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12 junho 2023

Frida Vingren: uma voz feminina no início do pentecostalismo brasileiro

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Artigo de autoria de meu antigo colega de classe, Thiago Tropardi Gonçalves, na disciplina O Papel da Mulher no Protestantismo Brasileiro, ministrada no Curso História e Teologia do Protestantismo no Brasil, pela Professora Rute Salviano Almeida, na Faculdade Teológica Batista de São Paulo, em fevereiro de 2015.

O movimento evangélico brasileiro é caracterizado, assim como na América do Norte, por sua grande variedade, por suas ricas e mesmo incomuns manifestações, e por ter sido intensamente impactado, no início do século XX pelo surgimento de uma nova força no mundo Protestante, O Movimento Pentecostal contemporâneo.

Apesar de existirem questões concernentes à proporcionalidade incompatível de evangélicos no Brasil e nos Estados Unidos, o contexto do surgimento do Pentecostalismo nos dois países tem semelhanças importantes. Tanto no Brasil quanto nos Estado Unidos a grande maioria das denominações históricas já estavam seguramente instaladas quando da ocasião do surgimento do Pentecostalismo, obviamente os protestantes eram minoria em terras tupiniquins, o que não ocorria no norte da América, contudo já havia uma base protestante sólida em território nacional.

Nesse sentido, não importa em qual dos dois países, o Pentecostalismo desde seu início tem na sua origem a essência de ser uma dissidência protestante surgida a partir das Igrejas Históricas ou, dependendo da perspectiva do observador, concomitantemente à mesma. Traduzindo em rápidas palavras: O Pentecostalismo moderno é um movimento Protestante tanto na origem quanto em seu posterior desenvolvimento. Aqueles que questionam a essência do movimento e propõe total incompatibilidade entre o Protestantismo Histórico e Tradicional e o Movimento Pentecostal claramente se mostram ignorantes com relação a essência histórica, bíblica e revolucionária do protestantismo, bem como também o fazem em se tratando da natureza, doutrina e história do Movimento Pentecostal.

Pentecostalismo é Protestantismo gostem ou não os Protestantes não-pentecostais. E, no caso do Brasil, a discussão é consideravelmente mais séria e relevante que no resto do mundo. Levando-se em consideração os debates e controvérsias sobre se de fato é legítimo falar em “Protestantismo Brasileiro” ou se o termo correto a ser usado seria “Protestantismo no Brasil”, tal discussão parte da premissa de que, de fato, existe a possibilidade de um “Protestantismo Brasileiro” não existir visto que o protestantismo praticado no Brasil em poucas ocasiões foi autônomo e/ou independente de influências estrangeiras. O Protestantismo Brasileiro nunca teria saído de baixo das asas de seus irmãos europeu e norte-americano e, por essa razão, faria então muito mais sentido falar em um “Protestantismo no Brasil”, ou seja, um protestantismo estrangeiro praticado em solo brasileiro.

Tomando como ponto de partida a discussão acima, muitos especialistas defendem ser o Pentecostalismo o legítimo "Protestantismo Brasileiro". O Pentecostalismo teria sido a modalidade de protestantismo que realmente adentrou à sociedade brasileira transformando-a enquanto foi transformado por ela. O Pentecostalismo alcançou pessoas, camadas sociais e grupos que o protestantismo histórico encontrou imensas dificuldades para alcançar ou mesmo que, na prática, nunca pretendeu atingir. Pentecostais dialogaram extensivamente com cultos afros e práticas populares tradicionais presentes na sociedade brasileira enquanto dialeticamente rejeitaram ainda outro enorme número de práticas populares tradicionalmente praticadas em diversas regiões do país. Apenas para citar um exemplo, enquanto alguns grupos pentecostais usam como instrumentos musicais apenas o violão e o teclado, outros levam atabaques, bumbos e diversos instrumentos de percussão de origem africana para cultuar ao Senhor nos cultos de domingo à noite. Pentecostalismo, na prática, é Ecclesia Reformata et Semper Reformanda est [1].

Isto posto, parece salutar observar a vida e obra de uma das grandes vozes da História do Movimento Pentecostal Brasileiro. Passemos então a observar vida e obra de Frida Maria Strandberg Vingren, conhecida popularmente como Frida Vingren.

Frida, assim como a maioria das grandes mulheres da História do Cristianismo, sendo ao mesmo tempo missionária, obreira, mãe e esposa encontrou muitas dificuldades no transcorrer de sua vida de fé, e como cristã fervorosa, jamais perdeu as esperanças ou a confiança de que seu Salvador a poderia livrar de qualquer mal e auxiliá-la a superar as mais terríveis dificuldades, mesmo àquelas presentes no cotidiano do contexto missionário.

Frida nasceu em Själevad, Västernorrlands, região norte da Suécia no dia 9 de Junho de 1891, filha de Jonas Strandberg e Margareta Sundelin. Os pais de Frida construíram uma grande família e a jovem teve vários irmãos. Seus pais eram cristãos luteranos, Frida, portanto, foi criada em uma família cristã e recebeu educação luterana quando criança, estudou até o nível superior sendo formada em enfermagem. Não obstante, a jovem, apesar de luterana na origem, logo começou a participar de cultos em uma igreja pentecostal. Sobre essa fase da vida de Vingren, Araujo comenta: “Ela tornou-se membro da Igreja Filadélfia de Estocolmo, onde cooperava. Batizada em águas pelo pastor Lewi Pethrus, em 24 de Janeiro de 1917, pouco tempo depois recebeu o batismo no Espírito Santo. Posteriormente, recebeu o dom de profecia.” [2]

Jovem com talentos incomuns Frida possuía aptidões e foi, durante sua vida e ministério, missionária, enfermeira, musicista, compositora de hinos da Harpa Cristã, pregadora, redatora, escritora, pesquisadora, ensinadora, pastora, mãe, esposa, administradora do lar e por vezes da igreja. A jovem, de fato, possuía talentos extraordinários. Analisaremos alguns destes talentos com mais cuidado no decorrer do texto.

É significativo que o Primeiro líder e fundador das Assembleias de Deus no Brasil fosse a favor de um ministério feminino mais ativo na Igreja. Gunnar Vingren, esposo de Frida, sempre desejou que sua esposa e que as mulheres assembleianas tivessem mais atuação no seio da igreja. Uma controvérsia conhecida ocorreu entre Vingren e Samuel Nyström o segundo missionário na linha de liderança da denominação. Nos eventos que antecederam a Convenção Geral das Assembleias de Deus de 1930 Vingren e Nyström travaram uma batalha em função da questão da ordenação feminina e da liberdade de atuação das mulheres na pregação e ensino na igreja, sobre esse fato Gunnar escreveu em 1929: “Samuel Nyström chegou do Pará. Não se humilhou. Sustenta que a mulher não pode pregar nem ensinar, só testificar. Disse mais que, provavelmente, vai embora do Brasil.” [3]

Em outro encontro relatado por Gunnar Vingren o missionário conta que Nyström foi a São Paulo e a Santos para ter apoio dos Missionários Daniel Berg e Simon Lundgren e assim finalmente convencer Vingren a respeito do ministério feminino ser ilegítimo, sobre esse encontro Vingren aponta o seguinte desfecho:

Chegaram Samuel, Simon e Daniel. Samuel não se humilhou. Separamo-nos em paz, mas para não trabalhar mais juntos, nem com jornal ou nas escolas bíblicas, até o Senhor nos unir. Simon disse que ficava de fora e Daniel tinha convidado Samuel a trabalhar em São Paulo. Assim disse para ele: Estamos separados. [4]

Apesar da sentença declarada pelo líder das ADs eles voltariam a trabalhar juntos, Nyström na verdade chegou a trabalhar com Frida em uma das ocasiões em que, na ausência de Gunnar, eles dirigiram juntos a Assembleia de Deus em Belém do Pará. Samuel conta a respeito dessa época: “A irmã Frida Vingren e eu trabalhávamos em colaboração. Muitos foram salvos e batizados nas águas e Jesus continuava batizando no Espírito Santo [5]". Entretanto Araujo defende que esta aceitação de Samuel com relação a Frida se dá apenas por ele considerar que a jovem missionária e o evento em que ocorrera seu pastorado eram uma exceção à regra e não pelo fato de o cofundador da denominação aceitar o ministério feminino na igreja [6].

Dentre as muitas funções que Frida acumulou durante sua vida a função de Pastora e pregadora foi de fundamental importância para o posterior desenvolvimento da denominação. Frida não exerceu apenas o pastorado em Belém, anos mais tarde ela assumiria a igreja em São Cristovam no Rio de Janeiro, a maior e mais importante igreja Assembleia de Deus no país, nas ocasiões em que seu esposo estava ausente, seja por enfermidade ou por ocasião de suas muitas viagens missionárias. Frida além de dirigir os cultos em São Cristovam (uma igreja para dois mil membros) por diversas vezes foi pregadora ao ar livre, assim Wesley e Withefield na Inglaterra do século XVIII.

Quando Gunnar não podia dirigir os cultos na AD de São Cristovam, devido ás suas muitas enfermidades, quem os dirigia era sua esposa. Os cultos ao ar livre no Rio de Janeiro, promovidos no Largo da Lapa, na Praça da Bandeira, na Praça Onze e na Estação Central eram dirigidos por Frida. Era costume também que ela ministrasse estudos bíblicos. [7]

Sobre os cultos ao ar livre e a pregação ainda é importante salientar que Frida foi “… a missionária que aprendeu português mais rápido. Dois meses após sua chegada fez sua primeira pregação" [8]. Ivar Vingren, filho de Frida e Gunnar, em uma visita à CPAD, em 1985, faz a seguinte afirmação sobre sua mãe: “... tinha um dom de ensinar e pregar como ninguém, e por essa razão sofreu muita perseguição [com relação a seu ministério de ensino e pregação]” [9].

Além dos cultos ministrados ao ar livre e na Igreja em São Cristovam, Frida ainda possuía um trabalho relacionado aos cultos em presídios, fontes afirmam que Frida era a dirigente oficial de cultos realizados na Casa de Detenção aos domingos, elucidando assim alguns aspectos a respeito da ativa rotina da missionária sueca em solo carioca.

Outro aspecto de Frida é o da ensinadora e escritora. Frida foi a única mulher na história das Assembleias de Deus a escrever comentários da Revista Lições Bíblicas, a revista oficial das escolas dominicais da Assembleia de Deus no Brasil. Era Frida quem dirigia a Escola dominical na Igreja de São Cristovam e, além de ensinar, era conhecida por sua postura incansável e por sua capacidade de rapidamente resolver os mais diversos problemas que lhe desafiavam.

Frida, como ensinadora cristã, participou ativamente na direção do jornal assembleiano Som Alegre e escreveu para o Jornal Boa Semente. Ambos se fundiriam e se tornariam o jornal tradicional da denominação, o Mensageiro da Paz.

Frida escreveu diversos artigos para esses jornais, a maioria deles tratavam de questões como a vida cristã, a fé, os dons espirituais, entre outros. Dos artigos publicados de autoria da missionária se destacam: A Fé dos Santos, de Janeiro de 1930, para o jornal Som Alegre; Dons Espirituais, também de Janeiro de 1930, para o jornal Som Alegre; Cristo Ressuscitado, de Abril de 1931, pelo recém fundado Mensageiro da Paz; e Ganhando o mundo e perdendo a Alma, de Setembro de 1931 para o jornal Mensageiro da Paz. Um de seus artigos, intitulado de A Fé dos Santos, mostra bem o estilo apologético, ético, escatológico e doutrinário de seus escritos: Peleja pela fé uma vez entregue aos santos, diz o apóstolo Paulo. Se naquele tempo havia necessidade de tal advertência – ainda mais hoje que é o tempo da apostasia. Um dos maiores sinais da segunda Vinda de Cristo é a apostasia.

A fé dos santos” é  uma das doutrinas fundamentais que o apóstolo nos recomenda guardar. Sim, ele diz: “pelejai por ela” – a fé. Isto inclui tanto (a fé), o uso prático dela em nossa vida particular, como um trabalho defensivo.

Proclamemos, portanto, em primeiro lugar, a salvação completa de todos os vícios e pecados. Uma salvação que comece no coração pelo novo nascimento e depois penetre em todo seu ser – corpo, espírito e alma [10].

Frida foi uma das mais influentes ensinadoras da denominação desde sua fundação, ademais também foi a mulher a conquistar maior espaço de atuação como pastora, pregadora ensinadora, escritora e também como musicista. Sobre todas essas qualidades da jovem missionaria sueca Araujo comenta:

Frida, então, desenvolveu, junto com o marido, intensas atividades evangelísticas, abrindo frentes de trabalho em muitos lugares. Todo o trabalho social da igreja, bem como a direção dos grupos de oração, de visitadoras e de evangelização, ficou sob a responsabilidade da missionária. Dirigia também a Escola Dominical, e nos cultos, fazia a leitura bíblica inicial. Tocava órgão, violão e cantava hinos, ás vezes sozinha, as vezes em companhia do esposo. […] escreveu profundas mensagens evangelísticas, doutrinárias e de exortação, além de compor belos hinos para o louvor a Deus, e fazer traduções. Na Harpa Cristã há 24 hinos com o seu nome (16 versões e 8 autorias), todos de grande valor espiritual.

Frida foi, pode-se dizer, uma das chamas que o senhor ascendeu no mundo para iluminar o caminho de muitos pecadores, sua obra ao lado de seu esposo Gunnar mudou em definitivo a história religiosa de toda uma nação. O valor do trabalho da missionaria, seus sofrimentos e dificuldades são, certamente, incalculáveis. Sua dedicação como pastora, pregadora, ensinadora, musicista, mãe, esposa, editora e escritora são tamanhos que, quando olhamos pelos retrovisores da história a trajetória da maior denominação protestante do país, nenhuma mulher parece se destacar tanto quanto a valorosa missionária sueca e, de fato, nenhuma outra mulher parece ter sido de tamanha importância para o avanço da igreja de Cristo no Brasil. Sem o zelo missionário e o esforço evangelístico dos primeiros missionários pentecostais suecos e norte americanos no Brasil, a pouca força da igreja tradicional/história teria se feito sentir de modo muito menos intenso. Não fossem as privações e dificuldades superadas por cristãos suecos que, perseguidos em sua nação de origem, vinham ao Brasil com zelo fervoroso pelas almas, nossa nação seria outra. Uma nação muito mais católica e com uma influência protestante muito menor em termos de proporção e intensidade.

Nesse sentido, os evangelistas pentecostais anônimos e os conhecidos, como no caso de Frida, tem em suas histórias o fascinante legado de ter levado Cristo a uma nação, não apenas a nação branca de classe média e alta, mas a nação brasileira realmente carente e necessitada de um salvador em todos os sentidos. Cristo, levado pela chama pentecostal e pregado pelos lábios pentecostais, alcançou a população simples e necessitada do Brasil como nunca antes. Nasce, com os pentecostais, a religião mais negra do Brasil, a mais alegre, apaixonada e por vezes perseguida. Nasce o protestantismo brasileiro e, não apenas isso, em suas relações e trocas de informação e vitalidade com o catolicismo romano popular, nasce o Cristianismo Brasileiro, em alguns aspectos um movimento absolutamente valioso e belo, em outros por vezes problemático. Mas, diferente do protestantismo tradicional, um cristianismo que experiências, vivencias e convicção religiosa dialética e simbiótica. Não existem experiências na igreja pentecostal que sejam compradas ou rejeitadas a priori, apenas experiências adquiridas e experimentadas.

Frida morre na Suécia aos 49 anos, no dia 30 de setembro de 1940, sete anos após Gunnar (falecido em 1933). Após uma vida de trabalhos incessantes, lutas e as mais diversas dificuldades, após passar fome, noites de oração em agonia e lágrimas, além das enfermidades sofridas por ela e pelo esposo [11].

No túmulo de sua mãe Ivar escreveu a seguinte mensagem: “Aquele que leva a preciosa semente, andando e chorando, voltará sem dúvida com alegria, trazendo consigo os seus molhos” (Salmos 126.6).

 

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Veja também:

A missionária sueca perseguida no Brasil, internada em hospício e ‘esquecida’ pela História.


Referências bibliográficas:

  • ARAUJO, Isael de. Dicionário do Movimento Pentecostal, 1ª Edição. Rio de Janeiro. CPAD: 2007.

  • MESQUITA, Antônio Pereira de. (Editor). Mensageiro da Paz: Artigos Históricos, 1ª Edição. Rio de Janeiro: CPAD, 2004.


Notas:

  • [1]  “Igreja Reformada sempre em Reforma” ou “Igreja reformada sempre se reformando”.
  • [2]  ARAUJO, 2007, p. 903.
  • [3]  Idem, p. 493.
  • [4]  Idem, p. 493.
  • [5]  Idem, p. 493.
  • [6]  Araujo comenta que “… o fato de Nyström ter uma posição definida sobre o assunto não o impediu de trabalhar com uma mulher a frente da obra, quando se fez necessário. Por outro lado, ele também não mudou sua opinião. Ele entendia que aquilo se tratava de algo excepcional” (ARAUJO, 2007, p. 493,494).
  • [7]  ARAUJO, 2007, p. 492.
  • [8]  Idem, p. 905.
  • [9Idem, pp. 905, 906.
  • [10VINGREN, Frida, Mensageiro da Paz: Artigos Históricos. CPAD, 2004, p. 32.
  • [11Em carta envia dia 27 de Maio de 1932 Frida escreve: “Somente o Senhor sabe da tribulação e do sofrimento que têm sido o preço do trabalho. Têm sido dias e noites de oração, lágrimas e agonia. Mas também não foi em vão pois temos visto a glória de Deus se manifestar. Tendo [sido] completamente esgotada dos nervos e também sofrida do coração, mas o Senhor tem me ajudado e curado muitas vezes” (ARAUJO, 2007, p. 905). Seu esposo Gunnar, confidencia o seguinte: “Durante o ano passado, eu tinha uma dívida. Então, para pagá-la, fizemos um esforço especial no último trimestre, e fomos forçados a viver com quase nada. A minha família teve que andar com roupa velha e usada. Minha esposa é testemunha de como eu tratei de compra somente o mais necessário. Mas eu agradeço ao Senhor por tudo, pois poderia ter sido muito pior” (ARAUJO, 2007, p. 905).

04 junho 2023

A importância da cultura para a História


O que é cultura e qual sua relação com a História? Como um conjunto de padrões integrados de comportamento, manifestados entre os membros de uma sociedade, a cultura constitui um fenômeno de interesse e objeto de estudo por parte dos cientistas sociais. Das várias ciências que são “auxiliares” (conjugadas) da História, a Antropologia é a que dá maior contribuição para entender esse fenômeno. Por isso, historiadores sociais como os da Escola das Mentalidades, defendem uma interpretação histórica. Daí, ser a cultura um conceito antropológico e também historiográfico, uma vez que ela serve como “lente” para o entendimento da evolução humana. Os sistemas culturais – valores, crenças, religião etc – dos povos não podem ser desligados da interpretação histórica. A História, portanto, como foi proposta nesse breve trabalho, é uma ciência sociocultural que estuda o cotidiano dos indivíduos, auxiliada pelas ciências sociais...

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Veja o trabalho completo em:

<A importância da cultura para a História>.


29 maio 2023

Ambiguidades do movimento operário

Por
DEL PRIORI, Mary e VENANCIO, Renato [1]

Aspecto de uma fábrica em São Paulo na década de 10 [2]


Na transição do Império para a República, uma nova forma de fazer política teve início no Brasil. Por essa época, começam a surgir os primeiros defensores de projetos socialistas, organizando partidos, sindicatos e jornais. Tratava-se, de fato, de uma mudança radical. Basta lembrarmos que, ao exaltar o “trabalhador” como principal elemento da sociedade, o movimento operário brasileiro rompeu com tradições seculares, herdadas da época escravista, que consideravam as atividades manuais aviltantes e indignas para os cidadãos. Inaugurava-se, assim, um novo princípio de exercício legítimo do poder que tem influência até os dias atuais.

Não por acaso, o Rio de Janeiro registrou as primeiras manifestações do movimento operário brasileiro. De fins do século XIX até os anos 1920, a capital republicana liderou o processo de industrialização, sendo posteriormente superada por São Paulo. A existência de trabalhadores em numerosas fábricas de tecidos, calçados, chapéus, cerâmicas e vidros, aliada ao próspero artesanato autônomo, como o de alfaiates e sapateiros, e a milhares de pequenos funcionários públicos abriu caminho, no meio urbano carioca, para a aceitação das novas ideias políticas. O Centro do Partido Operário, criado para disputar a eleição para a Constituinte de 1891, foi exemplo desta mudança. A plataforma por ele defendida, através do jornal Echo Popular, apresentava um conjunto de reivindicações modestas, havendo até condenação às greves. Além de aumentos salariais, defendiam-se direitos que hoje consideramos básicos – embora só tenham sido alcançados à custa de muita luta e perseguições –, tais como: proibição do trabalho infantil, jornada de trabalho de oito horas, direito a um dia de descanso semanal, aposentadoria para os idosos e inválidos, e também a criação de tribunais para arbitrar conflitos entre patrões e empregados. Apesar de defender causas de grande aceitação popular, o Centro do Partido Operário não sobreviveu muitos anos. Em 1893, por ter aderido à Revolta da Armada, a agremiação política foi extinta. No entanto, as bandeiras levantadas pelo movimento tiveram continuação; exemplos disto são o Partido Democrata Socialista, criado na capital paulista em 1896, e o Partido Operário Socialista, organizado em 1898 na cidade portuária de Santos. Os sindicatos foram outra criação da época.

No Rio de Janeiro e em São Paulo, as ligas operárias começaram a se formar nos anos 1870-80, mas só se tornaram numerosas após o advento da República. Aos poucos, acompanhando a industrialização, esse tipo de instituição espalhou-se por outras regiões brasileiras. A arma de luta sindical tinha um nome: grève; palavra escrita em francês até mesmo em jornais populares, sugerindo tratar-se de uma experiência social nova no Brasil, o que, de fato, era. Antes da década de 1890, a não ser em casos isolados de gráficos e cocheiros, não tinham sido registrados movimentos grevistas importantes no Brasil. Durante os primeiros anos republicanos, o quadro tornou-se bem diferente: na capital federal ocorreram, entre 1891 e 1894, 17 paralisações em defesa de aumento salarial ou pela jornada de oito horas, e no estado de São Paulo, 24 movimentos similares sucederam-se até 1900. Apesar de combativos, os sindicatos surgidos nesse período não conquistaram melhorias substantivas para a classe trabalhadora. Talvez por isso, no início do século XX, outra tendência política, bem mais radical, ganhou terreno no movimento operário. Tratava-se dos anarquistas. Assim, paralelamente aos grupos moderados, que continuaram a formar partidos, aliás de curta duração e sem expressão eleitoral – como o Partido Operário Brasileiro, de 1906, ou o Partido Operário Socialista, fundado três anos mais tarde –, havia agora aqueles que defendiam uma reorganização completa da sociedade, ou melhor, defendiam a revolução.

Ao contrário dos socialistas, os anarquistas não se organizavam em partidos, recusando-se a participar em parlamentos ou a aceitar cargos públicos. A teoria política que os orientava preconizava que o Estado, independentemente da classe social que estivesse no poder, era uma instituição repressiva, daí a defesa intransigente de sua substituição por associações espontâneas, tais como federações de comunas ou cooperativas de trabalhadores. As ligas operárias, obviamente, eram a forma de organização que mais se aproximava desse modelo de sociedade do futuro. Talvez por esse motivo, a época de difusão das ideias anarquistas coincida com a de expansão do movimento sindical brasileiro. Entre 1900 e 1914, por exemplo, o número de sindicatos na capital paulista aumentou de 7 para 41, e a média anual de greves se multiplicou por três. No Rio de Janeiro, os anarquistas também dão sinal de força. Em 1906, organizam um congresso e, no ano seguinte, criam a Federação Operária, congregando vários sindicatos, e levando o mérito de manterem os jornais operários de mais longa duração – como A Terra Livre – e, em 1918, de liderarem na capital republicana uma insurreição da qual participaram trabalhadores e militares.

No entanto, após esse período de expansão, o movimento anarquista entra em declínio. A primeira razão, foram os estragos causados pela repressão, e a suspeita não é infundada. Paralelamente às correntes pacifistas, havia, entre os anarquistas, os defensores da ação direta, em outras palavras, do emprego da violência contra as classes dominantes, como ficou registrado, no início do século XX, em panfletos anexados aos processos contra militantes cariocas, nos quais consta a defesa do assassinato sistemático de burgueses através do envenenamento do leite com biclorato de mercúrio. Tratava-se de uma situação aterradora, embora também seja curioso observar, por meio desse exemplo, a existência de um darwinismo social de origem popular, não voltado para a eliminação “das raças inferiores”, conforme mencionamos no capítulo anterior, mas sim para a extinção das “classes parasitárias”, identificadas às elites.

Embora minoritários entre os anarquistas, os partidários da ação direta deram margem para a organização de um eficiente sistema repressivo. Contribuía para isso o fato de muitos militantes terem nascido fora do Brasil, como nos casos registrados na capital paulista, onde, na década de 1910, entre 70% e 85% dos trabalhadores fabris, de transportes, do pequeno comércio e do artesanato eram estrangeiros. Embora a maioria dos italianos, portugueses e espanhóis fosse proveniente do meio rural, alguns deles tinham experiência sindical ou participação no movimento anarquista europeu, por isso se destacaram na fundação e liderança de sindicatos. Ora, a elite republicana levou isso em conta e, aproveitando-se de atos terroristas dos partidários da ação direta, aprovou leis favoráveis à expulsão de estrangeiros. Assim, de agentes civilizadores, como eram considerados no Império, os imigrantes europeus passaram a ser vistos como fonte de desordem e subversão política.

Todavia, a repressão não explica tudo. A forte presença de estrangeiros no movimento operário tinha ainda outras consequências negativas. Muitos homens e mulheres que aceitaram migrar para o Novo Mundo partiram na esperança de ascender socialmente. As fileiras do anarquismo, devastadas pela repressão policial, encontravam, dessa forma, dificuldades para se renovar; tanto pelo fato de os imigrantes afastarem-se do movimento assim que conseguiam melhores colocações, como pelo alto índice dos que retornavam ao país de origem, decepcionados com as condições de vida no Brasil.

As rivalidades étnicas, por outro lado, inviabilizaram a sobrevivência de muitas organizações sindicais. Um desses casos foi o da Sociedade de Resistência dos Trabalhadores em Trapiche e Café, sindicato que reunia trabalhadores portuários do Rio de Janeiro da República Velha. Tratava-se de um dos raros casos em que a liderança era composta por negros. No entanto, a presença crescente de estivadores portugueses levou ao surgimento de conflitos internos. Em 1908 chegaram a ser registradas mortes durante as reuniões sindicais. Nos quatro anos seguintes, os resultados dos conflitos foram desastrosos. O número de filiados diminuiu de 4 mil para apenas 50; o sindicato dos pintores cariocas, por essa mesma época, enfrentou problemas similares, enquanto outras agremiações sindicais se apresentavam claramente como guetos étnicos, delimitando de antemão a nacionalidade dos filiados e militantes, como no caso dos chapeleiros paulistas, reunidos na Società Cosmopolita fra Lavoratori Cappellaio.

Além do problema étnico, havia outros. A recusa do movimento anarquista à participação política parlamentar e de dar apoio político aos partidos existentes dificultava a cristalização das reivindicações dos trabalhadores em leis. Aliado a isso, os anarquistas condenavam o futebol, o carnaval, o catolicismo e a umbanda, vendo nessas manifestações artimanhas da burguesia para alienar as massas em relação a seus reais interesses; o que de fato contribuiu, entre os militantes, para a formação de preconceitos em relação à grande maioria dos trabalhadores e levando-os muitas vezes, paradoxalmente, a assumir posturas racistas ou elitistas.

Até 1920, os resultados das lutas sindicais brasileiras foram diminutos. Os ganhos salariais alcançados não acompanharam o aumento de preço dos alimentos e do aluguel de casas. A incipiente legislação trabalhista da época restringia-se, por sua vez, a indenizações por acidentes e à restrição ao trabalho feminino ou infantil; leis tímidas e alvos de reformas retrógradas, como o decreto estadual paulista de 1911, que proibiu o trabalho de menores de 10 anos em fábricas e oficinas, abreviando em dois anos o limite determinado na legislação de 1894. Outras leis não saíram do papel, como aquela aprovada em 1917 que definia a jornada de trabalho infantil, limitando-a a cinco horas e estabelecendo a exigência de certificado médico e de atestado de frequência escolar na admissão dos pequenos operários.

A exploração desenfreada de homens, mulheres e crianças que, por vezes, tinham de suportar jornadas de trabalho superiores a doze horas, multiplicava os casos de rebeldia individual e, principalmente, de comportamentos autodestrutivos entre os operários. Em São Paulo, durante as duas primeiras décadas republicanas, as prisões por desordens aumentaram em 40%, enquanto as por embriaguez cresceram quase 400%. Paralelamente a isso, a exclusão dos egressos do cativeiro no mercado de trabalho livre acentuava a prática de furtos. Em cidades como a Campinas do início do século XX, negros e pardos representavam apenas 20% da população total, mas respondiam por cerca de metade da população carcerária. Os dados cariocas mostram, por sua vez, que imigrantes europeus nem sempre desfrutaram de melhores condições. Em 1903, cerca de uma centena de portugueses residentes na capital federal foram expulsos do Brasil sob a acusação de vadiagem e roubo. Entre 1915-18, esse segmento respondeu por 32% dos processos criminais, apesar de constituir apenas 15% da população masculina adulta do Rio de Janeiro.

Perante os riscos da miséria, a grande maioria dos trabalhadores reagia criando associações mutualistas. De maneira semelhante às outras formas de organização mencionadas anteriormente, o mutualismo não era uma invenção local, e sim uma importação europeia, mais precisamente francesa. No Brasil, as primeiras instituições desse tipo começaram a surgir em meados do século XIX. Como o próprio nome sugere, o mutualismo promovia o socorro recíproco de seus filiados. Tal qual os sindicatos, elas podiam se organizar a partir de critérios socioprofissionais, recebendo inclusive denominações referentes ao grupo que representavam, tais como: Sociedade de Beneficência dos Artistas da Construção Naval, Sociedade Protetora dos Barbeiros e Cabeleireiros, ou, ainda, Sociedade de Socorros Mútuos dos Artistas Sapateiros e Profissões Correlatas. Contudo, a semelhança entre esse tipo de associação e os sindicatos encerrava-se por aí. Enquanto os sindicatos voltavam-se para a conquista de direitos e transformações sociais, as associações mutualistas promoviam assistencialismo e conformismo social. Além disso, as mutuais, em plena época de industrialização, mantinham traços semelhantes aos das antigas irmandades e confrarias religiosas – inclusive evitando os termos “operário” ou “trabalhador”, como pode ser observado na referência a “artistas” em suas denominações. O levantamento dos estatutos também confirma as características, por assim dizer, “coloniais” dessas associações. Em São Paulo, por exemplo, 80% delas tinham como principal objetivo a realização de cerimônias religiosas por ocasião da morte dos associados, comprometendo-se a pagar os custos do carro, caixão, flores, velas, roupas do morto e também indicar o grupo de sócios que acompanharia o esquife. Em outras palavras, enquanto os socialistas e anarquistas voltavam-se para as vitórias terrenas, os mutualistas promoviam a conquista do além.

Outros traços confirmam o perfil arcaico das mutualistas. Muitas delas, apesar de contar com sócios de origem humilde, convidavam ricos comerciantes para participar da diretoria e administração da associação. De forma semelhante às confrarias coloniais, também não se importavam de se subordinar ao Estado em troca de isenção de impostos, autorização para emprestar dinheiro a juros e receber legados testamentários. Sua presença, aliás, não estava necessariamente ligada à prosperidade econômica regional. Tanto é verdade que, em 1889, o Rio Grande do Sul possuía 85 associações mutualistas, enquanto o próspero estado de São Paulo contava com apenas 23; número também inferior às 40 registradas, em fins do século XIX, na Bahia.

O surgimento dos sindicatos, por sua vez, não fazia com que o mutualismo entrasse em declínio. Em 1928, os paulistas contavam com 83 mutuais, número bem superior às 23 existentes em 1889; na capital federal, esse crescimento também foi intenso: as 171 agremiações registradas em 1883 aumentaram para 438 em 1912; por essa época, enquanto os sindicatos cariocas contavam, no máximo, com 70 mil filiados, as mutualistas possuíam cerca de 280 mil associados. Como se vê, as instituições mutualistas eram bem mais representativas que as organizações sindicais. Ao contrário dessas últimas, elas se baseavam em uma prática política avessa ao conflito de classe, ao mesmo tempo em que compartilhavam com os socialistas algumas preocupações, como as de auxílio à saúde e assistência por ocasião da velhice, ou seja, por formas variadas de previdência social. Segundo pesquisas, a partir das décadas de 1930-40, Getúlio Vargas assumirá essas bandeiras, capitalizando para si o apoio de boa parte das camadas populares.

Veja também:


Notas:

  • [1Texto copiado na íntegra (e com adaptações) de: DEL PRIORI, Mary e VENANCIO, Renato. Uma breve história do Brasil. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2010, pp., 165 a 169, Capítulo 24.



Fonte / Referência bibliográfica:

  • DEL PRIORI, Mary e VENANCIO, Renato. Uma breve história do Brasil. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2010.

26 maio 2023

Cristianismo e Cultura

Por W. A. Dyrness [1]


Cultura é um conceito antropológico e está relacionado a toda invenção humana, seja ela material ou imaterial. Mas por sua vez, o homem criador de cultura, é um ser que tem sua origem no processo criativo de Deus. Daí, a importância de se analisar a cultura mais do que puramente antropológica, natural ou cientificamente, também teologicamente.

A cultura foi tema de estudos (dissertações) nossos nas áreas de História e de Teologia. E é nesse sentido que também produzimos vários textos e os publicamos neste blog, por exemplo:

Continuando este assunto, resolvi transcrever o texto abaixo, de W. A. Dyrness [3], no qual ele faz uma análise entre as relações do cristianismo com a cultura, sob a cosmovisão de um teólogo protestante e com um panorama histórico muito importante.


O cristão e a cultura


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As relações entre o cristianismo e a cultura têm variado segundo as circunstâncias e os modos específicos de percepção da cultura. Embora a ciência social moderna nos tenha dado uma compreensão mais pormenorizada da cultura, basicamente nos interessamos pela maneira que a obra divina da redenção – tanto nas Escrituras quanto na História – tem confrontado e transformado a ordem social no seu contexto criado, e também pelas formas de as comunidades crentes encararem o seu meio ambiente e corresponderem a ele. A Igreja confronta estas questões sempre quando procura viver na prática a sua fé e dar um testemunho fidedigno no lugar para onde Deus a chamou.

A palavra "cultura" originalmente referia-se ao cultivo da terra, e nunca perdeu completamente esta harmonia com a produtividade natural. Embora a palavra seja bastante usada de modo mais ligado às belas-artes, a cultura é melhor entendida como o padrão total do comportamento de um povo, e é neste último sentido que a palavra será empregada neste artigo. A cultura inclui todo o comportamento que é aprendido e transmitido pelos símbolos (ritos, artefatos, linguagem etc.) de um grupo especifico, e que se concentra em certas ideias ou pressuposições que chamamos de cosmovisão.


1. Estrutura Bíblica e Teológica

a) Antigo Testamento

A Bíblia não tem palavra correspondente a "cultura" como tal, mas fica claro desde o principio que Deus criou o homem e a mulher como criaturas de cultura. Os capítulos iniciais de Gênesis apresentam a ordem criada como uma comunidade inter-relacionada em que os relacionamentos com Deus, com a terra e com os seres humanos desempenhavam o seu papel. Há uma aliança subentendida entre o homem e Deus que deve ser vivida num contexto social por um povo encaixado na criação. Fica claro que a ordem era boa (Gn 1.31) e que o processo humano de exercer domínio também era bom.

A Queda que acompanhou a rebelião de Adão e Eva contra as instruções de Deus resultou numa comunidade desordeira e numa cultura que refletia a soberba humana (Gn 11.4). A intervenção divina, desde a escolha de Abraão até a libertação do Egito, deve ser vista em termos do propósito de Deus de restaurar e renovar a ordem criada através de um povo que refletisse o Seu caráter.

É um erro ver a Lei como uma expressão do desejo de Deus no sentido que Seu povo tivesse um sistema cultural sem igual. Boa parte da cultura de Israel coincidia com as culturas de outras nações do antigo Oriente Próximo. É verdade que o contato com outras culturas foi proibido quando Israel entrou em Canaã (Js 6.18), mas isto era devido ao fato de aqueles povos estarem sujeitos à ira de Deus por causa das suas iniquidades não por serem estrangeiros.

De fato, os antropólogos que estudam o AT reconhecem que Israel, devido à sua geografia, estava mais exposto às influências dos povos circunvizinhos do que qualquer outra nação antiga. Os estudiosos bíblicos têm começado a apreciar como as práticas bíblicas – e.g., a ornamentação do Templo ou até mesmo a ideia da aliança – têm paralelos estreitos nas culturas vizinhas. Desta forma, no processo da revelação, Deus não Se preocupou em dar ao Seu povo uma cultura especial, mas em intervir e revelar a Sua vontade de modo que instituições e práticas já existentes pudessem ser reformadas e tornar-se veículos apropriados da Sua glória. Isto, naturalmente, importava em proibir muitas coisas dentre as culturas vizinhas, e até mesmo aquelas instituições que Israel tinha em comum com seus vizinhos – tais como o sacerdócio e a monarquia – foram transformadas sob o impacto das instruções de Deus (e.g., Dt 17.14-20).

À medida que Israel prosperou durante a monarquia, esqueceu-se de que suas instituições eram um meio de promover os propósitos de Deus e passou a vê-las como fragilidades em si mesmas, de modo que Deus teve de expulsar Israel da sua terra e mandar habitar no meio de uma cultura estranha. Mesmo ali, Deus prometeu que um Rebento do tronco de Jessé levaria a efeito a renovação de toda a criação (Is 11); enquanto isso, israelitas teriam de procurar a prosperidade da terra onde habitavam (Jr 29.5-7).

b) Novo Testamento

O desejo de Deus de redimir e restaurar os padrões culturais humanos fica subentendido no ministério de Cristo, que veio com uma nítida consciência de estar cumprindo o propósito redentor do AT. Sua obra da nova criação, que abalou a terra, concentrou-se na ressurreição, na ascensão e no Pentecoste, que eram vistos como cumprimentos das promessas veterotestamentárias para a vida e a comunidade segundo Aliança.

A repetida observação de que o NT é indiferente à cultura é aplicável somente no caso de um conceito muito estreito do termo. A experiência que os cristãos têm com Cristo era considerada cheia de grandes implicações para a cultura (cf. o conselho de Paulo a Filemom). E se for levada em conta a visão veterotestamentária da renovação da terra e da humanidade, poderá ser visto que a obra terrena de Cristo deu início a um processo de transformação que será gloriosamente completado quando Ele voltar para julgar o mundo, uma consumação da qual, mediante nossa reação favorável em fé e obediência, já recebemos um antegozo.

Como no AT, o meio ambiente da Igreja no NT era altamente cosmopolitano. A administração romana e a língua e cultura gregas favoreciam o intercâmbio de ideias. Os escritores do NT frequentemente empregavam termos familiares a um amplo espectro de pessoas: João faz uso de palavras tais como logos ou sophia para expressar a realidade transformadora do Verbo que Se fez carne; Paulo demonstra que respeita uma grande variedade de práticas culturais (1 Co 10.23-33; Rm 14; CI 2.16; 1 Tm 4.3-4) para a libertação genuína que advém de estar em Cristo. Não se quer dizer com isto que o evangelho era compatível com todo e qualquer padrão cultural. Havia choques fundamentais com os judaizantes, que insistiam numa cultura judaica para todos os crentes com os gregos, que acreditavam que a sabedoria expressava uma ordem imanente que poderia ser descoberta pela razão humana. Para estes, a vinda de Cristo era o elemento decisivo; um novo sentido foi dado ao testemunho da Lei judaica e à procura grega da sabedoria humana.

2. A Perspectiva Histórica

a) A Igreja Primitiva

A igreja nasceu no meio de tradições intelectuais importantes. Alguns, como Justino Mártir, achavam que a boa cultura era uma reflexão do Logos divino e treinamento preliminar para o evangelho. Outros concordavam com Tertuliano, que insistia em dizer que a cultura era o foco do pecado e que a salvação envolvia uma separação ética das influências circunvizinhas. Mas logo ficou claro que, se a igreja quisesse comunicar a sua fé em termos que o mundo pudesse compreender, ela também, assim como a igreja neotestamentária, deveria fazer uso de expressões contemporâneas. As ideias de infinitude e eternidade, que os gregos relutavam em aplicar a Deus, eram usadas para descrever o Deus dos cristãos; a ideia de uma fonte transcendente de todas as coisas, oriunda do Oriente Próximo, influenciou as formulações posteriores da doutrina da Criação; e o mundo inteligível de Plotino foi usado para descrever a Nova Jerusalém e formular um caminho para Deus a partir do interior. Em outros aspectos, no entanto, como nos conceitos da História e da Providência, o cristianismo rompeu nitidamente com essas influências.

A conversão do Imperador Constantino (312 d.C.) alterou a posição do cristianismo no mundo, ou até o caráter do próprio cristianismo, e tornou possível a identificação de uma civilização especifica com o cristianismo. A tentação era considerar a fé de forma institucional, ao invés de ser o poder de Deus para transformar indivíduos e comunidades. Agostinho forneceu a primeira interpretação geral da história e da cultura em Cidade de Deus. Ali, argumentou que a história envolvia uma luta contínua entre a cidade dos homens, dominada pela cupiditas (ou cobiça), e a Cidade de Deus, governada pelo amor. Com a decadência da cultura clássica, Agostinho veio a sentir certo pessimismo no tocante às realizações humanas e à necessidade de confiar na graça de Deus. A Queda, se- gundo ele acreditava, criou uma divisão dentro da consciência humana, que poderia ser sanada somente pela submissão à Igreja e pela apropriação da sua arte e liturgia como modo de se obter um conhecimento amplo de Deus. A linguagem bíblica figurada passou, então, a tomar o lugar dos Clássicos como a base de uma "cultura crista" (cf. sua Da Doutrina Cristã), lançando, assim, o alicerce para a arte e adoração medievais.

Enquanto isso, os teólogos do leste ressaltavam a terra como um veículo em potencial do Espírito de Deus e viam a redenção em termos da divinização (Atanásio), uma restauração da sua "imagem" de Deus. Esta ideia reconquistou alguns ecos do AT que tinham sido perdidos no Ocidente, e levou às ricas tradições místicas das Igrejas Ortodoxas.

b) A Idade Média

A partir de Agostinho desenvolveu-se o conceito de que tudo na terra se conformava com algum padrão celestial. Bonaventura retratava o mundo como uma estrada que levava a Deus, ao longo da qual cada objeto O revelava. Para Aquino, a cultura como uma reflexão da finalidade natural do homem deve conformar-se à lei natural. Visto que "é natural ao homem ser um animal social e politico", a vida em sociedade é preceituada pela lei natural. A graça, a boa assistência da parte de Deus, aperfeiçoa, ao invés de julgar aquilo que é naturalmente bom, visto que a nossa finalidade está implícita em nossa natureza. Esta opinião compreendia a relevância eterna da realização humana – a nossa obra "dá frutos eternos", conforme a expressão de Dante, na Divina Comédia – mesmo quando reduzia seu significado histórico e, às vezes, causava lealdade não-critica a corporificações específicas da civilização cristã.

c) A Reforma

A crítica decisiva ao conceito medieval da cultura veio com a Reforma. A revolução copernicana e as viagens de descoberta focalizavam as possibilidades da vida terrestre. A cosmovisão medieval estática foi rompida, e os reformadores começaram a definir os propósitos cristãos não em termos de imaginação de algum padrão eterno mas de concretização de um ideal futuro. João Calvino enfatizava as intervenções soberanas de Deus e a vitória definitiva de Cristo que é ressaltada pela ressurreição. A ascensão deixava subentendido que todas as coisas ficam plenas da Sua glória e, portanto, o cristão pode ser otimista no tocante a esta ordem mundial. O reino dinâmico de Cristo avança através da Igreja, a fim de colocar toda a humanidade sob o domínio do evangelho.

Martinho Lutero, por outro lado, reagindo contra as pretensões medievais da cultura cristã, enfatizava o caráter pecaminoso da obra humana e a necessidade da graça. As formas culturais, portanto, não têm valor positivo e servem somente para refrear o mal. O ato espontâneo de amor que Deus produz no crente pode ser levado a efeito em qualquer profissão e, de qualquer maneira, não ficará plenamente manifesto a não ser na volta de Cristo. A Igreja leveda a sociedade, mas sua influência é frequentemente visível somente pela fé.

A corrente radical da Reforma – às vezes chamada anabatismo – retomou linhas ascéticas e perfeccionistas na Igreja, e ressaltava a conversão pessoal e uma comunidade cristã separada. O conceito deles no tocante ao caráter penetrante do pecado, a ênfase na volta iminente de Cristo e, talvez, a condição minoritária fizeram com que se tornassem pessimistas no tocante às possibilidades da cultura humana.

d) O lluminismo

A consciência da Reforma e a ênfase dada pela Renascença ao presente mundo contribuíram juntas para um processo de secularização no Ocidente em que o consenso cristão da Idade Média paulatinamente cedeu lugar aos alvos do estado secular. Os ideais cristãos frequentemente eram influentes na sociedade (como continuam sendo até ao dia de hoje), mas abria-se mão da realidade cristã. Já em fins do séc XVIII, durante o período chamado Iluminismo, o mundo era considerado em terma imanentes; Deus estava distante, sem Se envolver; o homem já se tornara maior de idade. Por trás desta fé subjazia a convicção de que "a situação humana é fundamentalmente caracterizada pelo conflito com a natureza" e não pelo conflito com Deus (H Niebuhr). Além disso, havia plena confiança da vitória nesse conflito, e o caminho ficou aberto para se identificar o cristianismo com a cultura europeia ocidental (e, posteriormente, norte-americana), e para o imperialismo cultural dos séculos XIX e XX.

A ideia de Hegel sobre o desenvolvimento imanente da realidade espiritual na cultura humana marcou uma etapa final da influência do cristianismo sobre a cultura europeia. Pouco depois, Nietzsche proclamou que Deus estava morto e que todos os valores deveriam ser reformulados. Karl Löwith chama o niilismo resultante "a única crença genuína de pessoas cultas", no fim do século XIX.

e) O Período Moderno

A Primeira Guerra Mundial pareceu confirmar o cinismo de Nietzsche, bem como a ausência de todas as influências cristãs sobre a cultura, e esmagou as esperanças de alguns que tinham acreditado na possibilidade da introdução do milênio. Não é de admirar que a maioria dos cristãos adotasse atitudes negativas diante da direção tomada pela cultura ocidental e se satisfizesse em lutar em frentes muito estreitas. Numa das primeiras tentativas de julgar criticamente a cultura moderna pós-cristã, T. S. Eliot argumentou, em 1934, que a literatura moderna era dominada por secularismo e individualismo. Mais recentemente, os evangélicos Francis Schaeffer e H. R. Rookmaaker traçaram a alienação da cultura moderna à capitulação dos valores cristãos desde a Renascença. B. I. Bell e C. S. Lewis descreveram a manipulação e a desumanização que resultaram da moderna sociedade de consumo, com as "sensibilidades famintas" consequentes. De modo mais positivo, Paul Tillich indicou que as formas culturais modernas ainda expressam uma dedicação básica religiosa ou absoluta, que possibilitam uma experiência de profundidade.

A influência do máximo alcance sobre o conceito cristão da cultura desde a Segunda Guerra Mundial tem sido levada a efeito pelo impacto crescente das ciências sociais. Estes estudos nos mostraram que a cultura é mais do que uma cosmovisão intelectual; é também um complexo de símbolos – incluindo objetos, palavras e eventos – por meio dos quais um povo se orienta no mundo. O significado e, portanto, as implicações da dedicação cristã revelam que permeiam a totalidade da cultura humana, possibilitando, assim, uma nova compreensão integral do evangelho. A comunicação transcultural da tem sugerido a necessidade de se aproveitarem os recursos da cultura emissora e da cultura receptora a fim de se obter uma compreensão mais completa da verdade cristã. Em todas as comunidades, há a consciência crescente de que a Palavra de Deus, e não alguma cultura especifica, corrigirá falhas e redimirá aspectos fortes, e toda percepção cultural da verdade cristã e das Escrituras pode ser usada para enaltecer a nossa compreensão do evangelho "até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus" (Ef 4.13).

3. A Tipologia

A história do encontro entre o cristianismo e a cultura demonstra certas reações típicas que refletem várias ênfases teológicas e contingências históricas. Correndo o risco de fazer divisões arbitrárias, podemos sugerir três conceitos típicos que têm sido influentes no pensamento evangélico.

a) O Anabatista

No decurso da história da cristandade uma corrente radical e rigorosa apareceu, enfatizando a natureza decaída desta ordem mundial e a necessidade de se criarem estruturas alternativas que sigam mais de perto o modelo do Senhor crucificado da Igreja. Tal conceito, que achou sua expressão mais clara na Reforma radical, tem continuado a influenciar os cristãos através das igrejas dentro dessa tradição e dos muitos grupos pietistas que compartilham desse mesmo espírito. Uma expressão extremada desse ponto de vista está em Watchman Nee, que acreditava que a salvação envolvia a separação total entre o crente e o sistema deste mundo. O cristão vive no mundo como num ambiente estranho – como um mergulhador na água – e assim deve desenvolver uma atitude de desprendimento. A obra terrena do cristão sempre está sujeita à sentença da morte: sua única esperança é ser finalmente libertado por Deus. Um proponente mais moderado deste conceito é Jacques Ellul, que argumentava que a civilização espera numa nova obra de Deus mediante a qual a Nova Jerusalém tomará o lugar desta cidade caída. Enquanto isso, continuamos a trabalhar, conscientes de que "estamos participando de uma obra de morte que está sob a maldição". Uma expressão mais positiva e influente desta tendência é oferecida por J. H. Yoder. Segundo Yoder, Jesus veio levar a efeito uma revolução social por meio da formação de uma nova comunidade voluntária, ao invés de um encontro com as autoridades. Cristo fundou uma nova ordem com padrões alternativos de liderança e estilo de vida que acabarão condenando e substituindo a velha ordem moribunda. O caminho da cruz, Yoder acredita, é uma "alternativa tanto a insurreição quanto ao quietismo". Este conceito tem dado expressão nítida aos elementos apocalípticos e transcendentes do cristianismo, e muitos dos seus representantes têm exercido uma forte influência profética, embora tenham hesitado em ocupar-se em esforços públicos ativos para melhorar as condições existentes.

b) O Conceito Anglo-Católico

Outros cristãos têm insistido mais na distribuição entre as esferas da graça e da natureza. Continuando a tradição medieval, pensadores com esta tendência acreditam que a área da cultura humana é indiferente aos valores religiosos. J. H. Newman deu expressão clássica a este conceito há um século, quando declarou que a cultura tem valor no seu próprio nível (natural), mas não pode ser o ambiente da virtude: "O cultivo intelectual não é a causa, nem o antecedente apropriado, de qualquer coisa sobrenatural". No presente século, C. S. Lewis adotou um ponto de vista semelhante. Ele acredita que o NT é inconfundivelmente frio na sua maneira de tratar a cultura, sendo que é necessário descartá-la no momento em que entra em conflito com o serviço de Deus. O bem da cultura pode formar uma analogia com o bem cristão, mas não é a mesma coisa – Lewis confessa não saber como se pode harmonizar bens espirituais e culturais. Estes pensadores dão, com toda a razão, prioridade aos valores espirituais, mas não conseguem sugerir perspectivas criticas formadas pela verdade cristã e, portanto, tendem a apoiar o status quo cultural.

c) O Conceito Reformado

Desde Justino Mártir têm havido cristãos com a convicção de que a cultura pode ser levada cativa ao senhorio de Cristo. Enfatizando o poder criador de Deus e a obra vitoriosa de Cristo, estes pensadores tendem a ser mais otimistas no tocante às estruturas humanas, pois têm a impressão que por mais iníquas e depravadas que certas instituições talvez pareçam ser, elas não estão fora do alcance da soberania de Cristo. Calvino deu expressão clássica a esta posição, e tem sido seguido pela tradição do cristianismo reformado e presbiteriano. No início do século XX, Abraham Kuyper expressou de modo conciso este ponto de vista, que coloca a glorificação do próprio Deus no centro do pensamento cristão a respeito da cultura. Toda a labuta humana exibe coletivamente a imagem de Deus e, mediante a graça geral, é dada para honrar a Cristo, o mediador da Criação. A cultura, portanto, pode ser o meio de controle da influência do pecado e, por causa da obra de Cristo que restaura a criação dentro das suas próprias raízes, pode começar a refletir o triunfo do reino restaurado de Cristo, que será consumado na Segunda Vinda. Kuyper acredita que o desenvolvimento genuíno na sociedade transbordará para a eternidade (Ap 21.24), embora os últimos dias tenham de demonstrar uma apostasia nas coisas espirituais. Este conceito tem tido muita influência nas sociedades onde se faz presente, e exibe uma ênfase atraente ao senhorio de Cristo e à realidade do Seu reino; sua fraqueza tem sido uma tendência ao triunfalismo que subestima o poder e a extensão da iniquidade.

Conclusão Teológica

Com base nas evidências examinadas, é possível sugerir algumas diretrizes para uma abordagem cristã à cultura? Alguns concordam com H.R Niebuhr em que as relatividades da nossa fé e da nossa posição sugerem que deixemos abertas as nossas opções. Certos parâmetros bíblicos, no entanto, podem ser oferecidos. Os evangélicos têm se preocupado, com razão, em evitar que as influências culturais não desafiem nem diluam a autoridade de Cristo e da Sua Palavra. Mas é claro que este problema não pode ser resolvido ao se evitar a cultura; é impossível dedicar-se a Cristo em isolamento da nossa cultura. Alguma medida de solidariedade com nosso meio ambiente é inevitável; somos produtos dele e, como cristãos, somos responsáveis diante dele para pensarmos sal e luz. Além disso, o pecado é a rebelião contra Deus e Sua Palavra, de modo que a luta básica na cultura não é contra a natureza, mas contra as forças do mal. Segue-se que não podemos evitar a batalha em prol da justiça na esfera cultural. Conforme Milton: "Ser ingênuo e ignorante no tocante às opções morais é uma coisa; uma outra coisa bem diferente é ter consciência das opções e escolher a obediência a Deus". A pureza visível, pois, embora provenha de Deus, não pode ser concretizada senão mediante provações, e as provações provêm daquilo que é contrário.

A necessidade básica para os cristãos no decurso das eras tem sido uma fé suficientemente grande para incluir a totalidade dos elementos bíblicos – que vê Deus como Criador e Sustentador; que honra a Cristo como Logos e Senhor; e que vê na redenção tanto a reconciliação do pecador quanto a renovação da ordem criada. Esta atitude leva um otimismo realista, porque a dedicação a Deus liberta-nos da subserviência aos princípios menos importantes e ajuda-nos a mantê-los na sua perspectiva correta. A Escritura é a norma para todos os povos e todos os tempos, mas o elemento supracultural sempre deve ser expresso em alguma forma cultural especifica, mesmo que tais formas sejam transformadas à medida que o Espirito Santo aplica a realidade do reino. Por ora, em nossas famílias e comunidades, oremos para termos o prazer da criança, que fica atônita simplesmente por existir, e a sabedoria do erudito, a fim de discernirmos a verdade e batalharmos por ela. Porque as "pequenas ações de pequenos homens e pequenas mulheres, todas incompletas e imperfeitas..., são cruciais e têm seu lugar nos grandes planos de Deus" (H. R. Rookmaaker).

Fonte:

DYRNESS, William A. Cristianismo e Cultura. Apud: Enciclopédia Histórico-Teológica. Editor Walter A. Elwell. Vol. I. São Paulo: Vida Nova: 1988, Pág. 375 a 380.

Notas:

  • [1William A. DYRNESS “… é  um teólogo americano e professor de teologia e cultura no Seminário Teológico Fuller . Ele ministra cursos de teologia, cultura e artes e é membro fundador do Brehm Center… Dyrness trabalha na interseção da teologia reformada, evangélica, global e ecumênica. Suas numerosas publicações podem ser caracterizadas como uma tentativa de lidar com o encontro dramático entre a fé e a cultura humana” (Wikipedia: William Dyrness )”. Acesso em: 25/05/2023. 
  • [3Texto copiado na íntegra, com algumas adaptações e aplicado ao Novo Acordo Ortográfico Brasileiro..