945, e o romance 1984, publicado em 1949.” Veja mais aqui.

  • [2O que diz o livro Revolução dos Bichos? “O conhecido livro do inglês George Orwell, A Revolução dos Bichos (1945), é um dos legados atemporais mais importantes que escritores do século passado nos deixaram. Na obra, Orwell faz uma crítica ao stalinismo. Então socialista, o inglês – nascido na Índia durante o domínio britânico – se desilude com a ideologia ao ver o totalitarismo soviético e satiriza o sucessor de Lênin. Na alegoria, o autor apresenta uma revolução idealizada por um porco, o Major (que pode representar tanto Marx como Lênin), que convoca os bichos da granja em que vive a expulsar seu proprietário, o humano Sr. Jones (que seria Nicolau II, imperador do Czar). Porco Major morre em seguida e dois outros suínos tomam a frente: Napoleão (representando Stálin) e Bola de Neve (que seria Trotski). A estória segue o roteiro soviético… Napoleão expurga Bola de Neve, deturpa as leis a seu favor e se torna um ditador. Os demais bichos (galinhas, gado, cavalo…) se rendem à autocracia sem questionar, de forma passiva. Cada vez trabalham mais, exaustivamente e com alimento controlado; enquanto isso, Napoleão toma posse das dependências do Sr. Jones, agindo, portanto, de forma mais exploradora e cruel que o antigo chefe. A ironia está no fato de que a máxima da revolução era ‘duas pernas/patas mau’ – referindo-se a seres humanos”. Leia mais em: Rodrigo Constantino – Gazeta do Povo.com.

  • [3] ORWELL, George. Revolução dos Bichos. Gazeta do Povo. Capítulo IX, pág. 128 a 145. Veja o livro completo aqui.