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11 fevereiro 2024

A Aposta de Pascal: da razão à fé em Deus

Por: Alcides Amorim


O Racionalismo, corrente filosófica que argumenta ser a razão a única forma para se chegar ao verdadeiro conhecimento é normalmente atribuído ao filósofo francês René Descartes (1596-1650), que é considerado também o fundador da filosofia moderna. Mas esta ideia de chegar ao verdadeiro conhecimento choca-se muitas vezes com a teologia e a fé. Foi na tentativa de aliar a razão com a fé que outro filósofo – também francês –, chamado Blaise Pascal (1623-1662) [1], desenvolve a apologética famosa exposta em sua principal obra Pensées (Pensamentos sobre a Religião e Alguns Outros Assuntos).

Segundo Richard V. Pierard, Pascal foi uma das maiores figuras na história intelectual do Ocidente, embora tenha vivido muito pouco: 39 anos. Foi criado por seu pai viúvo, um brilhante advogado e oficial cívico; tornou-se pensador, cientista e matemático; usando o método experimental, criou o primeiro calculador mecânico, pesquisas básicas sobre vácuos e hidráulica, a formulação da teoria da probabilidade e a formação dos alicerces para o cálculo diferencial e integral, entre outras contribuições.

Em 1646 Pascal passou por uma "conversão" para um ensino austero de renúncia do mundo e de submissão a Deus, conforme propunham os discípulos de Jean du Vergier. O resultado foi uma cessação temporária das suas labutas intelectuais, mas logo deixou o grupo. Em 1654 experimentou uma "segunda conversão", muito mais significativa, à doutrina Jansenista [2] em Port Royal, e aceitou fervorosamente a fé cristă, como se vê em suas obras posteriores, as Cartas Provinciais (1657) e sua obra publicada postumamente Pensées.

Nos seus escritos religiosos, Pascal era mais um apologista do que um pensador sistemático. Ao argumentar a favor da existência de Deus, não era um fideísta completo, pois achava possível demonstrar aos descrentes que a religião não era contrária à razão, mas rejeitava provas metafísicas como as de Descartes por serem insuficientes para levar alguém ao Deus vivo. Na verdade, argumentava psicologicamente [3], acreditando que o coração era a chave. Deus podia ser percebido pela intuição do coração, mas não pela razão. Tratava-se de combinar o conhecimento, o sentimento e a vontade, e de estabelecer um relacionamento místico vivificante com Cristo. Quando Pascal apresenta seu argumento da aposta, a probabilidade nos obriga a correr o risco da fé em Deus. Além disso, ele via a condição humana como de "grandeza e miséria". Rejeitando o pelagianismo jesuíta, Pascal aceitou a reafirmação jansenista do conceito agostiniano do pecado original. Disse que o homem possui uma condição moral e religiosa especial que o eleva muito acima dos animais, mas ele é controlado pelo pecado e necessita desesperadamente da graça especial de Deus a fim de ser salvo. Embora ele achasse que "o coração tem razões que a própria razão desconhece", não deixou de sustentar que as Escrituras, que se validam a si mesmas, as profecias, a existência dos judeus, os milagres e o testemunho da história, todos servem para autenticar o cristianismo.

Sobre a Aposta de Pascal deve ser considerado, conforme Rodrigo Silva, que pelo fato de sua doença que o levou à morte ainda muito jovem, este deixou muitos trabalhos ainda rascunhados, tanto que a Pensées foi uma obra póstuma e, possivelmente em elaboração, sem a conclusão do próprio autor. Em seu estudo, Rodrigo Silva mostra como as percepções de Pascal era parte de uma conclusão matemática daquele filósofo, um dos mais célebres da história. Portanto, embora Pascal é visto como controverso teologicamente – veja, por exemplo aqui –, é inegável que ele era um homem de fé, além de um filósofo. Fé e razão andando juntas.

Para Pascal, continua Pierard, ‘Ou Deus existe, ou Ele não existe’, e propõe que apostemos no assunto. Apostar que Ele existe importa numa modesta entrega da nossa razão, mas optar pela não-existência divina è arriscar a perda da vida e felicidade eternas. O valor da aposta (a nossa razão) é mínimo comparado ao prêmio que pode ser ganho. Se aquele que apostou em Deus tiver razão, ganhará tudo, mas nada perderá se sua escolha se revelar errada. Ja que foi demonstrado que esta aposta é razoável, pode-se avançar, agora, do ámbito do provável para a ação prática de se colocar a fé em Deus.

Deus existe ou Deus não existe [4]


Notas / Referências bibliográficas:

  • [1R. V. PIERARD, Doutor da Universidade de Iowa. Professor de História na Universidade Estadual de Indiana, Terre Haute, Indiana, EUA… (E mais aqui). Dois breves estudos, “A Aposta de Pascal” e “Blaise Pascal”, utilizados como fontes aqui, são contribuições de Pierard à Enciclopédia Histórico-Teológica. Editor Walter A. Elwell. Vol. I (Pág. 101 e 102) e Vol. III (Pág. 100) respectivamente. São Paulo: Vida Nova: 1988. (Texto adaptado).

  • [2O Jansenismo foi um movimento de muito rigor moral e dogmático, além de disciplinar e que assumiu também contornos políticos, ocorrido no seio da Igreja Católica nos séculos XVII e XVIII e cujas teorias foram consideradas controversas pela própria igreja. O Jansenismo foi fundado Na Bélgica por Cornélio Jansénio e difundido na França por Jean du Vergier. Foi neste meio de ensino austero de renúncia do mundo e submissão a Deus, que Pascal conviveu num primeiro momento e que provocou uma cessação temporária das suas labutas intelectuais, passando depois (em 1654) por outra experiência que ficou conhecida como uma ‘segunda conversão’. 

  • [3] … e principalmente matematicamente, na opinião de Rodrigo Silva, confrme o  vídeo abaixo.

  • [4Esquema ilustrativo anexo ao estudo de Rodrigo Silva, Aposta de Pascal. Acesso em: 09/02/2024.



Se o link não abrir, acesse: A Aposta de Pascal, com Rodrigo Silva..


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