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15 maio 2020

A Era dos Mártires (X): A perseguição no século terceiro

Por
GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 133 a 145.



Artigo completo em PDF:

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11 maio 2020

A Era dos Mártires (IX): Os mestres da igreja

Por
GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 109 a 132.





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07 maio 2020

A Era dos Mártires (VIII): O depósito da fé

Por

GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 095 a 108.



“O erro nunca se apresenta em toda sua nua crueza, a fim de não ser descoberto. Antes veste-se elegantemente, para que os incautos creiam que é mais verdadeiro do que a própria verdade” (Irineu de Leão).


Artigo completo em PDF:

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05 maio 2020

A Era dos Mártires (VII): A defesa da fé

A Era dos Mártires (VII): A defesa da fé 

Por
GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 079 a 094.


Artigo completo em PDF:

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A Era dos Mártires (VI): A perseguição no século segundo

A Era dos Mártires (VI): A perseguição no século segundo 

Por
GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 061 a 078.


Policarpo de Esmirna, queimado vivo em
155.    Antes de sua morte, ante ao pedido
 para negar a Cristo, ele disse: "Faz oitenta
e seis anos que o sirvo, e nenhum mal  me
fez.   Como hei de maldizer a meu rei, que
me  salvou?
"

Artigo completo em PDF:

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03 maio 2020

A Era dos Mártires (V): Os primeiros conflitos com o estado


A Era dos Mártires (V): Os primeiros conflitos com o estado

Por

GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires – Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1995 (Reimpressão), pág. 049 a 060.

 
Os cristãos no circo

Artigo completo em PDF:

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02 maio 2020

As Escrituras (2): formação do cânon e outras considerações

Por Alcides Barbosa de Amorim

Já falamos em outro momento sobre As Escrituras, como a verdade revelada e inspirada por Deus, ou seja, informações internas sobre a Bíblia, isto é, aquilo que ela fala de si mesmo, destacando sua revelação, inspiração, inerrância e infalibilidade. Neste, dando prosseguimento à nossa série de estudos sobre doutrinas e dogmas, queremos refletir sobre como a Bíblia veio a surgir como tal, transformando no cânon cristão, suas divisões internas – intertestamentárias – e alguns enfoques sobre os livros apócrifos ou deuterocanônicos.
1.    O Cânon do Antigo Testamento
“Pelo que, esta geração será considerada responsável pelo sangue de todos os profetas, derramado desde o princípio do mundo: desde o sangue de Abel até o sangue de Zacarias, que foi morto entre o altar e o santuário. Sim, eu lhes digo, esta geração será considerada responsável por tudo isso” (Lc 11.50-51)
O termo “cânon” deriva do grego kanõn, que designava uma medida de carpinteiro (talvez derivado do hebraico qãneh, que se refere a uma vara de medir, de seis côvados de comprimento), e tem sido usada para identificar aqueles livros considerados espiritualmente superlativos, em comparação com os quais os outros eram medidos e achados de valor secundário no uso geral da igreja. Para os cristãos primitivos e para (posso afirmar) o protestantismo reformado e conservador, esta “vara de medir” refere-se a um grupo de livros reconhecidos como regra de fé e prática.
Durante mais de mil anos de história dos judeus, eles praticavam sua religião, sem ver a necessidade de um cânon padrão. Com o tempo, porém, acreditamos que por providência divina, eles foram se preocupando com o assunto. E durante o período Inter bíblico ou intertestamentário[1], surgiram diversos livros, considerados apócrifos ou pseudoepígrafos que se juntaram aos demais considerados canônicos ou sagrados. Uma tradução dos livros judaicos para o grego feita nesta época é a Septuaginta ou versão dos Setenta (LXX), ocorrida possivelmente, durante o reinado de Ptolomeu Filadelfo (285-245 a.C.), para a sua biblioteca em Alexandria, no Egito.  Esta versão recebeu este nome por causa da quantidade de tradutores, um tanto inexata, que era de setenta e dois anciãos, e foi feita também para atender a conveniência de alguns judeus de fala grega, que por causa da influência do helenismo[2] desconheciam sua própria língua.
Precisamos considerar que a versão dos LXX, embora tenha sido popularizada com a expansão do helenismo e da língua grega, seus tradutores não se limitaram a traduzir apenas os livros conside­rados canônicos pelos judeus. Eles traduziram os demais livros judaicos disponíveis. O trabalho dos massoretas[3] (transmissores), substitutos dos antigos escribas (os Sopherim), foi importante para fazer a seleção dos livros, considerados canônicos dos demais, além de trabalhar para a vocalização e acentuação dos textos. Assim, um Texto Massorético (TM) veio a ser o texto padrão (Tenah) utilizado como cânon, por volta do 1º século a.C., contendo 22 livros, e utilizado nos tempos de Jesus. Archer Jr.[4], fala desta uma divisão do cânon hebraico de edição massorética, da seguinte forma:
· Os livros da Lei (Pentateuco) ou Torá: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio – 5 livros.
· Os Profetas (Neviim):
- Anteriores: Josué, Juízes, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis – 6 livros. 
- Posteriores – Maiores (Isaías, Jeremias, Ezequiel) e os doze Profetas Menores – 15 livros.
· Os Escritos (Kêtuvim): 
Poesia e Sabedoria: Salmos, Provérbios e Jó, os Rolos ou Megilloth (lidos no ano litúrgico) que são Cantares, Rute, Lamentações, Eclesiastes e Ester – 8 livros.
- Históricos: Daniel, Esdras, Neemias e 1 e 2 Crônicas – 5 livros.
Fiz questão de somar a quantidade de cada divisão interna do texto acima, totalizando 39 livros, pois esta corresponde ao atual Antigo Testamento (Veja as divisões abaixo) da Bíblia utilizada pela maioria dos protestantes, embora a ordem seja diferente. Daniel, por exemplo, está, em nossa Bíblia, entre os Profetas Maiores, enquanto para os judeus, ele está entre os históricos. Há ainda outras considerações, mas apenas para nota, nosso último livro do Antigo Testamento é o do profeta menor, chamado Malaquias, enquanto o do atual cânon judaico é 2Crônicas. Na verdade, “... a Bíblia protestante atual em nossa língua segue a ordem da Vulgata Latina [da qual falaremos mais à frente] e o conteúdo da Bíblia Hebraica” (J.R. MICRAY. In: ELWELL: 1990, Vol. I, p. 178). (Veja o vídeo de Yago Martins no final, quando ele cita Josefo fazendo referência aos 22 livros divinos dos judeus “considerados divinos”).
Destaco também aqui o texto de Lucas Banzoli[5], no qual ele faz referência às palavras de Jesus, que mencionei como cabeçalho deste capítulo: “Pelo que, esta geração será considerada responsável pelo sangue de todos os profetas, derramado desde o princípio do mundo: desde o sangue de Abel até o sangue de Zacarias, que foi morto entre o altar e o santuário. Sim, eu lhes digo, esta geração será considerada responsável por tudo isso” (Lc 11.50-51). Banzoli considera este período citado por Jesus, os dois extremos entre Abel (primeiro mártir da história humana) até Zacarias, o último mártir (não o último livro, pois em nossa Bíblia, o último livro é Malaquias e na Bíblia Hebraica, o último é 2Crônicas, como já vimos) do Antigo Testamento, como sendo o cânon que Jesus aprovou em seus dias. Nesse caso, especifica Banzoli, Jesus estava mostrando uma continuidade temporal, de Abel até Zacarias ou de A à Z, como começo e final, respectivamente, do cânon de seu povo, os judeus. “Uma vez que este Zacarias foi o último profeta canônico que sofreu martírio, a sentença ‘de Abel até Zacarias’ faz todo o sentido, pois compreende todo o período de revelação do Antigo Testamento considerando a história dos mártires, a qual começa em Abel e termina em Zacarias.(BANZOLI).
Desta forma, o Texto Massorético (TM) da Septuaginta (ou de Abel a Zacarias), ou seja, o texto tradicional do povo judeu, sem a inserção de outros livros, considerados apócrifos, era o cânon utilizado por Jesus e seus apóstolos, e foi também dos cristãos primitivos e corresponde ao Antigo Testamento da Bíblia Protestante.
2.    O cânon do Novo Testamento
“Para ele [Atanásio], como para Clemente, a regra da fé e o conteúdo da Escritura eram idênticos. A tradição, segundo Atanásio, só tem autoridade quando está de acordo com a Escritura. Como ele faz ver claramente em sua carta pascoal de 367, o cânone neotestamentário é definitivo”.[6]
Em relação ao Novo Testamento, este é parte exclusiva da Bíblia cristã, não utilizada pelos judeus não cristãos, por razões óbvias, como o fato de eles não aceitarem a pessoa de Jesus como o Cristo ou Messias. E foi, ademais, o resultado de muita discussão para as escolhas dos livros que comporiam esta parte das Escrituras, no decorrer do segundo século, após a morte de todos os apóstolos. Em meados do século II, os mestres cristãos decidiram incluir no cânon neotestamentário os quatro Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João), chamados por Eusébio (3, XXV), de “a santa tétrade dos Evangelhos”, dentre muitos outros, como os Evangelhos de Tomé, Pedro e Matias, por exemplo. Depois, juntaram-se aos Evangelhos, o livro de Atos e as epístolas paulinas. Estas foram as primeiras a conseguir aceitação geral. “Outros livros, tais como o Apocalipse, a Terceira Epístola de João, e a Epístola de Judas, demoraram mais tempo em ser universalmente aceitos.” (GONZÁLEZ: 1995a, p. 102).
Mas não havia ainda um cânon padrão para o Novo Testamento. Este trabalho tornou-se necessário, principalmente depois do surgimento de heresias como resultado de um sincretismo religioso que veio a preocupar os pais da igreja[7] que buscaram uma doutrina única para servir de base escrita e fidedigna para a fé cristã.
A escolha dos atuais 27 livros “genuínos” ou “canônicos”, bem como seu veredicto como parte do cânon, não foi obra apenas dos homens piedosos cristãos daquela época, mas foi direcionada pelo Espírito Santo. Já pelos fins do século II, estes livros já estavam definidos, mas as discussões acerca de sua canonicidade continuaram. “Essas discussões, sem dar-se por encerradas definitivamente, foram concluídas, a grosso modo [negrito no original], no Oriente (com exceção da Síria) e no Ocidente, pelo fim do século IV. As duas decisivas datas são, para o Oriente, a 39ª carta pascal de Atanásio, em 367, e para o Ocidente, o Sínodo de Roma de 382, e os Concílios africanos de Hipona (393) e de Cartago (367)” (CULLMAN: 1984, p. 117).
Portanto, no Concílio de Cartago (367) ficou definida a lista dos 27 livros que adotamos atualmente, e compõem o cânon do Novo Testamento que é aceito pelos três principais segmentos do Cristianismo: Igreja Católica, Igreja Ortodoxa Grega e pelos protestantes. Mas a decisão indiscutível para se usar este cânon com o nome de Escrituras divinas a serem lidas nas igrejas, ocorreu em 397, no outro Concílio de Cartago.
3.      Divisões da Bíblia e outras considerações
“A união do Novo Testamento ao Antigo Testamento em uma mesma ‘Bíblia” significa por uma parte que se realizou, realiza-se e se realizará um plano divino sobre uma linha histórica particular, escolhida por Deus e que se desenrola, desde as origens até o fim, dentro da história geral” (CULMANN: 1984, p. 120).
Queremos destacar aqui as divisões do Antigo e Novo Testamentos e fazer algumas observações sobre os apócrifos constantes na Bíblia utilizada pela Igreja Católica.
a)  Divisões do Antigo Testamento[8]:
Depois de vermos que a Bíblia Hebraica possui 22 livros e que os mesmos correspondem ao Antigo Testamento da Bíblia utilizada pelos cristãos protestantes, num total de 39 livros, vejamos como se dá em geral sua divisão:
· Lei ou Pentateuco: Gênesis (Gn); Êxodo (Ex) Levítico (Lv); Números (Nm) e Deuteronômio (Dt) – 5 livros.
· Históricos; Josué (Js); Juízes (Jz); Rute (Rt); 1 e 2 Samuel (1Sm, 2Sm); 1 e 2 Reis (1Re, 2Re); 1 e 2 Crônicas (1Cr, 2Cr); Esdras (Ed), Neemias (Ne) e Ester (Et) – 12 livros.
· Poéticos e Sapienciais: Jó (Jó); Salmos (Sl); Provérbios (Pv); Eclesiastes (Ec); Cantares de Salomão (Ct) e Lamentações de Jeremias[9] (Lm) – 6 livros.
· Proféticos:
- Profetas Maiores[10]: Isaías (Is); Jeremias (Jr); Ezequiel (Ez) e Daniel (Dn) – 4 livros.
- Profetas menores: Oseias (Os); Joel (Jl); Amós (Am); Obadias (Ob); Jonas (Jn); Miqueias (Mq); Naum (Na); Habacuque (Hc); Sofonias (Sf); Ageu (Ag); Zacarias (Zc) e Malaquias (Ml) – 12 livros
b)  Divisões do Novo Testamento:
As divisões dos 27 livros do Novo Testamento podem ser (sugestão minha) da seguinte ordem:
· Evangelhos: Mateus (Mt); Marcos (Mc); Lucas (Lc) e João (Jo) – 4 livros.
· Histórico: Atos dos Apóstolos (At) – 1 livro apenas.
· Epístolas ou Cartas:
- Paulinas: Romanos (Rm); 1 e 2 Coríntios (1Co, 2Co); Gálatas (Gl); Efésios (Ef); Filipenses (Fp); Colossenses (Cl); 1 e 2 Tessalonicenses (1Ts, 2Ts); 1 e 2  Timóteo (1Tm, 2Tm); Tito (Tt); Filemon (Fm) – 13 lvros.
- Gerais> Hebreus (Hb); Tiago (Tg); 1 e 2 Pedro (1Pe, 2Pe); 1, 2 e 3 João (1Jo, 2Jo, 3Jo) e Judas (Jd) – 8 livros.
· Profético: Apocalipse (Ap) – 1 livro apenas.
Apócrifos ou deutero-canônicos e a Vulgata
Já vimos acima que durante o Período Inter bíblico surgiram diversos livros e textos que não foram incluídos na Bíblia Hebraica. São os chamados apócrifos (gr. Apokrypha = “coisas ocultas” ou “escritos fora do cânon”). Estamos nos referindo, obviamente, ao Antigo Testamento da Bíblia protestante. “Cerca de treze livros perfazem os apócrifos: 3 e 4 Esdras, Tobias, Judite, o Restante de Ester, a Sabedoria de Salomão, Eclesiástico (que também é chamado a Sabedoria de Jesus, Filho de Siraque), Baruque, a Carta de Jeremias, os Acréscimos a Daniel, a Oração de Manassés e  1 e 2 Macabeus” (D. H. WALLACE. In.: ELWELL: 1990. Vol. I, p. 96).
No final do século IV e início do século V, Jerônimo (347-419) fez uma tradução da Bíblia Hebraica para o latim, que ficou conhecida como Vulgata (divulgada ou popular). Na sua Bíblia, Jerônimo conserva parte dos livros dos apócrifos citados acima, Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico (ou Sabedoria de Jesus bem Sirach), Baruque, 1 e 2 Macabeus (7 livros), além de acréscimos nos livros Ester e Daniel. Mas é importante destacar que Jerônimo faz questão de escrever diversas notas sobre estes livros e acréscimos. Só para citar um exemplo, depois de Ester 10.3[11], há uma destas notas que diz: “Traduzi com toda a fidelidade o que se acha no texto hebraico. As passagens que seguem [Ester 10.4 a seguir], encontrei-as apenas na edição ‘vulgata’ (isto é, ‘divulgada’) em língua e caracteres gregos e as coloquei aqui no fim do livro, marcados – como é nosso costume – com o óbelo, quero dizer, o sinal distintivo à margem”. Segundo os editores da referida Bíblia, “… a edição ‘vulgata’ de que fala São Jerônimo, é a antiga versão itálica, usual naquele tempo”. Jerônimo considera estes livros acrescidos em posição secundária aos demais. E ao que parece esta atitude foi uma recomendação de Agostinho de Hipona, com o qual Jerônimo teve várias divergências. GONZÁLEZ (1995b, pp. 160-161) afirma sobre uma carta de Agostinho destinada a Jerônimo sugerindo ele acrescentar “… notas que mostrem claramente em que pontos tua versão [a Vulgata de Jerônimo] difere da Septuaginta, cuja autoridade é inegável… Além disso não vejo como, depois de tanto tempo, alguém possa descobrir nos manuscritos hebraicos alguma coisa que tantos tradutores e bons conhecedores da língua hebraica não tenham visto antes”.
Bem, no Concílio de Trento, no século XVI, a Igreja Católica oficializou esta versão da Bíblia de Jerônimo, diferentemente do ramo protestante. E estes livros e acréscimos passaram a ser chamados pelos católicos de "deuterocanônicos.", isto é, uma espécie de segundo cânon ao lado dos demais livros, enquanto os protestantes os colocam no mesmo nível dos demais apócrifos.
Considerações finais:
Vimos como os judeus viveram por muito tempo sem um texto padrão que lhes servissem como um cânon. Mas com o tempo, houve a necessidade deste trabalho o que foi possível até por volta do século I a.C. aproximadamente. E como os cristãos são, na sua origem, uma comunidade que de certa maneira deu continuidade ao trabalho dos judeus em um novo momento – Nova Aliança –, o cânon dos judeus passou a ser também o cânon dos cristãos.
Ao texto judaico, Antigo Testamento foi acrescentado outro, pelos cristãos, que veio a ser chamado Novo Testamento, que também contou com providência divina na história de sua formação e formatação. Bom seria destacar aqui ainda, como a Bíblia Sagrada em seu todo foi dividida em capítulos e versículos e como chegou até nós o primeiro volume em Português, mas estes são assuntos que poderão ocupar outro ou outros capítulos...
Sugiro, para finalizar, o acompanhamento de todo o processo de formação do cânon, em vídeo de Yago Martins a seguir:



Referências bibliográficas:
ARCHER Jr., Gleason L. Merece confiança o Antigo Testamento? São Paulo: Vida Nova, 3ª edição, 1984.
BANZOLI, Lucas. “De Abel até Zacarias”: O cânon bíblico de Jesus. Disponível em: <http://www.lucasbanzoli.com/2018/07/de-abel-ate-zacarias-o-canon-biblico-de.html>. Acesso em: 21/03/2019.
CESAREIA, Eusébio de. História Eclesiástica: os primeiros quatro séculos da Igreja Cristã. Rio de Janeiro: CPAD, 1999.
CULLMAN, Oscar. A formação do Novo Testamento. São Leopoldo (RS). Sinodal, 1984.
DOUGLAS, J. D. (Editor Organizador). O Novo Dicionário da Bíblia, Volumes I, II e III. São Paulo: Vida Nova, 1979.
ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. I, II e III. São Paulo: Vida Nova, 1990.
GONZÁLEZ, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo, Vol. 1 – A era dos mártires. São Paulo: Vida Nova, 1995a.
_________, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo, Vol. 2 – A era dos gigantes. São Paulo: Vida Nova, 1995b.
HÄGGLUND, Bengt. História da Teologia. Porto Alegre: Concórdia: 2003.

Notas:

  •   [1] Inter bíblico é o nome que se dá ao período que vai de Malaquias, último profeta do Antigo Testamento (segundo nossas versões) até João Batista, no Novo Testamento. Foi um período de aproximadamente 400 anos, em que os judeus eram dominados primeiramente pelos persas e depois pelos romanos e sob influência da filosofia e língua gregas.
  •   [2] Helenismo foi a junção da cultura grega com outras do mundo oriental (mesopotâmica, egípcia, persas…), propagada por Alexandre, o Grande, portanto, durante o período Inter bíblico, e que influenciou muito o povo judeu e todo o mundo romano, ao mesmo tempo em que foi útil para a propagação do cristianismo.
  •   [3] Os massoretas eram os estudiosos que deram ao texto do Antigo Testamento sua forma final, entre 500 e 950 d.C. Receberam este nome porque conservaram por escrito a tradição oral (ou ‘massora’) no que diz respeito a vocalização e acentuação certa do texto, e o número de ocorrências de palavras raras e ortografias pouco comuns. Receberam o texto consoantal [sic] sem vocalização, da parte dos Sopherim, e intercalaram os pontos vocálicos que deram a cada palavra sua pronúncia e forma gramatical exatas” (ARCHER Jr. Op. Cit., p. 65).
  •   [4] ARCHER: 1984, pp. 70-71.
  •   [5] BANZOLI, Lucas. “De Abel até Zacarias”: O cânon bíblico de Jesus. Disponível em: <http://www.lucasbanzoli.com/2018/07/de-abel-ate-zacarias-o-canon-biblico-de.html>. Banzoli destaca as divergências entre os teólogos em relação ao Zacarias mencionado nas palavras de Jesus, mas ele defende que o referido Zacarias era o filho de Baraquias, conforme Mateus 23.35. Embora na ordem dos livros este Zacarias foi o autor do penúltimo livro, conforme costa em nossa Bíblia, mas ele foi o último mártir, para efeito de consideração do cânon do Antigo Testamento. O Novo Dicionário da Bíblia (Vide Bibliografia) comenta, sobre o que alguns pensam, que nesta passagem bíblica “... o Senhor Jesus se referia ao martírio de Zacarias, filho de Joiada, em 2Cr 20-22, e que o equívoco a respeito do nome do pai de Zacarias seria ou devido a erro do evangelista [Mateus], ou então, visto que não ocorre nos melhores manuscritos do Evangelho de Lucas, que as palavras ‘filho de Baraquias’ seriam uma adição do copista. Visto que o livro das Crônicas é o último livro da Bíblia hebraica, o aparecimento dos nomes de Abel e Zacarias, nesse versículo do Novo Testamento, seria o equivalente à nossa frase ‘de Gênesis ao Apocalipse’. Mas pode ser, como afirma Banzoli: de “A” (de Abel), a “Z” (de Zacarias).
  •   [6] In: HÄGGLUND (Op. Cit., p. 67).
  •   [7] “Quando falamos nos Pais Apostólicos [ou Pais da Igreja], geralmente nos referimos a alguns autores cristãos do fim do primeiro século e do início do segundo, cujos escritos chegaram até nós. Estes escritos – em sua grande maioria de natureza incidental (cartas, homilias) – são de valor para nós porque, ao lado do Novo Testamento, são as fontes mais antigas que possuímos como testemunho da fé cristã” (HÄGGLUND: 2003, p. 13).
  •   [8] A presente divisão é adaptada da Bíblia Sagrada com referências e anotações de Dr. C. I. Scofield, edição de 1987. Além das divisões com os nomes dos livros, achei importante descrever também a forma de abreviações normalmente aceitas e a quantidade de livros de cada divisão.
  •   [9] Scofield coloca Lamentações entre os profetas. Achei melhor, como aprendi em alguma ocasião, coloca-lo entre os poéticos, embora seja de autoria de um profeta: Jeremias.
  •   [10] Aqui também o Dr. Scofield utilizou uma contagem diferente: ele não separa profetas maiores de menores, e sim todos juntos: profecias.
  •   [11] Bíblia Sagrada (Centro Católico), 25ªedição.  São Paulo, Ed Ave Maria, 1978.

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Para visualizar e/ou imprimir este artigo, gravado em PDF, acesse:

As Escrituras (2): formação do cânon e outras considerações =


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As Escrituras (1): a verdade revelada e inspirada por Deus

Por Alcides Barbosa de Amorim

"Buscai no livro do Senhor, e lede; nenhuma destas coisas faltará...” (Is 34.16).
“Toda a Escritura divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça” (2Tm 3.16).


Temos visível evidência que a Bíblia é uma revelação de Deus. E nos é dito na Bíblia que Deus deu a revelação por inspiração. Se a Bíblia é a revelação de Deus, justo é deixá-la falar por si mesma sobre a sua própria natureza.”[1]

Este artigo (post), pretende ser uma série de breves estudos sobre doutrinas bíblicas e dogmas cristãos, feitos, obviamente, do ponto de vista de um protestante conservador. Em Deuteronômio 32.2, lemos: “Goteje a minha doutrina como a chuva, destile o meu dito como o orvalho, como chuvisco sobre a erva e como gotas de água sobre a relva”. Portanto, toda doutrina (verdade bíblica) e dogma (como esta verdade é declarada pelos cristãos) precisa ter sua base na Bíblia e nada fora dela.
Uma das doutrinas que queremos destacar, primeiramente,  é exatamente acerca das Escrituras, e faremos isto em dois capítulos, neste, a partir de interpretações de textos que as próprias Escrituras falam de si mesmas, em relação, principalmente, ao Antigo Testamento, e outra, com destaque à formação histórica e composição do cânon utilizado pelos cristãos.
Atribuímos o significado às Escrituras (do grego, graphai) ou Escrituras Sagradas, o mesmo que é aplicado à palavra “bíblia” (livros), plural do termo grego biblion, “rolo” ou “livro”, que originalmente veio de papiro, uma planta aquática, cuja casca interna era secada para se tornar uma matéria e escrita de uso generalizado no mundo antigo. Mas ao mesmo tempo, tornou-se o Livro por excelência, o registro reconhecido da revelação divina em uma coleção de textos (livros) considerados pelos judeus e cristãos como divinamente inspirados.
1.    As Escrituras: revelação de Deus ao homem
"Que é a verdade?", perguntou Pilatos a Jesus (Jo 18.38). Há possibilidade de se buscar esta virtude? Se não houvesse um meio de chegar ao conhecimento de Deus, do homem e do mundo, Pilatos então teria razão. Mas há, e está em forma de livro, as Sagradas Escrituras, que é a verdade revelada de Deus ao homem. Ela é a revelação escrita do único Deus verdadeiro, visando a salvação do homem, e que demonstra sua autoridade divina por meio de muitas provas infalíveis. "O mundo pela sabedoria (filosofia) não conheceu a Deus” (1Co 1.21). As verdades que informam o homem como passar da terra para o céu devem ser enviadas do céu à terra. Em outras palavras, o homem precisa de uma revelação. Há outra revelação que o homem pode alcançá-la por meio da razão, que é a natureza. Mas é a Palavra de Deus, a única capaz de “... penetrar até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração” (Hb 4.12). Como disse Kant, um dos maiores pensadores de todos os tempos, acerca dos cristãos: "fazem bem em basear a sua paz e piedade nos Evangelhos porque somente neles está a fonte das verdades profundas e espirituais, depois de a razão haver explorado em vão todas as possibilidades."
Para que a revelação de Deus passasse de pai para filho e se perpetuasse de geração para geração, precisaria estar escrita, em forma de livro. E “... tudo o que dantes foi escrito, para nosso ensino foi escrito, para que pela paciência e consolação das Escrituras tenhamos esperança” (Rm 15.4). A memória e a tradição podem falhar, por isso, acreditamos, Deus agiu com a máxima sabedoria e também dum modo normal dando ao homem a sua revelação. O Deus dos hebreus é a autoridade máxima a ser evocada quando se trata de sua Palavra. É nEle que se contempla toda a autoridade em última análise. E não somente sua autoridade, mas Ele próprio tornou-se conhecido na sua auto revelação escrita, a Bíblia Sagrada, que se tornou uma coletânea autorizada da sua revelação, em forma de livro, para servir de regra de fé e prática ao seu povo.
2.    A inspiração das Escrituras
Os registros históricos acerca do povo de Israel, dos milagres e ensinamentos de Jesus, do testemunho dos primeiros cristãos e, consequentemente, da história do Cristianismo demonstram a inspiração da Bíblia e seus efeitos benéficos sobre os que aceitam e vivem seus ensinamentos. Ela é “divinamente inspirada" (2Tm 3.16), literalmente, dada pelo sopro de Deus, para que o “homem de Deus”, “... seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda boa obra” (2Tm 3.17). O apóstolo Pedro afirma também que “... a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (2Pe 1.21).
A inspiração pode ser definida como "a influência sobrenatural do Espírito de Deus sobre a mente humana, pela qual os profetas, apóstolos e escritores sacros foram habilitados para exporem a verdade divina sem nenhuma mistura de erro" (In: PEARLMAN: 1977, p. 21). E também como "... o poder inexplicável que o Espírito Divino exerce sobre os autores das Escrituras, em guiá-los até mesmo no emprego correto das palavras e em preservá-los de todo erro, bem como de qualquer omissão" (Idem, p. 21).
A palavra Escritura, como aparece em 2Timóteo 3.16 e em outros textos, refere-se ao Antigo Testamento e é entendida como a Palavra de Deus. É como se o próprio Deus houvesse falado cada palavra[2] do livro, tornando-se o resultado da divina inspiração espiritual. Podemos dizer que a declaração de Pedro (2Pe 1.21) revela que o Espírito Santo estava presente duma maneira especial e milagrosa sobre os escritores das Escrituras, revelando-lhes as verdades que antes não conheciam e guiando-os também no registro dessas verdades e dos acontecimentos, dos quais eram testemunhas oculares, de maneira que as pudessem apresentar com exatidão substancial ao conhecimento de outrem.
A inspiração, ao invés de ser tratada como um assunto bastante complexo, conforme tem sido discutido nos vários credos cristãos através da história, como um assunto cheio de enigmas teológicos e tumultuado por definições obscuras etc., na verdade, ela pode ser entendida de forma bastante simples, a partir de reflexões de textos como os expostos acima. Mas com o passar dos tempos, a igreja teve de enfrentar doutrinas e opiniões erradas e defeituosas, por isso, doutores cristãos tiveram que definir e detalhar a doutrina da inspiração, tornando-a bastante complexa. Mas em resumo a inspiração das Escrituras pode ser definida como[3]:
·  Divina e não apenas humana – Diferentemente do que se diz acerca de grandes sábios, como Platão, Sócrates, Aristóteles, Browning, Shakespeare e outros gênios do mundo literário, filosófico e religioso, que eram especiais, mas humanos, a inspiração da Bíblia tem um caráter absoluto e sobrenatural que demonstram o elemento divino e espiritual em sua mensagem.
·  Única e não comum – Alguns confundem a inspiração com o esclarecimento e mantêm a opinião de que esse esclarecimento espiritual seja a explicação adequada sobre a origem da Bíblia. Mas este esclarecimento não é o mesmo que inspiração. Conforme depreendemos, por exemplo, de 1Pedro 1.10-12 (“Da qual salvação [em Cristo e por Ele] inquiriram e trataram diligentemente os profetas que profetizaram da graça que vos foi dada, indagando que tempo ou que ocasião de tempo o Espírito de Cristo, que estava neles, indicava, anteriormente testificando os sofrimentos que a Cristo haviam de vir, e a glória que se lhes havia de seguir. Aos quais foi revelado que, não para si mesmos, mas para nós, eles ministravam estas coisas que agora vos foram anunciadas por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pregaram o evangelho; para as quais coisas os anjos desejam bem atentar”). Por este texto, entendemos que os profetas recebiam verdades por inspiração e lhes era negado esclarecimento necessário à sua compreensão dessas mesmas verdades. O Espírito Santo inspirou-lhes as palavras, mas não achou por bem conceder-lhes a compreensão do seu significado. Neste caso, o texto sagrado está acima do entendimento humano e os profetas ou escritores apenas criam na mensagem que recebiam de Deus.
·  Viva e não mecânica – A inspiração não significa ditado, no sentido de que os escritores fossem passivos. A própria palavra inspiração exclui o sentido de ação meramente mecânica, e a ação mecânica exclui qualquer sentido de inspiração. O Divino Espírito usou as suas faculdades mentais produzindo desta maneira uma mensagem perfeitamente divina, e que, ao mesmo tempo, conservasse os traços da personalidade do autor. Embora seja a Palavra do Senhor, é ao mesmo tempo, em certo sentido, a palavra de Moisés, ou de Paulo. "Deus nada fez a não ser pelo homem; o homem nada fez, a não ser por Deus. É Deus quem fala no homem, é Deus quem fala pelo homem, é Deus quem fala como homem, é Deus quem fala a favor do homem." Se o entrosamento de mente e corpo já é um mistério demasiado grande, mesmo para o homem mais sábio; quanto mais não é o entrosamento do Espírito de Deus e o espírito do homem!
·  Completa e não somente parcial – Segundo a teoria da inspiração parcial, os escritores seriam preservados do erro em questões necessárias à salvação dos homens, mas não em outras matérias como sejam: história, ciência, cronologia e outras semelhantes. Portanto, segundo essa opinião, seria mais correto dizer que "A Bíblia contém a Palavra, em lugar de dizer que é a Palavra de Deus". Essa teoria nos submergiria num pântano de incertezas, pois quem pode, sem equívoco, julgar o que é e o que não é essencial à salvação? Onde está a autoridade infalível que decida qual parte é a Palavra de Deus e qual não o é? E se a história da Bíblia é falha, então a doutrina também o é, porque a doutrina bíblica se baseia na história bíblica. Finalmente, as Escrituras mesmas reivindicam para si a inspiração plenária. Cristo e seus apóstolos aplicaram o termo "Palavra de Deus" a todo o Antigo Testamento.
·  Verbal e não apenas de conceitos – Segundo outra teoria, Deus inspirou os pensamentos, mas não as palavras dos escritores. Isto é, Deus inspirou os homens, e deixou ao critério deles a seleção das palavras e das expressões. Mas a ênfase bíblica não está nos homens inspirados, mas sim nas palavras inspiradas. "Havendo antigamente falado aos pais pelos profetas" (Hb. 1.1). "Homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo" (2 Pe 1.21). Ainda mais, é difícil separar a palavra do pensamento; um pensamento é uma palavra antes de ser ela proferida. ("não comeceis a dizer em vossos corações"; "o tolo disse em seu coração"); uma palavra é um pensamento ao qual se deu expressão. Pensamentos divinamente inspirados naturalmente teriam sua expressão em palavras divinamente inspiradas. Paulo nos fala de "palavras ensinadas pelo Espírito" (1Co 2.13). Finalmente, uma simples palavra é citada como sendo o fundamento de doutrinas básicas (Jo  10.35; Mt 22.42-45; Gl 3.16; Hb. 12.26, 27).
3.    Inerrância e infalibilidade das Escrituras[4]:
A questão da autoridade é central para qualquer teologia e, no caso da teologia protestante, a Bíblia tem ocupado um papel importante na definição desta autoridade. A Reforma (século XVI) passou para seus herdeiros a crença de que a derradeira autoridade não se acha na razão nem no papa, mas nas Escrituras inspiradas. Por isso, dentro do protestantismo conservador, a questão da inerrância tem sido muito debatida.
As duas palavras mais comumente usadas para expressar a natureza da autoridade bíblica são “inerrância” e “infalível”. Embora estes termos sejam aproximadamente sinônimos com base na etimologia, são usados de modo diferente. Na teologia católico-romana, “inerrância” é aplicado à Bíblia, e “infalível” à igreja, especialmente à função do papa e do magisterium[5]. Visto que os protestantes rejeitam a infalibilidade tanto do papa como da igreja, o termo tem sido aplicado cada vez mais às Escrituras.
A inerrância é o ponto de vista de que, quando todos os fatos forem conhecidos, demonstrarão que a Bíblia, nos seus autógrafos originais e corretamente interpretada, é inteiramente verdadeira, e nunca falsa, em tudo quanto afirma, quer no tocante à doutrina e à ética, quer no tocante às ciências sociais, físicas ou biológicas.
Mas há várias considerações a serem feitas em relação à inerrância e infalibilidade no campo teológico. Destaco aqui apenas os argumentos bíblicos em prol destes pontos:
·  A Bíblia ensina sua própria inspiração, e isto requer inerrância (2Tm 3.16 – “Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça”. Ou seja, a Bíblia dá testemunho de si mesma.
·   A Bíblia ensina a Sua própria autoridade, e isto também requer inerrância (Mt 5.17-20 – aqui Jesus fala sobre o mínimo pormenor (“... nem um jota ou um til se omitirá...”) da lei que será cumprido); Jo 10.34-35 – Jesus diz que “... a Escrita não pode falhar).
·  Israel, povo do Antigo Testamento, tinha critérios claros para distinguir a falsa da verdadeira profecia e o falso do verdadeiro profeta (Dt 13.1-5, 18.20-22). A veracidade total e absoluta era uma da marca da mensagem divina. Tanto o profeta mensageiro quanto sua mensagem escrita eram instrumentos da comunicação divina e dignos de crédito.
·   As Escrituras usam, elas próprias (o seu todo), para apoiar sua inerrância. Às vezes, um argumento inteiro depende de uma única palavra. Por exemplo, em João 10.34, a palavra deuses foi extraída de Salmo 82.6 e seu sentido é encontrado pelo entendimento da leitura “do todo” da Bíblia.
·   As Escrituras confirmam a inerrância em relação ao caráter de Deus. Ele não mente (Nm 23.19, 1Sm15.29, Tt 1.2, Hb 6.18), portanto, a Bíblia que vem da parte de Deus para o homem, também não mente, ou seja, ela é inerrante e infalível.
Outras observações que destacamos ainda são:
·  A expressão "e Deus disse", ou equivalente, é usada mais de 2.600 vezes no Antigo Testamento, e confirma o testemunho e autoridade da Bíblia.
·  Jesus viveu em harmonia com os ensinos do Antigo Testamento e aprovou a sua veracidade e autoridade, como encontramos em diversos textos. Quero fazer referência apenas a Lucas 4.21 (“Então, começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos”); Mateus 22.29 (“... Errais, não conhecendo as Escrituras, nem o poder de Deus”); João 10.35 (“... a quem a palavra de Deus foi dirigida... e a Escritura não pode ser anulada...”); Lucas 24.25,27 (“... tudo que os profetas vos disseram! (...) E, começando por Moisés e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras”); Mateus 26.54 (“Como, pois, se cumpririam as Escrituras, que dizem que assim convém que aconteça?”)...
·  Os apóstolos e escritores do Novo Testamento também aprovaram as Escrituras (Antigo Testamento). Citamos, dentre os diversos textos apenas: Lucas 3.4 (“Segundo o que está escrito no livro das palavras do profeta Isaías...”); Romanos 3.2 (“... as palavras de Deus lhe foram confiadas [aos judeus]; Romanos 15.4 e 2 Timóteo 3.16 (já citados acima); Hebreus 1.1 (“Havendo Deus, antigamente, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos, nestes últimos dias, pelo Filho”); 2 Pedro 1.21 (já destacado); Atos 1.16 (“Varões irmãos, convinha que se cumprisse a Escritura que o Espírito Santo predisse pela boca de Davi...”); Atos 3.18 (“Mas Deus assim cumpriu o que já dantes pela boca de todos os seus profetas havia anunciado: que o Cristo havia de padecer”)...
Quanto à inspiração e escolha dos Evangelhos e dos demais livros que compõem o Novo Testamento falaremos em outro momento. Por ora, concluindo esta primeira parte de nosso estudo sobre as Escrituras, apenas recapitulamos sobre a revelação como o ato de Deus pelo qual ele dá a conhecer ao homem, pois este, por si mesmo não podia saber, enquanto por inspiração entendemos que o escritor sagrado é preservado de qualquer erro ao escrever essa revelação. Daí, afirmarmos sobre a inerrância e infalibilidade das Escrituras, hoje composta de Antigo e Novo Testamento, deixadas para ensino e como única regra de fé e prática dos cristãos. Qual foi o processo para se chegar à composição dos Testamentos, a escolha dos livros e sua compilação? É o que pretendemos estudar e destacar no próximo capítulo (post).

Referências bibliográficas:
ARCHER Jr. Gleason L. Merece confiança o Antigo Testamento? São Paulo: Vida Nova, 1984 (3ª Ed.) 
DOUGLAS, J. D. O Novo dicionário da Bíblia. Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1979 (3ª Ed.).
ELWELL, Walter a. (Editor). Enciclopédia Histórico-teológica da Igreja Cristã. Vol. I. São Paulo: Vida Nova: 1888 (1ª Ed.).
PEARLMAN, Myer. Conhecendo as doutrinas da Bíblia. São Paulo: Vida, 1977(6ª Ed.)



Notas:
  • [1] Imagem e texto disponíveis em: <https://www.institutogamaliel.org/teologia-a-inspiracao-da-biblia/>. Acesso em 11/03/2019.
  • [2] Cada palavra que compõe o texto sagrado é produto de inspiração divina? Não queremos explorar aqui esta questão, apenas fazer algumas observações. A expressão do Dr. William Evans, citada por Pearlman “... é como se o próprio Deus houvesse falado cada palavra do livro” (Op. Cit, p. 21) é uma força de expressão para enfatizar o papel do escritor frente à inspiração do texto que lhe foi dado e a escolha das palavras que melhor expressam a transmissão da sua mensagem. Na verdade, entendemos que Deus inspirou seus servos profetas e/ou autores em geral, mas eles transmitiram a mensagem recebida de Deus em suas próprias palavras, com suas figuras de linguagem, símbolos etc., usando seu estilo próprio, sua influência cultural. Às vezes até indoutos (boieiros, pescadores, agricultores...) foram portadores da mensagem de Deus. Se não fosse assim, as diversas versões da Bíblia estariam erradas – embora precisa ter cautela nesta questão também mas isto é papel dos teólogos –. Mas em geral, as versões atualizadas da Bíblia, com palavras mais modernas e compreensíveis ajudam o leitor a entender melhor o texto inspirado, mas que na sua grafia original estava muito distante e diferente de cada língua e cultura.
  • [3] Cf. PEARLMAN: 1977 (q.v.), pp. 21 a 24 – texto adaptado.
  • [4] FEINBERG, P.D. Inerrância e infalibilidade da Bíblia (adaptado). In: ELWELL: 1988, pp. 179 a 184.
  • [5] Destacamos esta posição da Igreja Católica, na 5ª parte de nosso texto “O depósito da fé: cânon, sucessão apostólica, tradição e outras considerações", onde destacamos o que o COMPÊNDIO do Catecismo da Igreja Católica afirma, em defesa do chamado Depósito da fé: “O depósito da fé é confiado pelos Apóstolos a toda a Igreja. Todo o povo de Deus, mediante o sentido sobrenatural da fé, conduzido pelo Espírito Santo, e guiado pelo Magistério da Igreja, acolhe a Revelação divina, compreende-a cada vez mais e aplica-a à vida”.

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