Este é
o quarto post que escrevemos acerca de Deus. Nos anteriores, falamos,
primeiramente, sobre os argumentos em prol da sua existência,
depois, sobre seus atributos, e por último, sobre sua doutrina, incluindo a Trindade. Neste,
queremos enfocar a revelação geral e a especial de Deus, embora estes dois
assuntos já estejam permeados nos posts anteriores.
“Porquanto o que de Deus
se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Porque as suas
coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a
sua divindade, se entendem, e claramente se veem pelas coisas que estão
criadas, para que eles fiquem inescusáveis” (Rm 1.19-20).
Num outro momento, já vimos acerca do argumento Teleológico ou do desígnio que afirma, entre outras coisas, ser
o universo, obra de um grande Arquiteto. Seguindo parte desta linha de
raciocínio, a revelação geral diz respeito ao universo ou a toda
manifestação de Deus que é feita a todas as pessoas de todos os tempos e
lugares, mediante a qual elas vêm a saber que Deus existe, e como Ele é. Embora
não transmita verdades salvadoras tais como a trindade, a encarnação ou a
expiação, a revelação geral transmite a convicção de que Deus existe que é
autossuficiente, transcendente, imanente, eterno, poderoso, sábio, bom e justo.
A revelação geral, ou natural pode ser dividida em duas categorias: a interna, que diz respeito ao senso
inato da deidade e da consciência, e a externa,
relacionada à natureza e à história da providência.
Demarest (Op.
Cit., pp. 303-304) afirma, citando Lutero, que “todos os homens têm o conhecimento geral de que Deus existe, que Ele
criou os céus e a terra, que Ele é justo, que Ele castiga os iníquos etc”,
enquanto Calvino insistiu que “até mesmo
homens iníquos são forçados, pelo mero contemplar da terra e do céu, a subirem
em direção ao Criador”.
Apresentando
alguns dados bíblicos, Demarest aponta:
O discurso de
Eliú dirigido a Jó (cap. 36.24-37.24), que chama a atenção à chuva que rega a
terra, ao trovão e aos raios que infundem terror no coração, à fúria da
tempestade e ao brilho fulgurante do sol depois da tempestade. O texto sugere
que esses fenômenos naturais atestam o poder, a majestade, a bondade e a
severidade do Deus Criador, e que os dados estão presentes para todos
contemplares (JÓ 36.25). Além disso, o discurso que Deus dirigiu a Jó (cap.
38.1-39.30) transmite a ideia de que os fenômenos naturais (trovão, relâmpago,
chuva, neve), o nascer do sol todas as manhas, as constelações majestosas nos
céus, e a complexidade e os inter-relacionamentos harmoniosos no reino animal,
todas essas coisas atestam a existência e a glória de Deus.
De acordo com
o Salmo 19, Deus Se revela através de uma obra em dois volumes: o livro da
natureza (vs. 1 a 6) e o livro da lei (vs. 7-13). No primeiro volume, lemos: “Os céus proclamam a glória de Deus e o
firmamento anuncia as obras de suas mãos” (v. 1). Aquilo que a ordem criada
demonstra é a “glória”, saber: a manifestação externa daquilo que Deus é no Seu
intimo e dos Seus atributos. A revelação da glória de Deus nos céus é declarada
perpétua ou ininterrupta (V. 2), muda ou inaudível (v. 3), e de alcance mundial
(v. 4).
Vemos mais um dado bíblico em Romanos 2.14-45,
onde Paulo ensina que uma modalidade adicional da revelação geral é a lei moral
implantada, da qual o coração dá testemunho mediante a faculdade da
consciência. Todos os homens são culpados por transgredirem a lei, argumenta
Paulo: os judeus, porque violaram a lei escrita em pedras, e os gentios, porque
deixaram de viver segundo a lei moral escrita no seu coração (cf. Rm 1.320.
Existe, comunicado a toda pessoa racional mediante o poder da consciência, um
supremo Legislador e Suas exigências morais. Por isso, podemos afirmar que a
revelação geral é referida como tal porque possui um conteúdo geral e é
revelada para um público em geral. Através da revelação geral, dirigida a todos
os homens, Deus comunica a Sua existência, Seu poder e Sua glória, de modo que
os homens são deixados sem desculpa.
2. Revelação Especial:
“Toda a Escritura é
divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para
corrigir, para instruir em justiça; Para que o homem de Deus seja perfeito, e
perfeitamente instruído para toda a boa obra” (2Tm 3.16-17).
A revelação geral, imediata (que ocorre sem um
agente intermediário) ou mediada (que ocorre através de um agente
intermediário, como as obras criadas, por exemplo) é dirigida a todos os
homens. No entanto, ela não é suficiente para levá-los ao conhecimento de Deus
e da sua vontade necessário para a salvação. Ela não revela Jesus Cristo ou Sua
obra redentora dirigida aos pecadores. Assim, torna-se necessário aquilo que é
chamado de revelação especial.
Embora a revelação de Deus não deva,
necessariamente, ser dividida em geral e a especial, mas não há dúvida que há
uma revelação especial, que é redentora e está acima da luz natural da razão.
As Escrituras, que como vimos, também fala da revelação geral ao destacar a
natureza e a consciência humana, publica as boas-novas que o Deus santo e
misericordioso promete a salvação como uma dádiva divina ao homem que não pode
salvar-se a si mesmo (AT), e que Ele agora cumpriu aquela promessa mediante a
dádiva do Seu Filho, em quem todos os homens são chamados a crer (NT). O
evangelho é a notícia de que o Logos encarnado (do qual falaremos noutro
momento) carregou sobre Si os pecados dos homens condenados, morreu em seu
lugar e ressuscitou para a sua justificação. Este é o centro permanente da
revelação especial redentora.
Para chegar esta revelação especial à humanidade, Deus
preparou um povo, Israel, na Antiga Aliança, e a igreja, na Nova Aliança, para
revelar-lhe diretamente o conhecimento necessário à salvação. Foi assim que
Deus revelou-se a Noé, a Abraão, a Moisés, aos profetas, a Davi, a Salomão, aos
seus apóstolos e, especialmente, em Cristo. É neste sentido que o autor da
Epístola aos Hebreus afirma que, “havendo
Deus, outrora, falado muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos
profetas, nestes últimos dias nos falou pelo Filho a quem constituiu herdeiro
de todas as coisas, pelo qual também fez o universo” (Hb 1.1-2). Cristo é a
revelação final de Deus.
É este também o sentido das palavras do apóstolo
Paulo endereçada aos gálatas: “Faço-vos,
porém, saber, irmãos, que o evangelho por mim anunciado não é segundo o homem;
porque eu não o recebi, nem o aprendi de homem algum, mas mediante revelação de
Jesus Cristo” (Gl 1.11-12). À igreja de Deus, portanto, foram confiados os
oráculos de Deus, uma revelação especial, inspirada, clara, precisa,
autoritativa, suficiente para ensinar ao homem o que ele deve conhecer e crer e
o que dele é requerido, com vistas à sua própria salvação e à glória de Deus.
Como afirma A Confissão de Fé Westminster 1.1:
Ainda que a luz da
natureza e as obras da criação e da providência manifestam de tal modo a
bondade, a sabedoria e o poder de Deus, que os homens sejam inescusáveis
todavia não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e de sua
vontade, necessário à salvação; por isso agradou ao Senhor, em diversos tempos
e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade; e
depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro
estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e contra a
maldade de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda.
Isto torna as Escrituras Sagradas indispensável [sic], tendo cessado aqueles
antigos modos de Deus revelar a sua vontade ao seu povo.[1]
Concluindo, vimos que pela revelação geral, a
humanidade em geral tem conhecimento de um Deus todo-poderoso e que através de
Suas obras e nossa consciência não somos enganados em relação à Sua resistência
e atributos. Mas que, além disso, Ele deixou-nos uma revelação escrita para
aqueles que queiram conhecer sobre o caminho da salvação, sua comunhão e seu
destino com Ele.
Sobre a Revelação Escrita, veja os meus posts:
- · As Escrituras (1): a verdade revelada e inspirada por Deus e
- As Escrituras (2): formação do cânon e outras considerações.
Referências bibliográficas:
DEMAREST, B. A. Revelação Geral. In: ELWELL,
Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.).
HENRY, C. F. H. Revelação Especial. In: ELWELL,
Walter. A. (Editor). Enciclopédia
Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª Ed.).
MATHISON, Keith. Revelação Geral e Revelação Especial – Uma abordagem reformada sobre a relação entre Ciência e Escrituras. Disponível em: <https://tuporem.org.br/revelacao-geral-e-revelacao-especial/>. Acesso em: 14/05/2019.
Nota:
- [1] Disponível em: <http://www.executivaipb.com.br/arquivos/confissao_de_westminster.pdf>. Acesso em 17/05/2019.
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