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22 outubro 2020

Revelação Geral e Revelação Especial de Deus

Este é o quarto post que escrevemos acerca de Deus. Nos anteriores, falamos, primeiramente, sobre os argumentos em prol da sua existência, depois, sobre seus atributos, e por último, sobre sua doutrina, incluindo a Trindade. Neste, queremos enfocar a revelação geral e a especial de Deus, embora estes dois assuntos já estejam permeados nos posts anteriores.


1. Revelação Geral:

“Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se veem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis” (Rm 1.19-20).

Num outro momento, já vimos acerca do argumento Teleológico ou do desígnio que afirma, entre outras coisas, ser o universo, obra de um grande Arquiteto. Seguindo parte desta linha de raciocínio, a revelação geral diz respeito ao universo ou a toda manifestação de Deus que é feita a todas as pessoas de todos os tempos e lugares, mediante a qual elas vêm a saber que Deus existe, e como Ele é. Embora não transmita verdades salvadoras tais como a trindade, a encarnação ou a expiação, a revelação geral transmite a convicção de que Deus existe que é autossuficiente, transcendente, imanente, eterno, poderoso, sábio, bom e justo. A revelação geral, ou natural pode ser dividida em duas categorias: a interna, que diz respeito ao senso inato da deidade e da consciência, e a externa, relacionada à natureza e à história da providência.

Demarest (Op. Cit., pp. 303-304) afirma, citando Lutero, que “todos os homens têm o conhecimento geral de que Deus existe, que Ele criou os céus e a terra, que Ele é justo, que Ele castiga os iníquos etc”, enquanto Calvino insistiu que “até mesmo homens iníquos são forçados, pelo mero contemplar da terra e do céu, a subirem em direção ao Criador”.

Apresentando alguns dados bíblicos, Demarest aponta:

O discurso de Eliú dirigido a Jó (cap. 36.24-37.24), que chama a atenção à chuva que rega a terra, ao trovão e aos raios que infundem terror no coração, à fúria da tempestade e ao brilho fulgurante do sol depois da tempestade. O texto sugere que esses fenômenos naturais atestam o poder, a majestade, a bondade e a severidade do Deus Criador, e que os dados estão presentes para todos contemplares (JÓ 36.25). Além disso, o discurso que Deus dirigiu a Jó (cap. 38.1-39.30) transmite a ideia de que os fenômenos naturais (trovão, relâmpago, chuva, neve), o nascer do sol todas as manhas, as constelações majestosas nos céus, e a complexidade e os inter-relacionamentos harmoniosos no reino animal, todas essas coisas atestam a existência e a glória de Deus.

De acordo com o Salmo 19, Deus Se revela através de uma obra em dois volumes: o livro da natureza (vs. 1 a 6) e o livro da lei (vs. 7-13). No primeiro volume, lemos: “Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras de suas mãos” (v. 1). Aquilo que a ordem criada demonstra é a “glória”, saber: a manifestação externa daquilo que Deus é no Seu intimo e dos Seus atributos. A revelação da glória de Deus nos céus é declarada perpétua ou ininterrupta (V. 2), muda ou inaudível (v. 3), e de alcance mundial (v. 4).

Vemos mais um dado bíblico em Romanos 2.14-45, onde Paulo ensina que uma modalidade adicional da revelação geral é a lei moral implantada, da qual o coração dá testemunho mediante a faculdade da consciência. Todos os homens são culpados por transgredirem a lei, argumenta Paulo: os judeus, porque violaram a lei escrita em pedras, e os gentios, porque deixaram de viver segundo a lei moral escrita no seu coração (cf. Rm 1.320. Existe, comunicado a toda pessoa racional mediante o poder da consciência, um supremo Legislador e Suas exigências morais. Por isso, podemos afirmar que a revelação geral é referida como tal porque possui um conteúdo geral e é revelada para um público em geral. Através da revelação geral, dirigida a todos os homens, Deus comunica a Sua existência, Seu poder e Sua glória, de modo que os homens são deixados sem desculpa.

2.  Revelação Especial:

“Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça; Para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra” (2Tm 3.16-17).

A revelação geral, imediata (que ocorre sem um agente intermediário) ou mediada (que ocorre através de um agente intermediário, como as obras criadas, por exemplo) é dirigida a todos os homens. No entanto, ela não é suficiente para levá-los ao conhecimento de Deus e da sua vontade necessário para a salvação. Ela não revela Jesus Cristo ou Sua obra redentora dirigida aos pecadores. Assim, torna-se necessário aquilo que é chamado de revelação especial.

Embora a revelação de Deus não deva, necessariamente, ser dividida em geral e a especial, mas não há dúvida que há uma revelação especial, que é redentora e está acima da luz natural da razão. As Escrituras, que como vimos, também fala da revelação geral ao destacar a natureza e a consciência humana, publica as boas-novas que o Deus santo e misericordioso promete a salvação como uma dádiva divina ao homem que não pode salvar-se a si mesmo (AT), e que Ele agora cumpriu aquela promessa mediante a dádiva do Seu Filho, em quem todos os homens são chamados a crer (NT). O evangelho é a notícia de que o Logos encarnado (do qual falaremos noutro momento) carregou sobre Si os pecados dos homens condenados, morreu em seu lugar e ressuscitou para a sua justificação. Este é o centro permanente da revelação especial redentora.

Para chegar esta revelação especial à humanidade, Deus preparou um povo, Israel, na Antiga Aliança, e a igreja, na Nova Aliança, para revelar-lhe diretamente o conhecimento necessário à salvação. Foi assim que Deus revelou-se a Noé, a Abraão, a Moisés, aos profetas, a Davi, a Salomão, aos seus apóstolos e, especialmente, em Cristo. É neste sentido que o autor da Epístola aos Hebreus afirma que, “havendo Deus, outrora, falado muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias nos falou pelo Filho a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo” (Hb 1.1-2). Cristo é a revelação final de Deus.

É este também o sentido das palavras do apóstolo Paulo endereçada aos gálatas: “Faço-vos, porém, saber, irmãos, que o evangelho por mim anunciado não é segundo o homem; porque eu não o recebi, nem o aprendi de homem algum, mas mediante revelação de Jesus Cristo” (Gl 1.11-12). À igreja de Deus, portanto, foram confiados os oráculos de Deus, uma revelação especial, inspirada, clara, precisa, autoritativa, suficiente para ensinar ao homem o que ele deve conhecer e crer e o que dele é requerido, com vistas à sua própria salvação e à glória de Deus.

Como afirma A Confissão de Fé Westminster 1.1:

Ainda que a luz da natureza e as obras da criação e da providência manifestam de tal modo a bondade, a sabedoria e o poder de Deus, que os homens sejam inescusáveis todavia não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e de sua vontade, necessário à salvação; por isso agradou ao Senhor, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e contra a maldade de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda. Isto torna as Escrituras Sagradas indispensável [sic], tendo cessado aqueles antigos modos de Deus revelar a sua vontade ao seu povo.[1]

Concluindo, vimos que pela revelação geral, a humanidade em geral tem conhecimento de um Deus todo-poderoso e que através de Suas obras e nossa consciência não somos enganados em relação à Sua resistência e atributos. Mas que, além disso, Ele deixou-nos uma revelação escrita para aqueles que queiram conhecer sobre o caminho da salvação, sua comunhão e seu destino com Ele.

Sobre a Revelação Escrita, veja os meus posts:

Referências bibliográficas:

DEMAREST, B. A. Revelação Geral. In: ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.).

HENRY, C. F. H. Revelação Especial. In: ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.).

MATHISON, Keith. Revelação Geral e Revelação Especial – Uma abordagem reformada sobre a relação entre Ciência e Escrituras. Disponível em: <https://tuporem.org.br/revelacao-geral-e-revelacao-especial/>. Acesso em: 14/05/2019.


Nota:

  •  [1] Disponível em: <http://www.executivaipb.com.br/arquivos/confissao_de_westminster.pdf>. Acesso em 17/05/2019.

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