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30 setembro 2024

Tempo e tempos (2): As dispensações

 Por: Alcides Amorim  

Mapa das dispensações [1]

Numa palavra inicial, quero destacar que inseri este assunto no tema dos textos escatológicos, pois entendo que o estudo das dispensações envolve toda a Bíblia. E os estudos relativos às promessas de Deus a Israel, à Igreja e, principalmente a sétima dispensação, são assuntos apocalípticos. Outra observação inicial é se podemos confiar neste método de estudo: o dispensacionalismo? Na verdade, o dispensacionalismo é apenas um método de interpretação e não um caminho para a salvação. E suas principais características são uma interpretação literal das Escrituras, a crença de que haverá o Arrebatamento da Igreja antes de um período de sete anos chamado Grande Tribulação, que depois disto, Jesus voltará com seus anjos e todos que foram arrebatados com Ele, que haverá um período de mil anos literalmente em que Jesus governará sobre na Terra, na separação entre Israel e Igreja etc. Da mesma forma que Deus concentra sua atenção na igreja nesta era, sua agente de promoção de Seu Reino neste período da Graça, Ele novamente, no futuro, concentrará Sua atenção em Israel (Romanos 9-11) [2].

Para nosso popósito, usamos como base para o estudo das dispensações, aliás, estudo aceito pela maioria dos evangélicos, as Notas da Bíblia do Dr. C. I. Scofield. No texto que segue, expus o conteúdo das notas explicativas de cada dispensação e suas referências bíblicas.

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Introdução

Domínio, conforme está em Gn 1.26, é uma unidade, e o propósito de Deus é um só. O homem criado à imagem de Deus (vs. 26-27) foi colocado como soberano sobre a terra (vs. 28-20), coroado com glória e honra (Sl 8.5-8), mas sujeito a Deus, seu Criador (Gn 2.15-17). A intenção divina era e é, que o homem tivesse comunhão com Deus, em obediência. Veio o pecado, a essência do qual é à rebeldia contra a vontade de Deus, e o homem separou-se de Deus (Gn 3.8-10) e perdeu a soberania sobre a terra (Gn 3.17-19). O alvo de Deus é restaurar o homem pecador à Sua semelhança, comunhão e domínio (Rm 8.29; Ap 21.3; 20.6; 22.5). "Agora, porém, ainda não vemos todas as cousas a ele sujeitas (humanidade), vemos, todavia, aquele (Jesus)... coroado de glória e de honra" em antecipação de muitos filhos participando de Sua comunhão e domínio (Hb 2.8-10; Rm 8.17-19). Isto está de acordo com a primeira promessa de redenção (Gn 3.15). Enquanto isto, esperamos com paciente certeza a vitória completa de Deus sobre a terra (Rm 8.19-25; 1 Co 15.24-28; Ap 11.15-18). Quanto à realização do propósito de Deus na redenção total, veja nota sobre Dispensação em 1:28 [a seguir].

Uma dispensação é um período de tempo no qual o homem é testado na sua obediência a alguma revelação específica da vontade de Deus. Três conceitos importantes estão implícitos nesta definição:

  • um depósito de revelação divina quanto à vontade de Deus, incorporando o que Deus exige quanto à sua conduta;

  • a mordomia do homem desta revelação divina, na qual ele é responsável de obedecer; e

  • um período de tempo, geralmente chamado de “século”, durante o qual esta revelação divina prevalece testando a obediência do homem a Deus.

As dispensações são revelações progressivas e associadas dos procedimentos de Deus para com o homem, às vezes relacionados com toda a raça e, em outras, a um povo em particular, Israel. Estas diferentes dispensações não são modos separados de salvação. Durante cada uma delas o homem é reconciliado com Deus de uma única maneira, isto é, pela graça de Deus mediante a obra de Cristo que foi realizada na cruz e vindicada em Sua ressurreição, Antes da cruz, o homem era salvo em perspectiva do sacrifício expiador de Cristo, crendo na revelação que lhe fora dada até então. Desde a cruz o homem tem sido salvo crendo no Senhor Jesus Cristo, no qual a revelação e a redenção foram consumadas.

Da parte do homem a contínua exigência é a obediência à revelação de Deus. Esta obediência é uma mordomia de fé. Embora a revelação divina se desdobre progressivamente, o depósito da verdade nos períodos de tempo anteriores não foi posto de lado, antes, é cumulativo. Assim, a consciência (responsabilidade moral) é uma verdade permanente na vida humana (Rm 2.15; 9.1: 2Co. 1.12; 4.2), embora não continue sendo uma dispensação. Semelhantemente, os salvos desta presente dispensação estão “não sob a lei” como uma prova específica da obediência à revelação divina (Gl 5.18; comp. Gl 2.16; 3.11), mas a lei permanece parte integral das Sagradas Escrituras que, para os remidos, são proveitosas para "a educação na justiça" (2Tm 3.16-17; comp. Rm 15.4).

O propósito de cada dispensação, portanto, é colocar o homem sob uma específica regra de conduta, mas tal mordomia não é uma condição de salvação. Em cada uma das dispensações passadas, o homem não regenerado fracassou, e ele tem fracassado nesta presente dispensação e fracassará no futuro. Mas a salvação tem sido e continuará sendo dispensada pela graça de Deus mediante a fé.

As sete dispensações [3] distinguem-se da seguinte maneira:

  • Inocência (Gn 1.28);
  • Consciência ou Responsabilidade Moral (Gn 3.7);
  • Governo Humano (Gn 8.15);
  • Promessa (Gn 12.1);
  • Lei (Êx 19.1);]
  • Igreja ou Graça (At 2.1);
  • Reino (Ap 20.4).


Primeira Dispensação: Inocência

E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra(Gn 1.28) [4].

O homem foi criado em inocência, colocado em um ambiente perfeito, sujeito a uma prova simples, e advertido das consequências da desobediência. Ele não foi compelido a pecar, mas, tentado por Satanás, preferiu desobedecer a Deus. A mulher foi enganada, o homem transgrediu deliberadamente (1Tm 2.14). A mordomia da Inocência terminou na sentença da expulsão do Éden (Gn 3.24).


Segunda Dispensação: Consciência ou Responsabilidade Moral

Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos e árvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu e deu também ao marido, e ele comeu.7 Abriram-se, então, os olhos de ambos; e, percebendo que estavam nus, coseram folhas de figueira e fizeram cintas para si(Gn 3.6-7).


O homem pecou (3.6-7), a primeira promessa de redenção estava para ser feita (3:15), e nossos primeiros pais seriam expulsos do Éden (3.22-24). O pecado do homem foi uma rebeldia contra uma ordem específica de Deus (2.16-17) e marcou uma transição do conhecimento teórico do bem e do mal para o conhecimento experimental (3.5-7,22). O homem pecou entrando no reino da experiência moral pela porta errada, quando poderia tê-lo feito fazendo o que era certo. Assim o homem tornou-se igual a Deus, através de uma experiência pessoal da diferença entre o bem e o mal, mas também diferente de Deus, passando por esta experiência, no escolher o mal e não o bem, Assim ele foi colocado por Deus sob a mordomia da responsabilidade moral, ficando responsável de praticar todo o bem conhecido, abster-se de todo o mal conhecido e aproximar-se de Deus por meio do sacrifício sangrento aqui instituído, em perspectiva à obra consumada de Cristo. O resultado é apresentado na Aliança Adâmica (Gn 3.14-21). O homem falhou no teste que lhe foi apresentado nesta dispensação (veja Gn 6.5), como nas outras. Embora, como teste específico, este período de tempo tenha terminado com o dilúvio, o homem continuou em sua responsabilidade moral conforme Deus acrescentou mais revelação referentes a Si mesmo e à Sua vontade nos períodos subsequentes (por exemplo, Atos 24.14-16; Rm 2.15; 2Co 4.2).


Terceira Dispensação: Governo Humano

Então, disse Deus a Noé:...” (Gn 8.15).

Esta dispensação começou quando Noé e sua família saíram da arca. Quando Noé entrou numa nova situação, Deus (na Aliança Noética) sujeitou a humanidade a um novo teste. Antes disso, nenhum homem tinha o direito de tirar a vida de outro homem (comp. Gn 4.10-11, 14-15, 23-24). Nesta nova dispensação, embora a responsabilidade moral direta do homem para com Deus continuasse ("Dai… a Deus o que é Deus", Mt 22.21), Deus delegou-lhe determinadas áreas de Sua autoridade, nas quais ele tinha de obedecer a Deus através de submissão ao seu próximo ("Dai, pois, a César o que é de César", Mt 22.21). Portanto Deus instituiu um relacionamento corporativo de homem para homem no governo humano.

A mais alta função do governo é proteger a vida humana, da qual deriva a responsabilidade da pena capital. O homem não deve vingar o homicídio individualmente, mas, na qualidade de grupo corporativo, ele deve salvaguardar a santidade da vida humana como um dom de Deus, que não pode ser exterminado, exceto quando Deus o permite. "Os poderes constituídos foram ordenados por Deus", e resistir-lhes é resistir a Deus. Enquanto, na dispensação precedente, as restrições feitas ao homem eram internas (Gn 6.3), o Espírito de Deus operando através da responsabilidade moral, agora uma nova restrição externa foi acrescentada, isto é, o poder do governo civil.

O homem fracassou em governar com justiça. Que ambos, judeus e gentios, tem governado para si mesmos, não para Deus, é a triste verdade. Este fracasso foi visto de um modo geral, na confusão de Babel (Gn 11.9): no fracasso de Israel, no período da teocracia, que terminou com o cativeiro na Babilônia (2Cr 36.15-21), e no fracasso das nações, no “tempo dos gentios” (Dn 2.31-45). O governo humano vai finalmente ser sobrepujado pelo reinado glorioso de nosso Senhor Jesus Cristo, cujo direito de reinar é incontestável (Is 9.6-7 Jr 23.5-6; 33.17; Ez 21.27; Lc 1.30-33); Ap 11.15-18; 19.16: 20.4-6). Como uma prova específica da obediência, a dispensação do Governo Humano foi seguida, pela da Promessa, quando Deus chamou Abrão como Seu instrumento de bênção para a humanidade. Contudo, a responsabilidade do homem pelo governo não acabou, mas continuará até que Cristo estabeleça o Seu reino.


Quarta Dispensação: Promessa

Ora, disse o Senhor a Abrão: Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai e vai para a terra que te mostrarei; de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção!” (Gn 12.1-2).


Esta dispensação estendeu-se da chamada de Abrão até a concessão da lei no Sinai (Êx 19.3 e segs.). Sua mordomia baseava-se sobre a aliança de Deus com Abrão, citada pela primeira vez aqui, Gn 12.1-3, e confirmada e ampliada em Gn 13.14-17; 15.1-7; 17.1-8, 15-19; 22.16-18; 26.2-5,24; 28.13-15; 31.13; 35.9-12.

  1. as provisões específicas que afetavam o próprio Abrão (Gn 15.15), seu filho e neto, Isaque e Jacó (Gn 26.1-5; 28.10-16) sob cuja bênção individual dependia a obediência individual (Gn 12.1;comp. 22.18; 26.5).
  1. Deus fez uma promessa incondicional de bênçãos através da semente de Abrão: a) para a nação de Israel herdar um território específico para sempre (Gn 12.2; 15.18-21); b) para a Igreja em Cristo (Gl 3.16, 28-29); e c) para as nações gentias (Gn 12.3).
  1. Havia uma promessa de bênçãos para aqueles indivíduos e nações que abençoassem os descendentes de Abrião, e uma maldição sobre aqueles que perseguissem os judeus (Gn 12.3; Mt 25.31-46). Consequentemente esta dispensação tem diversas aplicações. Para os gentios daquele período, a aplicação direta é pequena e diferente do teste implícito em Gn 12.3 e ilustrada pela bênção ou juízo de Deus sobre os indivíduos (Faraó, Gn 12.17; Abimeleque, Gn 20.3,17, etc.), ou nações (por exemplo, o Egito, Gn 47 a 50; Êx 1 a 15) que trataram bem ou mal Abrão e seus descendentes.

Observe:

No prosseguimento desta mordomia da verdade através dos séculos, os crentes da Igreja são convocados a confiar em Deus como Abrão confiou (Rm 4.11,16, 23-25; Gl 3.6-9), e assim receber as bênçãos da aliança que inaugurou a dispensação da Promessa.

As promessas de Deus a Abrão e sua semente certamente não terminaram no Sinai com a concessão da lei (Gl 3.17). Tanto o Velho como o Novo Testamento estão cheios de promessas pós-sináiticas referentes a Israel e à terra que será a possessão etema de Israel (por exemplo, Ex 32.13; 33.1-3; Lv 23.10; 25.2; 26.6; Dt 6.1-23; 8.1-18; Js 1.2,11; 24.13; At 7.17; Rm 9.4). Mas como teste específico da mordomia de Israel para com a verdade divina, a dispensação da Promessa foi suplantada, embora não anulada, pela lei que foi dada no Sinai (Ex 19.3 e segs.).


Quinta Dispensação: Lei

No terceiro mês da saída dos filhos de Israel da terra do Egito, no primeiro dia desse mês, vieram ao deserto do Sinai” (Êx 19.1).

Esta dispensação começa com a concessão da lei no Sinal e terminou como período de tempo com a morte sacrificial de Cristo, que cumpriu todas as suas provisões e tipos. Na dispensação anterior, Abraão, Isaque e Jacó, como também as multidões de outros indivíduos, falharam nos testes da fé e obediência que eram da responsabilidade do homem (por exemplo, Gn 16.1-4; 26.6-10, 27.1-25). O Egito também falhou em atender a advertência de Deus (Gn 12.3) e foi julgado. Não obstante Deus providenciou um libertador Moisés), um sacrifício (o cordeiro pascal) e o poder milagroso para tirar os israelitas do Egito (as pragas do Egito; livramento no Mar Vermelho).

Os israelitas, como resultado de suas transgressões (Gl 3.19), foram agora colocados sob a disciplina precisa da lei. A lei ensina:

  1. a santidade espantosa de Deus (Ex 19.10-25);

  2. a horrível hediondez do pecado (Rm 7.13; 1Tm 1.8-10);

  3. a necessidade da obediência (Jr 7.23-24);

  4. a universalidade do fracasso humano (Rm 3.19-20); e a maravilha da graça de Deus em providenciar um caminho até Ele através do sacrifício típico, antevendo um Salvador que viria a ser o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo (Jo 1.29), conforme "o testemunho da lei" (Rm 3.21).

A lei não alterou as provisões nem revogou a promessa de Deus dada na Aliança Abraâmica. Não foi concedida como um modo de vida (isto é, um meio de justificação, At 15.10-11; GI 2.16,21; 3.3-9,14,17,21,24-25), mas uma regra de vida para um povo já dentro da aliança de Abraão e coberto pelo sangue do sacrifício, isto é, do cordeiro pascal, etc. Um dos seus propósitos foi o de esclarecer a pureza e santidade que deveria caracterizar a vida de um povo, cuja lei seria ao mesmo tempo a lei de Deus (Ex 19.5-6).

Daí, a função da lei em relação a Israel foi de restrição disciplinar e corretiva, como aquela exercida sobre os filhos gregos e romanos pelo escravo ou tutor de confiança da casa (Gl 3.24 traduzido para "aio") para manter Israel sob controle para o seu próprio bem (Dt 6.24):

  1. Αté que Cristo viesse (Cristo é realmente o nosso Tutor, pois a graça que nos salva também nos ensina, Gl 3.24; Tt 2.11-12); e
  2. até que a ocasião designada pelo Pai para os herdeiros (filhos da promessa) serem removidos da condição de menoridade legal para os privilégios de herdeiros que atingiram a maioridade (Gl 4.1-3). Isto Deus fez enviando o Seu Filho, e agora, os crentes estão na posição de filhos na casa do Pai (Gl 3.26; 4.4-7).

Mas Israel interpretou mal o propósito da lei (1Tm 1.8-10), buscando a justiça através de boas obras e ordenanças cerimoniais (At 15.1; Rm 9.31-10.3), e rejeitou o seu próprio Messias (Jo 1.10-11). A história de Israel no deserto, na terra e dispersos entre as nações, tem sido um registro longo de transgressão da lei.


Sexta Dispensação: Igreja ou graça

Ao cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar;” (At 2.1).

Uma nova era foi anunciada por nosso Senhor Jesus Cristo em Mt 12.47 a 13.52. A Igreja foi claramente profetizada por Ele em Mt 16.18 (comp. Mt 18.15-19), comprada pelo derramamento do Seu sangue no Calvário (Rm 3.24-25; 1Co 6.20; 1Pe 1.18-19), e constituída como Igreja depois de Sua ressurreição e ascensão no Pentecostes quando, de acordo com a Sua promessa (At 1.5), os crentes foram pela primeira vez batizados individualmente com o Espírito Santo em um organismo espiritual unificado, semelhante a um corpo do qual Cristo é a Cabeça (1Co 12.12-13; Cl 2.19). Por causa da ênfase dada ao Espírito Santo, esta dispensação também tem sido chamada "dispensação do Espírito".

O ponto de prova desta dispensação é o Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo, a mensagem das boas novas sobre a Sua morte e ressurreição (Jo 19.30; At 4.12; 1Co 15.3-5, 2Co 5.21 etc.). A contínua e cumulativa revelação das dispensações anteriores combina com esta revelação mais completa para enfatizar a total iniquidade e perdição do homem, e a suficiência da obra historicamente completa de Cristo para salvar, pela graça, mediante a fé, a todos os que vem a Deus por Ele (Jo 14.6; At 10.43; 13.38-39; Rm 3.21-26; Ef 2.8-9; 1Tm 4.10; Hb 10.12-14; 11.6). Quando aqueles indivíduos salvos que compõem a verdadeira Igreja de Cristo cumprem as ordens do seu Senhor de pregar o Evangelho até os confins da terra (Mc 16.15; Lc 24.46-48; At 1.8), Deus está formando, durante esta dispensação, "um povo para o seu nome" (At 15.14) dentre os judeus e os gentios, chamado de "a Igreja" e portanto especialmente distinto dos judeus e gentios como tais (1Co 10.32; Gl 3.27-28; Ef 2.11-18; 3.5-6).


O Senhor Jesus advertiu que durante todo o período, enquanto a Igreja estiver sendo formada pelo Espírito Santo, muitos rejeitarão o Seu Evangelho e muitos outros pretenderão crer nEle e se tornarão uma fonte de corrupção espiritual e impedimento para o Seu propósito nesta dispensação, na igreja professa. Estes produzirão a apostasia, particularmente nos últimos dias (Mt 13.24-30, 36-40,47-49; 2Ts 2.5-8; 1Tm 4.1-2; 2Tm 3.1; 4.3-4; 2Pe 2. 1-2; 1Jo 2.18-20).
A Dispensação da Igreja chegará ao fim através de uma série de acontecimentos profetizados, o principal dos quais será:

1) A trasladação da verdadeira Igreja da terra para encontrar o Senhor nos ares em um momento conhecido por Deus mas não revelado aos homens, e sempre mantido diante dos crentes como uma esperança iminente e feliz, encorajando-os no serviço do amor e na santidade de vida. Este acontecimento geralmente é chamado de "arrebatamento" (veja 1Ts 4.17). 

2) Os juízos da septuagésima semana de Daniel, chamados de "a tribulação" (veja Ap 714) que cairão sobre a humanidade em geral, mas incluirão a parte não salva da igreja professa, que terá apostatado e por isso será deixada para trás sobre a terra, quando a verdadeira Igreja for trasladada para o céu. Esta forma final da Igreja apóstata está descrita em Ap 17 como "a meretriz que primeiro vai "montar" o poder político ("besta"), apenas para ser derrotada e absorvi da por esse poder (comp. Ap. 18:2, nota). E 

3) a volta do Senhor Jesus do céu à terra em poder e glória, trazendo com Ele a Sua Igreja, para estabelecer o Seu reino milenial de justiça e paz (veja Ap 19.11 e 17).


Sétima Dispensação: Reino

Vi também tronos, e nestes sentaram-se aqueles aos quais foi dada autoridade de julgar. Vi ainda as almas dos decapitados por causa do testemunho de Jesus, bem como por causa da palavra de Deus, tantos quantos não adoraram a besta, nem tampouco a sua imagem, e não receberam a marca na fronte e na mão; e viveram e reinaram com Cristo durante mil anos” (Ap 20.4).

Esta é a última das dispensações ordenadas que condicionam a vida humana na terra. É o Reino da Aliança feita a Davi (2Sm 7.8-17..., Zc 12.8..., Lc 1.31-33; 1Co 15.24...). O Filho maior de Davi, o Senhor Jesus Cristo, reinará sobre a terra como Rei dos reis e Senhor dos senhores por 1.000 anos, associando consigo mesmo naquele Reino, os Seus santos de todas as dispensações (Ap 3.21; 5.9-10; 11.15-18; 15.3-4; 19.16; 20.4,6).

A Dispensação do Reino une dentro de si mesmo e debaixo de Cristo as várias "épocas" mencionadas na Escritura:

  • 1) O período de opressão e desgoverno termina quando Cristo estabelece o Seu reino (Is 11.3-4).
  • 2) O período de testemunho e paciência divina termina em julgamento (Mt 25.31-46; At 17.30-31; Ap 20.7-15). 
  • 3) O período de luta termina em repouso e recompensa (2Ts 1.6-7). 
  • 4) O período de sofrimento termina em glória (Rm 8.17-18).
  • 5) O período da cegueira e castigo de Israel termina em restauração e conversão (Ez 39.25-29; Rm 11.25-27).
  • 6) O tempo dos gentios termina no desmoronamento da imagem e no estabelecimento do reino dos céus (Dn 2.34-35; Ap 19.15-21). E
  • 7) O período da escravidão da criação termina em livramento e manifestação dos filhos de Deus (Gn 3.17; Is 11.6-8; Rm 8.19-21).

No final dos mil anos, Satanás é solto por um pequeno período e instiga uma rebelião final que é sumariamente abafada pelo Senhor. Cristo lança Satanás no lago de fogo para ser eternamente atormentado, derrota o último inimigo a morte e então entrega o reino ao Pai (veja 1 Co 15.24…)


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Veja também o comentário feito no vídeo a seguir:



Notas / Referências bibliográficas:


  • [1] Mapa das dispensações. Imagem ilustrativa. Disponível em: <https://pt.linkedin.com/pulse/7-dispensa%C3%A7%C3%B5es-b%C3%ADblicas-alexander-guedes-de-souza>. Acesso em: 23/09/2024.
  • [2] Sobre a interpretação dispensacionalista das Escrituras, veja também: O que é o Dispensacionalismo?...In: <https://www.gotquestions.org/Portugues/dispensacionalismo.html>. Acesso em: 23/09/2024.
  • [3] SCOFIELD, Dr. C. I. Referências e Anotações. In: A Bíblia Sagrada. São Paulo: Imprensa Batista Regular do Brasil: 1987. Texto e abreviaturas das referências adaptados.
  • [4] As referências bíblicas que servem de introdução a cada dispensação são da versão ARA (Almeida Revista e Atualizada). Mas para efeito de praticidade, utilizei as do Portal Bíblia Online: <https://www.bibliaonline.com.br/ara>.



















































































































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16 setembro 2024

Reflexões sobre textos escatológicos (1): introdução ao livro do Apocalipse

 Alcides Amorim

Eu, João, que também sou vosso irmão... [1]”

Revelação de Jesus Cristo, a qual Deus lhe deu, para mostrar aos seus servos as coisas que brevemente devem acontecer; e pelo seu anjo as enviou, e as notificou a João seu servo… Escreve as coisas que tens visto, e as que são, e as que depois destas hão de acontecer…” (Ap 1.1,19) [2].


Queremos fazer, sob a graça de Deus, uma série de leituras e breves análises sobre vários temas relativos à Escatologia (doutrina das últimas coisas) retirados dos textos bíblicos alusivos aos mesmos, ou seja, textos apocalípticos. Os comentários estão fundamentados nas fontes abaixo e em observações interpretativas pessoais. Chamo de apocalípticos, aqui, textos que tratam do fim dos tempos como parte do livro de Ezequiel, Daniel, Zacarias, Mateus 24, Lucas 21, parte de 1 e 2 Tessalonicenses, o livro do Apocalipse e assim por diante.

E neste primeiro artigo (post), quero fazer uma breve introdução sobre o livro de Apocalipse, deixando claro, entretanto, nossa concepção interpretativa acerca do livro que exporemos abaixo.

Ο livro do APOCALIPSE, cuja autoria é atribuída ao apóstolo João, filho de Zebedeu, escrito por volta do ano 95. A palavra "apocalipse", usada como título do mesmo, vem do grego apokalupsis, que significa revelação daquilo que estava anteriormente escondido ou que era desconhecido e desvenda os grandes acontecimentos do encerramento da história, inclusive a revelação de Jesus Cristo em Sua segunda vinda.

1. Alguns destaques [3]:

  • O livro é um registro do que o Apóstolo João viu e ouviu.

  • Há no livro o uso constante de símbolos.

  • Referências aos acontecimentos do Antigo Testamento e suas profecias são abundantes.

  • Podem notar-se mudanças de local da terra para o céu e de volta à terra.

  • O livro é uma narrativa do juízo divino e do conflito que varre todo o mundo.

  • O número SETE (sete grupos de sete), número de perfeição na Bíblia, é constante no livro: sete igrejas, sete candeeiros de ouro, sete estrelas, sete selos, sete trombetas, sete taças, sete flagelos… ou seja, os sete estão por todo o livro.

  • As passagens citadas não têm sequência de narrativa profética, mas, indo para trás e para frente, resumem o passado e antecipam o futuro. Portanto, cronologicamente inconsistentes.

  • O propósito principal do livro é fornecer o cenário da revelação de Jesus Cristo. Trata do período da tribulação (que o mundo chama de o Apocalipse, propriamente dito), e do clímax do livro que e do retorno de Jesus à Terra para implantar Seu Reino.

Na época de João, como a Igreja era alvo de uma devastadora perseguição de Roma, assim deveria ser também nos últimos dias. A vitória dessa grande luta será o advento de Cristo em glória, e com Ele o estabelecimento do reino de Deus em poder, João claramente contemplou o fim como próximo (1.1-3).


2. As interpretações [4] e divisões [5] do Apocalipse:

Geralmente, os vários tipos de exposição do Apocalipse limitam-se a quatro:

  • a) Concepção preterista: vê as profecias como inteiramente relacionadas aos dias de João, sem nenhuma referência a épocas futuras. Esta concepção é francamente endossada, principalmente por autores liberais.
  • b) Interpretação histórica: contempla as visões como a predição da história desde o tempo do escritor até o fim do mundo. Os reformadores, em geral, adotam esta interpretação...

  • c) Explicação futurista: coloca a relevância das visões inteiramente no fim da época, afastando-as grandemente do tempo do profeta. Posição dos cristãos dos primeiros séculos da Igreja e de grande parte dos evangélicos atuais.

  • d) Explanação poética: considera ilegítimos todos os sistemas de interpretação rígidos. Segundo ela, o profeta simplesmente descreve, à maneira dos seus predicados de artista, o triunfo certo de Deus sobre todos os poderes do mal.

Qual a minha concepção? Como um bom "batisbleiano" (misto de batista com assembleiano), fico com a interpretação futurista, mas entendo que a interpretação histórica também está relacionada. Por exemplo, no verso 9 do primeiro capítulo, está escrito: “Escreve as coisas que tens visto, e as que são, e as que depois destas hão de acontecer”. As coisas que “João tinha visto” e “as que são”, tratam de fatos históricos (já cumpridos e se cumprindo), portanto, se enquadram numa interpretação histórica, enquanto “as que depois destas hão de acontecer” ainda não aconteceram, como o próprio termo indica. São acontecimentos futuristas. Neste verso estão as três principais divisões do Apocalipse.

  • a) as coisas passadas, ‘as cousas que viste’, isto é, a visão de Patmos (1.1 a 20);

  • b) as coisas presentes, ‘as que são’, isto é, as igrejas existentes (2.1 a 3.22); e
  • c) as coisas futuras, ‘as que hão de acontecer depois destas’, isto é, os acontecimentos depois da Dispensação da Igreja (4.1 a 22.5).

Esta divisão proposta por Scofield e por muitos evangélicos conservadores, sugere que após o capítulo 4, o livro apresenta acontecimentos futuros e, assim, segue até o final do livro. Para todos os efeitos devemos lembrar que, a exemplo dos profetas do A. T., (cf. 1 Pe 1.12 e 2Pe 1.20-21) a João também foi revelado coisas que não seriam cumpridas em seu tempo e que por enquanto parece obscuras até o tempo de seu cumprimento determinado por Deus.

O esboço (adaptado) do livro de Apocalipse proposto por Beasley-Murray pode ser:

  1. Introdução / Prólogo – 1.1-8.

  2. Visão do Filho do Homem – 1.9-20.

  3. As Cartas às sete igrejas – 2.1 a 3.22.

  4. A Visão do céu – 4.1 a 5.14.

  5. Os sete selos – 6.1 a 8.5

  6. As sete trombetas – 8.6 a 11.19.

  7. O fundo do conflito terrestre – 12.1 a 14.20.

  8. As sete taças – 15.1 a 16.21.

  9. A queda de Babilônia – 17.1 a 19.21.

  10. O reino consumado – 20.1 a 22.5.

  11. Conclusão / Epílogo – 22.6-21.

Para concluir esta introdução, quero propor o vídeo de Luiz Sayão, a seguir:


Notas:

  • [2] As referências bíblicas utilizadas aqui (e em outros artigos) são da versão Almeida Corrigida Fiel (ACF). Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/>. Acesso em: 11/09/2024.
  • [3] Texto adaptado de: SCOFIELD (Vide Referências bibliográficas).

  • [4] Texto adaptado de: BEASLEY-MURRAY (Vide Referências bibliográficas).

  • [5Texto adaptado de: SCOFIELD (Vide Referências bibliográficas).


Referências bibliográficas:

BEASLEY-MURRAY, George Raymond. Apocalipse. In: O Novo Comentário da Bíblia, Vol. II. São Paulo: Vida Nova, 1983.

SCOFIELD. Cyrus Ingerson. A Bíblia Sagrada com referências e anotações de Dr. C. I. Scofield. São Paulo: Imprensa Batista Regular do Brasil, 1987.



09 setembro 2024

Bispos e Papas (10): Aniceto

Por: Alcides Amorim


Bispo Aniceto [1]

Como já dissemos nos posts anteriores sobre os bispos e papas, estamos destacando inicialmente os listados por Eusébio de Cesareia, no seu livro História Eclesiástica [2]. Já vimos os nove primeiros bispos, e desta feita, vamos ver um pouco sobre o décimo bispo da lista, chamado Aniceto. Até aqui já tivemos: Lino, Anacleto, Clemente. “Mas esse Clemente foi sucedido por Evaristo, por Alexandre. Xisto seguiu-se como o sexto desde os apóstolos, após quem veio Telésforo, que também sofreu glorioso martírio, depois veio Higino e após ele, Pio, que foi seguido por Aniceto...” (HE: 5, VI).

Sobre Aniceto, conforme esta fonte [3], mais esta [4] e ainda esta outra [5]:

Aniceto nasceu na Síria e foi sucessor do Bispo Pio, em 155, quando Antonino Pio era imperador romano. Exerceu seu bispado (ou papado?) até 166 (conforme a wikipedia, seu papado ocorreu entre 154 e 166).

  • Enfrentou, além da perseguição sistemática, também cismas internos que abalaram o cristianismo.

Eusébio (HE: 4, XI), destaca que no tempo de Aniceto (e os dois bispos anteriores a ele), havia muitas questões teológicas como as heresias de Valentim, Cerdão e Marcião. Ele destaca também a posição firme de Justino (filósofo e teólogo), que veio a ser chamado Justino Mártir, o qual colaborou teologicamente para a definição e condenação dos hereges.

  • Destaca-se (cf Wikipedia), por ter sido o primeiro papa a condenar oficialmente uma doutrina como heresia, em concreto o montanismo.
  • Além da base teológica de Justino, Aniceto, especificamente, contou com a cooperação de Policarpo de Esmirna. O Gnosticismo, conhecida como racionalismo cristão (uma supervalorização do conhecimento, segundo o qual bastava isso para a salvação), foi combatido por Aniceto com apoio dos doutores citados acima.
  • Aniceto proibiu os padres de deixar crescer o cabelo, para este não ser um motivo de vaidade, e contou também com Policarpo, para definição da data da Páscoa: a ressurreição de Cristo.
  • Aniceto morreu em 166, mas as fontes não o inclui entre os mártires, apesar da perseguição que a igreja enfrentou.

A seguir, para concluir, o vídeo, de um portal católico, Altierez dos Santos Catequese e Teologia Católica, em:


Notas / Referências bibliográficas:

  • [2] Na versão publicada pela CPAD em 1995, nas páginas 409/410, a editora fez uma lista de 29 bispos de Roma citados por Eusébio, e Pio é o número 9 da lista...

02 setembro 2024

Evangélicos liberais, fundamentalistas e conservadores

Por: Alcides Amorim

Eu sou cristão desde pequeno, católico até março de 1980 e protestante a partir de então. Já em março daquele ano (1980), quando comecei minha nova vida espiritual, sabia que entre os chamados evangélicos ou crentes, ou ainda protestantes..., há vários segmentos teológicos e/ou ideológicos: tradicionais, pentecostais e neopentecostais (este último estava no começo na época). Mas há também outras divisões, entre os quais podemos afirmar que incluem parte dos três grupos acima citados, que são – em resumo – os liberais, os fundamentalistas e os conservadores.

igreja – Assembleia de Deus – da qual passei a fazer parte, em 1980, é fundamentalista. Lembro-me de que numa sala de aula de Teologia, acho que em 1981, um dos nossos professores disse aos alunos – maioria assembleianos – presentes, mais ou menos estas palavras que ficaram gravadas em minha mente: somos protestantes (porque somos herdeiros da Reforma); dispensacionalistas (porque acreditamos que Deus trata com o homem por períodos de tempo, abrangendo alianças e provas), pré-tribulacionistas (pois acreditamos que a Igreja será arrebatada antes da Grande Tribulação) e pré-milenistas (porque acreditamos que Jesus virá à Terra antes de um período de mil anos – literalmente – para governar). Pretendemos estudar rapidamente cada um destes dogmas, mas por ora, quero apenas destacar as três linhas ideológicas que envolvem a comunidade evangélica como um todo, destacando também, o papel dos conservadores na política brasileira.

1. Evangélicos liberais

Por muito tempo, depois da Reforma e Contrarreforma do século XVI, até o século XIX, havia duas grandes divisões no Cristianismo ocidental: católicos e protestantes. Estes últimos foram os que mais se ramificaram (subdividiram) em várias igrejas e impactaram cultural e politicamente a sociedade europeia e estadunidense.

O liberalismo, também chamado de “modernismo”, corresponde à grande mudança no pensamento teológico, alcançando seu ápi’ce principalmente entre meados do século XIX e a primeira guerra mundial. “Os desafios intelectuais que o século XIX apresentou ao cristianismo foram enormes, e tanto o protestantismo como o catolicismo viram-se obrigados a lhes responder(GONZÁLEZ [1]). O liberalismo teológico foi uma tentativa de resposta a estes desafios, procurando adaptar as ideias religiosas cristãs à cultura e formas de pensar da época. Uma vez que o mundo não era mais o mesmo dos tempos da Bíblia e dos credos, era preciso repensar a fé e transmiti-la em termos que possam ser compreendidos hoje. A Revolução Industrial, que afetou não só a economia, mas também todos os aspectos da vida; o Evolucionismo de Darwin, que levou os cristãos, senão a se tornarem ateus, pelo menos a pensarem num Deus imanente que edificou o universo lentamente e pôs em descrédito a narrativa do Gênesis; o processo científico em geral foi aplicado à teologia e à crítica bíblica e pôs em cheque os dogmas cristãos... Como enfatizei nesta minha monografia, [2neste período, as correntes do pensamento liberal, foram notáveis

em todos os aspectos da vida, como migrações, principalmente rurais, rompimento dos laços de família, crescente individualismo e egocentrismo (o tema do ‘eu’) que passou a ocupar a literatura da época. O olhar para o futuro, sob a ideia do progresso, contrariava a forma de pesquisa que adotava até então. Até pouco antes, a opinião mais comum era de que as ideias eram certas quanto mais antigas fossem. Agora, muitos dos intelectuais que enfatizavam o ‘futuro’, motivado pelo progresso, em detrimento do passado, vão pôr em dúvida o que se tem dito até então, em matéria de ‘verdades’ histórica e religiosa. E neste sentido, a ‘Teoria da Evolução, de Darwin, é uma expressão dessa confiança no progresso’. Progresso este, teorizado por Augusto Comte, fundador da Sociologia Moderna, que seguia as etapas da ‘… ‘teológica’ à ‘metafísica’, e desta à ‘científica’. (...) No campo religioso, estes estudos, aplicados à Bíblia, produziram fortes abalos e extensos debates”. E nos Estados Unidos, a teoria de Darwin e outras também de relevância defesa do progresso, repercutiram em forma de ‘teologia liberal’ que tentava ‘… harmonizar o cristianismo com a modernidade, caso contrário, a fé cristã se tornaria uma religião irrelevante e sem sentido nos tempos modernos’. Apesar de não ter sido um ‘movimento monolítico’ o liberalismo foi considerado uma ameaça à fé cristã, e exigiu uma resposta da ‘ala conservadora’ de reação ‘antiliberal’, que defendia os ‘fundamentos da fé’ (Nota 2: item 5.2).

E para destacar os principais ensinos do liberalismo quero aproveitar também parte de uma das fontes utilizadas em minha monografia, o texto de Osiel Lourenço de Carvalho [3]:

  • “A aceitação das teorias das ciências da natureza como a teoria da evolução de Charles Darwin.
  • O uso da alta e baixa crítica na interpretação da Bíblia.
  • O reconhecimento da influência de povos vizinhos de Israel na constituição da religião judaica.
  • A ênfase em Deus como amor, em lugar de sua figura de juiz da humanidade.
  • A presença, em cada pessoa, de uma centelha divina, proporcionando uma visão otimista quanto à sua identidade e futuro.
  • A teoria da revelação progressiva, com a influência dos fatores naturais, econômicos e políticos.
  • Jesus mais que um salvador da humanidade, é exemplo de plenitude das potencialidades humanas.
  • A Bíblia é um testemunho da experiência religiosa de Israel e da igreja em seus primeiros anos.
  • As doutrinas e dogmas das igrejas devem ser substituídos pela experiência religiosa de cada indivíduo.”

Como Pierard [4] afirma, “… a Primeira Guerra Mundial esmagou o otimismo inebriante que era o seu patrimônio principal, enquanto os conservadores contra-atacavam…” e “… já na década de 1960, a maioria dos liberais tinha abandonado o otimismo humanista, o imanentismo cultural progressivo e o sonho de um reino terrestre, sem, contudo, ceder terreno quanto à sua interpretação não-literal da Bíblia.” O certo é que a corrente protestante liberal não morreu e continua dividindo espaços com fundamentalistas e conservadores nos dias atuais. 

Sobre este assunto, veja também: O que é teologia liberal.


2. Evangélicos fundamentalistas

Como vimos acima, o fundamentalismo ganhou força após a primeira guerra mundial. Mas, como teoria ou linha ideológica/teológica, remonta até 1886, quando foi fundado o Moody Bibble Institute pelo evangelista norte-americano D. L. Moody, em Chicago, com o objetivo de combater a alta crítica e o avanço do liberalismo. Além deste seminário, já havia também, desde 1812, o Seminário Teológico de Princeton, de Nova Jérsei (EUA). Segundo o Portal Got Questions [5], “… 97 líderes de igrejas conservadoras de todo o mundo ocidental foram comissionados a escrever 12 volumes sobre os princípios básicos da fé cristã. Eles então publicaram esses escritos e distribuíram mais de 300.000 cópias gratuitamente para ministros e outros envolvidos na liderança da igreja. Os livros foram intitulados Os Fundamentos, e ainda existem hoje como um conjunto de dois volumes.”

Destacaram-se na formalização do Fundamentalismo, final do século XIX e início do século XX, alguns líderes cristãos, como John Nelson Darby, Dwight L. Moody, BB Warfield, Billy Sunday e outros, que estavam preocupados com o fato de que os valores morais estavam sendo corroídos pelo Modernismo ou liberalismo. Esta crença, segundo eles, estava centrada no homem e não em Deus. Seus adeptos, além da influência do Modernismo, era preciso lutar também contra o movimento alemão de alta crítica, o qual buscou negar a inerrância das Escrituras.

O Fundamentalismo é construído em cinco princípios da fé cristã, embora haja muito mais para o movimento do que a adesão a estes princípios [6]:

  • A Bíblia é literalmente verdadeira. Associada a este princípio é a crença de que a Bíblia é infalível, isto é, sem erro e livre de contradições.
  • O nascimento virginal e a divindade de Cristo. Os fundamentalistas acreditam que Jesus nasceu da Virgem Maria, foi concebido pelo Espírito Santo e era e é o Filho de Deus, plenamente humano e divino.
  • A expiação substitutiva de Jesus Cristo na cruz. O Fundamentalismo ensina que a salvação é obtida somente através da graça de Deus e a fé humana na crucificação de Cristo para os pecados da humanidade.
  • A ressurreição corporal de Jesus. No terceiro dia após a sua crucificação, Jesus ressuscitou dos mortos e agora está assentado à direita de Deus Pai.
  • A autenticidade dos milagres de Jesus como registrados nas Escrituras e a literal e pré-milenar segunda vinda de Cristo à Terra.

Diferentemente dos liberais, os fundamentalistas ensinam também, que os primeiros cinco livros da Bíblia foram escritos por Moisés; que a Igreja será arrebatada antes da tribulação do fim dos tempos e a maioria deles também é dispensacionalista (assunto do qual falaremos em outro momento).

Entendo que o fundamentalismo abrange tanto tradicionais quanto os pentecostais e neopentecostais. O fundamentalista exerce certa militância de sua religiosidade e se vê como guardião da verdade, normalmente excluindo a interpretação bíblica dos outros e gerando atritos com os mesmos, isto é, com outros segmentos religiosos.

O Fundamentalismo foi uma resposta radical para a época que nasceu, uma vez que o mundo estava adotando o Modernismo, Liberalismo e o Darwinismo, e a própria igreja estava sendo invadida por falsos mestres. Ele foi uma reação contra a perda do ensino bíblico, mas depois, começou a se fragmentar e se reorientar. “O grupo mais proeminente e vocal nos EUA [por exemplo] tem sido a Direita Cristã. Este grupo de autodenominados fundamentalistas tem sido mais envolvido em movimentos políticos que a maioria dos outros grupos religiosos. Na década de 1990, grupos como a Coalizão Cristã e Conselho de Pesquisa da Família têm influenciado a política e questões culturais. Hoje, o Fundamentalismo vive em vários grupos evangélicos, como a Convenção Batista do Sul. Juntos, esses grupos afirmam ter mais de 30 milhões de seguidores” (Idem). E como dissemos aqui, o fundamentalismo norte-americano chegou ao Brasil, no início do século XIX, como parte do “Destino Manifesto” protestante que se transformou no modelo do “Protestantismo de Missão”. Aqui, este modelo de protestantismo vai se firmar através de um “fundamentalismo” anticatólico e de muita pouca aproximação com a cultura brasileira, dificultando, desta forma, uma aproximação com pessoas de outros credos, mediante o diálogo sadio e amigável com estes grupos.

Os fundamentos são princípios de defesa do verdadeiro cristianismo, mas sua ênfase na inerrância da Bíblia, inclusive de sua escrita (letra-por-letra) fazem com que seus defensores, os fundamentalistas, sejam vistos como extremistas radicais, pessoas que, inclusive, idolatram a Bíblia. E assim, são criticados tanto por cristãos protestantes liberais, católicos e não-cristãos. Na verdade, os fundamentalistas têm uma característica evidente: “A convicção de que possuem o conhecimento absoluto da verdade, da qual se tornaram guardiões divinamente ordenados” (Lloyd Geering. In: Movimento Batistas por princípios – ver Nota 7). Teólogos conservadores como Alister McGrath afirmam que o movimento fundamentalista prejudicou a teologia acadêmica e o consequente debate com os liberais. Além disso, para ele, “… o surgimento do fundamentalismo causou impacto sobre o compromisso evangélico com a erudição em geral”. E no seu “… afã de se identificarem como detentores da verdade e paladinos da defesa do cristianismo, prejudicaram a integralização entre evangélicos e universidades” (Idem). O contraponto entre o radicalismo fundamentalista e a frouxidão (ou descuido com a pureza do verdadeiro Evangelho) do liberalismo pode ser visto, portanto, com a posição do conservadorismo, do qual falaremos a seguir...


3. Evangélicos conservadores

Voltando ao que falei no início, sobre a Igreja Assembleia de Deus, como sendo fundamentalista, alguns anos depois, esta posição já havia mudado bastante, e, num outro momento, lembro-me de que outro professor de teologia disse que esta igreja é literalista – interpreta a Bíblia de forma literal –, mas não fundamentalista. Eu fui membro daquela Assembleia em São Paulo, por 37 anos (há várias assembleias e cada uma com peculiaridades próprias), mas na verdade, sempre me considerei um “batisbleiano” (mistura de batista com assembleiano), portanto um fundamentalista por princípio, até certo ponto, mas convivi muito bem com outros que pensavam diferente. Em 2016, ao fazer um curso de pós numa faculdade batista, e ouvindo sobre muitas ressalvas e até críticas sobre o fundamentalismo – e isto num seminário tido como fundamentalista! –, resolvi estudar um pouco mais sobre o assunto, e escrevi o trabalho citado acima: “Fundamentalismo Protestante: dificuldades de interação e diálogo com a cultura brasileira”. Porém, embora eu reconheça esta dificuldade de interação com a cultura, vejo que o fundamentalismo defende pontos que são inegociáveis por serem verdades absolutas da Palavra de Deus. Por exemplo, mencionamos os cinco pontos de fé fundamentalista: a infalibilidade e inerência das Escrituras, a divindade de Cristo e seu nascimento virginal, a remissão dos pecados da humanidade pela crucificação de Jesus, a ressurreição corpórea de Jesus como um fato histórico e a volta iminente de Jesus à Terra. Eu acrescentaria também os cinco solas da Reforma: Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Fide, Sola Gratia e Soli Deo Gloria. Estas são defesas também de conservadores. Ah, hoje, morando em Pindamonhangaba/SP e membro da Igreja da Cidade, com princípios batistas, continuo nesta mistura teológica de fundamentalismo com conservadorismo. Há alguma diferença? Para responder a esta pergunta, quero utilizar, na sequência, parte de um texto de um portal batista, bem sugestivo, a propósito: “Movimento Batistas por Princípios”, que afirma que:

embora fundamentalistas e conservadores tenham a mesma percepção quanto à ‘defesa’ da doutrina, há modos diferentes de entender como essa postura apologética é conduzida. Com os primeiros (fundamentalistas), o diálogo é quase nulo; com os segundos (conservadores), é possível dialogar porque estes já se deram conta há algum tempo que as coisas mudaram e o mundo não é mais como antigamente… o conceito ‘fundamentalismo’ é um termo que surgiu no contexto religioso protestante nos EUA, mas que já ultrapassou o âmbito protestante estadunidense há muito tempo, principalmente depois dos ataques de 11 de setembro de 2001. O termo ficou popularizado e hoje pode ser visto sendo empregado não apenas no contexto religioso… Os conservadores passaram a se desvincular dos fundamentalistas por entender que a reflexão precisava acontecer e o recrudescimento a partir de posturas ferrenhamente antagônicas não contribuía para o debate com os liberais e, como consequência, com a sociedade. O que demonstra, que os conservadores procuraram o diálogo enquanto os fundamentalistas continuaram a se verem como os ‘únicos’ detentores de uma verdade que não abria para questionamentos… [7]

Bem, voltando à questão da “inerrância” ou “interpretação” da Bíblia Sagrada, vimos que os fundamentalistas afirmam de maneira peremptória sua inerrância, mas os conservadores preferem, ao invés disso, falar de sua “infalibilidade” “… em questões de doutrina e fé” (Júlio Zabatiero: Idem, Nota 7), considerando o contexto em que o texto foi escrito… Interessante que temos, dentre alguns teólogos bem conhecidos, aqueles que se identifica(ra)m como conservadores e não fundamentalistas, como: Billy Graham, John Stott, Isaltino Gomes Coelho Filho, Ebenézer Soares Ferreira, Irland Pereira de Azevedo etc. E os que são fundamentalistas sem serem conservadores, segundo o artigo a que estamos fazendo referência, são os que não aceitam “a diversidade” do modo de ser Batista. O éthos dos Batistas é ser conservador mas entende como a diversidade (ambos os lados são aceitos) é inerente ao seu sistema denominacional.

Conservadores e liberais na política

O conservadorismo se estendeu para fora do âmbito religioso e alcançou a política. De 2016 para cá, tornou-se muito comum ouvirmos falar de “direita conservadora” aqui no Brasil. O que isto quer dizer? Um pequeno livro do influencer evangélico Luiz Camargo, “Breve manual do cristão conservador” [8] trata de forma bem objetiva deste assunto. Itens que ele aborda como relação do conservadorismo com a direita do Brasil, liberais x conservadores, a Verdade, globalismo, aborto e outros, demonstram a influência do conservadorismo na política brasileira. Aliás, este conceito vai além do grupo dos evangélicos chegando inclusive a católicos, espíritas e até não-religiosos. Mas o que unem estas pessoas ou grupos? Um resumo pode ser:

  • O conservadorismo implica em preservar valores, costumes e tradições da cultura judaico-cristã. Portanto, se alguém é antissemitista, e anticristão, por exemplo, não pode ser considerado um conservador, ao passo que na sociedade, alguém que mesmo não sendo evangélico ou cristão, mas aceita os valores cristãos como moral, ética etc., conseguem conviver muito bem como conservadores. Percebo isto na lista de contatos (ou seguidores) nas redes sociais de grandes influenciadores (de direita conservadora) da internet, por exemplo.
  • Mesmo no aspecto político, os conservadores são contrários ao aborto, mudança de sexo, legalização das drogas, defendem a família tradicional (pai, mãe e filhos), a liberdade (de imprensa, expressão, comércio etc. – com base no livre-arbítrio das pessoas), a pouca intervenção do Estado na economia e na vida das pessoas, são pró-Israel (semitistas), defendem o Estado laico (não o laicismo) etc.

  • Como partidos considerados de esquerda não aceitam os valores dos conservadores, estes são considerados de direita no espectro político.

Então só existem conservadores de direita? Entendo que não há compatibilização entre os princípios que os conservadores defendem com os defendidos pela esquerda. É comum ouvirmos também de “liberais na economia e conservadores nos costumes”. Liberalismo, neste caso, é diferente do que vimos no sentido teológico acima. E o liberalismo, no sentido econômico, é comum também para conservadores. O certo é que, em geral, os conservadores buscam um governo que seja “… pautado pela prudência, por isso tem como premissa a preservação dos valores morais, religiosos e patrióticos tradicionais da civilização ocidental, que foram estabelecidos não por governos ou pensadores na tentativa de chegar a um objetivo previamente arquitetado, mas pelas relações livres dos indivíduos livres ao longo da história. [9]” Ao contrário da esquerda, o conservador não é revolucionário. Na verdade, é exatamente por meio da revolução que os membros da esquerda tentam destruir todo o alicerce da cultura ocidental preservado pelos conservadores através da história.

Evangélico e protestante são palavras sinônimas correspondentes a um mesmo segmento, mas subdividido, de cristãos não-católicos, que abrangem tradicionais, pentecostais e neopentecostais. Os liberais ainda estão presentes hoje, a maioria defendendo pautas da esquerda, presente em grande número dentro das igrejas, principalmente entre os evangélicos tradicionais e católicos. Mas no campo político, liberalismo não tem necessariamente relação com temas teológicos e morais. O conceito está restrito ao mercado. Muitos políticos liberais são ateus e até amoralistas. É comum, por exemplo, liberais defendendo aborto, drogas, pautas LGBT…, condenando Israel e assim por diante. Estes são, via de regra, bem-aceitos no campo político e nas instituições educacionais, já os fundamentalistas/conservadores – nesse caso, tratados como se fossem apenas um grupo, que pensam igualmente e defendem as mesmas pautas – são muitos criticados, vistos como radicais, retrógrados, terraplanistas, fascistas, extremistas, ultradireitistas, anticiência e às vezes tratados como cidadãos com menos direitos do que os demais. Conservadores são vistos como sinônimos de fundamentalistas, colocados num mesmo balaio, mas nos últimos anos, sua presença tem sido notória no campo político.

É sabido que no Brasil, a maioria é conservadora: não só de evangélicos, mas também de católicos e até outros grupos não-religiosos. Mas há algo preocupante, a meu ver, quando pesquisa como esta do Datafolha [10] aponta, por exemplo, que enquanto o número de “… evangélicos que se identifica com a direita, é proporcionalmente maior que o da média brasileira”, mas, por outro lado, entre os próprios evangélicos “...o número de evangélicos de direita é equivalente aos de esquerda”. Não quero aqui defender nem condenar nenhum dos lados, embora vejo que há uma certa tendência do cristão, ao escolher o lado da esquerda, absorver também suas pautas e viver uma espécie de “Evangelho Segundo Marx”, “Teologia da Libertação” etc. E, por este motivo, escolher governantes que também pensam e agem assim.

Para concluir, quero sugerir o vídeo abaixo, de Luiz Camargo, explicando a diferença, no campo político, entre conservadores e liberais.


Notas / Referências bibliográficas:

  • [1] GONZÁLEZ, Justo. Uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos novos horizontes. São Paulo: Vida Nova, 2009. Apud: AMORIM, Nota 2.
  • [3] CARVALHO, Osiel Lourenço de. Fundamentalismo Protestante. In: SOUZA, Sandra Duarte (Org.). Fundamentalismos religiosos contemporâneos. São Paulo: Fonte Editorial: 2013, pág.52 e 53.
  • [4] PIERARD, R. V. Liberalismo Teológico. In: ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. II. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.), Pág. 428 e 429.
  • [6] Idem (texto adaptado).
  • [8] CAMARGO, Luiz. Breve manual do cristão conservador. Campinas/SP: Vide Editorial, 2022.
  • [9] Idem, pág. 23.
  • [10Datafolha: número de evangélicos de direita é equivalente aos de esquerda. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2022/pesquisa-eleitoral/noticia/2022/06/07/datafolha-numero-de-evangelicos-de-direita-e-equivalente-aos-de-esquerda.ghtml>. Acesso em: 28/08/2024.