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23 outubro 2020

Ernesto Araújo e o seu grito por liberdade

“Sem a dimensão espiritual o ser humano perde a sua dignidade e os povos perdem a sua liberdade. Meu discurso hoje na formatura dos alunos do Instituto Rio Branco, prestigiada pela presença do Presidente...” (Ernesto Araújo).


Foto: Presidente Jair Bolsonaro e o Ministro

Ernesto Araújo, em22/10/220.

O discurso[1] do Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, no Instituto Rio Branco, em Brasília, dia 22/10/2020, soou como um grito de um conservador que anseia pela liberdade. Aquela liberdade que esperamos sempre que suas asas estejam abertas sobre nós brasileiros

A fala dele sobre que o Itamaraty precisa de libertação é extensiva à toda a Nação brasileira. O Brasil precisa de liberdade:

·  porque o comunismo brasileiro, outrora, uma ditadura do proletariado, hoje – esquerdistas / isentões / globalistas – agem em nome do politicamente correto e da criação de órgãos de controle da verdade.

·  porque há uma busca da dialética no sentido da relativização da verdade, onde a verdade é tudo aquilo que serve ao poder do partido.

·  porque estão querendo transformar o Brasil numa utopia de um país sem Deus, e os brasileiros em uma massa.

ð  uma massa que destrói igrejas e imagens, como no Chile;

ð  ... que destrói a fé cristã, não apenas de fora, mas também de dentro (culturalmente);

Obs: Teologia da libertação não é nem teologia nem muito menos liberta as pessoas.

ð  ... que a exemplo das oligarquias (no passado), querem o PODER, e para isso, vale até roubar o povo brasileiro.

·  a liberdade e a verdade para os cristãos e conservadores só se encontram em Deus, o qual proporciona a couraça moral e o coração palpitante de amor patriótico para enfrentar o dragão da maldade.

ð  intrínseca ao homem, criado à imagem e semelhança do criador e que possui uma alma imortal;

ð  pelo reconhecimento e cultivo da dimensão espiritual (homem ó criador), o ser humano poderá exercer plenamente sua humanidade e sua liberdade;

“A ordem moral, a percepção do bem e do mal, pressupõe uma dimensão vertical do ser humano, que transcende a dimensão horizontal da natureza. Na construção materialista só existe o poder. A lei é ali um instrumento do poder e a ele se subordina

ð  por ter aspirações à transcendência, o ser humano é uma permanente aspiração à transcendência, coisa que o iluminismo não consegue responder, pois queria esmagar Deus, o Cristo, o espírito humano, o próprio homem em sua essência indefinível, que escapa à lógica;

ð  tanto a liberdade quanto a justiça requerem que o homem continue a poder beber do caudal da transcendência.

·  liberdade constante na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (um verdadeiro hino à liberdade), mas que o globalismo esqueceu:

ð  Art. 18 – estabelece a liberdade de pensamento e de crença: não à cristofobia...;

ð  Art. 19 – consagra a liberdade de opinião e de expressão;

ð  Art. 21 – determina o direito à democracia: “todo o poder emana do povo”.

·  conservadores são tachados de ideólogos por pessoas com baixa capacidade intelectual, que não alcançam a compreensão de seus valores. Daí transformam:

ð  meio ambiente e as preocupações legítimas com esse tema em ambientalismo;

ð  mudança climática em climatismo;

ð  ciência em cientificismo;

ð  iluminação [pela verdade] em iluminismo;

ð  instituições multilaterais úteis para a coordenação entre as nações em multilateralismo;

ð  uma doença causada por um vírus, a Covid, por exemplo, em Covidismo.

“Aqueles que nos acusam de ideológicos são aqueles que ideologizam toda a realidade e toda a vida para concentrar poderes. Já têm a solução para tudo e estão sempre à cata de novos problemas para encaixar essa solução. A solução é mais poder para eles, menos poder para as pessoas comuns, menos liberdade para o espírito”.

 

Enfim, o excelente discurso de Ernesto Araújo, seguindo duas linhas de raciocínio, poesia e diplomacia, expõe principalmente o tema liberdade. E destaca que a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 é um verdadeiro hino à esta liberdade. Nesse sentido, acompanhando o que passa em nossa República, anseio para que aconteça o que diz o refrão de seu hino:

“Liberdade! Liberdade!

Abre as asas sobre nós

Das lutas na tempestade

Dá que ouçamos tua voz”,

É a liberdade que faz nosso País ser triunfante e que os conservadores a veja como uma “livre terra de livres irmãos!

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Abaixo, o Discurso falado[2] do Ministro na íntegra:

Link: <https://www.youtube.com/watch?v=eeEawfB7X-g>

Notas / Referências:



22 outubro 2020

Revelação Geral e Revelação Especial de Deus

Este é o quarto post que escrevemos acerca de Deus. Nos anteriores, falamos, primeiramente, sobre os argumentos em prol da sua existência, depois, sobre seus atributos, e por último, sobre sua doutrina, incluindo a Trindade. Neste, queremos enfocar a revelação geral e a especial de Deus, embora estes dois assuntos já estejam permeados nos posts anteriores.


1. Revelação Geral:

“Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se veem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis” (Rm 1.19-20).

Num outro momento, já vimos acerca do argumento Teleológico ou do desígnio que afirma, entre outras coisas, ser o universo, obra de um grande Arquiteto. Seguindo parte desta linha de raciocínio, a revelação geral diz respeito ao universo ou a toda manifestação de Deus que é feita a todas as pessoas de todos os tempos e lugares, mediante a qual elas vêm a saber que Deus existe, e como Ele é. Embora não transmita verdades salvadoras tais como a trindade, a encarnação ou a expiação, a revelação geral transmite a convicção de que Deus existe que é autossuficiente, transcendente, imanente, eterno, poderoso, sábio, bom e justo. A revelação geral, ou natural pode ser dividida em duas categorias: a interna, que diz respeito ao senso inato da deidade e da consciência, e a externa, relacionada à natureza e à história da providência.

Demarest (Op. Cit., pp. 303-304) afirma, citando Lutero, que “todos os homens têm o conhecimento geral de que Deus existe, que Ele criou os céus e a terra, que Ele é justo, que Ele castiga os iníquos etc”, enquanto Calvino insistiu que “até mesmo homens iníquos são forçados, pelo mero contemplar da terra e do céu, a subirem em direção ao Criador”.

Apresentando alguns dados bíblicos, Demarest aponta:

O discurso de Eliú dirigido a Jó (cap. 36.24-37.24), que chama a atenção à chuva que rega a terra, ao trovão e aos raios que infundem terror no coração, à fúria da tempestade e ao brilho fulgurante do sol depois da tempestade. O texto sugere que esses fenômenos naturais atestam o poder, a majestade, a bondade e a severidade do Deus Criador, e que os dados estão presentes para todos contemplares (JÓ 36.25). Além disso, o discurso que Deus dirigiu a Jó (cap. 38.1-39.30) transmite a ideia de que os fenômenos naturais (trovão, relâmpago, chuva, neve), o nascer do sol todas as manhas, as constelações majestosas nos céus, e a complexidade e os inter-relacionamentos harmoniosos no reino animal, todas essas coisas atestam a existência e a glória de Deus.

De acordo com o Salmo 19, Deus Se revela através de uma obra em dois volumes: o livro da natureza (vs. 1 a 6) e o livro da lei (vs. 7-13). No primeiro volume, lemos: “Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras de suas mãos” (v. 1). Aquilo que a ordem criada demonstra é a “glória”, saber: a manifestação externa daquilo que Deus é no Seu intimo e dos Seus atributos. A revelação da glória de Deus nos céus é declarada perpétua ou ininterrupta (V. 2), muda ou inaudível (v. 3), e de alcance mundial (v. 4).

Vemos mais um dado bíblico em Romanos 2.14-45, onde Paulo ensina que uma modalidade adicional da revelação geral é a lei moral implantada, da qual o coração dá testemunho mediante a faculdade da consciência. Todos os homens são culpados por transgredirem a lei, argumenta Paulo: os judeus, porque violaram a lei escrita em pedras, e os gentios, porque deixaram de viver segundo a lei moral escrita no seu coração (cf. Rm 1.320. Existe, comunicado a toda pessoa racional mediante o poder da consciência, um supremo Legislador e Suas exigências morais. Por isso, podemos afirmar que a revelação geral é referida como tal porque possui um conteúdo geral e é revelada para um público em geral. Através da revelação geral, dirigida a todos os homens, Deus comunica a Sua existência, Seu poder e Sua glória, de modo que os homens são deixados sem desculpa.

2.  Revelação Especial:

“Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça; Para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra” (2Tm 3.16-17).

A revelação geral, imediata (que ocorre sem um agente intermediário) ou mediada (que ocorre através de um agente intermediário, como as obras criadas, por exemplo) é dirigida a todos os homens. No entanto, ela não é suficiente para levá-los ao conhecimento de Deus e da sua vontade necessário para a salvação. Ela não revela Jesus Cristo ou Sua obra redentora dirigida aos pecadores. Assim, torna-se necessário aquilo que é chamado de revelação especial.

Embora a revelação de Deus não deva, necessariamente, ser dividida em geral e a especial, mas não há dúvida que há uma revelação especial, que é redentora e está acima da luz natural da razão. As Escrituras, que como vimos, também fala da revelação geral ao destacar a natureza e a consciência humana, publica as boas-novas que o Deus santo e misericordioso promete a salvação como uma dádiva divina ao homem que não pode salvar-se a si mesmo (AT), e que Ele agora cumpriu aquela promessa mediante a dádiva do Seu Filho, em quem todos os homens são chamados a crer (NT). O evangelho é a notícia de que o Logos encarnado (do qual falaremos noutro momento) carregou sobre Si os pecados dos homens condenados, morreu em seu lugar e ressuscitou para a sua justificação. Este é o centro permanente da revelação especial redentora.

Para chegar esta revelação especial à humanidade, Deus preparou um povo, Israel, na Antiga Aliança, e a igreja, na Nova Aliança, para revelar-lhe diretamente o conhecimento necessário à salvação. Foi assim que Deus revelou-se a Noé, a Abraão, a Moisés, aos profetas, a Davi, a Salomão, aos seus apóstolos e, especialmente, em Cristo. É neste sentido que o autor da Epístola aos Hebreus afirma que, “havendo Deus, outrora, falado muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias nos falou pelo Filho a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo” (Hb 1.1-2). Cristo é a revelação final de Deus.

É este também o sentido das palavras do apóstolo Paulo endereçada aos gálatas: “Faço-vos, porém, saber, irmãos, que o evangelho por mim anunciado não é segundo o homem; porque eu não o recebi, nem o aprendi de homem algum, mas mediante revelação de Jesus Cristo” (Gl 1.11-12). À igreja de Deus, portanto, foram confiados os oráculos de Deus, uma revelação especial, inspirada, clara, precisa, autoritativa, suficiente para ensinar ao homem o que ele deve conhecer e crer e o que dele é requerido, com vistas à sua própria salvação e à glória de Deus.

Como afirma A Confissão de Fé Westminster 1.1:

Ainda que a luz da natureza e as obras da criação e da providência manifestam de tal modo a bondade, a sabedoria e o poder de Deus, que os homens sejam inescusáveis todavia não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e de sua vontade, necessário à salvação; por isso agradou ao Senhor, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e contra a maldade de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda. Isto torna as Escrituras Sagradas indispensável [sic], tendo cessado aqueles antigos modos de Deus revelar a sua vontade ao seu povo.[1]

Concluindo, vimos que pela revelação geral, a humanidade em geral tem conhecimento de um Deus todo-poderoso e que através de Suas obras e nossa consciência não somos enganados em relação à Sua resistência e atributos. Mas que, além disso, Ele deixou-nos uma revelação escrita para aqueles que queiram conhecer sobre o caminho da salvação, sua comunhão e seu destino com Ele.

Sobre a Revelação Escrita, veja os meus posts:

Referências bibliográficas:

DEMAREST, B. A. Revelação Geral. In: ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.).

HENRY, C. F. H. Revelação Especial. In: ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.).

MATHISON, Keith. Revelação Geral e Revelação Especial – Uma abordagem reformada sobre a relação entre Ciência e Escrituras. Disponível em: <https://tuporem.org.br/revelacao-geral-e-revelacao-especial/>. Acesso em: 14/05/2019.


Nota:

  •  [1] Disponível em: <http://www.executivaipb.com.br/arquivos/confissao_de_westminster.pdf>. Acesso em 17/05/2019.

21 outubro 2020

A Doutrina de Deus

Sobre DEUS, já vimos dois artigos (posts): no primeiro, vimos o que Myer PEARLMAN descreve sobre alguns argumentos sobre sua existência, e no segundo, acerca de Seus atributos. Neste, fizemos um breve estudo sobre o Ser de Deus – sua personalidade –, conceituado pelos seus diversos nomes e a doutrina da Trindade.



1. Definição de Deus: sua personalidade 

Quem é, e que é Deus? A melhor definição, segundo Myer Pearlman[1] “... é a que se encontra no Catecismo de Westminster: ‘Deus é Espírito, infinito, eterno e imutável em seu ser, sabedoria, poder, santidade, justiça, bondade e verdade” (Op. Cit., p. 41). E ele afirma também que a formulação bíblica desta definição está na compreensão dos “nomes de Deus”, assunto destacado mais abaixo. Sabemos que é impossível uma definição rigorosa da ideia de Deus. E a que foi mencionada acima é baseada no que a Bíblia ou o próprio Deus se revela de Si mesmo e de seus atributos. Uma das verdades acerca de Deus é que Ele é pessoal. 
Em contraste, com qualquer conceito metafísico neutro abstrato, afirma R. L Saucy[2], Deus das Escrituras é um Ser pessoal. Ele Se revela por nomes, especialmente o grande nome pessoal Javé (cf. Ex 3.13-15; 6.3; Is 42.8). Ele conhece e determina de modo autoconsciente, de acordo com o nosso conceito da personalidade. Por exemplo, em 1Coríntios 2.10-11 encontramos: “Mas Deus no-las revelou pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de Deus. Porque, qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o espírito do homem, que nele está? Assim também ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de Deus”. E em Efésios 1.11, vimos: “Nele, digo, em quem também fomos feitos herança, havendo sido predestinados, conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade”. A centralidade da personalidade de Deus é vista no fato de que, embora seja o Criador e o Preservador de toda a natureza, Ele é encontrado nas Escrituras não principalmente como o Deus da natureza, como nas religiões pagãs, mas, sim, como o Deus da história, que controla e dirige os assuntos dos homens. O lugar central da aliança mediante a qual Ele Se liga com os homens num relacionamento pessoal é uma indicação adicional da ênfase bíblica dada à natureza pessoal de Deus. Em nenhum lugar a personalidade de Deus fica mais evidente do que na Sua descrição bíblica como Pai. Jesus falava constantemente de Deus como “meu Pai”, “vosso Pai” e “o Pai celeste”. Além do relacionamento trinitariano sem igual entre o Filho divino e o Pai, que certamente envolve traços pessoais, a paternidade de Deus fala dEle como a origem e o sustentador das Suas criaturas, que pessoalmente cuida delas (Mt 5.45; 6.26-32), e Aquele para quem o homem pode voltar com confiança. 
A personalidade de Deus tem sido colocada em dúvida com base no nosso uso da palavra “pessoa”, no que diz respeito aos seres humanos. A personalidade humana envolve limitação que permite o relacionamento com outra pessoa ou com o mundo. Ser uma pessoa significa ser um indivíduo entre indivíduos. Tudo isto nos acautela contra antropomorfismos errôneos de Deus. Biblicamente, é mais apropriado entender que a personalidade de Deus tem prioridade sobre a do homem e, portanto, entender a personalidade humana de modo teomórfico, isto é, como uma réplica finita da pessoa divina infinita. A despeito da derradeira incompreensibilidade da personalidade supra-humana de Deus, as Escrituras O retratam como uma pessoa real que Se oferece a nós num relacionamento recíproco como um “tu” genuíno. 
O conceito bíblico da personalidade de Deus refuta todas as ideias filosóficas abstratas acerca dEle como mera Causa Prima ou Motor Imóvel bem como todos os conceitos naturalistas e panteístas. As equações modernas entre Deus e os relacionamentos pessoais imanentes – o amor – também são rejeitadas.


2. Os principais nomes de Deus 

Conforme vimos acima, Myer Pearlman afirma que a formulação bíblica para a definição de Deus está na compreensão dos seus “nomes”. Deus revela-se a si mesmo fazendo-se conhecer ou proclamando o seu nome JAVÉ. “E eu apareci a Abraão, a Isaque, e a Jacó, como o Deus Todo-Poderoso; mas pelo meu nome, o Senhor [Javé], não lhes fui perfeitamente conhecido” (Êx 6.3). Vejamos o significado deste e de outros nomes de Deus que encontramos nas Escrituras:

a) Javé ou Jeová (traduzido "SENHOR" na versão de Almeida[3]): 
Este nome, originado do tetragrama YHWH, intercalado com as vogais A e E ou E, O e A (YAHWÉH ou YEHOWAH. Tem relação também com o SER, em Êxodo 3.14-15 (E disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me enviou a vós. E Deus disse mais a Moisés: Assim dirás aos filhos de Israel: O Senhor Deus de vossos pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó, me enviou a vós; este é meu nome eternamente, e este é meu memorial de geração em geração), cujo verbo (SER) inclui os três tempos desse verbo — passado, presente e futuro. O nome, portanto significa: Ele que era, que é e que há de ser; em outras palavras, o Eterno. Visto que Jeová é o Deus que se revela a si mesmo ao homem, o nome significa: Eu me manifestei, me manifesto, e ainda me manifestarei. O que Deus opera a favor de seu povo acha expressão nos seus nomes, e ao experimentar o povo a sua graça, desse povo então pode dizer-se: "conhecem o seu nome." 
A relação entre Jeová e Israel resume-se no uso dos nomes encontrados nos concertos entre Jeová e seu povo. Por isso, Javé ou Jeová aparece acompanhado de outros nomes e significados como: 

  • Jeová-Rafa (Yahweh Raph’eka), "o Senhor que cura (sara)" (Êx 15.26). É a resposta de Jeová aos que jazem em leitos de doença (dor). 
  • Jeová-Nissi (Yahweh-nisi), "o Senhor é minha (nossa) bandeira" (Êx 17.15). O nome invocado pelos oprimidos frente à fúria do inimigo.
  • Jeová-Shalom (Yahweh-shalom), "o Senhor é (nossa) Paz" (Jz 6.24). Jeová enfatiza que a verdadeira paz para os desconsolados vem Dele.
  • Jeová Ra'ah, "o Senhor meu pastor" (Sl 23.1). Esse é o nome empregado pelo salmista Davi para expressar a liderança, provisão e proteção de Deus para com seu povo.
  • Jeová-Tsidkenu (Yahweh-tsidqenu), "o Senhor é nossa justiça" (Jr 23.6). Resposta de Jeová àqueles que se sentem sob condenação e necessitados da justificação.
  • Jeová Jireh (Yhaweh-yir’eh), "o Senhor que provê" (Gn 22.14). Esse foi o nome utilizado por Abraão para se referir a Deus na ocasião em que ele iria sacrificar seu filho Isaque no Monte Moriá.
  • Jeová-Shammah (Yahweh-shamah), "o Senhor está ali" (Ez 48.35). Expressão final da profecia do profeta Ezequiel, que enfatiza a promessa da presença de Deus com o seu povo.
  • Jeová Sabaote (Yahweh-tseva’ot), “Senhor dos Exércitos”. Título divino que aparece pela primeira vez em 1Samuel 1.3, e é mesmo utilizado por Davi quando ele foi lutar contra o gigante Golias dos filisteus (1Sm 17.45). 
b) Elohim. A palavra Elohim (p. ex. Gn 1.1) é a forma plural de El (Deus). Esta palavra emprega-se sempre que sejam descritos ou implícitos o poder criativo e a onipotência de Deus. Elohim é o Deus Criador. A forma plural significa a plenitude de poder e [pode] representa a trindade. A expressão “façamos o homem” (Gn 1.26) diz respeito à ação de Elohim (Deus, no plural) na criação do homem. Ou seja, a presença da trindade na obra da criação.

c) El (Deus), usado em certas combinações:

  • El-Elyon (Gn 14.18-20), o "Deus altíssimo", o Deus que é exaltado sobre tudo o que se chama deus ou deuses.
  • El-Shaddai, "o Deus que é suficiente para as necessidades do seu povo" (Êx 6.3).
  • El-Olam, "o eterno Deus" (Gn. 21.33)...

d) Adonai significa literalmente "Senhor" e “Pai”, e dá a ideia de governo e domínio. (Êx 23.17; Is 10.16,33.) Por causa do que Deus é e do que tem feito, ele exige o serviço e a lealdade do seu povo. Este nome no Novo Testamento aplica-se ao Cristo glorificado.


3. O Deus trino 

As Escrituras, afirma Pearlman, ensinam que Deus é Um, e que além dele não existe outro Deus. Poderia surgir a pergunta: "Como podia Deus ter comunhão com alguém antes que existissem as criaturas finitas?" A resposta é que a Unidade Divina é uma Unidade composta, e que nesta unidade há realmente três Pessoas distintas, cada uma das quais é a Divindade, e que, no entanto, cada uma está sumamente consciente das outras duas. Assim, vemos que havia comunhão antes que fossem criadas quaisquer criaturas finitas. Portanto, Deus nunca esteve só. Veja o esquema abaixo:

Não é o caso de haver três Deuses, todos três independentes e de existência própria. Os três cooperam unidos e num mesmo propósito, de maneira que no pleno sentido da palavra, são "um". O Pai cria, o Filho redime, e o Espírito Santo santifica; e, no entanto, em cada uma dessas operações divinas os Três estão presentes. O Pai é preeminentemente o Criador, mas o Filho e o Espírito são tidos como cooperadores na mesma obra. O Filho é preeminentemente o Redentor, mas Deus o Pai e o Espírito são considerados como Pessoas que enviam o Filho a redimir. O Espírito Santo é o Santificador, mas o Pai e o Filho cooperam nessa obra.

A Trindade é uma comunhão eterna, mas a obra da redenção do homem evocou a sua manifestação histórica. O Filho entrou no mundo duma maneira nova ao tomar sobre si a natureza humana e lhe foi dado um novo nome, Jesus. O Espírito Santo entrou no mundo duma maneira nova, isto é, como o Espírito de Cristo incorporado na igreja. Mas ao mesmo tempo, os três cooperaram. O Pai testificou do Filho (Mt 3.17); e o Filho testificou do Pai (Jo 5.19). O Filho testificou do Espírito (Jo 14.26), e mais tarde o Espírito testificou do Filho (Jo 15.26).

Será tudo isso difícil de compreender? Como poderia ser de outra maneira visto que estamos tentando explicar a vida íntima do Deus Todo poderoso! A doutrina da Trindade é claramente uma doutrina revelada, e não doutrina concebida pela razão humana. De que maneira poderíamos aprender acerca da natureza íntima da Divindade a não ser pela revelação? (1Co 2.16.) É verdade que a palavra "Trindade" não aparece no Novo Testamento; é uma expressão teológica, que surgiu no segundo século para descrever a Divindade. Mas o planeta Júpiter existiu antes de receber ele este nome; e a doutrina da Trindade encontrava-se na Bíblia antes que fosse tecnicamente chamada a Trindade.

3.1) A Trindade no Antigo Testamento:

O Antigo Testamento não ensina clara e diretamente sobre a Trindade, e a razão é evidente. Num mundo onde o culto de muitos deuses era comum, tornava-se necessário acentuar esta verdade em Israel, a verdade de que Deus é Um, e de que não havia outro além dele. Se no princípio a doutrina da Trindade fosse ensinada diretamente, poderia ter sido mal entendida e mal interpretada.

Muito embora essa doutrina não fosse explicitamente mencionada, sua origem pode ser vista no Antigo Testamento. Sempre que um hebreu pronunciava o nome de Deus (Elohim) ele estava realmente dizendo "Deuses", pois a palavra é plural, e às vezes se usa em hebraico acompanhada de adjetivo plural (Js. 24:18,19) e com verbo no plural. (Gn 35.7.) Imaginemos um hebreu devoto e esclarecido ponderando o fato de que Deus é Um, e, no entanto, é Elohim — "Deuses". Facilmente podemos imaginar que ele chegasse à conclusão de que exista pluralidade de pessoas dentro de um Deus.

Todos os membros da Trindade são mencionados no Antigo Testamento:

a) O Pai:
  • “Mas tu és nosso Pai, ainda que Abraão não nos conhece, e Israel não nos reconhece; tu, ó Senhor, és nosso Pai; nosso Redentor desde a antiguidade é o teu nome” (Is 63.16).
  • “Não temos nós todos um mesmo Pai? Não nos criou um mesmo Deus? Por que agimos aleivosamente cada um contra seu irmão, profanando a aliança de nossos pais?” (Ml 2.10).
b) O Filho de Jeová:
  • “O teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo; o cetro do teu reino é um cetro de equidade. Tu amas a justiça e odeias a impiedade; por isso Deus, o teu Deus, te ungiu com óleo de alegria mais do que a teus companheiros” (Sl 45.6,7).
  • “Os reis da terra se levantam e os governos consultam juntamente contra o Senhor e contra o seu ungido... Eu, porém, ungi o meu Rei sobre o meu santo monte de Sião. Proclamarei o decreto: o Senhor me disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei... Beijai o Filho, para que se não ire, e pereçais no caminho, quando em breve se acender a sua ira; bem-aventurados todos aqueles que nele confiam” (Sl 2.6,7,12).
Alguns textos apresentam também o Messias (o Filho) com títulos divinos:
  • “Eis que vêm dias, diz o Senhor, em que levantarei a Davi um Renovo justo; e, sendo rei, reinará e agirá sabiamente, e praticará o juízo e a justiça na terra. Nos seus dias Judá será salvo, e Israel habitará seguro; e este será o seu nome, com o qual Deus o chamará: O SENHOR JUSTIÇA NOSSA” (Jr 23.5,6).
  • “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e o principado está sobre os seus ombros, e se chamará o seu nome: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz” (Is 9.6.).
  • “Eis que eu envio um anjo diante de ti, para que te guarde pelo caminho, e te leve ao lugar que te tenho preparado. Guarda-te diante dele, e ouve a sua voz, e não o provoques à ira; porque não perdoará a vossa rebeldia; porque o meu nome está nele” (Êx 23.20,21).
c) O Espírito Santo:
  • “E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas” (Gn 1.2).
  • “E repousará sobre ele o Espírito do Senhor, o espírito de sabedoria e de entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito de conhecimento e de temor do Senhor. E deleitar-se-á no temor do Senhor; e não julgará segundo a vista dos seus olhos, nem repreenderá segundo o ouvir dos seus ouvidos” (Is 11.2,3).
  • “Chegai-vos a mim, ouvi isto: Não falei em segredo desde o princípio; desde o tempo em que aquilo se fez eu estava ali, e agora o Senhor DEUS me enviou a mim, e o seu Espírito” (Is 48.16).
  • “O Espírito do Senhor Deus está sobre mim, porque o Senhor me ungiu para pregar boas-novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos” (Is 61.1).
  • “Mas eles foram rebeldes e contristaram o seu Espírito Santo; pelo que se lhes tornou em inimigo e ele mesmo pelejou contra eles” (Is 63.10-ARC).

Prenúncios da Trindade veem-se na tríplice bênção de Nm 6.24-26 (“O Senhor te abençoe e te guarde; O Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti, e tenha misericórdia de ti; O Senhor sobre ti levante o seu rosto e te dê a paz”) e tríplice doxologia de Is 6.3 (E clamavam uns aos outros, dizendo: Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória).

3.2) A Trindade no Novo Testamento:

Os cristãos primitivos mantinham como um dos fundamentos da fé o fato da unidade de Deus. Tanto ao judeu como ao pagão podiam testificar: "Cremos em um Deus." Mas ao mesmo tempo eles tinham as palavras claras de Jesus para provar que ele arrogou a si uma posição e uma autoridade que seriam blasfêmia se não fosse ele Deus. Os escritores do Novo Testamento, ao referirem-se a Jesus, usaram uma linguagem que indicava reconhecerem a Jesus como sendo "... sobre todas as coisas, Deus bendito para sempre" (Rm 9.5). E a experiência espiritual dos cristãos apoiava estas afirmações. Ao conhecer a Jesus, conheciam-no como Deus.
O mesmo se verifica em relação a Deus e ao Espírito Santo. Os primitivos cristãos criam que o Espírito Santo, que morava neles, ensinando-os, guiando-os, e inspirando os a andar em novidade de vida, não era meramente uma influência ou um sentimento, mas um ser ao qual poderiam conhecer e com o qual suas almas poderiam ter verdadeira comunhão. E, ao examinarem o Novo Testamento, ali acharam que ele era descrito como possuindo os atributos de uma personalidade.
Assim a igreja primitiva se defrontava com estes dois fatos: que Deus é Um, e que o Pai é Deus; o Filho é Deus e o Espírito Santo é Deus. E estes dois grandes fatos concernentes a Deus constituem a doutrina da Trindade. Deus, o Pai, era para eles uma realidade; o Filho era para eles uma realidade; e da mesma forma, o Espírito Santo. E, diante desses fatos, a única conclusão a que se podia chegar era a seguinte: que havia na Divindade uma verdadeira, embora misteriosa, distinção de personalidades, distinção que se tomou manifesta na obra divina para redimir o homem.

3.3) Várias passagens do Novo Testamento mencionam as três Pessoas Divinas.

  • “E, sendo Jesus batizado, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba e vindo sobre ele. E eis que uma voz dos céus dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo” (Mt 3.16,17).
  • “E, chegando-se Jesus, falou-lhes, dizendo: É-me dado todo o poder no céu e na terra. Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28.18,19).
  • “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre; O Espírito de verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco, e estará em vós (...) Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito” (Jo 14.16,17,26).
  • “Mas, quando vier o Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito de verdade, que procede do Pai, ele testificará de mim” (Jo 15.26).
  • “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo seja com todos vós. Amém” (2Co 13,14).
  • “E, porque sois filhos, Deus enviou aos vossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai” (Gl 4.6).
  • “Porque por ele ambos temos acesso ao Pai em um mesmo Espírito” (Ef 2.18).
  • “Ora o Senhor encaminhe os vossos corações no amor de Deus, e na paciência de Cristo” (2Ts 3:5).
  • “Eleitos segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e aspersão do sangue de Jesus Cristo: Graça e paz vos sejam multiplicadas” (1Pe 1.2).
  • “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo” (Ef 1.3).
  • “Quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito eterno se ofereceu a si mesmo imaculado a Deus, purificará as vossas consciências das obras mortas, para servirdes ao Deus vivo?” (Hb 9.14).

Num próximo estudo, pretendemos falar mais especificamente sobre a deidade de cada uma das pessoas da Trindade, cuja doutrina desenvolveu-se do desejo da igreja de preservar as verdades bíblicas no tocante ao Deus que é o Senhor transcendente sobre toda a História e que, porém, dá-Se a Si mesmo pessoalmente para agir dentro da História. Aliás, a própria a palavra Trindade, que não se encontra na Bíblia, surge no século II, como resultado da preocupação com a definição da doutrina de Deus. O verdadeiro conhecimento desta verdade foi, e continua sendo, necessário para refutar distorções como o Subordinacionismo, que tornava Cristo menor do que Deus, o Pai, o adocianismo, que entendia que Cristo era apenas um ser humano revestido por algum tempo com o Espírito de Deus, o modalismo ou o sabelianismo, que diz que as pessoas de Cristo e do Espírito Santo são apenas papéis ou modificações históricas do único Deus...

A doutrina trinitariana, portanto, é central para o kerigma salvífico das Escrituras, de acordo com o qual o Deus transcendente age pessoalmente na História, para redimir as Suas criaturas e dar-Se a elas. Orígenes concluiu corretamente que o crente ‘não chegaria à salvação se a Trindade não fosse completa’. Portanto, que “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo seja com todos vós. Amém”.


Referências bibliográficas:

  • ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.).
  • PEARLMAN, Myer. Conhecendo as doutrinas da Bíblia. São Paulo: Vida, 1978 (7ª ed.).

Notas:

  • [1] PEARLMAN: 1978 (q.v.), pp. 51 a 55 – Texto adaptado de acordo com o Novo Acordo Ortográfico Brasileiro.
  • [2] SAUCY, R. L. Doutrina de Deus. In: ELWELL: 1988 (q.v.), pp. 440-444 – Texto parcial e adaptado de acordo com o Novo Acordo Ortográfico Brasileiro, usado conjuntamente com o texto de PEARLMAN (Nota 1) no decorrer deste estudo.
  • [3] Versão de Almeida é o nome às principais versões bíblicas do principal tradutor da Bíblia para a Língua Portuguesa, João Ferreira de Almeida. “A grande maioria dos evangélicos do Brasil associa o nome de João Ferreira de Almeida às Escrituras Sagradas. Afinal, é dele a tradução da Bíblia mais usada e apreciada pelos protestantes brasileiros. Disponível, no Brasil, em duas edições, a Revista e Corrigida e a Revista e Atualizada, a tradução de Almeida é a preferida de mais de 60% dos leitores evangélicos das Escrituras no País”. Disponível em: <http://www.sbb.org.br/a-biblia-sagrada/joao-ferreira-de-almeida/>. Acesso em 09/05/2019.


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19 outubro 2020

Deus (2): seus atributos

“No princípio... Deus...” (Gn 1.1). 

“Onde estavas tu, quando eu fundava a terra? Faze-mo saber, se tens inteligência” (Jó 38.4).

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus” (Jo 1.1). 

“Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para ele” (Cl 1.16).

Como parte da série Doutrinas Bíblicas, queremos dar continuidade ao nosso estudo, ainda que superficial, cerca de Deus. Depois do nosso artigo em prol da existência de Deus, queremos destacar, neste, os seus atributos[1], apesar de nossa limitação para tratar de assunto tão profundo e infinito. Para isto, usei como base o texto – adaptado e de acordo com o Novo Acordo Ortográfico – e as sugestões de G. R. LEWIS[2], mas com algumas inserções, destacadas nas notas abaixo.

O Deus, do qual ocupamos nesta e em outras reflexões é o Deus dos hebreus, cujas informações sobre o qual nós as encontramos no Antigo Testamento, primeira parte das Escrituras cristãs. E esta primeira parte da Bíblia inicia com a expressão: “no principio, criou Deus os céus e a terra” (Gn 1.1). Isto significa que Deus não se preocupa em provar sua existência. São as informações acerca de seus atributos que nos levam a entender um pouco do “ser de Deus”.


       Atributos são qualidades ou adjetivos que marcam as particularidades próprias de alguém. No caso de Deus, como um Ser invisível, pessoal e vivo, que se diferencia de todos os demais seres, podemos destacar os atributos como seguem: metafísicos, existenciais, éticos, intelectuais, emocionais e relacionais. 

1.  Atributos metafísicos: auto existência, eternidade e imutabilidade

Diferenças relevantes aparecem em vários aspectos, mas primeiramente focalizaremos as características de Deus metafisicamente distintas.

a)      Deus é auto existente:

Todos os demais seres foram criados e, portanto, têm um começo. Devem a outro sua existência. Para existir, Deus não depende do mundo nem de qualquer pessoa que nele há. O mundo depende de Deus para a sua existência. De modo contrário àqueles teólogos que dizem que não podemos conhecer nada a respeito de Deus em Si mesmo, Jesus revelou que Deus tem vida em Si mesmo: “Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo, assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo” (Jo 5.26). O fundamento da existência de Deus não se acha nos outros, porque nada há de mais ulterior do que Ele mesmo. Deus não tem origem; é Aquele que sempre existe: “E disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me enviou a vós” (Êx 3.14). Perguntar quem deu origem a Deus é fazer uma pergunta contraditória, conforme os termos do conceito que Jesus tem de Deus.

Outro termo que transmite o conceito e auto existência de Deus é “asseidade”. A palavra é derivada do latim a, que, significa “de” e se que significa “si mesmo”. Deus tem existência não-derivada, necessária, independente. Compreender que Deus é incontingente ajuda-nos a ver como Deus não é limitado por coisa alguma, é infinito, autodeterminado, não determinado por outra coisa senão Ele mesmo, de conformidade com Seus propósitos soberanos.

b)     Deus é eterno:

A vida de Deus vem de Si mesmo, não é algo que teve início no mundo do espaço e do tempo. Deus não teve início, fase de crescimento, velhice nem fim. O Senhor está entronizado como Rei para sempre: “O Senhor se assentou sobre o dilúvio; o Senhor se assenta como Rei, perpetuamente” (Sl 29.10). Este Deus é o nosso Deus para todo o sempre: “Porque este Deus é o nosso Deus para sempre; ele será nosso guia até à morte” (Sl 48.14). Embora Deus não seja limitado por espaço e tempo, nem pela sucessão de eventos no tempo, Ele criou o mundo com espaço e tempo. Deus sustenta o âmbito mutável dos eventos sucessivos e está consciente de cada movimento na História. O mundo observável e mutável não é sem importância nem irreal (maya, no hinduísmo) para o onipresente Senhor de tudo. Nenhuma vida, seja de uma tribo, nação, cidade, família ou pessoa, é sem valor, por mais breve ou aparentemente insignificante que seja. A natureza eterna de Deus não está totalmente fora do tempo, nem removida de tudo no tempo e no espaço. O mundo do espaço e do tempo não é estranho a Deus nem lhe é desconhecido. A História é o produto do planejamento eternamente sábio de Deus, do Seu propósito criador, da Sua preservação providencial e da Sua graça geral. Deus enche o espaço e o tempo com a Sua presença, sustenta-os e lhes dá propósito e valor. O Deus onipresente e ubíquo[3] é Senhor do tempo e da história, e não a forma contrária. Deus não nega o tempo, mas o cumpre. Nele, os Seus propósitos são atingidos.

Portanto, no cristianismo a eternidade não é de natureza intemporal e abstrata, mas o eterno é uma característica do Deus vivo presente em todos os tempos e todos os lugares, criando e sustentando o mundo do espaço e do tempo e realizando os Seus propósitos redentores na plenitude do tempo.

c)      Deus é imutável:

Deus é imutável em sua natureza, desejo e propósito. Dizer que Deus é imutável não é contradizer a verdade prévia de que Ele é vivo e ativo. É afirmar que todos os empregos do poder e da vitalidade divinos são coerentes com Seus atributos, como a sabedoria, a justiça e o amor. Os atos de Deus nunca são meramente arbitrários, embora alguns deles o possam ser por razões totalmente inerentes a Ele, ao invés de serem condicionados pela reação humana. Por trás de cada punição dirigida aos maus e de cada perdão concedido aos arrependidos está Seu imutável propósito no tocante ao pecado e à conversão. Ao contrário do conceito estoico da imutabilidade divina, Deus não é indiferente às atividades humanas. Pelo contrário, sempre podemos contar com a preocupação de Deus a favor da retidão humana. Deus responde imutavelmente à oração, de conformidade com Seus desejos e propósitos de amor santo. Daí, embora se fale em termos da experiência humana, às vezes se afirma nas Escrituras que Deus se arrepende; mas, na realidade, os impenitentes é que mudaram, ou os fiéis é que se tornaram infiéis.

Deus é o mesmo, embora tudo mais na criação envelheça como uma roupa: “Desde a antiguidade fundaste a terra, e os céus são obra das tuas mãos. Eles perecerão, mas tu permanecerás; todos eles se envelhecerão como um vestido; como roupa os mudarás, e ficarão mudados. Porém tu és o mesmo, e os teus anos nunca terão fim” (Sl 102.25-27). Jesus compartilhava desta mesma natureza imutável: “E: Tu, Senhor, no princípio fundaste a terra, E os céus são obra de tuas mãos. Eles perecerão, mas tu permanecerás; E todos eles, como roupa, envelhecerão, E como um manto os enrolarás, e serão mudados. Mas tu és o mesmo, E os teus anos não acabarão” (Hb 1.10-12) e a exibiu de modo vívido e coerente no decurso de todo o Seu ministério ativo, numa variedade de situações.

A imutabilidade do caráter de Deus significa que Ele nunca perde a Sua própria integridade nem decepciona as pessoas. Em Deus não pode existir variação ou sombra de mudança (Tg 1.17). A natureza e a palavra inabaláveis de Deus fornecem o fundamento mais forte para a fé e trazem forte consolação (Hb 6.17-18). Deus não é homem para mentir (Nm 23.19) ou Se arrepender (1Sm 15.29). O conselho do Senhor permanece para sempre (Sl 33.11). Passarão o céu e a terra, porém as palavras de Deus não passarão (Mt 5.18; 24.35).

2.  Atributos intelectuais: onisciência, fidelidade e sabedoria

A capacidade intelectual de Deus é ilimitada, e Deus a usa de modo pleno e perfeito.

a)  Deus é onisciente:

Deus sabe todas as coisas (1Jo 3.20). Jesus também tem este atributo de divindade, pois Pedro diz: “Senhor, tu sabes todas as coisas, tu sabes que eu te amo” (Jo 21.17). Deus conhece todos os pensamentos íntimos e os atos externos da humanidade (Sl 139). Nada em toda a criação está oculto aos olhos de Deus. Todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de prestar contas (Hb 4.13). Isaías fazia distinção entre o Senhor de tudo e os ídolos pela capacidade de o Senhor predizer o futuro (Is 44.7-8,25-28). Fica claro que o conhecimento do futuro da parte do Senhor era comunicável em conceitos e palavras humanos. No contexto, Isaías fez predições a respeito de Jerusalém, Judá, Ciro e o templo. Estes conceitos foram inspirados na língua original e são traduzíveis nos idiomas de todo o mundo.

Como Deus pode conhecer o fim desde o começo? De uma forma maior do que aquela ilustrada no conhecimento que uma pessoa tem que de um salmo decorado, sugeriu Agostinho. Antes de recitarmos o Salmo 23, ele está todo em nossa mente. Então, citamos a primeira metade dele, e sabemos o que já passou e a parte que ainda falta ser citada. Deus conhece a totalidade da História de uma só vez, simultaneamente, porque não é limitado por tempo e sucessão, mas Deus também conhece qual parte da História está no passado hoje, e qual parte está no futuro, porque o tempo não é irreal nem sem importância para Ele (Confissões XI, 31).

A crença de que Deus conhece tudo – no passado, no presente e no futuro – é de pouca relevância, no entanto, se o conhecimento de Deus fosse removido do conhecimento humano por uma distinção infinita e qualitativa, a frequente alegação de que o conhecimento de Deus é totalmente diferente do nosso subentende que a verdade de Deus pode ser contraditória em relação à nossa verdade. Ou seja, aquilo que é verdadeiro para nós é falso para Deus, ou aquilo que é falso para nós pode ser verdadeiro para Deus. Os defensores desta posição argumentam que, pelo fato de Deus ser onisciente, ele não pensa de modo discursivo, linha por linha, nem usa conceitos distintivos ligados pelo verbo “ser” em proposições lógicas. Este conceito da transcendência divina forneceu um corretivo eficaz às mãos de Barth[4] e Bultmann[5] contra a continuidade que o modernismo alegava entre o pensamento humano mais sublime e o pensamento de Deus. E aquela influência recebe apoio adicional dos místicos orientais que negam qualquer validez ao pensamento conceptual com referência ao eterno. Os relativistas de muitos campos também negam que quaisquer asseverações humanas, inclusive as da Bíblia, sejam capazes de expressar a verdade a respeito de Deus.

No entanto, segundo a perspectiva bíblica, a mente humana foi criada à imagem divina para pensar os pensamentos de Deus segundo Ele, ou receber, a verdade da parte de Deus, mediante as revelações geral e especial. Embora a queda tenha afetado a mente humana, esta capacidade não foi erradicada. O novo nascimento envolve a renovação da pessoa, pelo Espírito Santo, no conhecimento segundo a imagem do Criador (Cl 3.10).

Contextualmente, o conhecimento possível aos regenerados inclui a posição e a natureza atuais do Cristo exaltado (Cl 1.15-20) e o conhecimento da vontade de Deus (Cl 1.9). Com este conhecimento, os cristãos podem evitar o engano proveniente de raciocínios falazes que soam bem (Cl 2.4). Devem fortalecer a fé na qual foram instruídos por conceitos e palavras (Cl 2.7). E o conteúdo da palavra de Cristo pode prestar informações ao ensino e à adoração deles (Cl 3.16).

Destas maneiras e de muitas outras, as Escrituras pressupõem uma revelação informativa da parte de Deus, verbalmente inspirada e iluminada pelo Espírito, a mentes criadas e renovadas à imagem divina para o recebimento desta verdade. À medida que captamos o significado contextual dado pelos escritores originais das Escrituras, são verdadeiras as nossas asseverações, baseadas nas Escrituras, de que Deus é espirito, é santo, e é amor. Estas afirmações são verdadeiras para Deus assim como Ele é em Si mesmo. São verdadeiras para a fé e a vida dos cristãos e das igrejas.

A verdade proporcional que a Bíblia transmite em frases indicativas que afirmam, negam, argumentam, sustentam, pressupõem e inferem é plenamente verdadeira para Deus e para a humanidade. Naturalmente, a onisciência de Deus não é limitada às distinções entre os sujeitos e os predicados, a sequência lógica, a pesquisa exegética ou o raciocínio discursivo. Mas Deus conhece a diferença entre um sujeito e um predicado, relaciona-Se tanto com a sequência como com a sequência temporal, estimula pesquisas exegéticas e o raciocínio discursivo baseado na revelação. Embora a mente de Deus seja ilimitada e conheça tudo, não é totalmente diferente em todos os aspectos das mentes humanas criadas à Sua imagem. Portanto, sendo onisciente, Seus julgamentos se formam com conhecimento de todos os dados relevantes. Deus sabe tudo quanto diz respeito à verdade concernente a qualquer pessoa ou evento. Nossos julgamentos são verdadeiros à medida que se conformam aos de Deus, sendo coerentes ou fiéis a todas as evidencias relevantes.

b)  Deus é fiel e verdadeiro:

Porque Deus é fiel e verdadeiro (Ap 19.11), Seus juízos (Ap 19.2) e Suas palavras em linguagem humana são fiéis e verdadeiras (Ap 21.5; 22.6). Não há falta de fidelidade na pessoa, no pensamento ou na promessa de Deus. Ele não é hipócrita nem incoerente.

Mantenhamos firme a nossa esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel: “Retenhamos firmes a confissão da nossa esperança; porque fiel é o que prometeu” (Hb 10.23). Ele é fiel para perdoar os nossos pecados (1Jo 1.9), santificar os crentes até à volta de Cristo (1Ts 5.23-24), fortalecê-los e protegê-los do maligno (2Ts 3.3), e para não permitir que sejam tentados além daquilo que podem suportar (1Co 10.13). Até mesmo quando somos infiéis, Ele permanece fiel, pois de maneira nenhuma pode negar-se a Si mesmo (2Tm 2.13).

Nenhuma das boas promessas que Deus deu por meio de Moisés falhou (1Re 8.56). Isaías louva o nome divino, porque com fidelidade perfeita Deus fez coisas maravilhosas há muito tempo planejadas (Is 25.1). Passagens como estas transmitem uma integridade divina básica tanto na vida quanto no pensamento. Nenhum contraste pode ser feito entre aquilo que Deus é em si mesmo e aquilo que Ele é com relação aos que nEle confiam. Deus não contradiz as Suas promessas em Suas obras ou em outros ensinos por meio de dialética, paradoxo ou mera complementaridade. Deus conhece tudo, e nada pode surgir que já não tenha sido levado em conta antes de Deus revelar os Seus propósitos.

Porque Deus é fiel e coerente, nós também devemos ser fiéis e coerentes. Jesus disse: “Seja, porém, a tua palavra: Sim, sim; não, não” (Mt 5.7). Paulo demonstrou esta autenticidade lógica nos seus ensinos a respeito de Deus. Tão seguramente como Deus é fiel, disse ele, a nossa mensagem para convosco não é “sim” e “não” (2Co 1.18). Aqueles que imaginam que a conversa a respeito de Deus na linguagem humana tem de afirmar e negar a mesma coisa ao mesmo tempo e no mesmo assunto (na dialética ou no paradoxo) têm um conceito diferente do de Paulo sobre o relacionamento entre a mente divina e a mente da pessoa piedosa. Porque Deus é fiel, devemos ser fiéis em nossa mensagem a respeito dEle. Visto que Deus não pode negar a Si mesmo, não devemos negar a nós mesmos, ao falarmos a Deus.

Conhecendo a ligação entre a fidelidade pessoal e a conceptual em Deus, sabemos que a ideia de que pessoas não devem contradizer a si mesmas não se originou com Aristóteles. Embora ele tenha formulado a lei da não-contradição, de forma que tem sido citada a partir de então, a fonte ulterior do desafio à fidelidade humana na pessoa e na palavra está arraigada no próprio Deus. A exigência universal de honestidade intelectual reflete no coração humano a total integridade do coração do Criador.

c)  Deus é sábio:

Deus não é apenas onisciente e coerente em Sua Pessoa e palavra, mas também perfeitamente sábio. Além de conhecer todos os dados relevantes sobre qualquer assunto, Deus seleciona Seus fins com discernimento, e age com harmonia com Seus propósitos de amor santo. Talvez nem sempre consigamos ver que os eventos nas nossas vidas cooperam para um propósito sábio, mas sabemos que Deus escolhe dentre todas as alternativas possíveis os melhores fins e meios para atingi-los. Deus não somente escolhe os fins certos como também o faz pelas razões certas: o bem das Suas criaturas e, portanto, a Sua glória.

Embora talvez não possamos entender plenamente a sabedoria divina, temos boas razões para confiar nela. Depois de escrever a respeito da grande dádiva da justiça que vem de Deus, Paulo exclama: “Ao Deus único e sábio seja dada glória, por meio de Jesus Cristo, pelos séculos dos séculos. Amém” (Rm 16.27). Anteriormente, já fizeram alusão à profundidade insondável da riqueza da sabedoria e do conhecimento de Deus (Rm 11.33).

O inter-relacionamento dos atributos é evidente, porque a onisciência divina tem consciência não somente daquilo que existe, mas também daquilo que deve existir (moralmente); a fidelidade e a coerência divinas envolvem a integridade moral sem hipocrisia; e a sabedoria toma decisões no sentido de agir visando certos fins e meios em termos dos mais altos valores. Portanto, não devemos sentir estranheza quando lemos que o temor do Senhor é o princípio da sabedoria (Pv 1.17).

3.  Atributos éticos: santidade, justiça e amor

Deus é distinto de todas as Suas criaturas e transcendente a todas elas, não apenas metafísica e epistemologicamente, mas também moralmente, Deus é moralmente imaculado no caráter e na ação, reto, puro e imaculado por desejos, motivos, pensamentos, palavras ou ações malignas.

a)  Deus é santo:

Deus é santo, e, como tal, é a fonte e o padrão de tudo quanto é justo. Deus está livre de todo o mal, ama toda a verdade e a bondade. Dá valor à pureza e detesta a impureza e a inautenticidade. Deus não pode aprovar qualquer mal. E nele não tem prazer (Sl 5.4), nem pode tolerá-lo (Hc 1.13). Deus aborrece o mal e não pode suportar o pecado de modo algum (Tg 1.13-14). Os cristãos não têm reverente temor àquilo que é santo de modo abstrato, mas ao Santo (Is 40.25). O Santo não é meramente um objeto de fascínio emocional, mas também deve ser ouvido de modo inteligente e obedecido segundo a volição.

A santidade não é apenas o produto da vontade de Deus, mas também uma característica imutável da Sua natureza eterna. Assim, a pergunta formulada por Platão precisa ser refraseada para se aplicar ao Deus dos cristãos: “O bem é bom porque Deus assim determina? Ou Deus o determina porque é bom?”. A pergunta não se relaciona com a vontade de Deus, mas à essência de Deus. O que é bom, justo, puro e santo é santo, não em razão de um ato arbitrário da vontade divina, nem de um princípio independente de Deus, mas porque é uma decorrência da Sua natureza. Deus sempre determina de modo coerente à Sua própria natureza. Ele determina o bem porque Ele é bom. E porque Deus é santo, Ele consistentemente odeia o pecado e repugna todo o mal, sem fazer distinção de pessoa. O Espírito Santo é chamado santo não somente porque, como membro da Trindade Divina, compartilha da santidade da natureza divina, mas também porque a função distintiva do Espírito é produzir amor santo no povo redimido de Deus. Devemos procurar ser moralmente imaculados em nosso caráter e ação, retos e justos como o Deus a quem adoramos.

b)  Deus é justo ou reto:

A justiça ou retidão de Deus é revelada na Sua lei moral que expressa a Sua natureza moral e no Seu juízo, outorgando a todos, nas questões de mérito, exatamente aquilo que merecem. Seu julgamento não é arbitrário nem segundo caprichos, mas com princípios sem acepção de pessoas. Os escritores do AT frequentemente protestam contra a injustiça experimentada por pobres, viúvas, órfãos, estrangeiros e piedosos. Deus, por contraste, tem compaixão dos pobres e necessitados (Sl 72.12-14). Ele responde, liberta, reavive, inocenta e outorga-lhes a justiça que lhes é devida. Em Sua justiça, Deus liberta os necessitados da injustiça e da perseguição. Finalmente, Deus criará novo céu e nova terra, onde habitará a justiça (Is 65.17).

A ira de Deus é revelada quando os pecadores suprimem a Sua verdade e a impedem pela injustiça (Rm 1.18-31), sendo que tanto os judeus quanto os gentios agem assim (Rm 2.1-3,20). No evangelho é revelada uma justiça da parte de Deus, justiça que subsiste pela fé, do começo ao fim (Rm 1.17; 3.21). Os crentes são justificados livremente pela graça de Deus, vinda mediante Jesus Cristo, que forneceu o sacrifício da expiação (Rm 3.24). Assim, como Abraão, os que são plenamente convencidos de que Deus pode fazer aquilo que prometeu (Rm 4.21) descobrem que a sua fé lhes é creditada como justiça (Rm 4.3,24). Deus na Sua justiça provê gratuitamente a condição de justos para os crentes em Cristo. Em Deus, a justiça não está desligada da misericórdia, da graça e do amor.

c)  Deus é amor:

Na Sua misericórdia, Deus retém ou modifica o julgamento merecido e, na Sua graça, concede gratuitamente benefícios imerecidos a quem Ele quiser. Todas estas características morais fluem do grande amor de Deus. Em contraste com Sua auto existência transcendente, está o Seu amor gracioso, abnegado, o amor agape. Aquele que vive para sempre como santo, alto e sublime também habita com o contrito e abatido de espírito (Is 57.15).

Não se trata de Deus precisar de alguma coisa (At 17.25), mas, sim, de Ele desejar dar de Si mesmo para o bem-estar das pessoas amadas, a despeito do fato de não serem dignas de amor nem terem outros méritos. Deus não somente ama como também é amor em Si mesmo (1Jo 4.8). Seu amor é como o de um marido para com a esposa, de um pai para com o filho, e como o de uma mãe para com seu bebê a quem amamenta. Com amor, Deus escolheu a Israel (Dt 7.7) e predestinou os crentes da igreja a serem adotados como filhos mediante Jesus Cristo (Ef 1,4-5). Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna (Jo 3.16).

O amor cuida de idosos, oprimidos, pobres, órfãos e demais necessitados. O Deus amoroso da Bíblia não permanece insensível por causa das pessoas que têm necessidades genuínas (nem fica impossível). O Deus de Abraão, Isaque, Jacó, Jeremias, Jesus, Judas, Pedro e Paulo sofria, era realmente longânimo (sofredor). Com empatia, Deus, através da imaginação, penetra nos sentimentos das Suas criaturas. Além disso, o Deus encarnado submeteu-se às nossas tentações e sofrimentos, mediante a participação neles. Conforme disse H. W. Robinson: “Apenas como sofrimento o mal moral pode entrar na consciência do moralmente bom”. Em todas as aflições de Israel, Deus Se afligia (Is 63.9). Que significado pode haver, pergunta Robinson, num amor que nada custa àquele que ama? O Deus da Bíblia está longe de ser apático no tocante ao vasto sofrimento das pessoas no mundo. Com amor, Deus enviou Seu Filho para morrer, a fim de que, finalmente, o sofrimento fosse abolido e a justiça restaurada em toda a terra, assim como as águas cobrem o mar.

Visto que o amor envolve um compromisso com o bem-estar dos outros, um compromisso responsável e fiel, ele não é classificado como basicamente emocional. O amor é uma disposição firme da vontade que envolve toda a pessoa que procura o bem-estar dos outros.

4.  Atributos emocionais: Deus detesta o mal, é longânimo e compassivo

H. Strong diz que Deus está livre de paixões e caprichos. De fato, Deus está isento de caprichos, injustiças e emoções fora do controle. Neste artigo já procuramos negar quaisquer paixões indignas de Deus. Strong acrescenta, como razão: “Não em Deus qualquer ira egoísta”. Mesmo assim, Deus é pessoal e ético, e estes dois conceitos exigem emoções ou paixões saudáveis. Aquele que Se deleita na justiça, na retidão e na santidade, visando o bem-estar das Suas criaturas, pode sentir repulsa diante da injustiça, da iniquidade e da corrupção, que destroem os seus corpos, mentes e espíritos. Daí, a Bíblia frequentemente referir-se à justa indignação de Deus contra o mal. A justa indignação é a ira provocada, não pelo fato de alguém ser vencido por emoções egoístas, mas pela injustiça e por todas as obras da “carne” decaída.

a)  Deus é benigno:

Deus detesta o mal. Em geral, Jesus e as Escrituras falam mais frequentemente da ira de Deus diante de injustiças, tais como os maus tratos persistentes aplicados aos pobres e necessitados, do que do amor e do céu. Embora o Senhor seja tardio em irar-Se, jamais inocenta os culpados, mas derramará sobre eles a Sua fúria (“O Senhor é tardio em irar-se, mas grande em poder, e ao culpado não tem por inocente...”, Na 1.3). Ninguém pode suportar a Sua indignação, que é derramada como fogo e esmaga as rochas diante dEle (Na 1.6). À parte de uma compreensão da ira de Deus contra o mal, é impossível entender a extensão do amor divino na encarnação, a magnitude do sofrimento de Cristo na cruz, a natureza propiciatória do Seu sacrifício, as Escrituras proféticas sobre o grande dia da ira de Deus, a grande tribulação e o livro do Apocalipse.

b)  Deus é longânimo:

Deus é paciente e longânimo. Zelando pelo bem-estar dos objetos do Seu amor, Deus torna-Se irado por causa da injustiça cometida contra eles, mas sofre sem Se abater. Deus, sendo longânimo com os malfeitores, mas sem lhes desculpar o pecado, fornece-lhes graciosamente benefícios temporais e espirituais imerecidos, Deus prometera a terra a Abraão, mas a iniquidade dos amorreus ainda não se enchera (Gn 15.16). Depois de quatrocentos anos de sua autocontenção longânima, Deus, na plenitude do tempo, permitiu que os exércitos de Israel trouxessem o justo juízo à iniquidade dos amorreus. Mais tarde, Israel adorou o bezerro de ouro e mereceu o castigo divino como os demais idólatras. Mas Deus Se revelou, ao dar a Lei pela segunda vez, como “Senhor, Senhor Deus compassivo, clemente e longânimo, e grande em misericórdia e fidelidade” (Ex 34.6). O salmista pôde escrever: “Mas tu, SENHOR, és Deus compassivo e cheio de graça, paciente e grande em misericórdia e em verdade” (Sl 86.15). Todavia, o dia da graça de Deus tem seu fim. Finalmente, sem acepção de pessoas, o justo juízo de Deus caiu sobre Israel, por causa dos seus males difusos. A longanimidade de Deus é uma virtude notável, mas não exclui nem contradiz a justiça divina.

c)  Deus é compassivo:

Embora os teólogos da tradição tomista tenham ensinado a impassibilidade de Deus, as Escrituras não hesitam em chamar Deus de compassivo. Não somos consumidos por causa do Seu grande amor, porque “as suas misericórdias não têm fim” (Lm 3.22). Mesmo depois do cativeiro de Israel, Deus voltaria a demonstrar-lhe compaixão (Mq 7.19). O Deus da Bíblia não é um Deus apático, mas é Aquele que Se preocupa profundamente até com o pardal. Jesus demonstrou, de uma linda maneira, esta compaixão divino-humana por famintos (Mt 15.32), cegos (Mt 20.34) e enlutados (Lc 7.13). Jesus também ensinou a importância da compaixão através da Parábola do Bom Samaritano (Lc 10.33) e de outra sobre a solicitude do pai para com seu filho perdido (Lc 15.20).

O Cristo encarnado sentiu tudo o que os seres humanos sentem em todas as áreas, mas não Se rendeu às tentações envolvidas nestes sentimentos. Como Deus, ao participar literalmente da experiência humana, Jesus chorava com os que choravam a alegrava-Se com os que se alegravam. Ele relembrava a exultante glória compartilhada com Seu Pai antes da fundação do mundo (Jo 17.5,13). Entretanto, o autor divino-humano da nossa salvação foi aperfeiçoado através das coisas que sofreu nesta vida (Hb 2.10). Pelo fato de ter sofrido, ele pode prestar ajuda aos que sofrem e são tentados (Hb 2.18). O Deus revelado em Jesus Cristo não é uma causa primeira apática, isolada e impessoal. O Pai que Jesus revelou fica profundamente tocado por tudo que fere seus filhos.

5.  Atributos existenciais: liberdade, autonomia e onipotência

A preocupação moderna no tocante a liberdade, autenticidade e plenitude não deve ser limitada à humanidade. Os escritores bíblicos parecem ter se preocupado muito mais com que Deus fosse compreendido como um Ser livre, autêntico e pleno.   

a)  Deus é livre:

Desde a eternidade, Deus nunca esteve condicionado a qualquer elemento, a não ser a Si próprio, que fosse contrário aos Seus propósitos. Como já vimos, as coisas boas são planejadas com prazer e capacidade divinos. As coisas más são permitidas com desprazer divino. Mas, de qualquer forma, Deus é autodeterminado. Autodeterminação é o conceito de liberdade que enfatiza a realidade de que pensamentos, sentimentos e volição não são determinados por fatores externos, mas sim pela própria pessoa.

Deus não é livre para aprovar o pecado, deixar de amar, ser insensato, ignorar os duros fatos da realidade, ser infiel àquilo que é ou deve ser, ser incompassivo ou não-misericordioso. Deus não pode negar a Si próprio. Deus é livre para ser Ele mesmo, um ser com características pessoais, eternas, vivas, intelectuais, éticas, emocionais e volitivas. 

b)  Deus é autêntico:

Deus é autêntico, autenticamente Ele mesmo. O Deus que, em Cristo, Se opôs de modo tão implacável à hipocrisia, não é um hipócrita. Já enfatizamos acima a Sua fidelidade ou integridade intelectual. Agora, damos ênfase à Sua integridade dos pontos de vista ético, emocional e existencial. Deus é autoconsciente, sabe quem é e quais são os Seus propósitos (1Co 2.11). Ele tem uma alta percepção de identidade, significado e propósito.

Deus sabe que é o Ser ulterior e que, na realidade, nada se compare a Ele. Entretanto, ao conclamar as pessoas para que abandonem os ídolos, de forma alguma Deus está nos solicitando algo que esteja em desacordo com a realidade. Em Sua firme oposição à idolatria, Ele procura livrar as pessoas de interesses fadados à desilusão e ao desapontamento. Deus requer a nossa adoração para o nosso bem, para que, no final, não sucumbamos ao desespero, à medida que somos abandonados pelos nossos deuses finitos.

c)  Deus é onipotente:

Continuando, Deus é onipotente (Mc 14.36; Lc 1.37). Deus é capaz de fazer tudo quanto determinada, à seu modo. Deus não escolhe fazer coisa alguma contrária à Sua natureza de sabedoria e santo amor. Deus não pode negar a Si mesmo e não escolhe fazer tudo por Seus próprios meios imediatos, sem agentes angelicais e humanos intermediários. Embora Deus determine que algumas coisas aconteçam incondicionalmente (Is 14.24-27), a maioria dos eventos na História são planejados sob certas condições, pela obediência do povo aos preceitos divinos e pela sua desobediência permitida (2Cr 7.14; Lc 7.30; Rm 1.24). De qualquer maneira, os propósitos eternos de Deus para a História não são frustrados, mas cumpridos do modo que Ele escolheu (Ef 1.11).

Deus não somente tem força para levar a efeito todos os Seus propósitos, da maneira que os determina, como também autoridade no âmbito total do Seu reino para fazer o que quer. Deus não está sujeito ao domínio de outrem, mas é Rei e Senhor de todos. Em virtude de todos os Seus outros atributos – por exemplo, sabedoria, justiça e amor – Deus é digno de dominar tudo quanto criou e sustenta. Deus é um soberano sábio, santo e gracioso. Por ser justo, o poder de Deus em si mesmo não pode punir os pecadores mais do que eles merecem. Àquele a quem muito foi dado, muito lhe será exigido; e àquele a quem muito se confia, muito mais lhe pedirão. Mas na concessão de benefícios e dádivas imerecidos, Deus está livre para distribuí-los conforme o Seu beneplácito (Sl 135.6). Tendo permitido o pecado, Deus é suficientemente grande para limitar as paixões furiosas dele, submetendo-o à Sua soberania para um bem maior, como se deu no Calvário (At 4.24-28). Deus pode derrotar as nações e as hostes demoníacas que se enfurecem contra Ele. Ninguém pode existir independentemente da soberania divina. A tentativa de a pessoa seguir o seu próprio caminho independente de Deus é uma insolência pecaminosa da parte de criaturas que nEle vivem, se movem e existem. Somente um tolo poderia dizer que não há Deus, pois é o próprio Deus quem sustenta o fôlego que o ateu usa para negar o domínio divino sobre ele.      

6.  Atributos relacionais: transcendência e imanência

Relacionalmente, Deus é transcendente na Sua existência, universalmente imanente na Sua atividade providencial e imanente com seu povo na atividade redentora.

a)  Deus é transcendente:

Como transcendente, Deus é diferente, de forma inigualável, de tudo na criação. A distinção entre Deus e a existência do mundo tem sido subentendida nas discussões anteriores dos atributos metafísicos, intelectuais, éticos, emocionais e existenciais de Deus. Deus está relacionalmente “oculto”, por ser tão grande de todas estas outras maneiras. A existência de Deus é eterna; a do mundo, temporal. O conhecimento de Deus é total; o conhecimento humano, incompleto. O caráter de Deus é santo; o caráter da humanidade, decaído e pecaminoso. Os desejos de Deus colocam-se consistentemente contra o mal, mas Ele é longânimo e compassivo; os desejos humanos flutuam de modo incoerente, com frequência misturam o mal com o bem. A energia de Deus é incansável e inexaurível; a energia do mundo está sujeita à depleção pela entropia. Por isso, Deus é superior e está acima das pessoas do mundo em todos estes aspectos.

A transcendência divina incomparável envolve um dualismo radical entre Deus e o mundo, que não deve ser ofuscado por um ressurgimento do monismo[6] e do panteísmo[7]. Embora tenha sido feita segundo Deus e à imagem divina, a humanidade (ao contrário de Cristo) não é gerada a partir de Deus nem é uma emanação de Deus que possua a mesma natureza divina. O alvo ulterior da salvação não é a reabsorção para dentro da existência de Deus, mas a comunhão ininterrupta com Deus. A união que os cristãos procuram com Deus não é metafísica, mas relacional, uma unidade de mente, desejo e vontade. Procurar ser como Deus, de uma perspectiva bíblica, não é uma espiritualidade mais profunda, mas idolatria ou blasfêmia rebelde. Os cristãos podem respeitar a natureza como uma criação divina, mas não a adora como divina. Os cristãos podem respeitar os fundadores das religiões do mundo, mas não podem se curvar diante de qualquer guru como o divino manifesto na forma humana. Somente Jesus Cristo vem de cima; todos os demais vêm de baixo (Jo 8.23). Porque Deus está separado do mundo, os cristãos não podem se curvar diante de qualquer potência na terra como se ela fosse Deus, quer seja uma potência econômica, política, religiosa, científica, educacional ou cultural. O benefício inestimável do ato de curvar-se diante de um Senhor transcendente a todas as coisas é que ele liberta a pessoa de todas as tiranias finitas e descaídas.

O teísta bíblico não somente crê que o único Deus vivo está separado do mundo, em contraste com o panteísmo e o panenteísmo[8], mas também acredita que Deus está continuamente ativo em todo o mundo, de modo providencial, contrastando com o deísmo. Deus não está tão exaltado que não possa conhecer, amar ou relacionar-Se com a lei natural no mundo da experiência de todos os dias. Um estudo da providência divina, conforme ensinada nas Escrituras, demonstra que Deus sustenta, orienta e governa tudo quanto criou. Os salmos da natureza refletem sobre a atividade de Deus com relação a cada aspecto da terra, da atmosfera, da vegetação e da vida animal (e.g. Sl 104). Deus também preserva e governa a história humana, condenando as sociedades corruptas e abençoando os justos e os ímpios com benefícios temporais tais como luz do sol, a chuva, o alimento e a bebida. Mediante a atividade providencial universal de Deus, o cosmos se mantém unido, e Seus propósitos sábios da graça geral são realizados.      

b)  Deus é imanente:

Mas Deus é imanente nas vidas dos Seus que se arrependem do pecado e vivem pela fé para realizar os alvos da Sua graça redentora. “Porque assim diz o Alto, o Sublime, que habita a eternidade, o qual tem o nome de Santo: Habito no alto e santo lugar, mas habito também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar espírito dos abatidos, e vivificar o coração dos contritos” (Is 57.15). Assim como as pessoas podem estar presentes umas com as outras em graus variados, Deus pode estar presente com os ímpios de certa maneira, e com os justos de uma forma mais rica. Uma pessoa pode estar presente simplesmente como mais um passageiro num ônibus ou, de modo muito mais relevante, como uma mãe piedosa que orou diariamente por alguém durante toda a sua vida. Deus está graciosamente presente, com amor perdoador. Junto ao convertido, que pela fé foi propiciado, reconciliado e redimido pelo sangue precioso de Cristo. Tornam-se o Seu povo, e Ele Se torna o seu Deus. Deus habita em Seu povo como Seu santo lugar ou templo. A união relacional de pensamentos, desejos e propósitos cresce com o passar dos anos. Esta união é compartilhada por outros membros do Corpo de Cristo que têm dons para se edificarem uns aos outros, a fim de se tornarem progressivamente mais semelhantes ao Deus a quem adoram, não metafisicamente, mas intelectualmente, ética, emocional e existencialmente.

Em resumo:

Deus é Espírito vivo e pessoal, digno de adoração e da confiança de todo coração, separado do mundo, porém continuamente ativo no mundo.

Deus criou e sustenta o cosmos, as leis científicas, as fronteiras geográficas e políticas.

Deus está além do tempo, mas não deixa de Se relacionar ativamente com o tempo, com a vida humana, lar, cidade, nação e com a história da humanidade em geral.

Embora transcendente Deus não deixa de relacionar-Se de modo inteligente com o pensamento proposicional e com a comunicação verbal. Com a validez objetiva, com a consciência lógica, com a fidelidade, coerência e clareza fatual, bem como a autenticidade subjetiva e a integridade existencial.

Embora não esteja limitado por um corpo, Deus não deixa de Se relacionar providencialmente com o poder físico na natureza e na sociedade, nos aspectos industrial, agricultural, social e político. Deus conhece e julga a mordomia humana no uso de todos os recursos de energia do mundo.

Deus transcende toda tentativa de se obter justiça no mundo, mas, relaciona-Se retamente com todos os bons esforços das Suas criaturas, pessoal, econômica, acadêmica, religiosa, e politicamente.

Embora esteja livre de emoções indignas e descontroladas, Deus mostra-Se solícito aos pobres, infelizes, solitários, enlutados, enfermos e vítimas de preconceito, injustiça, ansiedade e desespero.

Além de toda aparente falta de significado e propósito na existência humana, Deus pessoalmente dá relevância à vida mais insignificante.

Referência Bibliográfica:

  • ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.), pp. 427-438 – Texto adaptado.


Notas:

  • [1] LEWIS, G. R. Atributos de Deus. In: ELWELL: 1988, pp. 427-438. Vide Referência Bibliográfica.
  • [2] LEWIS, Gordon R. – Ph.D., Universidade Syracuse. Professor de Teologia e Filosofia, Seminário Teo-lógico Batista Conservador de Denver, Denver. Colorado, EUA.
  • [3] Ubíquo: aquele (Deus) que está ou existe ao mesmo tempo em toda parte.
  • [4] Karl Barth, teólogo reformado suíço que é muitas vezes considerado o maior teólogo protestante do século 20. “Barth destaca a absoluta transcendência de Deus. Deus é o único positivo, o ser. O homem, no entanto, da mesma forma que o mundo, é a negação, o não ser. Justamente por não ser nada, o homem não tem a possibilidade de auto redenção; nem ao menos de conhecer Deus, mas somente de saber que não o conhece” (Disponível em: <http://teologia-contemporanea.blogspot.com/2008/02/karl-barth-1886-1969.html>. Acesso em 18/04/2019.
  • [5] Rudolf Karl Bultman (1884-1976), teólogo alemão que dedicou-se ao estudo do N.T. “... Da doutrina de Bultmann deduz-se que a fé cristã deve interessar-se pelo Jesus histórico para centrar-se no Cristo transcendente do querigma [proclamação da Palavra/Evangelho]. A fé cristã, a fé no querigma da Igreja, pela qual se pode dizer que Jesus Cristo ressuscitou, e não fé no Jesus histórico...” (Disponível em: <http://teologia-contemporanea.blogspot.com/2008/03/rudolf-bultmann-1884-1976.html>. Acesso em: 18/04/2019.
  • [6] Este ressurgimento do monismo a que Lewis refere, ocorreu principalmente na Idade Média. Na verdade, o monismo parece ser uma resposta à pergunta filosófica no campo da metafísica. Os pré-socráticos perguntavam: “quantas coisas existem”? Enquanto o monismo medieval responde: existe “uma coisa”. Mas há conceitos diferentes em relação a este assunto, como o monismo substancial, de Spinoza, que afirma, por exemplo, “... que existe uma só substância ou coisa, que existe independente, e que tanto Deus quanto o universo são aspectos dessa substância”. Por outro lado, o monismo atributivo (uma só categoria) sustenta que “... a realidade, em última análise, é composta de muitas coisas, em vez de uma só... [Mas] a tradição intelectual cristã geralmente tem sustentado que o monismo substancial deixa de tratar à altura distinção entre Deus e as criaturas, e que do monismo atributivo somente o idealismo [categoria da existência, no campo mental] é teologicamente aceitável...”. In: ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. II. São Paulo: Vida Nova, 1990 (1ª Ed.). pp. 547-548. Veja o significado de panteísmo na nota a seguir, ambos (monismo e panteísmo) conceitos muito parecidos.
  • [7] Panteísmo: palavra derivada do grego pan e theos (“tudo é Deus”). Normalmente identificada com o sistema filosófico que tende a identificar Deus com o mundo. O panteísmo é tipicamente monista em relação à realidade, ao passo que o teísmo bíblico faz uma distinção entre Deus e o mundo. Ou seja, o mundo existe porque Deus o criou e ambos não podem confundir-se. “... Por causa da tendência de identificar Deus com o mundo material, surge... uma negação menor ou maior do caráter pessoal de Deus. Nas Escrituras, Deus não somente possui os atributos de uma pessoa, como também, na encarnação, Ele assume um corpo e se torna o Deus-homem. Deus é retratado supremamente como uma Pessoa”. In: ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1990 (1ª Ed.). p. 90.
  • [8] Panenteísmo: “Todos em Deus”, é a doutrina que diz que o universo está contido em Deus, mas Deus é maior do que o universo, bem distinto do panteísmo e do monismo. O panenteísmo procura combinar os pontos fortes do teísmo clássico como do panteísmo clássico. Deus é visto como a alma do universo, o espírito universal presente em todos os lugares, ao mesmo tempo transcende todas as coisas criadas. Mas, como afirma o texto,o teísta bíblico não somente crê que o único Deus vivo está separado do mundo, em contraste com o panteísmo e o panenteísmo, mas também acredita que Deus está continuamente ativo em todo o mundo, de modo providencial, contrastando com o deísmo”.

Campo 14 – bebês mortos a pauladas, fome e execuções: a vida em um campo de concentração norte-coreano

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