Translate

Mostrando postagens classificadas por data para a consulta ópio do povo. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens classificadas por data para a consulta ópio do povo. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens

26 de março de 2025

Cristianismo e Socialismo: como compatibilizar?

 

Bandeira do Socialismo Cristão [1]


Ouça o artigo: 000 (via Clipchamp/Dropbox)...


O socialismo é uma corrente política e um sistema socioeconômico no qual a produção e a distribuição dos produtos é planejada com vistas a atender, pelo menos na teoria, as necessidades básicas da população. O socialismo pode ser dividido em três segmentos: utópico, cujos pensadores como Charles Fourrier (1772-1837) e Robert Owen (1771-1858), foram assim chamados porque a maioria de seus planos era irrealizável (utópico); científico, atribuído a Karl Marx (1818 – 1883) e Friedrich Engels (1820 – 1895) que consideravam sua doutrina científica por terem chegado a ela através de análises críticas do desenvolvimento das sociedades humanas; e cristão, cujo precursor foi o sacerdote francês Robert Lamennais (1782 – 1854). Mas o principal personagem desta linha que queremos destacar é Henri Saint Simon, o qual destacaremos abaixo. 


1. Saint-Simon e o socialismo cristão [2]


O reformador social Henri de Saint-Simon (1760-1825) foi um pensador e teórico social francês. Também conhecido como socialista utópico, foi ele quem tentou aplicar os princípios sociais do cristianismo, criando o conceito “socialismo cristão”. Ele predisse uma era muito mais industrializada na qual os problemas sociais seriam resolvidos pela ciência e tecnologia. Foi só mais tarde que ele introduziu uma nota religiosa. Seu Nouveau Christianisme ("Novo Cristianismo") publicado no ano da sua morte, sustentava que a religião devia "guiar a comunidade em direção ao alvo sublime de melhorar tão rapidamente quanto possível as condições de vida da classe mais pobre". Tendo visto aquilo que a França sofreu, primeiramente sob a Revolução com toda a sua ferocidade, e depois sob o governo de Napoleão, conclamou todos os governantes da Europa a se unirem visando a supressão da guerra, e a voltarem para aquele cristianismo verdadeiro que se preocupa com a situação miserável dos pobres. As opiniões de Saint-Simon eram frequentemente desordenadas e imprecisas, mas passaram a influenciar uma combinação improvável de pensadores que incluíam Thomas Carlyle, John Stuart Mill, Heinrich Heine, Auguste Comte, Friedrich Engels e Walter Rauschenbusch, e posteriormente foram ecoadas nas obras dos teólogos norte-americanos mais recentes, tais como Paull Tillich e Reinhold Niebuhr.

Além de exercer um impacto na França, o socialismo cristão era uma força real em muitos outros países europeus, e fomentava a organizações de grupos, sustentando que o operário e o lavrador tinham direito à justiça social e econômica, e que estas eram áreas nas quais os cristãos deviam ser ativos. Na Alemanha, desviou-se tristemente para o antissemitismo que resultou na condenação imperial em 1894. Cinco anos antes, a Sociedade dos Socialistas Cristãos tinha sido formada nos Estados Unidos, mas a ideia estava presente desde 1849, quando Henry James, Sr. expôs princípios semelhantes.

O termo "socialismo cristão" foi popularizado na Inglaterra nos meados do século XIX quando, depois do fracasso do movimento cartista, um grupo de anglicanos procurou obter a aplicação dos princípios cristãos na organização da indústria. Seus líderes foram J. M. F. Ludlow (que fora educado na França), J. F. D. Maurice e Charles Kingsley. Eles ajudaram a financiar sociedades cooperativas, deram início a associações para vários ofícios, e em 1854 fundaram a Faculdade dos Trabalhadores em Londres, tendo Maurice como presidente. As novelas de Maurice, especialmente Yest (“Levedura”) e Alto Locke (publicadas em 1850), desempenharam um papel considerável num movimento que, no entanto, nunca cativou a igreja inglesa, e que logo entrou em declínio. Nem por isso deixou de legar à posteridade princípios e práticas que beneficiaram uma ampla gama de interesses sociais, inclusive cooperativas, institutos educacionais para operários e sindicatos trabalhistas.


2. Como um cristão deve encarar o socialismo?[3]


O socialismo é um sistema social no qual a propriedade, os recursos naturais e os meios de produção são de propriedade e controlados pelo estado, em vez de indivíduos ou empresas privadas. Uma crença básica do socialismo é que a sociedade como um todo deve compartilhar todos os bens produzidos, pois todos vivem em cooperação uns com os outros. Várias teorias do socialismo foram apresentadas desde os tempos antigos, incluindo uma forma de socialismo cristão.

O filósofo mais proeminente a argumentar a favor do socialismo foi Karl Marx, que ensinou que o fator motriz por trás de toda a história humana é a economia. Marx nasceu de pais judeus alemães em 1818 e recebeu seu doutorado aos 23 anos. Ele então embarcou em uma missão para provar que a identidade humana está ligada ao trabalho de uma pessoa e que os sistemas econômicos controlam totalmente uma pessoa. Argumentando que a humanidade sobrevive pelo trabalho, Marx acreditava que as comunidades humanas são criadas pela divisão do trabalho.

Marx viu a Revolução Industrial como uma mudança no estilo de vida básico da humanidade, porque, na mente de Marx, aqueles que trabalhavam livremente para si mesmos agora eram forçados pela economia a trabalhar em fábricas. Isso, Marx sentiu, tirou sua dignidade e identidade, e agora eles foram reduzidos a meros escravos controlados por um poderoso capataz. Essa perspectiva fez da economia do capitalismo o inimigo natural da marca de socialismo de Marx.

O socialismo busca acabar com a propriedade privada. Karl Marx supôs que o capitalismo enfatiza a propriedade privada e, portanto, reduziu a propriedade a poucos privilegiados. Duas "comunidades" separadas surgiram na mente de Marx: os empresários, ou a burguesia; e a classe trabalhadora, ou o proletariado. De acordo com Marx, a burguesia usa e explora o proletariado com o resultado de que o ganho de uma pessoa é a perda de outra. Além disso, Marx acreditava que os empresários influenciam os legisladores para garantir que seus interesses sejam defendidos em vez da perda de dignidade e direitos dos trabalhadores. Por fim, Marx sentiu que a religião é o "ópio das massas", que os ricos usam para manipular a classe trabalhadora; o proletariado recebe a promessa de recompensas no céu um dia se continuar trabalhando diligentemente onde Deus os colocou (subservientes à burguesia).

No socialismo que Marx imaginou, o povo possui tudo coletivamente, e todos trabalham para o bem comum da humanidade. O objetivo de Marx era acabar com a propriedade privada por meio da propriedade estatal de todos os meios de produção econômica. Uma vez que a propriedade privada fosse abolida, Marx sentiu que a identidade de uma pessoa seria elevada e o muro que o capitalismo supostamente construiu entre os proprietários e a classe trabalhadora seria quebrado. Todos se valorizariam e trabalhariam juntos para um propósito compartilhado. O governo não seria mais necessário, pois as pessoas se tornariam menos egoístas.

Há pelo menos quatro erros no pensamento de Marx, revelando algumas falhas no socialismo. Primeiro, sua afirmação de que o ganho de outra [uma] pessoa deve vir às custas de outra pessoa é um mito; a estrutura do capitalismo deixa muito espaço para todos elevarem seu padrão de vida por meio da inovação e da competição. É perfeitamente viável que várias partes compitam e se saiam bem em um mercado de consumidores que querem seus bens e serviços.

Segundo, Marx estava errado em sua crença socialista de que o valor de um produto é baseado na quantidade de trabalho que é colocado nele. A qualidade de um bem ou serviço simplesmente não pode ser determinada pela quantidade de esforço que um trabalhador despende. Por exemplo, um mestre carpinteiro pode fazer uma peça de mobiliário mais rápida e lindamente do que um artesão não qualificado e, portanto, seu trabalho será muito mais valorizado (e corretamente) em um sistema econômico como o capitalismo.

Terceiro, a teoria do socialismo de Marx necessita de um governo livre de corrupção e nega a possibilidade de elitismo dentro de suas fileiras. Se a história mostrou alguma coisa, é que o poder corrompe a humanidade caída, e o poder absoluto corrompe absolutamente. As pessoas não se tornam naturalmente menos egoístas. Uma nação ou governo pode matar a ideia de Deus, mas alguém tomará o lugar de Deus naquele governo. Esse alguém é, na maioria das vezes, um indivíduo ou grupo que começa a governar a população e busca manter sua posição privilegiada a todo custo. É por isso que o socialismo levou a ditaduras com tanta frequência na história mundial.

Quarto e mais importante, o socialismo está errado ao ensinar que a identidade de uma pessoa está ligada ao trabalho que ela faz. Embora a sociedade secular certamente promova essa crença, a Bíblia diz que todos têm o mesmo valor porque todos são criados à imagem do Deus eterno. O verdadeiro valor humano intrínseco está na criação de nós por Deus.

Marx estava certo ao dizer que a economia é o catalisador que impulsiona a história humana? Não, o que dirige a história humana é o Criador do universo que controla tudo, incluindo a ascensão e queda de cada nação. Deus também controla quem é colocado no comando de cada nação: “O Altíssimo governa o reino dos homens, e o concede a quem quer, e constitui sobre ele o mais humilde dos homens” (Daniel 4.17). Além disso, é Deus quem dá a uma pessoa habilidade no trabalho e a riqueza que vem dele, não o governo: “Aqui está o que vi ser bom e apropriado: comer, beber e divertir-se em todo o seu trabalho em que se esforça debaixo do sol durante os poucos anos de sua vida que Deus lhe deu; porque esta é a sua recompensa. Além disso, quanto a todo homem a quem Deus deu riquezas e bens, também lhe deu poder para comer delas, e receber a sua recompensa, e alegrar-se no seu trabalho; este é o dom de Deus” (Eclesiastes 5.18-19).

O socialismo, apesar de toda sua popularidade em alguns círculos, não é um modelo bíblico para a sociedade. Em oposição ao socialismo, a Bíblia promove a ideia de propriedade privada e emite comandos para respeitá-la: comandos como “Não furtarás” (Deuteronômio 5.19) não têm sentido sem propriedade privada. Ao contrário do que vemos em experimentos fracassados ​​no socialismo, a Bíblia honra o trabalho e ensina que os indivíduos são responsáveis ​​por se sustentarem: “Quem não quer trabalhar não coma” (2Tessalonicenses 3.10). A redistribuição de riqueza fundamental para o socialismo destrói a responsabilidade e a ética bíblica do trabalho. A parábola de Jesus em Mateus 25.14-30 ensina claramente nossa responsabilidade de servir a Deus com nossos recursos (privados).


Notas:

  •  [2] DOUGLAS, J. D. Socialismo Cristão (Texto na íntegra, adaptado). Ver R. B.
  •  [3] GOT QUESTIONS. Socialismo-Christian (Texto na íntegra, adaptado). Ver R. B.

Referências bibliográficas:

  • DOUGLAS, J. D. Socialismo Cristão. In: ELLWELL, Walter A (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1990. Pg. 410.

18 de junho de 2024

Marxismo e Fé cristã: dialética

Por: Alcides Amorim



A palavra dialética, conforme costuma-se definir no campo da Filosofia, significa o "caminho entre as ideias" e “… consiste em um método de busca pelo conhecimento baseado na arte do diálogo. É desenvolvida a partir de ideias e conceitos distintos e que tendem a convergir para um conhecimento seguro” [1]. Este “conhecimento seguro” só será possível após diversos diálogos, incluindo os prós e os contras, discussões gerais e finalmente, a chegada a um consenso ou essência do saber do objeto ou ideia em questão. Mas longe de dar um veredito final ao resultado do objeto estudado, a dialética propõe “... um modo de pensar que, ao privilegiar as contradições da realidade, permite que o sujeito se compreenda como agente e colaborador do processo de transformação constante através do qual todas as coisas existem…” (KONDER: 1998)[2].

A dialética, que teve sua origem na Grécia Antiga, ou com Zenão de Eleia (c. 490-430 a.C.) ou com Sócrates (469-399 a.C.), tem estado a serviço da Filosofia na Antiguidade, Idade Média, Moderna e Contemporânea. Para os objetivos deste post, fixamos apenas nos pensamentos de Hegel e Marx. Com Hegel (1770-1831), segundo o qual, a filosofia veio a ser um tipo de teologia, a sua dialética também seguia por este caminho. Hegel percebe que a realidade restringe as possibilidades dos seres humanos, que se realizam como uma força da natureza capaz de transformá-la a partir do trabalho do espírito. Sua dialética compunha de três elementos: a tese, a antítese e a síntese. A tese é a afirmação inicial, a proposição que se apresenta; a antítese é a refutação ou negação da tese, considerando a contraditoriedade daquilo que foi negado; e a síntese é composta a partir da convergência lógica (lógica dialética) entre a tese e sua antítese. Essa síntese, entretanto, não assume um papel de conclusão, mas sim como uma nova tese capaz de ser refutada dando continuidade ao processo dialético…

A dialética hegeliana enquanto teoria do conhecimento é aprofundada pelo marxismo. Aqui o conhecimento é totalizante. Karl Marx (1818-1883) concorda com Hegel no aspecto do trabalho como força humanizadora. Entretanto, para ele o trabalho dentro da perspectiva capitalista, pós-revolução industrial assume um caráter alienante.

Marx defendeu que vivemos em um mundo onde tudo é material, não havendo o sobrenatural. Assim, são abolidas as noções espirituais e o transcendente. A sociedade passa a ser explicada apenas em um ciclo de classes opressoras e oprimidas. Defendendo a materialidade de tudo, os valores morais também são reduzidos à materialidade, importando apenas os bens econômicos. Não há respeito à dignidade única de cada pessoa, sua liberdade, vida e escolhas.
O comunismo seria um paraíso terrestre, uma sociedade idealizada. Em prol de um futuro idealizado, sacrifica-se o presente[3].

O marxismo procura ser científico, tentando não depender de uma filosofia. Acontece que não consegue escapar de uma escolha filosófica prévia que por sua vez informa todo seu desenvolvimento científico posterior. E esta escolha é um ato de fé que corresponde ao ato de fé daquele que se vira para Cristo, mas o dogmatismo marxista não permite outra solução a não ser aquela aventurada por Marx. Os marxistas fazem uma crítica cerrada àqueles que aceitam a Bíblia (ou a tradição eclesiástica) como ponto de partida para sua fé. No entanto, os ideólogos marxistas citam os escritos de Marx e Engels como se fossem uma revelação divina.

A critica de Marx à religião como “começo de toda crítica”, e expressa na conhecida frase “A Religião é o Ópio do Povo”, é uma orientação antirreligiosa que o torna, sim, segundo Fulton J. Sheen, o Comunismo no “ópio do povo”. Marxistas esperam que o povo troque a religião pelo marxismo através da revolução cultural.

O Comunismo engana o pobre com a esperança falaz de um paraíso terrestre…
O Comunismo é o ópio do povo porque adormece os pobres prometendo-lhes algo que nunca lhes pode dar, ou seja um paraíso terrestre. Mudando apenas uma palavra numa sentença de Lenine: ‘O Comunismo ensina aqueles que labutam toda a sua vida em pobreza a serem resignados e pacientes neste mundo, e consola-os pelo pensamento de um paraíso terrestre’. Singular espécie de paraíso esse, que é inaugurado pelo morticínio, pelo exílio e pelo confisco; estranha espécie de paraíso esse, que espera estabelecer a fraternidade pregando a luta de classes, e estabelecer a paz praticando a violência. Estranha espécie de paraíso esse que tem de recorrer ao temor e à tirania para impedir que alguém ‘escape’ dele[4].

Portanto, como vimos aqui, a ideologia e a dialética marxistas estão intimamente interligadas ao saber numa autorreflexão hegeliana, embora encaixadas dentro do esquema materialista.

Infelizmente, há uma grande quantidade de “cristãos” achando que é possível ser cristão e comunista ao mesmo tempo. Como abrimos o post acima, pode ser que o comunismo esteja neste mundo hoje porque os cristãos não foram suficientemente cristãos e as democracias não foram suficientemente democráticas”, já dizia Martin Luther King.

E para concluir, veja o vídeo a seguir:


Veja também:


Notas / Referências bibliográficas:

  • [4] dem.


30 de maio de 2024

Marxismo e fé cristã: ideologia

Por Alcides Amorim


Em seu trabalho o marxismo e a fé cristã, o escritor J. Sturz divide o seu estudo em três partes importantes: os conceitos marxistas (ideologia, dialética, a história e o homem); Marx e a religião (a irreligião marxista, evangelho segundo Marx e diálogo marxista-cristão) e marxismo e teologia. Nosso propósito aqui, e em outros posts (esperamos poder publicar) é refletir sobre os sub-temas do referido trabalho escrito no início dos anos 80 e que ainda julgamos relevantes para nossos dias, obviamente com outros ingredientes complementares. O primeiro deles é a ideologia.

Como definição de ideologia podemos citar o que é dito aqui, como sendo ela “… um termo que possui diferentes significados e duas concepções: a neutraum… conjunto de ideias, de pensamentos, de doutrinas ou de visões de mundo de um indivíduo ou de um grupoe a críticaque… pode ser considerado um instrumento de dominação que age por meio de convencimento (persuasão ou dissuasão, mas não por meio da força física) de forma prescritiva, alienando a consciência humana”.

Sturz diz que os conceitos marxistas ideologia e dialética estão inter-relacionados e estão ligados ao saber baseados numa auto-reflexão hegeliana. Mas sobre este último queremos falar num outro momento. Como fazia com outros conceitos relacionadas ao saber, Marx tentava encaixar suas ideias dentro do esquema materislista, ou seja, tentava separar as ideias da realidade histórico-social. Para Marx, “… a classe dominante impõe suas ideias através da escola, da religião, dos costumes ao ponto de que são consideradas verdadeiras, universais quanto à humanidade. Esta classe desenvolveu-se junto com suas ideias dentro de um modo de produção" [1]. Para desfazer a ideologia da classe dominante, Marx propõe uma revolução da classe oprimida contra a classe opressora. E a nova classe emergente, depois de sistematizar suas ideias, diferentes da existente e de acordo com seus interesses, precisam ganhar o apoio de toda sociedade. Sturz cita Marilena Chauí e destaca que a ideologia marxista não está encarregada de “tomar o lugar” da prática, nem de “guiar” a prática e nem tampouco de se “inutilizar enquanto teoria” para valorizar apenas a prática (Idem, pág. 210). Segundo esta linha de raciocínio marxista, as “… ideologias podem não ser consideradas visões de mundo… porque grande parte dos ideólogos propõe transformações sociais ao invés de uma teoria que tente explicar a realidade”. Ou seja, Karl Marx entende que ‘Os filósofos têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo’” [2].

Mas será que o marxismo escapa de ser ou ter uma ideologia?, pergunta Sturz. Na verdade, “… o marxismo, longe de ser apenas uma análise de fatos concretos, torna-se bandeira de ideias para fazer a realidade depender delas. De símbolos estas ideias se tornaram verdadeiros ídolos…” [3].

Ampliando este raciocínio, vejamos o estudo da Brasil Paralelo sobre o assunto: “Marx acreditava que a burguesia criava ideias ilusórias, como a religião, para enganar as outras classes e conseguir dominá-las mais facilmente. Ele chamava as supostas ideias falsas da burguesia de ideologia. Contudo, as características das teorias de Marx são semelhantes às da ideologia de Destutt [4], especialmente devido as influências iluministas nas obras de ambos"A Brasil Paralelo destaca ainda as características de uma ideologia:

  • Reducionismo da realidade: os ideólogos observam a realidade a partir do que pensam, fechando-se a tudo o que a realidade apresenta e que está fora da sua linha de pensamento.

  • Formação de um governo extremista: “Uma vez que a sociedade perfeita pode ser formada, o governo ideológico se vê no direito de eliminar aqueles que atrapalhem tamanho bem aparente, já que não existe uma punição além da terrena”.

  • Rechaço contra religiões transcendentais: os ideólogos (marxistas) acreditam que conseguem gerar uma civilização perfeita na Terra com seus próprios esforços, ao contrário da maioria das que religiões acreditam que a vida perfeita está para além deste mundo.

  • Formação de uma religião imanentista: para os comunistas, após viver a doutrina marxista e conseguir a conversão de um número de pessoas adequado, a revolução seria feita e o paraíso seria atingido.

Ao analisarmos as características acima, podemos dizer que os conservadores (não conservadoristas, pois assim se tornariam também ideólogos) pensam o contrário disso. Entender o oposto do que é ideologia pode auxiliar na melhor compreensão de seu conceito através da observação da realidade. Essa observação gera a construção de teorias e a descoberta de postulados, mas que não esgotam toda a existência. De forma coerente, a BP propõe os pensamentos de Tomás de Aquino e de Aristóteles como exemplos de ideias antagonistas das ideologias. Assim, os conservadores procuram entender o conceito mas rejeitam a qualificação de conservadorismo como bandeira ideológica, evitando assim, que seu pensamento venha a tornar-se num código rígido e dogmático de pensamento politizado.

E por que devemos rejeitar o marxismo? Por conta do enfoque idolátrico que aparece quando procura tornar um elemento apenas natural em absoluto. Neste afã, Marx desenvolve “três teorias”[5] que se tornam ídolos:

  • o materialismo dialético (a evolução humana, relações sociais determinadas pelas classes e os pensamentos humanos representam apenas estas classes);

  • um otimismo que vê solução de todos os problemas na marcha histórica; e

  • um humanismo religioso que encarrega o homem de sua própria salvação.

Como os ídolos são espécies de deuses que ocupam o lugar do verdadeiro Deus, as teorias marxistas tornam seus adeptos em verdadeiros “crentes” em Marx e suas ideias. Se a ideologia, segundo Marx “mascara a realidade social”, e toma o “falso por verdadeiro e o injusto por justo[6]", podemos interpretar, à luz Bíblia e da teologia cristã, de forma invertida estas palavras, isto é, afirmarmos o contrário: chamarmos de “treva” o que o marxismo chama de “luz”; de “falso” o que é entendido como “verdadeiro”, de “injusto” ao invés de “justo” e assim por diante.

Embora o marxismo não crê em nenhum elemento sobrenatural (metafísico), seu sistema tornou-se um verdadeiro dogma no sentido de que suas ideias (teorias, argumentações…) estejam colocadas acima de qualquer outro modo de pensar. E entendido sua ideias como verdades, os comunistas/marxistas tornam-se exclusivistas e não aceitam ser contraditados. É por isso que Marx defendia a implantação violenta do comunismo, inclusive a destruição do Cristianismo, esta ou qualquer outra religião é o “ópio do povo”. Veja o vídeo sugerido abaixo.

Um paralelo entre Comunismo e Cristianismo [7] sobre as várias situações da vida caracterizam bem as diferenças entre ambos:


    Comunismo: para o comunista...

    Cristianismo: para o cristão...

  • O homem não é livre, porque a sua iniciativa vem de fora, isto é, do Partido, que dita não somente o que ele deverá fazer, mas também o que deverá pensar. Ele é como o leme de um navio, que vai para onde quer que o dirija o comandante, que é o ditador do Partido.

  • O homem é livre, porque a sua iniciativa vem de dentro, a saber, da sua alma. Ele pode ser comparado a um capitão de navio, que é livre de traçar o seu próprio curso e de escolher o seu próprio porto.

  • O homem é um objeto. Um objeto não pode agir, mas é acionado como um autômato social, e torna-se como o cinzel na mão de um escultor.

  • O homem é um sujeito. Um sujeito pode determinar suas ações, como o artista pode livremente pintar quaisquer pinturas que escolher.

  • Só há uma espécie de unidade — a unidade político-econômica, que é realizada não de dentro, por laços espirituais, mas de fora, pela força, pelo terror e pela propaganda.

  • Há duas espécies de unidade: unidade político-econômica, e unidade orgânico-espiritual, pela qual nós somos membros uns dos outros no Corpo Místico de Cristo.

  • O homem é cidadão de um só mundo, e, desde que o Estado é tudo, daí se segue que o homem não tem direitos salvo aqueles que o Estado lhe deu. Por conseguinte, quando o entender, pode o Estado tirar-lhe esses direitos.

  • O homem é um cidadão de dois mundos8, e, em virtude do segundo, ele possui certos direitos inalienáveis, tais como a vida, a liberdade e a propriedade, dos quais nenhum Estado pode privá-lo.

  • A personalidade é relacionada ao tempo. O homem é alienado da sua humanidade no presente, para atingir uma humanidade duvidosa num paraíso terrestre no futuro. Tal como o expõe Lenine: “Durante o período da ditadura em que não haveria liberdade, o povo acostumar-se-ia às novas condições e sentir-se-ia livre numa sociedade comunista" (O Estado e a Revolução).

  • O homem existe não somente no presente, mas também no futuro. A personalidade é independente do tempo, porque tem um valor intrínseco em todos os tempos.

  • O homem é determinado pela sociedade… e nela perde a sua identidade como uma gota de água perde a sua identidade num copo de vinho...

  • O homem deve determinar a natureza da sociedade e ser o senhor desta.

Portando, quem estuda a Bíblia e à luz desta analisa o marxismo, torna-se (espera-se) anti-comunista ou evita ser comunista. E mesmo sem a Bíblia, na opinião de Reagan, como mencionamos na imagem acima, "Os comunistas são as pessoas que leram Marx e Engels, os anti-comunistas são aqueles que entenderam."

Veja mais:

Sobre os dogmas marxistas, que fazem desta ideologia “quase” uma verdadeira religião, veja o vídeo a seguir:



Notas:

  • [1] In: BROWN, Colin. Filosofia e fé cristã. São Paulo: Vida Nova: 1985, pág. 209.
  • [2] 000 O que é ideologia. Disponível em: <https://www.brasilparalelo.com.br/artigos/o-que-e-ideologia>. Acesso em: 23/05/2024.
  • [3BROWN: 1985, pág. 210.
  • [4Antoine Destutt de Tracy (1754-1836), considerado o “pai” do termo ideologiaFilósofo iluminista francês, cunhou o termo no final do século XVIII para designar aquilo que ele acreditava ser a “ciência das ideias”. Disponível em: <https://www.cafehistoria.com.br/o-pai-do-termo-ideologia/>. Acesso em 24/05/2024.
  • [5Idem, pág. 210.
  • [6In: Nota 2. 
  • [8] Sugiro a leitura e o vídeo sobre A aposta de Pascal...aqui.