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23 outubro 2021

A greve dos urubus

A greve dos urubus

Por José Lutzenberger[1]

Charge do Bessinha (site Conversa Afiada) [2]

A manhã estava linda. Um sol maravilhoso, o céu, muito azul, encontrava no horizonte com o mar que parecia um mingau de vidro. E tudo aquilo podia ser mais bonito se a praia estivesse branquinha, como Deus inventou.

Mas não estava. Naquele enorme areal não se podia dar um passo sem pisar em algum lixo. Era lata de cerveja vazia, era copo usado de plástico, era pauzinho de picolé chupado, era papel de tudo que era cor e feitio. Na beira d’água era mais triste ainda. Pedaços de pau, manchas pretas de óleo e uma porção de peixinhos mortos, com a barriga virada para cima.

Os banhistas ainda não tinham começado a chegar e só os urubus é que andavam no meio daquela lixarada, fazendo o seu serviço, limpando a praia do que havia de mais sujo e fedorento.

Mas não demorou muito e apareceu o primeiro. Era uma mulher, de óculos escuros e chapeuzinho de palha. Debaixo do braço trazia uma barraca, tipo guarda-chuva e uma toalha. Na mão, uma sacola, onde levava bronzeador, cigarro, fósforos, lápis e uma revistinha de palavras cruzadas. Levou um tempão para arrumar aquilo tudo na areia, sentar e começar a besuntar o corpo com uma coisa visguenta que saía da garrafinha.

Não muito longe, uma urubua tinha parado de ciscar na sujeira e ficou olhando para ela perder tanto tempo, só para acabar sentando e se sujar daquele jeito. A urubua continuou olhando para tanta esquisitice e uma porção de pensamentos subia e descia dentro da sua cabecinha cinzenta. Um desses pensamentos era assim:

– “Todos os bichos que existem neste mundo gostam de se aquecer no sol quando é inverno e faz frio. Mas num dia de verão danado, como hoje, todos procuram uma sombrinha, onde é mais fresco. Só mesmo pra procurar comida ou ir pra casa é que qualquer um, seja de pele, pena ou pelo, é que enfrenta um calorão desses. Mas o bicho homem é mesmo muito biruta. É o único que se mete debaixo do sol, até ficar com a pele dolorida de tão queimada, cheia de bolha, sem ter nada de importante para fazer ali.”

Sacudiu a cabeça de um lado para outro, tirou com o pé um pedaço de sardinha que ficou entalado no canto do bico e teve outro pensamento:

– “Não entendo mesmo o que é que essa gente tem dentro da cabeça. Dizem que nós, os urubus, é que somos uns bichos diferentes porque gostamos de porcaria. O compadre porco gosta das mesmas coisas que nós gostamos, mas os homens até fazem criação deles. E o que esse pessoal vem fazer numa praia imunda como esta se todos são tão cheios de chiques e não-me-toques, torcendo o nariz por qualquer coisinha…? Coitados… É capaz até que eles não saibam que essa água do mar, onde eles adoram tomar banho, é tão suja como a água que sai das privadas das casas deles. Vai ver é isso mesmo… Vou avisar aquela mulher…

A urubua não tinha andado nem um metro na direção da banhista e levou com uma garrafa de guaraná vazia bem no meio do pescoço. E, de quebra, uma porção de: “chô… chô… Vai embora, bicho nojento. Fora daqui…”

Ela abriu as asas, deu uma corridinha para pegar impulso e levantou voo. De todos os cantos da praia, outros urubus também estavam voando porque já eram muitas as barracas armadas e muitas as pessoas que tinham chegado, arranjando um lugarzinho no meio daquela lixarada toda.

E como sempre faziam, depois que comiam pela manhã, iam pousar no telhado do matadouro. Era ali o ponto de reunião da urubuzada daquele lugar. Ali é que eles batiam papo, contavam as novidades da família, e davam as dicas de onde podia ser encontrada comida pro bando todo.

A urubua, depois que alisou as penas e espreguiçou as duas asas, começou a conversar com o urubu que estava ao seu lado. E contou como quase-quase teve o pescoço quebrado aquela manhã, lá na praia. O urubu também lhe contou que estava ciscando naquela areia negra e oleosa, lá no Entreposto de Pesca, quando, de repente, olhou de banda e viu que um caixote velho vinha caindo direto em cima dele. Se não fosse de circo e não soubesse pular numa perna só, aquela hora não estava ali, contando o susto que levou. Não demorou muito e todos os urubus estavam falando sobre a mesma coisa: como cada dia a vida ficava mais difícil, como eram xingados de tudo que era nome feio e como precisavam estar sempre preparados para não levarem pauladas, garrafadas, pedradas e tudo que era adas que os homens podiam jogar em cima deles.

Urubu é bicho que não canta nem faz qualquer barulho. Mas naquela manhã eram tantos, falando ao mesmo tempo, que o zum-zum era tão forte que quem passasse na rua, olhava pra cima pra ver o que estava acontecendo.

Aí o Lula, que era o presidente do Sindicato dos urubus, resolveu falar. Bateu as asas três vezes… tlec… tlec… tlec… E todos se calaram. Quando aquela porção de bicos estava toda virada para o lado dele e todos os urubus ficaram quietos, ele falou:

– “Urubuzada, atenção, por favor! O que todos vocês estão reclamando hoje não é nenhuma novidade. Venho ouvindo essas queixas há muito tempo e acho que chegou a hora da gente fazer alguma coisa”.

Todos os urubus bateram as asas ao mesmo tempo porque esse é o jeito de urubu bater palmas.

– “Silêncio, por favor!” – disse o Lula. E continuou quando os tlec tlec pararam.

– “Não podemos continuar sendo humilhados assim. Cada dia que passa a quantidade de lixo que é fabricado pelos homens vai aumentando. As praias, os rios, os monturos, estão cada vez mais fedorentos. E somos nós que damos um jeito, catando o dia todo, dando sumiço nas porcarias mais porcarias. A injustiça deles é tão grande que dão o nome de porcaria para as maiores sujeiras e nunca se lembraram de chamar urubuzaria para qualquer coisa, em homenagem ao nosso trabalho, quando somos nós que fazemos a maior parte do serviço.”

Foi um tal de tlec tlec em cima do telhado do matadouro que chegou até fazer um ventinho. E o Lula foi em frente com o seu discurso:

– “Milhares de companheiros nossos da turma que mora lá no mangue da Baía da Guanabara, foram engaiolados para a Alemanha para serem estudados pelos cientistas que estão querendo descobrir a cura do câncer, uma doença que dá neles e nunca dá em nós. Desde que o mundo é mundo, o nosso trabalho é fazer que o lixo seja menos lixoso. Antigamente, no tempo em que os urubus ainda podiam escolher as cores de suas penas, em vez desse uniforme preto que usamos agora, éramos respeitados. Hoje em dia os homens xingam, maltratam e até matam qualquer urubu que não seja bastante vivo pra voar para longe, logo que um deles vai chegando perto. Por tudo isso, pra que eles vejam como somos úteis, acho que devemos entrar em greve geral. Não vamos mais tocar nos montes de lixo que eles fazem em volta das suas cidades e na beira de tudo que é praia, rio ou lago. E assim talvez as coisas mudem. Quem estiver de acordo, levante a asa direita.”

No mesmo instante, todas as asas direitas que estavam ali, ficaram esticadas para cima. Depois disso passaram-se dias, semanas e fazia quase um mês que nenhum urubu era visto voando ou ciscando por onde sempre andaram. Os montes de lixo tinham crescido uma barbaridade e ninguém aguentava mais o fedor que saía deles. Foi só aí que os homens entenderam a falta que os urubus faziam. Mas como é que iam fazer pros urubus voltarem?

Aí tiveram uma ideia. Se pedissem desculpas e mostrassem que haviam compreendido que, mesmo sendo feios e desajeitados, eles eram tão importantes como são importantes todos os bichos que existem neste mundo, eles talvez voltassem pra fazer o que sempre fizeram.

Reuniões no Ministério não sei do que, comissões de estudo na Secretaria do não sei que mais, mesa-redonda do isso-mais-aquilo e finalmente encontraram uma solução. Eles deviam organizar uma campanha em todo o país para que o povo entendesse como os urubus deviam ser tratados com respeito, como os urubus eram úteis, quanto os urubus ajudaram para se conhecer as correntes de ar, chamadas ascendentes e descendentes. E uma porção de outras coisas desse tipo.

Como nenhum bicho desse planeta consegue elogiar e puxar saco melhor que o bicho homem, a tal campanha foi um sucesso. Fizeram até uma musiquinha que tocava no rádio em todos os intervalos de propaganda.

Vamos todos bater palmas

Pro nosso amigo urubu

Pleft… pleft…

É preciso que ele ouça

Nosso recado do amor

I love you… I alove you…

Pleft… pleft…

Não é um amor passageiro

Pra esse grande lixeiro

Que acaba com o fedor

Pleft… pleft…

Um cantor muito na moda, o Gilberto Jiló, inventou a “Dança do urubu”, para aproveitar a onda de um assunto que andava na boca de toda gente. Ele aparecia no palco vestido de penas pretas e com uma lata de lixo amarrada na cabeça. Como tudo que ele cantava era muito admirado por todos os rapazes e moças, por todos os estudantes universitários, logo apareceram as camisetas com o desenho de um urubu dizendo: “Help me”.

Na televisão, depois daquele plic plic que avisa que é hora das pessoas saírem da sala para irem até o banheiro ou até a cozinha para beber água, aparecia um filmezinho lindo, sobre a vida dos urubus. Era tão bem-feito que nem dava pra desconfiar que era sobre urubus. Aparecia um deles voando mais bonito que uma águia e de um jeito que a sua cor preta virou prateada. Urubu não canta nem em Dia de Finados, mas vendo aquele filme qualquer um ficava com vontade de ter um urubu em casa, só pra ouvir uns gorjeios mais bonitos do que sabiá cantando no meio do mato.

Isso, sem falar nas reportagens que saíram em tudo que era tipo de revista. E nos cartazes coloridos, pregados nos muros de todas as cidades, com o retrato de um urubu sorrindo e segurando uma flauta. Em baixo, em letras bem grandes, a frase: “Ponha um urubu em sua vida! Ele merece!” Em todas as casas de discos não se encontravam mais nada que falasse de urubu. Esgotada a música do Gilberto Jiló e esgotada uma outra, dos tempos em que o almirante era cantor famoso e cantava um maxixe que dizia assim:

Urubu veio de cima

Com fama de cantador

Urubu chegou na festa

Tirou dama e não dançou

Ora dança urubu

Eu não sinhô

Tira a dama, doutô

Não sou doutô…

Não precisa dizer que em todas as escolas, os mais famosos urubuzólogos fizeram uma porção de conferências. E que para completar a série, o governo instituiu o “Dia Nacional do Urubu”.

Quem é que pode resistir uma badalação dessas, não é mesmo? Aos pouquinhos os urubus foram voltando. E estão novamente por aí, ciscando o lixo, como fizeram sempre.

 

Fonte:

  • LUTZENBERGER, José. A Greve dos urubus. São Paulo: Brasiliense (?)…

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Veja também:

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Notas:

  •  [1] O gaúcho José Antonio Lutzenberger (1926-2002) “... foi um agrônomo, escritor, filósofo, paisagista e ambientalista brasileiro que participou ativamente na luta pela preservação ambiental...” (Wikipédia). A fábula acima foi parte de uma aula de Sociologia que tive em 1992 e ainda parece atual, pois o Urubu-Mor ainda está dando suas cartas, enquanto se ouve um bando de tlec... tlec... tlec... quando ele grasna... 
  •  [2] Imagem que ilustra o texto “PT está usando de todos os meios, no Supremo, para livrar Lula da prisão”, texto escrito em setembro de 2018. In: http://www.tribunadainternet.com.br/pt-esta-usando-de-todos-os-meios-no-supremo-para-livrar-lula-da-prisao/. E a mensagem da fábula continua atual...


07 setembro 2021

A República do Brasil: história e consolidação

Por: Alcides Barbosa de Amorim

Proclamação da República, de Benedito Calixto[1]

República (do latim res publica = “coisa pública”), é a forma de governo, cujo chefe do Estado, normalmente o Presidente, é eleito pelos cidadãos por tempo limitado de acordo com a Constituição do país. No caso do Brasil, o tempo estipulado pela Constituição para o mandato do Presidente da República é de quatro anos, podendo ser reeleito para mais quatro, caso seja a vontade dos eleitores.

A origem desta forma de governo está na Roma Antiga e foi experimentado, pela primeira vez, quando os patrícios, classe privilegiada, destronou o último etrusco do poder, e implantaram este novo regime, instaurando o chamado Período Republicano que durou entre 509 a 27 a.C.

1.    Ideias republicanas no Brasil Colônia

No Brasil, que viveu sob a tutela de Portugal por mais de três séculos, a ideia de implantação do regime republicano já existia desde o final do século XVIII. Com tendências separatista e regionalizada, podemos perceber essa ideia em movimentos como a Inconfidência Mineira (1789), a Conjuração Baiana (1798) e a Insurreição Pernambucana de 1817.

Inconfidência Mineira, que culminou com a morte de Tiradentes em 1792, foi o primeiro movimento que manifestou claramente a interação de separação política de Portugal. Influenciada pelo Liberalismo, o Iluminismo e a Independência dos Estados Unidos, parte dos inconfidentes, no plano político, “almejava a república”.

A conjuração pretendia eliminar a dominação portuguesa das Minas Gerais, estabelecendo um país independente. Não havia a intenção de libertar toda a colônia brasileira, pois naquele momento uma identidade nacional ainda não havia se formado. A forma de governo escolhida foi o estabelecimento de uma República, inspirados pelas ideias iluministas da França e da Independência dos Estados Unidos da América (1776). Ressalve-se que não havia uma intenção clara de libertar os escravos, já que muitos dos participantes do movimento eram detentores dessa mão-de-obra[2].

Após a execução de Tiradentes sobrava o lema da Inconfidência: “Liberdade ainda que tardia”, expressão que ficou marcada na bandeira de Minas Gerais.

Sobre a Conjuração Baiana, a revista Nova Escola (novembro de 2012), por exemplo, em um de seus artigos sob o título “Aconteceu na França, respingou aqui”, menciona o fato de ela ter tido grande influência no exemplo da República, implantada na França, como parte do processo da Revolução. ‘Todos serão iguais, não haverá diferença, só haverá liberdade, igualdade e fraternidade’. Esta declaração descrita em panfletos no dia 12 de agosto de 1798, convocava as pessoas à revolução e à instauração da República Baiana. O movimento revolucionário foi reprimido com violência e com a execução dos conjurados, mas expressou a popularidade do movimento.

Em Pernambuco, a chamada Insurreição Pernambucana contou com representantes de várias classes. “Os presos políticos foram libertados, criou-se a bandeira da República Pernambucana, extinguiram-se os títulos de nobreza e aumentou-se o soldo militar”. (Costa & Mello, Op. Cit., página 100). As forças metropolitanas mataram, prenderam e executaram insurretos, mas a Insurreição deixou implantada as ideias republicanas, as quais se manifestariam, novamente, em 1824, na chamada Confederação do Equador, movimento que envolveu outras províncias nordestinas e que também chegaram a implantar uma República, ainda que tenha durado por pouco tempo.

Independência Política do Brasil, ocorrida em 1822, além de não trazer nenhuma mudança significativa das condições de vida da maioria da população pobre, formada principalmente por escravos e mestiços, apresentava algumas diferenças entre o que ocorreu no Brasil e em outros países da antiga América Espanhola. Enquanto lá foi adotada a república logo em seguida à independência, o Brasil continuou sendo governado por um monarca (e ainda) membro da família real de sua ex-metrópole. A República só aconteceria no Brasil em 1889.

2.    O movimento republicano e o fim do Segundo Reinado

Durante o Império, revoltas como a da Revolução Farroupilha (1835 a 1845), por exemplo, representaram a tentativa de acabar com a monarquia no Brasil. E após a Guerra do Paraguai (1864 a 1870), os militares, “vitoriosos” da guerra, voltaram para o Brasil com ideias abolicionistas, republicanas e com grande prestígio popular. Faltavam apenas algumas pinceladas para que a República surgisse totalmente definida. “Não é a república que vem, é o império que vai”, dizia-se na época.

“A centralização, tal como existe, representa o despotismo, dá força ao poder pessoal que avassala, estraga e corrompe os caracteres, perverte e anarquiza os espíritos, comprime a liberdade, constrange o cidadão, subordina o direito de todos ao arbítrio de um só poder, nulifica de fato a soberania nacional, mata o estímulo do progresso local, suga a riqueza peculiar das províncias, constituindo-as satélites obrigadas da Corte – centro absorvente e compressor que tudo corrompe e tudo concentra em si”[3].

O trecho do discurso republicano acima demonstra a intenção de descentralizar o poder do rei e dar mais autonomia às províncias. Na verdade, o que os republicanos pretendiam era atender às conveniências das camadas dominantes locais, representados pela ala radical do antigo Partido Liberal. Esse setor – radical – adota as ideias republicanas e funda no Rio de Janeiro, em 1870, o Partido Republicano que, pouco a pouco, seria criado também em São Paulo (1873) e em Minas Gerais (1888).

Os adeptos do Partido Republicano dividiram-se em duas facções: uma, evolucionista, cujo principal líder era Quintino Bocaiuva, era favorável à implantação da República por meio de eleições, e a outra, revolucionária, cujo principal líder era Silva Jardim, entendia que somente uma revolução popular derrubaria a monarquia.

O que acabou prevalecendo, no entanto, não foi nenhuma das facções acima e, sim, um golpe tramado pelos militares (uma verdadeira quartelada) e os cafeicultores. Na manhã do dia 15 de novembro de 1889, o Marechal Deodoro da Fonseca e suas tropas invadiram o Ministério da Guerra, onde os monarquistas estavam refugiados, destituíram Ouro Preto (último primeiro-ministro, que respondia pelo imperador, que estava doente). Os monarquistas não reagiram, e assim, dentro de um gabinete militar, a república foi instaurada. Mais uma vez, assim como aconteceu em 1822, sem a participação popular.

3.    A consolidação da República: Governo Provisório e Constituição de 1891

Em 15 de novembro de 1889, foi proclamada oficialmente a república brasileira pelo Marechal Deodoro da Fonseca, e este assumiu o governo, até que uma nova Constituição foi votada. Enquanto esta não saia, Deodoro toma algumas medidas, sob a forma de “Governo Provisório Republicano”.

As principais medidas tomadas pelo Governo Provisório[4] foram:

§  Estabelecimento da República federativa como regime político, sob a denominação de Estados Unidos do Brasil.

§  As províncias passam a se chamar estados.

§  Absolvição das Assembleias Provisórias e das Câmaras Municipais.

§  Nomeação de novos governantes para os estados e municípios.

§  Criação da bandeira republicana, com o lema positivista Ordem e Progresso.

§  Concessão da cidadania brasileira aos estrangeiros aqui residentes (a grande naturalização).

§  Convocação de uma Assembleia Constituinte.

§  Separação entre Igreja e Estado, instituição do casamento civil e secularização dos cemitérios;

§  Reforma do Código Penal.

Entre os direitos dos cidadãos, a Constituição – conjunto de leis que estabelecem os direitos e os deveres dos cidadãos – estabeleceu:

§  a igualdade de todos perante a lei;

§  liberdade religiosa e separação entre o Estado e a Igreja;

§  a inviolabilidade do lar e o sigilo da correspondência (isto é, todos teriam o direito de não ter a casa invadida nem a correspondência aberta);

§  a manutenção da propriedade particular;

§  o livre exercício de qualquer profissão;

§  a liberdade de associação e de manifestação de pensamento;-o casamento civil;

§  o ensino leigo (não religioso) nas escolas públicas;

Para votar e ser votado, o cidadão já não precisava ter renda mínima anual. Bastaria ser maior de 21 anos e do sexo masculino, desde que não fosse mendigo, analfabeto, soldado raso ou membro de ordem religiosa[5].

Durante o Governo Provisório, o ministro da Fazenda foi Rui Barbosa, que pretendendo tornar o Brasil uma república capitalista moderna e com muitas indústrias, permitiu a alguns bancos imprimir e emprestar dinheiro. Com o dinheiro fácil, muita gente começou a pedir empréstimos e investir na bolsa de valores. Assim, muitas empresas fantasmas foram criadas só para conseguir investimentos. No fim, veio a crise: a desvalorização do dinheiro, a desorganização financeira, a falência das empresas, grandes e pequenas fortunas perdidas etc. Essa crise recebeu o nome de Encilhamento, devido à semelhança que existia entre a barulheira feita na hora do fechamento dos negócios na bolsa de valores e na do fechamento das apostas no jóquei (clube de corridas de cavalos).

Tanto os fazendeiros (que queriam continuar mandando no país) como as empresas estrangeiras (que queriam continuar exportando para o Brasil e por isso eram contra a industrialização) começaram a exigir o afastamento de rui Barbosa e a fazer oposição ao presidente Deodoro da Fonseca. Este, para tentar se manter no poder, demitiu Rui Barbosa e colocou em seu lugar um monarquista conservador, o barão de Lucena, que era contra a política de rui Barbosa e defendia o predomínio da agricultura sobre a indústria. Agora eram os reformistas e industrialistas que protestavam.

Diante da forte oposição, o presidente não teve dúvidas: no dia 3 de novembro de 1891 fechou o congresso e convocou novas eleições, embora a Constituição não lhe desse poderes para isso. A reação foi grande. As Forças Armadas não apoiaram o presidente, que, sem outra alternativa, no dia 23 de novembro declarou aos militares: “Não sou mais o presidente da República”, sendo sucedido pelo Marechal Floriano Peixoto.

 

Bandeira do Brasil

A ideia da bandeira atual foi elaborada pelo professor Raimundo Teixeira Mendes, que contou também com a participação do Dr. Miguel Lemos e o professor Manuel Pereira Reis e quem realizou a confecção do desenho foi o pintor Décio Vilares[6].

O Congresso Constituinte começou seus trabalhos em 15 de novembro de 1890 e, em 24 de fevereiro de 1891, foi promulgada a segunda Constituição do Brasil e a primeira da República. A nova Constituição organizou o governo em três poderes autônomos: Poder Executivo, exercido pelo presidente da República; Poder Legislativo, exercido pelo Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado) e Poder Judiciário, exercido pelo Supremo Tribunal Federal.

Veja no vídeo (link abaixo), o Hino da República do Brasil[7]:

§  Letra: Medeiros e Albuquerque, 1890.

§  Composição: Leopoldo Américo Miguez, 1890.

§  Publicação: Diário Oficial, em 21/01/1890.


Para reflexão: 

A Proclamação da República foi um golpe?

Veja o vídeo (link a seguir) a seguir...



Notas / Referências bibliográficas:

  •  [1] SOUSA, Rainer. A Proclamação da República. Disponível em: <http://educador.brasilescola.com/estrategias-ensino/a-proclamacao-republica.htm>. Acesso em: 07/09/2021.
  •  [3] Trecho do MANIFESTO DOS REPUBLICANOS. In. COSTA, Luís César Amand & MELLO, Leonel Itaussu A. História do Brasil. São Paulo: Scipione (?), p. 178.
  •  [4] COTRIM, Gilberto. Saber e Fazer História, 8ª Série (Adaptado). São Paulo: Saraiva, 2002. P. ?.
  •  [5] PILETTI, Nelson & Claudino. História: EJA (Educação de Jovens e Adultos), Ensino Fundamental, 4º Ciclo (texto adaptado). São Paulo: Ática, 2003, p. 100.
  •  [6] BNDEIRA do Brasil. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Bandeira_do_Brasil>. Acesso em: 07/09/2021.
  •  [7] Hino da Proclamação da República. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Hino_da_Proclama%C3%A7%C3%A3o_da_Rep%C3%BAblica>. Acesso em: 07/09/2021.

28 agosto 2021

O Apóstolo Tomé

Tomé[1]

Ora, Tomé, um dos doze, chamado Dídimo, não estava com eles quando veio Jesus. Disseram-lhe, pois, os outros discípulos: Vimos o Senhor. Mas ele disse-lhes: Se eu não vir o sinal dos cravos em suas mãos, e não puser o meu dedo no lugar dos cravos, e não puser a minha mão no seu lado, de maneira nenhuma o crerei. E oito dias depois estavam outra vez os seus discípulos dentro, e com eles Tomé. Chegou Jesus, estando as portas fechadas, e apresentou-se no meio, e disse: Paz seja convosco. Depois disse a Tomé: Põe aqui o teu dedo, e vê as minhas mãos; e chega a tua mão, e põe-na no meu lado; e não sejas incrédulo, mas crente. E Tomé respondeu, e disse-lhe: Senhor meu, e Deus meu!
Disse-lhe Jesus: Porque me viste, Tomé, creste; bem-aventurados os que não viram e creram” (Jo 20.24-29)[2] – Grifos meus
.

Tomé (em aramaico te`ômã`), foi um dos apóstolos de Jesus, também chamado Dídimo (em grego), que significa “gêmeo”, (Jo 11.16; 20.24; 21.2). Embora seu nome apareça nos quatro Evangelhos do Novo Testamento, os traços sobre sua personalidade aparecem principalmente no quarto: Evangelho de João. Por isso que destaquei na passagem acima a expressão “incrédulo”, atribuída a ele por Jesus, pelo fato de ele descrer de sua ressurreição, e a sua resposta “Senhor meu, e Deus meu”, uma das grandes verdades a respeito da divindade de Jesus, reconhecida por ele em seguida, um (possivelmente) ex-incrédulo, que entendeu rapidamente o pedido de Jesus para mudar de atitude e ser “crente”, depois de ser confrontado com a verdade de que Jesus tinha ressuscitado e que ele podia até tocar em suas feridas provocadas pelas lanças dos seus algozes. Por estes motivos, acho que ele pode também bem ser adjetivado como um apóstolo de personalidade racional e dúbia, uma vez que ele tinha dificuldade de crer em milagres, mas também, uma vez ciente da verdade a que buscava, ele a defendia naturalmente.

Devido ao significado de seu nome, parece evidente que Tomé tenha tido um irmão gêmeo, porém não existe qualquer informação sobre esse irmão ou irmã dele nos Evangelhos. Também é no Evangelho de João – repito – que encontramos as melhores informações sobre quem foi Tomé, visto que nos outros Evangelhos e no livro de Atos ele é meramente mencionado na lista que traz os nomes dos apóstolos (Mt 10.3; Mc 3.18; Lc 6,15 e At 1.13).

Ainda um pouco mais sobre a personalidade de Tomé, percebe-se que ele demonstra pessimismo e uma enorme devoção ao Senhor ao mesmo tempo, por exemplo, quando da ressurreição de Lázaro. Nesta ocasião, Tomé, considerando a ameaçava real de apedrejamento caso Jesus fosse à Judéia, declarou: “...vamos também nós para morrermos com ele” (Jo 11.16b). Embora Tomé demonstre desânimo e pessimismo frente a possibilidade de ser morto, ele declara sua aptidão a morrer – se fosse o caso – juntamente com o seu Senhor. Todavia, esta aparente prontidão de morrer com Jesus não fica demonstrada por Tomé quando Jesus é preso. Naquele momento, ele e os demais apóstolos fugiram. Embora, pelas Escrituras do Antigo Testamento, isto de fato aconteceria para cumprimento da profecia que afirma: “... ferirei o pastor, e as ovelhas se dispersarão” (Mc 14.27c) – conforme Zacarias 13.7.

Tomé[3] também demonstrou dúvida acerca do ensino do Senhor Jesus de que os discípulos conheciam o caminho para onde Ele estava indo, ao dizer: Disse-lhe Tomé: Senhor, nós não sabemos para onde vais; e como podemos saber o caminho?” (Jo 14.5). É possível que Tomé, nesse questionamento, estivesse representando o pensamento dos outros discípulos. De qualquer forma, essa frase revela certa fraqueza, mas que é imediatamente confrontada com a conhecida resposta do Senhor Jesus: Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim (Jo 14.6).

Mas Tomé viu o Cristo ressurreto, seu Senhor e seu Deus. Após sua ressurreição, como já vimos, Tomé demonstra incredulidade e depois revela o atributo da onisciência de Jesus, portanto, de um Cristo Deus, o qual tinha visto e ouvido suas demonstrações de incredulidade, oito dias antes. O texto bíblico não esclarece se Tomé tocou ou não nas feridas de Jesus, ou se apenas esse terno convite, respondendo nos mínimos detalhes a sua exigência, já tenha bastado. Em todos os casos, seja qual tenha sido sua reação, ela o conduziu prontamente à sua profunda declaração de fé: “Senhor meu, e Deus meu!” (João 20:28). E sendo Deus, Jesus é reconhecido por Tomé e pelos cristãos, como uma das pessoas da Trindade (cf. Jo 1.1-3).

Tomé também estava presente junto aos discípulos que pescavam num barco no mar da Galileia quando Jesus novamente apareceu a eles (João 21).

Além destes (e outros) relatos bíblicos expostos acima, há muitas especulações e (possíveis) lendas a respeito de Tomé na tradição cristã. Uma dessas “lendas” (ou não) que já destacamos, por exemplo, em outro momento, afirma que Tomé esteve no (que um dia viria a ser) Brasil. Segundo Jorge PINHEIRO[4], pelo menos dois grupos indígenas, o dos Tupinambá e o Tupi-Guarani, faziam menção a um tal “Pai Çumé” (ou Sumé), ou seja, Tomé, um dos apóstolos de Cristo. “... os tupis [por exemplo] acreditavam que Çumé partiu caminhando sobre as águas do Atlântico, mas prometeu voltar um dia para continuar sua obra civilizatória. Quem sabe a profecia se cumpriu e Çumé retornou com a chegada dos jesuítas?”, diz Jorge (PINHEIRO: 2008, p. 104). Há outras “possíveis” referências sobre Tomé também na Bahia, Peru, Bolívia..., e há informações também que Tomé pregou o Evangelho na Índia e Síria.

Sobre sua morte, não é possível afirmar qualquer coisa realmente confiável sobre como ela aconteceu. Segundo Franklin Ferreira, “Tomé foi morto por lanceiros próximo a Madras[5], cidade indiana, no ano 72[6]. É bem possível que haja algum autor gnóstico com o mesmo pseudônimo de Tomé, mas – concordamos com Conegero (NOTA 3) – o que realmente precisamos saber a respeito de Tomé, as informações registradas na Bíblia acerca dele são suficientes. Aquele Tomé, popularmente conhecido como “incrédulo” é também aquele que o Evangelho de João o apresenta como revelador de um dos mais profundos atributos de Jesus Cristo: a sua deidade, expressa na confissão “Senhor meu, e Deus meu!”.

Sugiro vídeo de Lamartine Posella, abaixo, como ampliação deste conteúdo...



Notas / Referências bibliográficas:

  • [1] Imagem meramente ilustrativa. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Tom%C3%A9,_o_Ap%C3%B3stolo>. Acesso em: 28/08/2021.
  • [2] Esta e as demais passagens bíblicas utilizadas neste artigo são da versão protestante ACF – Almeida, Corrida Fiel, disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf>. Acesso em: 28/08/2021. 
  • [3] CONEGERO, Daniel. Quem Foi o Apóstolo Tomé? (Texto adaptado). Disponível em: <https://estiloadoracao.com/quem-foi-o-apostolo-tome/>. Acesso em: 28/08/2021. 
  • [4] PINHEIRO, Jorge. Deus é brasileiro: as brasilidades e o reino de Deus. São Paulo: Fonte Editorial, 2008. 
  • [5] FERREIRA, Franklin, O martírio cristão. Disponível em: <https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/franklin-ferreira/o-martirio-cristao/?#success=true>. Acesso em: 28/08/2021. 
  • [6] Veja NOTA 1.


Campo 14 – bebês mortos a pauladas, fome e execuções: a vida em um campo de concentração norte-coreano

P or J ones R ossi  [ 1 ] Uma aula no Campo 14   Os  professores do Campo 14 eram guardas uniformizados:  tratados por Shin no desenho acima...