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23 maio 2023

O Arrebatamento da Igreja

Por  R. G. Clouse [1]

Uma expressão usada pelos pré-milenistas para se referirem à união da Igreja com Cristo na Sua Segunda Vinda (do latim rapio, “arrebatado”). A principal passagem bíblica na qual este ensinamento é baseado é 1Ts 4.15-17: "Ora, ainda vos declaramos, por palavra do Senhor, isto: nós, os vivos, os que ficarmos até à vinda do Senhor, de modo algum precederemos os que dormem. Porquanto o Senhor mesmo, dada a sua palavra de ordem, ouvida a voz do arcanjo, ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro; depois nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares, e assim estaremos para sempre com o Senhor”.

As principais divisões de interpretação dos palavras de Paulo centralizam-se no relacionamento entre o tempo do arrebatamento e o período de tribulação que marca o fim de era. Os pré-tribulacionistas ensinam que a igreja será removida antes deste período de sete anos e da revelação do anticristo. Um segundo grupo, os mid-tribulacionistas, argumentam que a igreja será arrebatada durante a tribulação, depois de o anticristo ter subido ao poder, mas antes dos julgamentos severos que preparam o caminho para a volta de Cristo, que virá a fim de estabelecer o Seu reino na terra. Outra abordagem ao problema é a dos pós-tribulacionistas, que creem que a igreja continuará a existir no mundo durante a tribulação inteira, e que será removida no fim do período quando Cristo voltar em poder.

O Pré-Tribulacionismo e a Origem da Controvérsia do Arrebatamento

A despeito da tentativa dos dispensacionalistas de identificar todos os pré-milenistas com aspectos peculiares do pensamento deles, tais como o arrebatamento pré-tribulacionista, fica óbvio que, no decurso da maior parte da história da igreja, aqueles que ensinavam o pré-milenismo não tinham uma interpretação tão pormenorizada dos tempos do fim. Até o começo do século XIX, aqueles crentes que discutiam o arrebatamento acreditavam que ele ocorreria junto com a volta de Cristo no fim do período da tribulação. A contribuição de John Nelson Darby à escatologia levou muitos cristãos a ensinarem que a volta de Cristo se daria em duas etapas: uma, para buscar Seus santos no arrebatamento, e a outra, com Seus santos para controlar o mundo no fim da grande tribulação. Segundo esta interpretação das profecias bíblicas, entre estes dois eventos seria cumprida a septuagésima semana predita por Daniel (9.24-27) e o anticristo viria com poder. Com a igreja saindo de cena, Deus reativaria naquele tempo Seu tratamento com Israel.

As ideias de Darby tiveram ampla influência na Grá-Bretanha e nos Estados Unidos. Muitos evangélicos tornaram-se pré-tribulacionistas através da pregação dos evangelistas interdenominacionais nos séculos XIX e XX, A Bíblia de Scofield bem como os principais institutos bíblicos e faculdades de teologia tais como o Seminário Teológico de Dallas, o Seminário Talbot, e o Seminário Teológico "Grace" também contribuíram para a popularidade deste ponto de vista. Durante os tempos conturbados da década de sessenta, houve um reavivamento do ponto de vista pré-tribulacionista num nivel popular, através dos livros de Hal Lindsey e dos ministérios dos pregadores e ensinadores bíblicos que empregam os meios eletrônicos de comunicação.

Embora seja óbvia a influência de Darby no trabalho dos seus sucessores, é mais difícil determinar como ele chegou à compreensão do arrebatamento secreto antes da tribulação. Samuel P. Tregelles, membro do movimento Irmãos de Plymouth, assim como Darby, alegou que o dito ponto de vista teve sua origem num culto carismático dirigido por Edward Irving, em 1832. Outros estudiosos afirmam que o novo modo de entender o arrebatamento resultou de uma visão profética dada a uma jovem escocesa, Margaret MacDonald, em 1830. Ela alegava ter introspeção especial quanto à Segunda Vinda, e começou a compartilhar com outros o seu ponto de vista. Sus conduta extática e seus ensinos apocalípticos provocaram uma renovação carismática na Escócia. Impressionado pelos relatos de um novo Pentecoste, Darby visitou o cenário do reavivamento. De acordo com seu próprio testemunho dado em anos posteriores, ele conheceu Margaret MacDonald, mas rejeitou as alegações quanto a um novo derramamento do Espírito. A despeito da sua oposição à abordagem geral de MacDonald, alguns escritores acreditam que Darby aceitou o conceito dela quanto ao arrebatamento, e o adaptou ao seu sistema.

Outros estudiosos acham que devemos aceitar a explicação do próprio Derby sobre como chegou ao seu ponto de vista escatológico. Baseou-se em seu entendimento de que a igreja e Israel são entidades separadas nas Escrituras. Quando a igreja for removida do mundo, então poderão ser cumpridos os eventos proféticos que dizem respeito a Israel. O anticristo subirá ao poder por meio de promessas de paz à terra, e fará um acordo para proteger o novo Estado de Israel. Os judeus, no entanto, serão traídos pelo novo benfeitor, que repentinamente suspenderá todas as cerimônias religiosas tradicionais e exigirá que lhe prestem culto. Aqueles que não cooperarem serão perseguidos. Este holocausto final contra o povo escolhido de Deus o levará a aceitar Cristo como seu Salvador. Pragas devastarão a terra durante este período de tribulação e, finalmente, a batalha do Armagedom resultará na volta à terra, vitoriosa, pessoal e visível, de Cristo e Seus santos. O Senhor, então, amarrará Satanás durante mil anos, e reinará na terra com Seus seguidores durante o milênio. Segundo os pré-milenistas pré-tribulacionistas, todas as profecias que deveriam ter sido cumpridas quando Cristo veio pela primeira vez, serão realizadas na Sua Segunda Vinda. A rejeição de Cristo pelos judeus no século I forçou o adiamento do reino até a Segunda Vinda. O ponto de vista adotado quanto à igreja e à sua posição na profecia é crucial para a aceitação do arrebatamento pré-tribulacionista e o sistema que ele sustenta.

Outro argumento oferecido em prol do arrebatamento pré-tribulacionista é que a influência constrangedora do Espirito Santo deve ser removida antes de o anticristo poder ser revelado (2 Ts 2.6-8). Porque o Espirito está especialmente associado com a igreja, segue-se que a igreja deverá estar fora de cena depois de o Espirito ter se retirado. Entre as outras razões que parecem apoiar o pré-tribulacionismo é a iminência do arrebatamento. Se ele pode ocorrer a qualquer momento, nenhum sinal prévio da tribulação, como a revelação do anticristo, a batalha do Armagedom, ou a abominação no templo, poderá anteceder o "bendito evento".

O Ponto de Vista Mid-Tribulacionista

Um dos lideres na apresentação de um ponto de vista diferente do arrebatamento foi Harold John Ockenga, um líder no movimento evangélico que se desenvolveu nos Estados Unidos depois de Segunda Guerra Mundial. Num breve testemunho pessoal em Chistan Life (“Vida Cristã”) (fev. de 1955), citou muitas dificuldades associadas com o pré-tribulacionismo. Estas incluíram o aspecto secreto do arrebatamento, o reavivamento a ser experimentado durante a tribulação, a despeto da remoção do Espirito Santo, e a redução da importância da igreja envolvida na escatologia dispensacionalista. Outros líderes evangélicos acrescentaram suas críticas à posição pré-tribulacionista. As modificações (Ap 16-18) aos primeiros três anos e meio (quarenta e dois meses) em Dn 7.9 e 12, e em Ap 11 e 12, argumentavam a favor de um período abreviado de tribulação. Como apoio deste argumento, citavam Dn 7.25 que indica que a igreja estará sujeita ao governo tirânico do anticristo durante três anos e meio. Dn 9.27 também indica que o governante mundial do fim dos tempos fará um acordo com os cristãos e os judeus, dando garantias da liberdade religiosa, mas que passará, depois, a levar a efeito a segunda etapa do seu plano, e suprimirá as observâncias religiosas. Acreditava-se que várias passagens do NT também apoiavam o mid-tribulacionismo, incluindo Ap 12,14, que prediz uma fuga da igreja para o deserto durante primeiros três anos e meio do período da tribulação. Além disso, os mid-tribulacionistas acreditavam que o ponto de vista deles se encaixa no discurso do Monte das Oliveiras (Mt 24; Mc 13; e Le 12) melhor do que a interpretação pré-tribulacionista.

Os mid-tribulacionistas declaram que o arrebatamento deve ocorrer depois de certos sinais preditos e da fase preliminar da tribulação, conforme a descrição em Mt 24.10-27. O evento não será secreto, mas sim acompanhado por uma demonstração impressionante, incluindo um alto brado e o ressoar da trombeta (1 Ts 4.16; Ap 11.15; 14.2). Este sinal dramático atrairá a atenção das pessoas não salvas e, quando estas perceberem que os cristãos desapareceram, virão para Cristo em números tão grandes que haverá um reavivamento em grande escala (Ap 7.9,14).

O Ponto de Vista Pós-Tribulacionista.

Muitos outros intérpretes não se sentiam à vontade com a forte distinção que os pré-tribulacionistas fizeram entre a Igreja e Israel. Cristo, segundo acreditavam, voltaria para arrebatar os Seus santos e para estabelecer Seu reino milenar ao mesmo tempo. Citavam numerosas passagens (Mt 24.27,29) que indicavam que a Segunda Vinda de Cristo deve ser visível, pública e posterior à tribulação. O argumento baseava-se no fato de que os conselhos dados nas Escrituras às igrejas, no tocante aos últimos dias, não fazem sentido se a igreja não tiver de passar pela tribulação. Por exemplo, a igreja é ordenada a fugir para as montanhas quando ocorrerem certos eventos, tais como o estabelecimento do abominável da desolação no lugar santo (Mt 24.15-20).

Muitos argumentos sugeridos por aqueles que defendem o ponto de vista pós-tribulacionista são declarados em oposição à posição pré-tribulacionista, que tem sido a interpretação mais geralmente sustentada entre os pré-milenistas norte-americanos do século XX. Incluídas nestas criticas há sugestões de que a volta iminente de Cristo não requer um arrebatamento pré-tribulacionista. Os pós-tribulacionistas também indicam a dificuldade em resolver quais passagens das Escrituras se aplicam a Israel, e quais delas são relevantes para a Igreja. Além disso, argumentam que há uma falta notável de ensinos explícitos no NT a respeito do arrebatamento.

Os defensores da posição pós-tribulacionista diferem entre si quanto à aplicação das Escrituras proféticas e aos pormenores da volta de Cristo. John Walvoord detectou entre eles quatro escolas de interpretação. A primeira delas, o pós-tribulacionismo clássico, é representada pela obra de J. Barton Payne, que ensinou que a igreja sempre tem estado na tribulação e, portanto, a grande tribulação já foi cumprida, na sua maior parte. O segundo grupo principal dos pós-tribulacionistas é o que mantém a posição semiclássica que se acha na obra de Alexander Reese. Entre a variedade de crenças sustentadas por estas pessoas, a mais comum é a de que todo o curso da história da igreja é uma era de tribulação, mas que, além dela, haverá um período futuro de grande tribulação. Uma terceira categoria de interpretação pós-tribulacionista é chamada futurista, e é apresentada de modo competente nos livros de George E. Ladd. Aceita um período futuro de três anos e meio, ou sete anos, de tribulação entre a presente era e a Segunda Vinda de Cristo. Foi levado a esta conclusão por uma interpretação literal de Ap 8-18. Um pré-milenista firme, ele acredita que o arrebatamento pré-tribulacionista foi um acréscimo às Escrituras que, por isso mesmo, obscureceu o evento verdadeiramente importante, o próprio aparecimento de Cristo para inaugurar o Seu reino. Um quarto ponto de vista de de Robert H. Gundry, que Walvoord chama de interpretação pós-tribulacional dispensacional. Gundry combina de modo original os argumentos pré-tribulacionistas com a aceitação do arrebatamento pós-tribulacionista.

A Interpretação do Arrebatamento Parcial

Além dos pontos de vista pré-tribulacionista, mid-tribulacionista e pós-tribulacionista do arrebatamento, tem havido aqueles que argumentam a favor de uma teoria do arrebatamento parcial. Este pequeno grupo de pré-tribulacionistas ensina que somente os que forem fiéis na igreja serão arrebatados no início da tribulação. Os demais serão arrebatados durante o período de sete anos, ou no fim dele. Segundo estes intérpretes, aqueles que forem mais leais a Cristo serão levados primeiro, e os mais mundanos serão arrebatados mais tarde. Embora este ponto de vista seja condenado pela maioria dos pré-milenistas, o respeitado G. H. Lang o defendia.

Conclusão

A interpretação do arrebatamento tem provocado algumas diferenças de opinião entre os evangélicos. Aqueles que defendem um arrebatamento pré-tribulacionista têm sido acusados de terem uma atitude severamente limitada para com a igreja e a sua missão, a cultura e a educação, e os eventos da atualidade. Embora alguns dispensacionalistas deem motivo a isto, por considerarem sua posição quase como doutrina fundamental da fé, a maioria rejeitaria a crítica acima como generalização sem base. Insistiriam que sua posição não exclui nem uma ética social altamente desenvolvida, nem uma política de rejeição do mundo, no sentido correto desta expressão.


Nota:

  • [1] CLOUSE, Robert G. Ph. D., pela Universidade de Iowa. Professor de História, Universidade do Estado de Indiana, em Terre Haute, Indiana, EUA.

Fonte:

CLOUSE, Robert G. O Arrebatamento da Igreja. Apud: Enciclopédia Histórico-Teológica. Editor Walter A. Elwell. Vol. I. São Paulo: Vida Nova: 1988, Pág.116 a 119.

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