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15 de junho de 2020

Escatologia: a morte

Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram” (Rm 5.12).
Já falamos em outro momento sobre o conceito de escatologiadoutrina das últimas coisas, entre as quais está o conceito de morte. À luz da bíblia, podemos conceituar “a morte como “... a separação da alma do corpo pela qual o homem é introduzido no mundo invisível[1]. E de certo modo, ela é a mais natural das coisas, pois “... aos homens está ordenado morrerem uma vez, vindo depois disso o juízo” (Hb 9.27)[2].
1.  Expressões bíblicas para morte:
Algumas expressões bíblicas acerca de morte física ou morte do corpo nos ajudam a caracterizá-la melhor:
·      experiência descrita com o sentido de "dormir":
Ø Assim falou; e depois disse-lhes: Lázaro, o nosso amigo, dorme, mas vou despertá-lo do sono” (Jo 11.11).
Ø E disse o Senhor a Moisés: Eis que dormirás com teus pais; e este povo se levantará, e prostituir-se-á indo após os deuses estranhos na terra, para cujo meio vai, e me deixará, e anulará a minha aliança que tenho feito com ele” (Dt 31.16).
·      Deixar a casa terrestre ou tabernáculo:
Ø Porque sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos, eterna, nos céus” (2Co 5.1).
Ø E tenho por justo, enquanto estiver neste tabernáculo, despertar-vos com admoestações” (2Pe 1.13).
·      Pedido da alma por Deus:
Ø Mas Deus lhe disse: Louco! esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será?” (Lc 12.20).
·      Seguir o caminho de onde não tornará:
Ø Como no caso do pobre mendigo que morreu e foi para o seio de Abraão, e do rico, que também morreu e foi para o inferno (Jo 16. 22,23
·      Ser congregado ao seu povo:
Ø Acabando, pois, Jacó de dar instruções a seus filhos, encolheu os pés na cama, e expirou, e foi congregado ao seu povo” (Gn 9.33).
·      Descer ao silêncio:
Ø Os mortos não louvam ao Senhor, nem os que descem ao silêncio” (Sl 115.17).
·      Expirar:
Ø E logo caiu aos seus pés, e expirou. E, entrando os moços, acharam-na morta, e a sepultaram junto de seu marido” (At 5.10).
·      Tornar-se em pó:
Ø No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás” (Gn 3.19).
·      Partir:
Ø Mas de ambos os lados estou em aperto, tendo desejo de partir, e estar com Cristo, porque isto é ainda muito melhor” (Fp 1.23) etc.
2.  Morte física e espiritual
A morte física, segundo vemos em expressões como death (Hebraico) e apothaneinnekrós ou thánatos (Grego) ou ainda mortis (Latim), “... parece ser necessária para corpos constituídos como são os nossos. A decadência física e a dissolução são inescapáveis”[3]. Mas a Bíblia também fala da morte como resultado do pecado. A morte é o primeiro efeito externo ou manifestação visível do pecado, e será o último efeito do pecado, do qual seremos salvos. Vejamos:
Ø Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram” (Rm 5.12).
Ø “Porque convém que reine até que haja posto a todos os inimigos debaixo de seus pés. Ora, o último inimigo que há de ser aniquilado é a morte” (1Co 15.25,26).
Deus disse a Adão que no dia que ele comesse da árvore do “conhecimento do bem e do mal” certamente morreria (Gn 2.17). Entendemos que “morte” aqui não fala apenas no sentido físico, mas também espiritual. E isto é enfatizado por Paulo quando afirma que “... por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens...” (Rm 5.12). E este homem – Adão – morreu primeiro espiritualmente, quando foi lançado fora do jardim (Gn 3.23), e depois, fisicamente, com novecentos e trinta anos (Gn 5.5). Nos capítulos 5 e 6 aos Romanos, Paulo contrasta a morte que ocorreu por meio do pecado de Adão com a vida que Cristo trouxe aos homens. No entanto, a obra redentora de Cristo não anula ou cancela a nossa morte física, embora anule sua sentença condenatória. O homem não morre como um corpo. Ele morre como homem, na totalidade do seu ser. Ele morre como um ser espiritual e físico. E a Bíblia não estabelece uma clara linha de demarcação entre esses dois aspectos. A morte física, portanto, é um símbolo apropriado da morte mais profunda que o pecado inevitavelmente produz, sendo ao mesmo tempo uma expressão desta morte, e uma união com ela.
Qual a conexão entre a morte e a doutrina da imortalidade? Há dois termos, "imortalidade" e "incorrupção" que se usam em referência à ressurreição do corpo, em 1Coríntios 15.53,54: “Porque convém que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade, e que isto que é mortal se revista da imortalidade”. A imortalidade significa não estar sujeito à morte, e, obviamente, não diz respeito ao nosso corpo terrestre, pois este passa pela morte, por ser “corruptível” e voltar ao pó “... porquanto és pó [Adão/humanidade] e em pó te tornarás” (Gn 3.19). Mas os que estão em Cristo, os cristãos, desfrutarão da imortalidade. Isto é, receberão corpos glorificados que não estarão sujeitos à morte, por ocasião da ressurreição (assunto do qual falaremos num outro momento) e se tornarão também incorruptíveis (1Co 15.52). Ou seja, o corpo material sofre corrupção (se desfaz), fraqueza e a morte física, mas ressuscitará em glória e vigor (1Co 15.42,43).
E os não-salvos receberão também novos corpos? Pelas Escrituras, entendemos que sim, embora não sejam corpos glorificados.  Entendemos que o termo "imortalidade" se aplica à alma. Desta forma, o corpo morre e volta ao pó e a alma ou o espírito continua a existir conscientemente no mundo invisível dos espíritos desencarnados. Assim o homem é mortal, estando o seu corpo sujeito à morte, embora seja imortal a sua alma, que sobrevive à morte do corpo.
Para ilustrar a morte física, pensemos no caso de Lázaro (João 11). “O Lázaro fisicamente morto não podia fazer nada por si mesmo. Ele não respondia a nenhum estímulo e estava alheio a toda a vida ao seu redor”[4]. Mas, aos ser ressuscitado (fisicamente) por Cristo, ele ficou cheio de vida. Obviamente, Lázaro morreu fisicamente novamente e aguarda, como disse Marta, irmã do citado Lázaro, a ressurreição, que ocorrerá “no último dia” (v. 24).
E onde estarão as pessoas após à morte e depois da ressurreição da carne (ou corpo)? Este é um assunto para o próximo capítulo (post). Por ora, deixo a reflexão a seguir, do Reverendo Hernandes Dias Lopes:



    Notas:
    • [1] PEARLMAN, Myer. Conhecendo as doutrinas da Bíblia. São Paulo: vida, 1978 (7ª ed.), p. 232.
    • [2] Todas as referências bíblicas utilizadas neste texto são da ACF (Almeida Corrigida Fiel).
    • [3] DOUGLAS, J.D. (Org.). O Novo Dicionário Bíblia, Vol. II. São Paulo: Vida Nova, 1979, p. 1073.
    • [4] O que é a morte espiritual?”. Disponível em: <https://www.gotquestions.org/Portugues/morte-espiritual.html>. Acesso em: 15/06/2020.

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    Para visualizar e/ou imprimir este texto, em PDF, acesse:


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    8 de junho de 2020

    A Era dos Novos Horizontes: Horizontes Políticos - Os Estados Unidos

    GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos novos horizontes – Vol. 9. São Paulo: Vida Nova, 1988 (1ª ed.), pág. 017 a 056.

    Texto e Imagens adaptadas por:
    Alcides Barbosa de Amorim



    Artigo completo em PDF:

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    4 de junho de 2020

    Escatologia: doutrina das últimas coisas

    "Assim diz o Senhor... Eu sou o primeiro, e eu sou o último..." (Is 44.6).
    “Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, o primeiro e o derradeiro” (Ap 22.13).
    Nas duas referências bíblicas acima destacamos as expressões Primeiro x Último e Princípio (Alfa) x Fim (Ômega), relativas a Deus, Aquele que já escreveu, tanto o primeiro como o último capítulo da história de todas as coisas. Ou seja, desde o Gênesis, que trata das origens de todas as coisas, até o Apocalipse, que revela como essas coisas chegarão ao seu fim, estão sob o controle de Deus.
    A disciplina que trata teologicamente, principalmente das “coisas do fim” é chamada ESCATOLOGIA, termo que emprega a junção de duas palavras gregas eschatos (último) e logos (assunto, estudo), ou seja, estudo ou doutrina das últimas coisas. A escatologia bíblica diz respeito não apenas ao destino do indivíduo, mas também se preocupa com a história. Isso se deve ao caráter particular da revelação da Bíblia. Visto que Deus é o Senhor da história, a consumação da obra redentora de Deus incluirá a redenção da própria história. E a tarefa da redenção – dos indivíduos e da história – foi executada por  Jesus, uma das pessoas do Deus Trino, “a quem constituiu herdeiro de tudo, por quem fez também o mundo” (Hb 1.2) e que veio à Terra na "plenitude do tempo" (Gl 4.4).
    Jesus é o Messias prometido no Antigo Testamento pelos profetas, que viria redimir os justos e expurgar a terra de todo o mal, enquanto o Novo Testamento vê na encarnação de Cristo o cumprimento da esperança do Antigo Testamento, e em Sua segunda vinda a consumação dessa esperança.
    A chegada do Messias já era profetizada como parte do fim ou últimos dias. Veja este verso: “havendo Deus antigamente falado muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho” (Hb 1.1). Aqui, o escritor está falando da primeira vinda de Jesus, mas como sendo nos “últimos dias”. Por isso entendemos que tudo que for relativo à encarnação do Verbo, o Pentecostes, o tempo da Igreja – dispensação da graça –, até a segunda vinda de Cristo nos ares (1Ts 4.17) é parte do fim ou dos últimos dias.
    O mesmo “... Jesus, que dentre vós foi recebido em cima no céu, há de vir assim como para o céu o vistes ir” (At 1.11). Mas além da volta do Senhor, este e os demais assuntos abaixo, que também fazem parte da disciplina escatologia, trataremos em capítulos (posts) à parte:
    Por ora,
    “... tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai” (Fp 4.8).
    “... tudo isto lhes sobreveio como figuras, e estão escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos (1Co 10.11).
    “... mediante a fé estais guardados na virtude de Deus para a salvação, já prestes para se revelar no último tempo...” (1 Pe 1.5).
    “Mas, amados, não ignoreis uma coisa, que um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos como um dia” (2Pe 3.8).

    Este texto é apenas uma introdução a estes assuntos listados acima, sobre os quais, repito, pretendemos falar em posts separados.
    Ainda sobre esta introdução, sugiro o vídeo abaixo:

    Fonte:

    • PEARLMAN, Myer. Conhecendo as doutrinas da Bíblia. São Paulo: vida, 1978 (7ª ed.).
    • SHEDD, R. P. (Editor). O Novo Dicionário da Bíblia, Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1979 (3ª ed.).




    28 de maio de 2020

    A Era dos Mártires (XII): A grande perseguição e o triunfo final

    Por 

    GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 164 a 177.




    Artigo completo em PDF:

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    27 de maio de 2020

    A Era dos Mártires (XI): A vida cristã

    Por

    GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 147 a 161.





    Artigo completo em PDF:

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    26 de maio de 2020

    As Setenta Semanas de Daniel: o que está determinado para Israel


    “Setenta semanas estão determinadas sobre o teu povo, e sobre a tua santa cidade, para cessar a transgressão, e para dar fim aos pecados, e para expiar a iniquidade, e trazer a justiça eterna, e selar a visão e a profecia, e para ungir o Santíssimo. Sabe e entende: desde a saída da ordem para restaurar, e para edificar a Jerusalém, até ao Messias, o Príncipe, haverá sete semanas, e sessenta e duas semanas; as ruas e o muro se reedificarão, mas em tempos angustiosos. E depois das sessenta e duas semanas será cortado o Messias, mas não para si mesmo; e o povo do príncipe, que há de vir, destruirá a cidade e o santuário, e o seu fim será com uma inundação; e até ao fim haverá guerra; estão determinadas as assolações. E ele firmará aliança com muitos por uma semana; e na metade da semana fará cessar o sacrifício e a oblação; e sobre a asa das abominações virá o assolador, e isso até à consumação; e o que está determinado será derramado sobre o assolador” (Dn 9.24-27 – ACF).

    O profeta Daniel, cujo significado é “Deus é meu juiz”, foi levado ainda jovem à Babilônia, na primeira deportação de Nabucodonosor, em 604 a.C., no reinado de Jeoaquim, rei de Judá (Dn 1.1).
    Profeticamente, o prazo para os judeus ficarem na Babilônia seria de setenta anos (Jr 25.11 e Dn 9.2). E, no capítulo 9, enquanto Daniel orava e analisava as profecias de Jeremias – setenta anos de cativeiro –, o anjo Gabriel apareceu para ele e revelou o que está sintetizado no verso 24: fim da transgressão e dos pecados, expiação da iniquidade, aplicação da justiça eterna, selo da visão e da profecia e unção dos santos. A explicação destes objetivos está nos versículos seguintes (vs. 25 a 27): as setenta semanas.
    1.  Nosso Calendário x Calendário Bíblico
    Para melhor entendermos as datas mencionadas no texto de Daniel, é importante destacarmos os conceitos de calendário, tanto o “universal”, o Calendário Cristão ou Gregoriano, quanto o Calendário Bíblico.
    O nosso calendário, o Gregoriano, considera um ano médio de 365,25 dias: um ciclo de 3 anos de 365 dias e um de 366, chamado ano bissexto. Mas mesmo assim, este formato que estava em vigor desde Júlio Cesar, apresentava uma diferença de 3 dias a cada 400 anos. Para resolver o problema, o Papa Gregório XIII, seguindo um conselho de sábios, propôs em 1582, a supressão de 3 anos bissextos de 400 em 400 anos. Desta forma, passou-se a considerar um dia a mais a cada 4 anos e ao final de 400 anos desconsidera-se este dia. Por exemplo, o ano 2000 deveria ter sido bissexto por ser múltiplo de 4 anos, mas não foi, por causa do acordo feito em 1582, pois era final de uma série de 400 anos[1].
    E o Calendário Bíblico (Hebraico)[2]? Este calendário, que é lunar, considera meses de 30 e de 29 dias, tendo algumas variações em relação ao nosso calendário. Mas para efeito de aproximações (datas arredondadas), consideramos o ano bíblico de 360 dias ou 12 meses de 30 dias. Entendemos que é nesse sentido (aproximado) que as expressões “1.260 dias” ou “42 meses” de Apocalipse 12.6 e 13.5, respectivamente, por exemplo, equivalem a 3 anos e meio. Ex.: 1.260 / 360 = 3,5 anos; ou 42 / 12 = 3.5 anos, respectivamente, repito. Veja ainda as expressões “...tempo, dois tempos e metade dum tempo” (Dn. 7:25), também correspondendo a 3,5 anos ou 1260 dias.
    Mas estudiosos dispensacionalistas ou fundamentalistas como o Dr. C. I. SCOFIELD[3], por exemplo, considera que as 70 semanas de Daniel são semanas de anos:
    As ‘setenta semanas’ da profecia são semanas de anos, uma importante medida de tempo sabática do calendário judeu. A transgressão da ordem de se guardar o ano inteiro trouxe o juízo do cativeiro babilônico e determinou sua duração de setenta anos. Comp. Lv. 25:1-22; 26:33-35; IICr. 36:19-21; Dn. 9:2. Compare também Gn. 29:26-28 quanto ao uso de ‘semana’ indicando sete anos.  
    Assim entendido, consideramos a profecia sobre as “setenta semanas de Daniel” como sendo 490 anos, divididos desta forma:
    ·         70 x 7 = 490 anos ou um total de 176.400 dias;
    ·         Entendem-se que 69 semanas (anos) já se cumpriram (69 x 7 = 483 anos);
    ·         Falta o cumprimento da última semana, isto é, 7 anos ou 84 meses ou ainda 2.520 dias).
    Vejamos cada período descrito no texto de Daniel em destaque.
    2.    Tempo de restauração, e edificação de Jerusalém: 7 semanas ou 49 anos
    Sabe e entende: desde a saída da ordem para restaurar, e para edificar a Jerusalém... haverá sete semanas” (v. 25)
    Estas “sete semanas”, mencionadas no verso 25, correspondem ao período entre a ordem para a saída do povo do cativeiro babilônico, ocorrida em 445 a.C., no vigésimo ano do rei Artaxerxes (Neemias 2)[4] e o fim da reconstrução da cidade de Jerusalém (Ne 6.15-16), correspondendo assim a sete semanas ou 49 anos.
    Segundo o texto bíblico, as ruas e o muro da cidade seriam reedificados, “... mas em tempos angustiosos” (v. 25). O livro de Neemias relata esta dificuldade enfrentada pelo povo. Neemias encontrou adversários como Sambalate (Ne 4.1) e Tobias (Ne 4.3) entre outros, que os forçavam a trabalhar armados, pois a qualquer momento podiam ser atacados. “E disse eu [Neemias] aos nobres, aos magistrados e ao restante do povo: Grande e extensa é a obra, e nós estamos apartados do muro, longe uns dos outros. No lugar onde ouvirdes o som da buzina, ali vos ajuntareis conosco; o nosso Deus pelejará por nós. Assim trabalhávamos na obra; e metade deles tinha as lanças desde a subida da alva até ao sair das estrelas. Também naquele tempo disse ao povo: Cada um com o seu servo fique em Jerusalém, para que à noite nos sirvam de guarda, e de dia na obra” (Ne 4.19-22).
    Apesar das perseguições, diz Neemias, “... acabou-se, pois, o muro aos vinte e cinco do mês de Elul [agosto/setembro]; em cinquenta e dois dias” (Ne 6.15), prosseguindo a partir daí com as atividades relacionadas à cidade e ao templo, pondo fim às primeiras sete semanas (49 anos), mencionadas em Daniel 9.25.
    3.    Da edificação de Jerusalém à morte do Messias: 62 semanas ou 434 anos
    “Sabe e entende: desde a saída da ordem para restaurar, e para edificar a Jerusalém, até ao Messias, o Príncipe, haverá sete semanas, e sessenta e duas semanas; as ruas e o muro se reedificarão, mas em tempos angustiosos” (Dn 9.25).
    Dividimos Daniel 9.25 em duas partes. A primeira, a qual já comentamos, referente a um período de 7 semanas (ou 49 anos), e esta segunda parte, um período de 62 semanas ou 434 anos, que vai da reconstrução da cidade de Jerusalém até à morte do Ungido ou Messias. “... isto é, alguém que é ao mesmo tempo ungido e também príncipe, ou, em outras palavras, alguém que é sacerdote e príncipe. Existe apenas Um para Quem podem aplicar-se essas palavras, a saber. Jesus, que é o Cristo.”[5]
    A expressão “será cortado o Messias” (Dn 9.26) subtende a morte de Jesus:
    Da opressão e do juízo foi tirado; e quem contará o tempo da sua vida? Porquanto foi cortado da terra dos viventes; pela transgressão do meu povo ele foi atingido (Is 53.8).
    E, quando Jesus tomou o vinagre, disse: Está consumado. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito (Jo 19.30).
    Quando isto aconteceu? Isto é, quando Jesus morreu? SCOFIELD fala da morte de Cristo como tendo ocorrido em 29 A.D. (d.C.). E, com a morte de Cristo – a morte do Ungido (Dn 9.26), cf. a versão NVI –,  entendemos que ocorreu o final da 69ª semana de Daniel, ou seja, 483 anos, desde que foi proferida a profecia. Mas pode referir-se também até o ano 70, com a queda de Jerusalém, pois entendemos que a frase “... o povo do príncipe, que há de vir, destruirá a cidade e o santuário” (v. 26), esteja ligada ao final da 69ª semana.
    Sobre a data da morte de Jesus, em 29 d.C., há outras fontes que indicam esta ou outra data próxima, 29 ou 30, como o Ministério Got Questions[6], por exemplo, que afirma:
    Uma série de fatores nos permite identificar o ano da morte de Jesus. Sabemos que João Batista iniciou o seu ministério em 26 d.C., com base na nota histórica em Lucas 3:1. Jesus provavelmente começou o seu ministério logo após João ter começado o dele. Jesus então ministrou pelos próximos três anos e meio, aproximadamente. Assim, o fim de seu ministério teria sido c. 29-30 AD... Há argumentos acadêmicos que apoiam as duas datas [entre 30 e 33 AD, e entre 29 e 30 AD]... A data anterior (30 AD) parece estar mais de acordo com o que se deduz sobre o início do ministério de Jesus em Lucas 3:1[7].
    4.    A 70ª Semana – 7 anos: o príncipe que há de vir
    “... e o povo do príncipe, que há de vir, destruirá a cidade e o santuário, e o seu fim será com uma inundação; e até ao fim haverá guerra; estão determinadas as assolações. E ele firmará aliança com muitos por uma semana; e na metade da semana fará cessar o sacrifício e a oblação; e sobre a asa das abominações virá o assolador, e isso até à consumação; e o que está determinado será derramado sobre o assolador” (Dn 9.26.27).
    Até aqui entende-se o cumprimento de 483 anos, até à morte de Cristo. Observe que o “Messias” ou “Ungido’, nos versos 25 e 26, refere-se ao “Príncipe” – com P (maiúsculo) – e ainda no verso 26, aparece também outro “príncipe’ – com p (minúsculo). E o povo ligado a este (príncipe), diz o verso 26, “... destruirá a cidade e o santuário, e o seu fim será com uma inundação; e até ao fim haverá guerra; estão determinadas as assolações”. Veja também: “Então Pilatos, vendo que nada aproveitava, antes o tumulto crescia, tomando água, lavou as mãos diante da multidão, dizendo: Estou inocente do sangue deste justo. Considerai isso. E, respondendo todo o povo, disse: O seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos” (Mt 27.24,25). Esta profecia, relacionada à destruição de Jerusalém por Roma, ocorreu no ano 70.
    O dia 30 de agosto do ano 70 d.C.  marcou o fim do cerco romano a Jerusalém. O evento foi um dos mais sangrentos da primeira guerra judaico-romana. Durante o conflito, o exército de Roma, comandado pelo futuro imperador Tito, cercou e conquistou a cidade, que era controlada por facções rebeldes da Judéia desde o ano 66 d.C.[8]
    E depois disto – destruição de Jerusalém –, entendem os estudiosos, que há um hiato – um longo parêntese – entre a destruição de Jerusalém e a aliança (acordo) que o príncipe fará com muitos por uma semana – a última (70ª), conforme o verso 27. Neste hiato acontecem guerras e assolações.
    Este futuro príncipe tem relação com o “pequeno chifre”, referido em Daniel 7.8. Bem, este pequeno chifre surge dentre outros dez chifres de um “... quarto animal, terrívelespantoso...” (verso 7). Este animal “terrível e espantoso” refere-se ao Império Romano que teve seu fim em 476 d.C. Mas
    o ex-Império Romano (o reino de ferro de 2:33-35, 40-44; 7:7) terá dez chifres (isto é, reis, Ap. 17:12), correspondentes aos dez artelhos da imagem. Considerando esta visão dos dez reis, Daniel vê que entre eles levantam-se um ‘outro pequeno’ chifre (rei?) que subjuga três dos dez reis de maneira tão completa que a identidade separada dos seus reinos é destruída. Sete reis dos dez são deixados, e o ‘outro pequeno’ chifre que é ‘um príncipe, que há de vir’, de 9:26, a ‘abominação’ de 12:11 e Mt. 24:15. E a ‘besta do mar’ de Ap. 13.1-10. Ele será o chefe do quarto império mundial restaurado (Besta, veja Ap. 19:20...)[9].
    Assim como Scofield, outros também acreditam (interpretam) que o antigo Império Romano será restaurado, uma vez que as características do “príncipe” ou “Anticristo” ..., ao qual Daniel se refere, tem relação com os romanos, como vimos acima. “O ‘príncipe que há de vir’ é uma referência ao Anticristo, o qual, ao que parece, terá alguma ligação com Roma, já que foram os romanos que destruíram Jerusalém[10]”. Os adventistas afirmam categoricamente que sobre o Anticristo, trata-se de um papa, por causa de sua ligação com Roma até no nome da Igreja: Católica Romana. Não sendo esta hipótese, não dá como descartar alguma outra instituição, organização, bloco de países etc. que tenha a ligação com o “povo do príncipe, que há de vir”, e que já veio, e já sabemos que foram: os romanos.
    Vale destacar também que este hiato, repito, é chamado de “tempo dos gentios”. Quando falava sobre a destruição de Jerusalém, Jesus disse também, em relação aos judeus: “E cairão ao fio da espada, e para todas as nações serão levados cativos; e Jerusalém será pisada pelos gentios, até que os tempos dos gentios se completem” (Lc 21.24). A Igreja Cristã é a assembleia ou corpo de Cristo, formada por judeus e gentios (aqueles que não são judeus), sendo que estes últimos – a maioria dos crentes –, correspondem àqueles que receberam, e continuam recebendo, Jesus, conforme João 1.11,12: “Veio [o Verbo/Jesus] para o que era seu [Israel], e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam [gentios], deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome”.
    Portanto, durante o período entre a sexagésima nona e a septuagésima semana deve intervir todo o período da Igreja apresentado no N.T. A interpretação que atribui a última das setenta semanas ao fim dos tempos é dos Pais da Igreja. Quando esta septuagésima semana era mencionada durante os dois séculos e meio da Igreja Cristã, quase sempre era atribuída ao fim dos tempos. Irineu coloca o aparecimento do Anticristo ao fim dos tempos na última semana; na verdade, ele assegura que o período da tirania do Anticristo vai durar exatamente meia semana ou três anos e seis meses. Assim da mesma maneira, Hipólito declara que Daniel ‘indica o aparecimento dos sete anos que serão os últimos tempos’[11].
    O tempo dos gentios, que tem seu início, na verdade, com o começo do cativeiro de Judá, por Nabucodonosor, funde-se com o da Igreja, portanto, é um período que não é contado como dentro das 70 semanas, pois não correspondem ao “teu povo e a tua santa cidade”, ou seja, a Israel e à Jerusalém. Há consenso também entre os estudiosos de visão dispensacional e pré-milenista que o arrebatamento da Igreja mencionado em 1 Tessalonicenses 4:13-18, aconteça antes que a 70ª semana comece[12], mas este é assunto para um próximo artigo (estudo). O certo é que a profecia de Daniel é para o “teu povo” (v. 24), isto é, o povo de Daniel, Israel, repito, e “com muitos” de seu povo – acreditamos que nem todos aceitarão –, o príncipe ou Anticristo fará uma aliança  por 7 anos, sendo que na metade da semana, 3 anos e meio (v. 27); ou 1260 dias (Ap 12.6); ou ainda 42 meses (Ap 13,5), ele romperá o acordo “... e terá começo uma feroz perseguição que se prolongará pelos 3 ½ anos restantes do sete [última semana ou 7 anos], quando Cristo então retornará em companhia de Seus santos a fim de reinar por mil anos[13].
    O final do versículo 24 de Daniel 9 diz: “... para trazer a justiça eterna, para selar a visão e a profecia, e para ungir o Santo dos Santos”. Estas promessas finais das Setenta Semana de Daniel ocorrerão com a presença do Messias entre “teu povo” e na “tua santa cidade”, portanto, é a revelação de Jesus, na sua segunda vinda, para salvar o Israel remanescente (Is 10.22; 11.9; Rm 9.27), ao qual Zacarias diz corresponder à “terceira parte”, e que será provada como a prata. Este remanescente, a terceira parte, “... invocará o meu nome, e eu a ouvirei; direi: É meu povo, e ela dirá: O SENHOR é meu Deus” (Zc 13.9).
    Zacarias 14 é o desfecho da história de Israel que ajuda a entender o final da profecia a Daniel: ajuntamento das nações – Armagedom (v. 2 – Copara com Ap 16.13-16; 19.17); o livramento de Israel entre as nações (v. 3); a volta de Jesus ao Monte das Oliveiras, acompanhado de mudanças físicas na terra, na região de Israel – abertura do Monte das Oliveiras e aparecimento de um rio (vs. 4-8) e, por fim, o estabelecimento do reino e a benção total da terra (v. 9-21):
    E o Senhor será rei sobre toda a terra; naquele dia um será o Senhor, e um será o seu nome... e não haverá mais destruição, porque Jerusalém habitará segura (Zc 14.9-11).



    Notas:

    1. O calendário gregoriano, que usamos no Ocidente, é o resultado de uma adaptação do calendário juliano (romano), ocorrida em 1582, ordenada pelo pala Gregório XIII, no sentido de “... ajustar o ano civil, o do calendário, ao ano solar (...) Para adequar a data da Páscoa com o equinócio de primavera no Hemisfério Norte, o papa Gregório XIII ordenou que o dia seguinte a 4 de outubro de 1582 passasse a ser o dia 15 de outubro. Um salto de 11 dias! Para diminuir a defasagem, os dias bissextos não ocorreriam nos anos centenários (terminados em 00), a não ser que fossem divisíveis de forma exata por 400”. Disponível em: <https://escolakids.uol.com.br/historia/historia-do-calendario.htm>. Acesso em: 19/05/2020.
    2. Sobre os nomes e as variações dos meses e das horas em relação ao calendário hebraico ou bíblico, veja o artigo <https://bibliacompartilhada.com/calendario-biblico/>. Acesso em: 19/05/2020.
    3. SCOFIELD, C. I. Notas de Daniel 9.24-27. In: Bíblia Sagrada (ARA). São Paulo: Imprensa Batista Regular do Brasil: 1987.
    4. Considerei aqui o Decreto de Artaxerxes, mas outros consideram o Decreto de Ciro, mencionado em Ed 6.3: “No primeiro ano do rei Ciro, este baixou o seguinte decreto: A casa de Deus, em Jerusalém, se reedificará para lugar em que se ofereçam sacrifícios, e seus fundamentos serão firmes; a sua altura de sessenta côvados, e a sua largura de sessenta côvados”. Este decreto é datado de volta do ano 536 a.C.
    5. SHEDD, Dr. Russel P. (Editor). O Novo Comentário da Bíblia, Vol. II. São Paulo: Vida Nova: 1983 (Reimpressão), pág. 829.
    6. Got Questions Ministriesum ministério que “busca glorificar o Senhor Jesus Cristo disponibilizando respostas bíblicas, apropriadas e rápidas a perguntas relacionadas à espiritualidade através do ambiente da internet”.
    7. Disponível em: <https://www.gotquestions.org/Portugues/que-ano-Jesus-morreu.html>. Acesso em: 21/05/2020.
    8. Cerco romano a Jerusalém termina em banho de sangue”. Disponível em: <https://br.historyplay.tv/hoje-na-historia/cerco-romano-jerusalem-termina-em-banho-de-sangue>. Acesso em: 23/0/5/2020.
    9. SCOFIELD. Vide Nota 3.
    10. O que são as setenta semanas de Daniel?”. Disponível em: <https://www.gotquestions.org/Portugues/setenta-semanas.html>. Acesso em: 23/05/2020.
    11. SHEDD, Dr. Russel P. Vide Nota 5.
    12. Por exemplo, Alexandre DUTRA. Disponível em: <https://www.gospelprime.com.br/setenta-semanas-daniel-messias/>. Acesso em: 23/05/2020.
    13. SHEDD, Dr. Russel P. Vide Nota 4., pág. 830.

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    • Sugiro o estudo do Pastor Armando Bispo sobre o assunto, acessando o vídeo a seguir:

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      Para visualizar e/ou imprimir este artigo em PDF, acesse:


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