Por: George Orwell [1]
In: Gazeta do Povo [2]
Capítulo X [3]
Os anos se passaram. As estações chegavam e partiam e as vidas curtas dos animais passavam voando. Chegou o tempo em que mais ninguém se lembrava dos velhos tempos antes da Revolução, exceto Esperança, Benjamim, Moisés, o corvo, e alguns dos porcos.
Muriel tinha morrido; Mimi, Lulu e Pipa tinham morrido. Jones também estava morto – ele havia morrido em um lar para alcoólatras em outro canto do país. O Bola de Neve foi esquecido. Golias foi esquecido, exceto pelos poucos que o conheceram. Esperança era agora uma égua velha e robusta, com articulações rígidas e com uma tendência a ter remelas nos olhos. Ela já tinha passado dois anos da idade de aposentadoria, mas na verdade nenhum animal jamais chegou a se aposentar. A conversa de reservar um canto do pasto para animais velhos já havia sido abandonada há muito tempo. Napoleão era agora um javali maduro de cento e cinquenta quilos. O Berro estava tão gordo que mal conseguia enxergar através do espaço que suas bochechas deixavam para os olhos. Apenas o velho Benjamin era quase o mesmo de sempre, exceto por ter mais pelos cinzas ao redor do focinho e, desde a morte de Golias, ter ficado mais rabugento e casmurro do que nunca.
Agora a fazenda tinha bem mais criaturas, embora o aumento não tenha sido tão grande como se esperava em anos anteriores. Para muitos dos animais jovens, a Revolução não passava de uma tradição confusa, transmitida de boca a boca, enquanto outros animais comprados nunca tinham ouvido falar sobre a Revolução antes de chegarem lá. A fazenda possuía agora três cavalos além da Esperança. Eram animais de bem, trabalhadores dispostos e bons camaradas, mas muito estúpidos. Nenhum deles se mostrou capaz de aprender o alfabeto além da letra B. Eles aceitaram tudo o que lhes foi dito sobre a Revolução e os princípios do animalismo, especialmente pela Esperança, por quem tinham um respeito quase filial; mas ninguém sabia ao certo se tinham entendido bem.
A fazenda era agora mais próspera e organizada: tinha até sido ampliada com compra de dois campos do Sr. Pilkington. O moinho tinha sido finalmente concluído com sucesso, e a fazenda possuía uma debulhadora e um elevador de feno, e várias novas construções tinham sido acrescentadas a ele. Whymper tinha comprado uma pequena carruagem para si mesmo. O moinho de vento, entretanto, não havia sido usado para gerar energia elétrica no fim das contas. Ele era usado para moer milho, o que trazia um belo lucro em dinheiro. Os animais estavam trabalhando duro na construção de mais um moinho de vento; quando este estivesse terminado, assim se dizia, os dínamos seriam instalados. Mas os luxos mencionados por Bola de Neve, que deixou os animais sonhando com baias com luz elétrica, água quente e fria e semanas com apenas três dias de trabalho não eram mais mencionados. Napoleão havia denunciado tais ideias como contrárias ao espírito do animalismo. A felicidade mais verdadeira, disse ele, estava em trabalhar duro e viver frugalmente.
De alguma forma, parecia que a fazenda tinha ficado mais rica sem tornar os próprios animais mais ricos – exceto, é claro, os porcos e os cães. Talvez isto se deva em parte ao fato de haver tantos porcos e cães. Não que essas criaturas não trabalhassem, dentro de suas possibilidades. Havia, como Berro nunca se cansava de explicar, uma quantidade interminável de trabalho na supervisão e organização da fazenda. Muito desse trabalho era do tipo que os outros animais eram ignorantes demais para entender. Por exemplo, Berro lhes disse que os porcos despendiam horas de trabalho diário em coisas misteriosas chamadas “arquivos”, “relatórios”, “atas” e “memorandos”. Estas eram grandes folhas de papel que tinham que ser cobertas de escrita, e assim que eram cobertas, eram queimadas na fornalha. Isto era da maior importância para o bem-estar da fazenda, disse Berro. Mas, mesmo assim, nem os porcos nem os cães produziam qualquer alimento com seu próprio trabalho; e eles eram muitos, e seus apetites eram sempre imensos.
Quanto aos outros, suas vidas eram, até onde sabiam, como sempre foram. Geralmente tinham fome, dormiam na palha, bebiam dos bebedouros, trabalhavam nos campos; no inverno, eram perturbados pelo frio, e no verão, pelas moscas. Às vezes, os mais velhos entre eles guardavam suas lembranças sombrias e tentavam determinar se nos primeiros dias da Revolução, quando a expulsão de Jones ainda era recente, as coisas eram melhores ou piores do que agora. Mas eles não conseguiam se lembrar. Não havia nada com que pudessem comparar suas vidas atuais: eles não tinham nada para se basear, exceto as listas de dados de Berro, que demonstravam invariavelmente que tudo estava ficando cada vez melhor. Os animais achavam o problema insolúvel; em todo caso, eles tinham pouco tempo para especular sobre tais coisas agora. Somente o velho Benjamin professou recordar cada detalhe de sua longa vida e saber que as coisas nunca haviam sido, nem poderiam ser, muito melhores ou muito piores – a fome, as dificuldades e o desapontamento sendo, assim disse, a lei inalterável da vida.
E, no entanto, os animais nunca perderam a esperança. Mais ainda, eles nunca perderam, mesmo por um instante, seu senso de honra e privilégio de serem membros da Fazenda dos Animais. Eles ainda eram a única fazenda em todo o condado – em toda a Inglaterra! – possuída e operada por animais. Nenhum deles, nem mesmo os mais jovens, nem mesmo os recém-chegados que haviam sido trazidos de fazendas a dez ou vinte milhas de distância, jamais deixaram de se maravilhar com isso. E quando eles ouviam a arma disparar e viam a bandeira verde tremulando no mastro, seus corações se enchiam de orgulho irrevogável, e a conversa voltava-se sempre para os velhos dias heroicos, a expulsão de Jones, a escrita dos Sete Mandamentos, as grandes batalhas nas quais os invasores humanos haviam sido derrotados. Nenhum dos velhos sonhos havia sido abandonado. A República dos Animais que o Major havia predito, quando os campos verdes da Inglaterra deveriam ser libertos de pés humanos, ainda era um sonho. O dia estava chegando: poderia não estar em breve, poderia não acontecer com os animais vivos agora, mas ainda assim estava chegando. Até mesmo a melodia de “Animais da Inglaterra” era cantarolada secretamente aqui e ali: de qualquer forma, era algo que todos os animais da fazenda conheciam, embora ninguém ousasse cantá-la em voz alta. Talvez suas vidas fossem difíceis e nem todas as suas expectativas tivessem sido cumpridas; mas eles estavam conscientes de que não eram como os outros animais. Se passavam fome, não era para alimentar seres humanos tirânicos; se trabalhavam duro, pelo menos trabalhavam para si mesmos. Nenhuma criatura entre eles tinha duas pernas. Nenhuma criatura chamava qualquer outra criatura de “Mestre”. Todos os animais eram iguais.
Um dia, no início do verão, Berro ordenou que as ovelhas o seguissem, e as levou para um terreno baldio tomado por mudas de bétula no outro extremo da fazenda. As ovelhas passaram o dia inteiro lá sob a supervisão do Berro. À noite, ele voltou para a fazenda mas, como estava quente, disse às ovelhas para ficarem onde estavam. No fim, elas ficaram lá uma semana inteira, sem contato nenhum com os outros animais. O Berro ficava com elas durante a maior parte do dia. Disse que estava lhes ensinando uma nova canção e precisa de privacidade.
Em uma noite agradável logo após o retorno das ovelhas, quando os animais tinham terminado o trabalho e estavam voltando para as instalações da fazenda, o relincho aterrorizado de um cavalo soou do pátio. Assustados, os animais pararam em seus lugares. Era a voz da Esperança. Ela relinchou novamente, e todos os animais arrombaram em galope e correram para o pátio. Então todos viram o que ela tinha visto.
Era um porco andando sobre suas patas traseiras.
Sim, era o Berro. Um pouco desajeitado, como se não estivesse acostumado a suportar sua considerável massa naquela posição, mas com perfeito equilíbrio, ele estava passeando pelo pátio. E no momento seguinte, da porta da casa, saiu uma longa fila de porcos, todos andando sobre suas patas traseiras. Alguns o faziam melhor do que outros, um ou dois estavam até um pouco instáveis e pareciam precisar do apoio de uma vara, mas cada um deles conseguiu dar uma volta inteira no quintal com sucesso. Finalmente, os cães ladraram e a gata preta deu um miado estridente, então veio o próprio Napoleão, majestosamente erguido, lançando olhares altivos de um lado para o outro, com seus cães empolgados à sua volta.
Ele carregava um chicote em sua pata.
Havia um silêncio mortal. Espantados, aterrorizados e amontoados, os animais observavam a longa fila de porcos marchando lentamente ao redor do pátio. Era como se o mundo tivesse virado de cabeça para baixo. Depois veio um momento em que o primeiro choque havia passado e quando, apesar de tudo – apesar do terror dos cães e do hábito, desenvolvido durante longos anos de nunca reclamar, nunca criticar, não importando o que acontecesse – eles poderiam ter proferido alguma palavra de protesto. Mas naquele momento, como se fosse um sinal, todas as ovelhas explodiram em um tremendo balido de…
“Quatro pernas bom, duas pernas melhor! Quatro patas bom, duas patas melhor!
Quatro patas bom, duas patas melhor!”
Isso continuou por cinco minutos sem parar. E, quando as ovelhas se acalmaram, a chance de protestar já havia passado, pois os porcos haviam voltado para a casa.
Benjamin sentiu um nariz zumbindo em seu ombro. Ele olhou em volta. Era Esperança. Seus olhos velhos pareciam mais escuros do que nunca. Sem dizer nada, ela o puxou suavemente pela crina e o levou até o final do grande celeiro, onde os Sete Mandamentos foram escritos. Durante um ou dois minutos eles ficaram olhando a parede marcada com as letras brancas.
“Minha visão está falhando”, disse ela finalmente. “Mesmo quando eu era jovem, não conseguia ler o que estava escrito ali. Mas me parece que aquele muro está diferente. Os Sete Mandamentos são os mesmos que eram antes, Benjamin?”
Por uma vez Benjamin consentiu em quebrar sua própria regra, e leu para ela o que estava escrito na parede. Agora não havia nada lá, exceto um único Mandamento:
Todos os animais são iguais
Mas alguns animais são mais iguais do que outros
Depois disso, não pareceu estranho quando no dia seguinte os porcos que estavam supervisionando o trabalho da fazenda carregavam todos chicotes em suas patas. Não pareceu estranho saber que os porcos tinham comprado um rádio, estavam organizando a instalação de um telefone e tinham feito assinaturas das revistas “John Bull” e “Tit-Bits”, e do jornal “Daily Mirror”. Não parecia estranho quando Napoleão foi visto passeando no jardim da fazenda com um cachimbo na boca – não, nem mesmo quando os porcos tiraram as roupas do Sr. Jones do guarda-roupa e as vestiram, o próprio Napoleão aparecendo com um casaco preto, calças bufantes com botas de couro, enquanto sua porca favorita apareceu com o vestido leve de seda que a Sra. Jones costumava vestir aos domingos.
Uma semana depois, à tarde, uma série de carroças foi até a fazenda. Uma delegação de fazendeiros vizinhos havia sido convidada para fazer uma excursão de inspeção. Eles foram levados para todos os cantos da fazenda, e expressaram grande admiração por tudo o que viram, especialmente o moinho de vento. Os animais estavam trabalhando no campo de nabos. Eles trabalhavam diligentemente, mal levantando o rosto do chão, sem saber se deviam ter mais medo dos porcos ou dos visitantes humanos.
Naquela noite, gargalhadas e cantorias vieram da casa. E, de repente, ao som das vozes misturadas, os animais foram acometidos de curiosidade. O que poderia estar acontecendo ali, agora que pela primeira vez animais e seres humanos estavam se encontrando em termos de igualdade? Em comum acordo, eles começaram a rastejar o mais silenciosamente possível para o jardim da fazenda.
Eles pararam no portão, meio assustados para continuar, mas a Esperança liderou o caminho para dentro. Eles se inclinaram para a casa, e os animais que eram suficientemente altos se espreitaram na janela da sala de jantar. Lá, ao redor da longa mesa, sentavam-se meia dúzia de agricultores e meia dúzia dos porcos mais eminentes, o próprio Napoleão ocupando o assento de honra à frente da mesa. Os porcos pareciam completamente à vontade em suas cadeiras. A companhia vinha desfrutando de um jogo de cartas, mas havia feito uma pausa, evidentemente para fazer um brinde. Um grande jarro estava circulando, e as canecas estavam sendo reabastecidas com cerveja. Ninguém notou as faces curiosas dos animais que olhavam para dentro da janela.
O Sr. Pilkington, de Foxwood, havia se levantado com sua caneca na mão. Ele logo pediria, disse, que todos fizessem um brinde. Mas antes de fazer isso, havia algumas palavras que ele sentia que lhe competia dizer.
Foi uma fonte de grande satisfação para ele, disse – e, estava certo, para todos os outros presentes também – sentir que um longo período de desconfiança e mal-entendidos havia chegado ao fim. Houve um tempo – não que ele, ou qualquer um dos fazendeiros presentes, tivesse compartilhado tais sentimentos – mas houve um tempo em que os respeitados proprietários da Fazenda dos Animais foram considerados, não com hostilidade, mas talvez com uma certa dose de apreensão, por seus vizinhos humanos. Ocorreram infelizes incidentes, ideias equivocadas tinham corrido por aí. Tinha-se sentido que a existência de uma fazenda de propriedade de porcos e operada por porcos era de alguma forma anormal e poderia ter um efeito perturbador na vizinhança. Muitos agricultores haviam assumido, sem a devida investigação, que em tal fazenda prevaleceria um espírito de preguiça e indisciplina. Eles estavam nervosos com os efeitos sobre seus próprios animais e até mesmo sobre seus empregados humanos. Mas todas essas dúvidas foram agora dissipadas. Hoje ele e seus amigos haviam visitado a Fazenda dos Animais e inspecionado cada centímetro dela com seus próprios olhos, e o que encontraram? Não apenas os métodos mais atualizados, mas uma disciplina e uma ordenação que deveria ser um exemplo para todos os fazendeiros em todos os lugares. Ele acreditava estar certo ao dizer que os animais ali trabalhavam mais e recebiam menos comida do que os animais em qualquer outra fazenda do condado. De fato, hoje ele e seus colegas visitantes haviam observado muitas características que pretendiam introduzir imediatamente em suas próprias fazendas.
Ele terminaria suas observações, disse ele, enfatizando mais uma vez os sentimentos amigáveis que subsistiam, e deveriam subsistir, entre a Fazenda dos Animais e seus vizinhos. Entre porcos e seres humanos não havia, e não precisava haver, nenhum conflito de interesses, seja qual fosse. Suas lutas e suas dificuldades eram uma só. O problema do trabalho não era o mesmo em todos os lugares? Então ficou evidente que o Sr. Pilkington estava prestes a fazer alguma graça cuidadosamente preparada, mas ele ficou tão impactado pelo seu próprio humor que foi incapaz de contar a piada em voz alta. Depois de muita asfixia, durante a qual seus vários queixos ficaram roxos, ele conseguiu: “Se vocês têm que lidar com animais inferiores”, disse ele, “nós temos que lidar com nossas classes inferiores”! Esta tirada fez com que toda a mesa fosse tomada por risos; e o Sr. Pilkington mais uma vez parabenizou os porcos pelo baixo consumo de ração, pelas longas horas de trabalho e pela ausência geral de mimos que ele havia observado na Fazenda dos Animais.
E agora, disse finalmente, pediria a todos que se levantassem e se certificassem de que seus copos estavam cheios. “Cavalheiros”, concluiu o Sr. Pilkington, “cavalheiros, eu lhes faço um brinde: À prosperidade da Fazenda dos Animais”!
Houve uma ovação entusiasmada e um bater de pés. Napoleão ficou tão grato que saiu de seu lugar e deu a volta na mesa para brindar com o Sr. Pilkington, dando uma batidinha leve entre as canecas antes de esvaziar a sua. Quando os aplausos se extinguiram, Napoleão, que havia ficado de pé, insinuou que ele também tinha algumas palavras a dizer.
Como todos os discursos de Napoleão, esse também foi curto e direto ao ponto. Ele também, disse, estava feliz pelo fim do período de mal-entendidos. Durante muito tempo houve rumores – circulados, tinha motivos para pensar, por algum inimigo maligno – que havia algo subversivo e até revolucionário na visão dele e de seus colegas. Acreditavam que eles tentavam provocar a rebelião de animais em fazendas vizinhas. Nada poderia estar mais longe da verdade! Seu único desejo, agora e no passado, era viver em paz e ter relações comerciais normais com seus vizinhos. Esta fazenda, que ele teve a honra de controlar, acrescentou, era uma empresa cooperativa. Os títulos de propriedade, que estavam em seu próprio poder, eram de propriedade conjunta dos porcos.
Ele não acreditava, disse ele, que qualquer uma das antigas suspeitas ainda persistisse, mas certas mudanças haviam sido feitas recentemente na rotina da fazenda, o que deveria ter o efeito de promover ainda mais a confiança. Até então, os animais da fazenda tinham um costume bastante tolo de se tratarem uns aos outros como “camarada”. Isso seria suprimido. Havia também um costume muito estranho, cuja origem era desconhecida, de marchar todos os domingos de manhã passando pelo crânio de um javali que era pregado em um poste no jardim. Isto também seria suprimido e o crânio já havia sido enterrado. Seus visitantes também poderiam ter observado a bandeira verde que voava do mastro. Se assim fosse, eles talvez tivessem notado que o casco branco e o chifre com os quais ela havia sido marcada anteriormente tinham sido removidos. A partir de agora, seria uma bandeira verde simples.
Ele tinha apenas uma crítica, disse ele, a fazer ao excelente discurso do Sr. Pilkington. O Sr. Pilkington havia se referido a “Fazenda dos Animais”. É claro que ele não podia saber – pois ele, Napoleão, estava anunciando isso pela primeira vez – mas o nome “Fazenda dos Animais” havia sido abolido. Daí em diante a fazenda seria conhecida como “Fazenda Solar” – que, ele acreditava, era seu nome correto e original.
“Cavalheiros”, concluiu Napoleão, “Eu farei o mesmo brinde de antes, mas de uma forma diferente. Encham seus copos até a borda. Meus senhores, aqui está meu brinde: À prosperidade da Fazenda Solar”!
Houve o mesmo aplauso de antes, e as canecas foram esvaziadas até o fundo. Mas enquanto os animais do lado de fora olhavam para o local, parecia que alguma coisa estranha estava acontecendo. O que foi que havia mudado no rosto dos porcos? Os velhos olhos escuros de Esperança iam de um rosto para o outro. Alguns deles tinham cinco queixos, outros quatro, outros três. Mas o que foi que parecia estar fundindo e mudando? Então, os aplausos chegaram ao fim, a companhia pegou suas cartas e continuou o jogo que havia sido interrompido, e os animais saíram se arrastando silenciosamente.
Ainda não tinham se afastado mais de 20 metros quando pararam. Um alvoroço de vozes vinha da casa da fazenda. Eles correram de volta e olharam pela janela novamente. Sim, uma violenta briga estava em andamento. Havia gritos, pancadas sobre a mesa, olhares suspeitos, negações furiosas. A fonte do problema parecia ser que Napoleão e o Sr. Pilkington tinham jogado um ás de espadas simultaneamente.
Doze vozes gritavam raivosas e iguais. Agora não havia mais dúvidas sobre o que havia acontecido com os rostos dos porcos. As criaturas lá fora olhavam de porco para o homem, e de homem para porco, e de porco para homem novamente; mas já era impossível dizer quem era quem.
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Agora, veja o Capítulo X e último, em audiolivro:
Notas:
- [1] George Orwell: “...escritor nascido em uma colônia inglesa na Índia, é considerado um dos mais importantes romancistas da vertente distópica da literatura mundial, caracterizada pela narração de enredos em que os personagens vivenciam situações em espaço e tempo futuros, nos quais não há possibilidade para a utopia, ou seja, para o sonho e para a esperança. Nessa linha, destacam-se suas duas obras-primas, traduzidas para vários idiomas e transpostas para as telas do cinema mais de uma vez: o romance A revolução dos bichos, publicado em 1945, e o romance 1984, publicado em 1949.” Veja mais aqui.
- [2] O que diz o livro Revolução dos Bichos? “O conhecido livro do inglês George Orwell, A Revolução dos Bichos (1945), é um dos legados atemporais mais importantes que escritores do século passado nos deixaram. Na obra, Orwell faz uma crítica ao stalinismo. Então socialista, o inglês – nascido na Índia durante o domínio britânico – se desilude com a ideologia ao ver o totalitarismo soviético e satiriza o sucessor de Lênin. Na alegoria, o autor apresenta uma revolução idealizada por um porco, o Major (que pode representar tanto Marx como Lênin), que convoca os bichos da granja em que vive a expulsar seu proprietário, o humano Sr. Jones (que seria Nicolau II, imperador do Czar). Porco Major morre em seguida e dois outros suínos tomam a frente: Napoleão (representando Stálin) e Bola de Neve (que seria Trotski). A estória segue o roteiro soviético… Napoleão expurga Bola de Neve, deturpa as leis a seu favor e se torna um ditador. Os demais bichos (galinhas, gado, cavalo…) se rendem à autocracia sem questionar, de forma passiva. Cada vez trabalham mais, exaustivamente e com alimento controlado; enquanto isso, Napoleão toma posse das dependências do Sr. Jones, agindo, portanto, de forma mais exploradora e cruel que o antigo chefe. A ironia está no fato de que a máxima da revolução era ‘duas pernas/patas mau’ – referindo-se a seres humanos”. Leia mais em: Rodrigo Constantino – Gazeta do Povo.com.
- [3] ORWELL, George. Revolução dos Bichos. Gazeta do Povo. Capítulo X, pág. 147 a 163. Veja o livro completo aqui.